A idéia que está sendo gestada no Ministério da Fazenda, de transformar o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários(CVM) em “superórgãos” encarregados de fiscalizar os mercados financeiros, de capitais, segurador e de previdência, absorvendo para isso Susep e Previc, é criticada pelo advogado Fávio Martins Rodrigues, sócio do escritório Boccater Camargo. “Essa idéia de juntar as estruturas de fiscalização é um discurso antigo, de simplificação, mas que não resolve os problemas complexos de cada um desses ambientes”, afirma. “E no fim acaba gerando desregulação”.
Segundo ele, o modelo “twin peaks” adotado pelo Reino Unido e Holanda e que está sendo visto como referência pelo Ministério da Fazenda, simplifica ao concentrar em dois órgãos, que correspondem aos nossos BC e CVM, a regulação de quatro mercados. Entretanto, o modelo enfrenta críticas atualmente, na Inglaterra, por ter foco excessivo na área financeira. “Um órgão que fiscaliza vários mercados geralmente acaba priorizando o mercado financeiro, que tem sempre questões emergenciais, em detrimento das especificidades dos outros mercados, como seguros e previdência, cujas questões emergenciais relacionadas à déficit, solvência, etc acabam ficando em segundo plano”, diz.
Além disso, o modelo “twin peaks” adotado por Reino Unido e Holanda não é o único existente. Outros países, como Estados Unidos, França e Alemanha, adotam modelos descentralizados. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Federal Reserve (Fed) fiscaliza o sistema financeiro, a Securities and Exchange Commission (SEC) fiscaliza o mercado de capitais, o Department of Labour fiscaliza a previdência e o Federal Insurance Office (Fio) fiscaliza o setor de seguros. “Na Alemanha as fiscalizações desses mercados também são feitas por órgãos especializados”, diz Rodrigues. “E o modelo do Reino Unido não é melhor que o norte-americano, ou do que o alemão”.
Segundo Rodrigues, o modelo do “twin peaks” tem a tendência a adotar os mesmos conceitos e soluções do sistema financeiro para as outras áreas reguladas, como previdência e de seguros. “É o caso da marcação a mercado, um conceito do mercado financeiro transplantado para a previdência complementar”, diz. “É a adoção de uma solução simples para um problema complexo”, diz.
Rodrigues conta que nos seminários internacionais são relatados casos ilustrativos sobre como o modelo “twin peaks” acaba gerando falta de foco em áreas específicas e desregulação. Num dos últimos encontros internacionais de que participou, foram apresentados casos concretos de trabalhadores ingleses que tinham comprado renda de aposentadoria em seguradoras, as quais compartilharam os riscos com resseguradoras, que por sua vez os recompartilharam com outras resseguradoras instaladas nas Ilhas Virgens ou do Panamá, onde os mercados são bem menos regulados.
As seguradoras e resseguradoras seguiram a lógica do mercado, operaram onde era mais barato, o problema é que isso não foi detectado pela regulação. “Então, a aposentadoria do trabalhador inglês acabou ficando muito mais vulnerável, sujeita a mercados pouco regulados, sem que ele próprio soubesse”, analisa Rodrigues.