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Institutos voltam à renda variável
Valorização do Ibovespa no primeiro semestre e perspectiva do fim do ciclo de alta dos juros ao final do ano estimulam a volta às bolsas

Edição 377

hoehn alessandra navegantesprev 25maiCom o ciclo de alta dos juros da economia brasileira e os prêmios das NTN-Bs acima das metas atuariais ao longo de 2024, os RPPS adotaram a tendência clara de redução das alocações na renda variável doméstica. Contudo, com a recuperação da Bolsa brasileira no primeiro semestre de 2025, os regimes próprios de previdência social (RPPS) voltam a olhar para as opções de fundos de ações e ETFs (exchange traded funds) disponíveis no mercado. Diversos regimes próprios começam a analisar novamente as oportunidades do mercado de ações brasileiro seja para rebalancear ou até mesmo para ampliar a alocação nesta classe de ativos.
O retorno para a renda variável deve ocorrer, na maioria dos casos, com uma gestão mais ativa e diversificada, deixando de lado os fundos passivos de Ibovespa, segundo os gestores de regimes próprios ouvidos pela reportagem. “Vemos o mercado de renda variável bastante promissor no cenário atual. Estamos analisando o aumento das aplicações desta classe de ativos. Temos vários fundos e gestores aprovados no ano passado e estamos começando com novos aportes”, diz Alessandra Hoehn, assessora financeira do NavegantesPrev, de Santa Catarina.
A gestora conta que o instituto está reduzindo a alocação em fundos passivos do Ibovespa. “Agora temos evitado esse tipo de fundo de ações. Procuramos maior diversificação na renda variável. Buscamos uma gestão mais ativa, com fundos de small caps, dividendos e, principalmente, produtos de gestores independentes com carteiras menores que não são coloquiais”, comenta.
Entre os independentes, Alessandra cita nomes como Guepardo, Tarpon, Wix Capital, Organon Capital, AZ Quest, 4UM, entre outros que já possuem recursos do regime próprio alocados em seus fundos. Ela destaca que os índices de small caps e dividendos subiram 27% e 31% em 2025, respectivamente, bem acima do Ibovespa que tem boa performance no ano, com alta de 16%, mas abaixo de outros segmentos. Há ainda fundos mono ativos que estão batendo em 37% de valorização no ano, como é o caso de um produto com ações da empresa de aterro sanitário Horizon. “É um case muito bom em nossa carteira de uma empresa bastante resiliente com excelente performance neste ano”, diz.
O NavegantesPrev administra atualmente um patrimônio de R$ 501 milhões, com cerca de 16% em renda variável. Outros 3,2% estão alocados em BDRs e 0,32% em ETFs. O instituto trabalha com a perspectiva de ampliar para 20% a parcela do patrimônio alocado em fundos de ações até o final do ano. No caso de produtos com gestão mais passiva, o instituto de Navegantes pretende optar pela alocação em ETFs, que possuem menor taxa de administração se comparados com os fundos passivos de ações.
A assessora de investimentos analisa que a Bolsa doméstica ainda está com preços baratos se considerar a perspectiva de preço versus lucro das empresas listadas. “Mesmo com a alta verificada em 2025, os preços ainda estão bem achatados. O aumento dos lucros das empresas abrem boas perspectivas também para a distribuição de dividendos”, aponta. A dificuldade ainda fica por conta da alta volatilidade que deve continuar afetando nos mercados no curto e médio prazos, mas ela acredita que é importante aproveitar as oportunidades para montar posições de longo prazo.

luz alvaro deziderio da SMIEducacao 24julNovo ciclo econômico - Álvaro da Luz, economista da consultoria SMI, indica que o ciclo econômico mudou e que há novas oportunidades para voltar a aumentar a alocação em renda variável. “Temos uma visão que o ciclo econômico mudou. Independente dos movimentos de um mês para o outro, independente se o Trump fale uma coisa ou outra, entendemos que o cenário mudou, pois estamos no final do ciclo de alta da Selic”, comenta. O economista explica que a parte longa dos juros, especialmente no pré-fixado, está cedendo. A inflação ainda não cedeu, pois está sujeita às questões fiscais, mas o ciclo econômico, que é o que determina o desempenho das classes de ativos a médio prazo, já mudou.
“Estamos vendo oportunidades para voltar a aumentar a renda variável, até aumentar os fundos de ações, sobretudo para os regimes próprios que fizeram a imunização de carteira, aqueles que compraram títulos públicos, que tem uma parte boa fora do risco e acima da meta, tem espaço para aproveitar classes de mais risco”, recomenda.
Álvaro indica que vai recomendar a montagem de novas posições na Bolsa de maneira parcimoniosa. “O RPPS aproveita tendências, não eventos pontuais, porque ele não deve fazer gestão de curto prazo. Então, vamos sugerir o aumento e montagem de estratégias em renda variável”, indica.

Rebalanceamento - Mesmo para quem não vislumbra o aumento da alocação em renda variável, o cenário atual e os próximos meses podem representar um momento de movimentação para o rebalanceamento dos fundos de ações. É o caso do Iperon (Instituto de Previdência de Rondônia), que conta com patrimônio de R$ 6,4 bilhões, com 6,5% alocados em renda variável doméstica. Isso corresponde a uma carteira de R$ 406 milhões em fundos de ações.
“Estávamos com uma conduta passiva na renda variável. Os únicos movimentos foram de pedir resgate de fundos que ficamos desenquadrados. Agora estamos mais otimistas com a Bolsa e vamos voltar a nos movimentar nesse segmento”, indica Felipe Ataíde de Albuquerque, coordenador de investimentos e gestor de recursos do Iperon. O instituto tem uma posição confortável com 55% do patrimônio alocado em títulos públicos (NTN-Bs) marcados na curva (a vencimento), 11% de Letras Financeiras de bancos S1 e outros 22% em fundos de renda fixa.
A alocação em renda variável no início de 2024 estava ao redor de 10% do patrimônio. Com a desvalorização das ações, a carteira encolheu para o nível atual. “Pretendemos realizar um rebalanceamento de fundos, saindo de ações livres, que representam atualmente 60% da carteira de renda variável”, aponta o gestor. Ele revela que o instituto pretende promover a migração para fundos de dividendos, que hoje representa 15% da carteira de renda variável, para ampliar até 25% ou 30%. “É uma boa janela para o rebalanceamento. Estávamos esperando este momento de alta da Bolsa. E já zeramos alguns fundos e resgatamos outros por questão de desenquadramento”, conta Felipe.
Ele comenta que o instituto está sublocado em Bolsa, mas mesmo assim, que não pretende aumentar muito a alocação nesta classe de ativo. A expectativa é terminar o ano com até 7% em fundos de ações. “O estrangeiro faz muito preço na Bolsa doméstica. Isso porque a porteira está pequena. Mas a Bolsa ainda está barata; pode ir facilmente até 250 mil pontos”, prevê o gestor do Iperon.
Alguns movimentos recentes realizados pelo Iperon foram os aportes em dois novos fundos de dividendos, um deles do Santander e outro do Bradesco. Também foi realizado um novo aporte em fundo que já tinha alocação do instituto, o AZ Quest Sistemático.

Ciclo dos juros - Felipe Ataíde explica que a tendência de alta da Bolsa deve ser impulsionada pela saída de recursos da renda fixa nos próximos anos. “Provavelmente os juros daqui dois anos não estarão no patamar de hoje. E boa parte dos recursos deve voltar para a Bolsa. Por isso, temos visão otimista com a renda variável para os próximos 2 ou 3 anos”, diz.
O gestor do Iperon explica que só não amplia o retorno à renda variável devido aos resultados recentes da carteira. Foram os fundos de ações o principal vilão do resultado do ano passado. Em 2024, os investimentos do instituto de Rondônia marcaram 95% da meta atuarial. Até outubro do ano passado, o Iperon estava empatando com a meta, mas no fechamento de dezembro, ficou abaixo do objetivo. Em 12 meses, o retorno está marcando 10,51% ante 10,48% da meta. Em 24 meses, a rentabilidade de 24,47% ficou bem acima da meta do período, de 19,91%. Em 2025, a carteira do instituto está marcando 1% acima da meta.
Devair Pietraroia, Superintendente do IPSM de São José dos Campos, coincide com a análise que os juros não devem se manter nos patamares atuais. O instituto chegou a concentrar mais de 20% do patrimônio em renda variável, mas promoveu a redução até os atuais 6,4%. O patrimônio atual do RPPS de São José gira em torno de R$ 2 bilhões.
“Assim como a maioria dos regimes próprios, estávamos reduzindo a renda variável para ampliar a aplicação em NTN-Bs marcadas na curva, com o objetivo de bater a meta atuarial”, comenta. E a estratégia deu resultado, pois as metas foram batidas tanto em 2023 quanto em 2024. Porém, em 2025, a estratégia deve começar a mudar. “Estamos começando a vislumbrar o momento de retorno para os fundos de ações, com a tendência positiva da Bolsa doméstica”, indica Devair. A preferência deve recair sobre os fundos de dividendos, mas a seleção de produtos deve priorizar a qualidade e histórico dos gestores.
O gestor aponta que a direção do instituto também está olhando para os fundos imobiliários como alternativa para alocação. “Os fundos imobiliários também apresentam opções com boas perspectivas”, diz o Superintendente do IPSM de São José dos Campos. Ele esclarece que a renda variável deve crescer com fundos de ações domésticas, pois no caso de fundos no exterior, o limite de 10% permitido pela regulação, já está tomado.

Investimentos no exterior - Os regimes próprios têm apostado na alocação de recursos em fundos com ativos no exterior. O NavegantesPrev começou a alocar em fundos de ações no exterior a partir de 2020. A alocação veio aumentando pouco a pouco até o ano passado, com a forte valorização do S&P 500. Os ganhos foram bastante positivos acima da meta atuarial até o final do ano passado. Mas em 2025, a carteira de fundos no exterior tem sofrido com a maior instabilidade do cenário da economia americana. “Ainda não resgatamos [investimentos no exterior]. Registramos forte valorização até o final do ano passado. Mas em 2025, estamos verificando instabilidade nesta carteira”, diz Alessandra Hoehn.
A ideia não é reduzir o percentual de alocações no exterior, mas de buscar maior diversificação. “Estamos buscando outras opções, como por exemplo, o mercado acionário europeu”, comenta a assessora de investimentos do RPPS de Navegantes.
O Iperon adotou estratégia diferente com os investimentos no exterior. “Decidimos zerar os fundos no exterior no segundo semestre de 2024, antes das eleições americanas”, revela Felipe Ataíde. Ele diz que a alocação nestes fundos era carregada há cerca de 6 anos e os retornos giravam entre 200% a 300%. “Foi um rali muito forte nos últimos anos e após a análise de valuation, decidimos colocar o lucro no bolso”, diz o gestor do Iperon. O instituto não deixa de olhar para as oportunidades no exterior, mas agora com preferência para a renda fixa.
No mercado doméstico, o Instituto de Rondônia continua apostando nos fundos de investimentos em participações (FIPs). O atual nível de alocação em FIPs gira em torno de 3% atualmente, mas deve crescer bem mais. O objetivo é alocar algo entre 5% e 10% do patrimônio neste tipo de fundos.