O Comitê de PolÃtica Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu, nesta quarta-feira (20/01), manter inalterada a taxa básica de juros em 2% ao ano, na sua mÃnima histórica. Esta é a quarta vez consecutiva em que o Copom opta pela manutenção da taxa nesse patamar.
A decisão era aguardada com expectativa pelo mercado, principalmente devido à elevação da inflação no final do ano passado e à imprevisibilidade no cenário econômico nacional por conta do atraso na vacinação da população brasileira. A inflação de 2020 fechou em 4,52%.
O Copom também decidiu retirar o forward guidance, instrumento adotado pelo BC em agosto do ano passado em uma tentativa de acalmar o mercado com a sinalização de que os juros permaneceriam baixos por um longo tempo — naquela altura a taxa básica já estava em 2% ao ano. Entretanto, para evitar especulações, a retirada do instrumento nessa reunião pelo Compom veio acompanhada de uma sinalização do Comitê de que isso não significa o inÃcio de um ciclo de aperto monetário. De acordo com o comunicado do Comitê (ver abaixo), a retirada do forward guidance "não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros".
Para o sócio da gestora Panamby Capital e ex-diretor de PolÃtica Monetária do Banco Central, Reinaldo Le Grazie, “a retirada do forward guidance já era esperadaâ€. Ele acha que isso não significa indicação de inÃcio de alta da Selic, mas que o Copom está sinalizando que irá fazer um acompanhamento mais detalhado da inflação. “Apesar da alta da inflação ter surpreendido no final do ano passado, ainda há muita dúvida sobre como ela vai se comportar daqui para a frenteâ€, diz. “Está difÃcil ler os indicadores de inflação, e isso está acontecendo não só no Brasilâ€.
Segundo ele, embora a inflação tenha vindo muito alta no final do ano passado, a expectativa para este ano e para o ano que vem é de uma inflação em torno de 3,5%, dentro da meta do BC que é de 3,75% para este ano e de 3,5% para o ano que vem. Além disso, a atividade econômica está vindo mais fraca do que se esperava, neste inÃcio de ano. “Até o crescimento estatÃstico do PIB ameaça ser frustrado neste anoâ€, diz.
Paralelamente a isso, os dados de desemprego são ruins o que deve impedir crescimentos reais de salários neste ano, impactando o consumo. E em relação ao crédito, que também cresceu muito no ano passado, “não sei quanto sobra para crescer neste anoâ€, diz o ex-diretor do BC.
Segundo Le Grazie, “não dá para trazer uma mensagem de alta de juros com esse ambiente. No mundo inteiro os Bancos Centrais estão preferindo errar com mais estÃmulo do que errar com menos estÃmuloâ€. De acordo com ele, os bancos Centrais estão adotando a seguinte linha de pensamento: “se a inflação andar, lá na frente a gente resolve, mas agora não é hora de tirar estÃmulos da economiaâ€.
Balanço de riscos mais simétrico - Para o diretor do Asa Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, “o BC reagiu à elevação das expectativas de inflação com a retirada da prescrição futura ("forward guidance"), passando a adotar um balanço de riscos para a inflação mais simétricoâ€.
Na opinião de Kawall, “o BC manteve uma visão cautelosa com relação aos seus passos futuros, em função do quadro de agravamento da pandemia no plano internacional e também no Brasil. Como o horizonte de polÃtica monetária agora se deslocou predominantemente para 2022, continuamos esperando a manutenção da Selic por perÃodo prolongadoâ€.
Veja o comunicado na Ãntegra:
Em sua 236ª reunião, o Comitê de PolÃtica Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 2,00% a.a. A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:
• No cenário externo, o aumento do número de casos e o aparecimento de novas cepas do vÃrus têm revertido os ganhos na mobilidade e deverão afetar a atividade econômica no curto prazo. No entanto, novos estÃmulos fiscais em alguns paÃses desenvolvidos, unidos à implementação dos programas de imunização contra a Covid-19, devem promover uma recuperação sólida da atividade no médio prazo. A presença de ociosidade, assim como a comunicação dos principais bancos centrais, sugere que os estÃmulos monetários terão longa duração, permitindo um ambiente favorável para economias emergentes;
• Em relação à atividade econômica brasileira, indicadores referentes ao final do ano passado têm surpreendido positivamente, mas não contemplam os possÃveis efeitos do recente aumento no número de casos de Covid-19. Prospectivamente, a incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia permanece acima da usual, sobretudo para o primeiro trimestre deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxÃlios emergenciais;
• A recente elevação no preço de commodities internacionais e seus reflexos sobre os preços de alimentos e combustÃveis implicam elevação das projeções de inflação para os próximos meses. Apesar da pressão inflacionária mais forte no curto prazo, o Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, ainda que tenham se revelado mais persistentes do que o esperado. Assim, o Copom segue monitorando sua evolução com atenção, em particular as medidas de inflação subjacente;
• As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se em nÃveis acima do intervalo compatÃvel com o cumprimento da meta para a inflação;
• As expectativas de inflação para 2021, 2022 e 2023 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 3,4%, 3,5% e 3,25%, respectivamente; e
• No cenário básico, com trajetória para a taxa de juros extraÃda da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de R$5,35/US$*, e evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom situam-se em torno de 3,6% para 2021 e 3,4% para 2022. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva até 3,25% a.a. em 2021 e 4,75% a.a. em 2022.
O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções.
Por um lado, o nÃvel de ociosidade pode produzir trajetória de inflação abaixo do esperado, notadamente quando essa ociosidade está concentrada no setor de serviços. Esse risco se intensifica caso uma reversão mais lenta dos efeitos da pandemia prolongue o ambiente de elevada incerteza e de aumento da poupança precaucional.
Por outro lado, um prolongamento das polÃticas fiscais de resposta à pandemia que piore a trajetória fiscal do paÃs, ou frustrações em relação à continuidade das reformas, podem elevar os prêmios de risco. O risco fiscal elevado segue criando uma assimetria altista no balanço de riscos, ou seja, com trajetórias para a inflação acima do projetado no horizonte relevante para a polÃtica monetária.
O Copom avalia que perseverar no processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para permitir a recuperação sustentável da economia. O Comitê ressalta, ainda, que questionamentos sobre a continuidade das reformas e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia.
Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponÃveis, o Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa básica de juros em 2,00% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatÃvel com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2021 e, principalmente, o de 2022.
Segundo o forward guidance adotado em sua 232ª reunião, o Copom não reduziria o grau de estÃmulo monetário desde que determinadas condições fossem satisfeitas. Em vista das novas informações, o Copom avalia que essas condições deixaram de ser satisfeitas já que as expectativas de inflação, assim como as projeções de inflação de seu cenário básico, estão suficientemente próximas da meta de inflação para o horizonte relevante de polÃtica monetária. Como consequência, o forward guidance deixa de existir e a condução da polÃtica monetária seguirá, doravante, a análise usual do balanço de riscos para a inflação prospectiva.
O Comitê reitera que o fim do forward guidance não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros pois a conjuntura econômica continua a prescrever, neste momento, estÃmulo extraordinariamente elevado frente à s incertezas quanto à evolução da atividade.
Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Fabio Kanczuk, Fernanda Feitosa Nechio, João Manoel Pinho de Mello, MaurÃcio Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso e Paulo Sérgio Neves de Souza.
* Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio R$/US$ observada nos cinco dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.