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As EFPCs se comunicam mal
O superintendente da Previc diz que a comunicação das entidades é distante do entendimento das pessoas sobre o que é um plano de previdência

Edião 374

Pena,Ricardo(Previc) 24fevO sistema de previdência complementar fechado aguarda a consolidação dos balanços de 2024 das entidades fechadas para saber a extensão do déficit atuarial, mas não será algo insignificante. Em entrevista à Investidor Institucional o superintendente da Previc, Ricardo Pena disse que dados preliminares indicam uma rentabilidade média de 6,06% no ano passado, com um grupo pequeno de entidade fechando abaixo da meta. Os resultados finais serão conhecidos ao final de março e divulgados pela autarquia provavelmente em abril. Veja abaixo os principais trechos da entrevista de Pena à Investidor Institucional:

Investidor Institucional - Como as entidades fecharam o ano passado, na média, do ponto de vista de resultados?
Ricardo Pena - Ainda não temos todos os dados fechados, mas temos uns números preliminares que indicam uma rentabilidade média de 6,06% no ano, sendo 5,66% nos planos de Benefício Definido (BD), 6,22% nos planos de Contribuição Variável (CV) e 7,15% nos planos de Contribuição Definida (CD). Essa média, que estava em torno de 7,5% até outubro, piorou bastante com os resultados de dezembro, que vieram bem ruins. Então, foi um ano muito difícil para os investimentos, um ano onde a Bolsa recuou 10% e o IMA-B 5+ recuou 8%, apesar da inflação estar sob controle, com o CDI perto de 11%.

Já dá prá saber quantas entidades fecharão o ano com déficit?
Ainda não, como eu disse ainda não temos os dados fechados, mas o balanço que tínhamos até outubro identificava três grandes grupos: um grupo menor formado por aquelas entidades que alcançaram a meta ou sua referência atuarial, um grupo maior que chegou perto desses objetivos, marcando entre 70% e 80% da meta ou da referência atuarial, e outro grupo também menor que ficou bem longe dos seus objetivos. Essa era a avaliação até outubro, mas como eu disse dezembro foi bem ruim, então esse quadro pode ter se deteriorado um pouco. Mas nós vamos ficar atentos sobretudo em relação a esse último grupo, fazendo uma janela de análise de três anos, sobretudo nos planos CD, que tiveram dificuldade por conta da marcação a mercado.

A marcação a mercado atrapalhou muito os CDs?
Em geral sim, mas por conta dessa exigência da marcação a mercado também muitos CDs estavam bem encurtados em suas posições e conseguiram performar.

Muitas fundações passaram a adotar, nos últimos anos, a estratégia conhecida como “imunização”. O que acha disso?
Não gosto muito desse termo, porque imunizar nem vacina imuniza. Nós tivemos que tomar quantas doses na Covid para imunizar, e ainda temos que tomar doses, então é um conceito muito forte. O que você tenta fazer é um cash flow, ou seja, você tem as suas obrigações e tenta fazer um match em função dos seus ativos. Mas não existe match perfeito para dizer eu estou imunizado, que eu imunizei a minha carteira.

Mas não faz sentido essa estratégia num cenário de juros altos?
Do ponto de vista da atual conjuntura, com o juro real elevado, a NTN-B acima de 7%, 7,5%, até pode fazer sentido, mas com essa “imunização”, que promove a concentração em títulos públicos, o nosso setor têm desaprendido a fazer diversificação. Eu acho que o título público é um bom ativo, combina alta rentabilidade, baixo risco, liquidez imediata, e talvez num plano BD, que já está mais maduro, essa estratégia do match do cash flow faça sentido, mas nos planos abertos, sobretudo nos planos CDs, com novos participantes entrando, é difícil você falar em imunização.

Muitos dirigentes dizem que só estão aproveitando a conjuntura favorável. O que vc acha disso?
Numa visão prospectiva, de médio e longo prazo, essa realidade de juro real a 7%, 7,5%, não vai continuar. E você faz a política de investimento para os 5 anos seguintes. Por exemplo, tem planos CD com quase 50% da carteira em operações compromissadas, e compromissada é caixa, é overnight. Se você olha a estrutura da duration do ativo em relação à duration do passivo previdenciário do plano, ele pode até performar no curto prazo mas tem um risco de descasamento muito grande, e além disso também tem o risco do reinvestimento. Se ele imuniza comprando o título a uma determinada taxa e espera até o vencimento, e aí tem uma taxa menor, então ele passa a ter um problema gravíssimo.

Falando sobre 2025, quais as principais dificuldades de investimento neste ano?
Eu acho que 2025 vai ser um ano difícil, até porque nós já estamos entrando num ciclo eleitoral. Cabe ao gestor de plano de previdência montar uma estratégia para os próximos 5 anos, definindo como é que ele vai fazer a alocação, o rebalanceamento, a escolha dos ativos. Em relação ao cenário macro, eu acho que a gente ainda vai ter alguma dificuldade, mas o gestor de fundo de previdência não pode brigar com a realidade. Ele está lá para ganhar dinheiro para o plano. Agora, em relação à volatilidade, que pesou no ano passado, acho que melhorou com a Resolução 61, que a entidade pode usar ou não usar para marcar os títulos na curva.

Elas vão marcar?
Olha, eu já escutei de muito gestor que ele não vai marcar, que ele vai preferir encurtar porque quer ter performance.

Será que isso não é por pressão dos participantes, tipo aquele grupo que fez um abaixo assinado pedindo a criação de um perfil de investimento só com títulos públicos?
Acho que você tem razão. E acho que por conta disso as entidades vão ter que investir em instrumentos permanentes de letramento dos participantes e também utilizar mecanismos de finanças comportamentais no desenho dos planos, no regulamento dos planos, no regulamento dos perfis para evitar que os participantes mudem de perfil todo dia, todo mês. Alguns participantes dizem que querem um perfil só de título público, como se título público também não apresentasse performance ruim. Veja aquele Tesouro Direto RendA+, criado no início de 2023, ele recuou 45% no ano passado. Então, eu acho que a ideia do perfil é boa, precisa ser incentivada, mas eu acho que também precisa olhar como a gestão da entidade está orientando o participante, fornecendo informações e tendo um modelo de decisão que o conduza à melhor escolha.

E isso está acontecendo?
Eu tenho recebido muitas queixas aqui, de participantes, de aposentados, de pensionistas, de empresas também, que sentem como se a entidade tivesse sido capturada por ela mesmo, para os dirigentes dela. Uma coisa que me incomoda é ver as entidades divulgando todo mês a rentabilidade mensal como se fosse um banco, uma asset, distante da realidade das pessoas, distante do entendimento das pessoas sobre o que é um plano de previdência. Em alguns casos, eu vejo a comunicação gerando até passivo, do tipo “eu não performei porque teve a marcação a mercado, mas se eu considerar a marcação na curva a rentabilidade seria tanto”. Eu acho isso muito temerário, e na justiça é um recurso grande que algumas pessoas poderão usar dizendo que não estavam sendo bem informadas. Então, a gente vai estar atento na fiscalização dessa comunicação.

A questão da comunicação das entidades está na pauta da Previc?
Sim, é uma coisa que me incomoda é ver, na própria Investidor Institucional por exemplo, todo mês tem algum dirigente dizendo que bateu metas, mas quando não bate ele se esconde, tergiversa, apresenta o resultado de uma forma criativa. Então, também precisa ter coragem, e às vezes humildade, para dizer, olha nós não performamos, vamos ser persistentes, nós temos uma construção a fazer. O resultado das entidades, em si, é lógico que me preocupa, mas a forma da comunicação também não está boa.

O que seria importante comunicar?
Tem que informar melhor as janelas de verificação da performance, comparar com os principais indicadores, ter uma linguagem mais simples, porque não adianta rebuscar, usar termos em inglês, porque isso assusta o participante. Eu já recebi participante aqui dizendo que, se ele pudesse, sacava tudo porque já não confiava no gestor. Então, a gente quer mexer nisso.

Mudando de assunto, como está a questão da revisão da Resolução 4.994? Quando será votada no Conselho Monetário Nacional?
Eu estive com o Secretário da Fazenda, Marcos Pinto, em fevereiro para a gente alinhar o encaminhamento da proposta da revisão da 4.994 e ele me disse que mandaria a proposta da Previc para o CMN até março. Para nós é importante, mesmo que o CMN diga olha, isso aqui não pode, mas aqui pode, para nós é fundamental ter uma decisão, até pra gente se reorganizar. É importante também para as entidades, porque elas tinham a expectativa de terem essa atualização até o final do ano passado para montar uma nova estratégia de investimento para os próximos 5 anos. Então, nós não desistimos, essa agenda é prioritária para nós, junto com outras medidas, como a revisão da resolução 30 e também do decreto sancionador.

Mas porque está demorando tanto?
Pra entender, tem que explicar que quando começou o governo, em 2023, nós participamos de um grupo no Ministério da Fazenda que discutia uma agenda de reformas financeiras, que tinha 17 pontos. Um desses pontos referia-se às diretrizes de investimento não só dos fundos de pensão mas das entidades abertas e também dos regimes próprios. Da nossa parte, a ideia era melhorar o cardápio de investimentos para os fundos de pensão. A gente tinha o problema dos FIPs, que foram demonizados, tanto que das 15 maiores fundações hoje só duas têm programas abertos para FIPs, que são a Fundação Copel e a Fundação Itaú Banco. Então, a ideia na revisão da norma era apertar os limites dos FIPs, incluir as debêntures de infraestrutura nos investimentos das entidades fechadas, incluir os ativos da transição energética, acabar com a regra que manda vender todos os imóveis até 2030. A gente propôs isso e mandamos lá para o Ministério da Fazenda em abril do ano passado, com a expectativa de que fosse aprovado até julho. Mas a Fazenda colocou como condição para avançar essa proposta uma nova discussão, sobre a marcação dos passivos a mercado.

Qual a regra hoje para a marcação dos passivos?
Hoje a gente usa aquela regra do túnel, que é a média das operações de NTN-B dos últimos 5 anos. Essa média define a taxa que vai descontar o passivo previdenciário dos planos. Nossa avaliação é que essa regra está ruim, precisa melhorar, até porque hoje 75% do portfólio está em NTN-Bs, talvez até estimulado por essa regra. Se a regra está dizendo que a taxa de desconto do passivo é a média da NTN-B, eu vou comprar NTN-Bs porque isso vai me dar conforto regulatório. Então, neste ano nós vamos levar para o CNPC uma proposta de revisão da marcação do passivo, que está dentro da Resolução 30.

A questão da Resolução 4.994 foi pacificada junto à Secretaria da Fazenda?
A gente discutiu com o Ministério da Fazenda que a revisão da 4.994 não tinha nada a ver com a questão do passivo. Explicamos que nosso objetivo é simplesmente melhorar o cardápio para incluir ativos que fazem parte do portfólio dos fundos de pensão globais. Por exemplo, os três grandes fundos de pensão canadenses, Canada Pension Plan (CPPIB), Fundo de Investimentos de Quebec (CDPQ) e Ontário Teachers (OTPP), estão comprando tudo no Brasil. Esses dias mesmo, o CPPIB anunciou uma parceria com a Cyrela para investir em condomínio de luxo em São Paulo, aplicação direta, e o nosso setor ainda não tem essa perspectiva. Ao contrário, tem que vender os seus ativos imobiliários. Então, explicamos que a nossa proposição era no sentido de melhorar o cardápio de investimentos das entidades fechadas.

O secretário Marcos Pinto entendeu?
Ele disse que ia encaminhar as três propostas de mudanças de regras de investimento que estão na Fazenda, que são a da Previc, a da Susep e do Ministério da Previdência (que formulou a proposta de mudanças para os regimes próprios), ao CMN ainda em março. É preciso fazer urgente essa atualização, nós estamos falando de uma indústria de previdência que é pujante, se somar as entidades abertas, as fechadas e os RPPS são quase 30% do PIB em reservas previdenciárias.

No início você disse que uma parte das entidades fechadas deve fechar 2024 com déficit. Isso deve resultar em novas propostas de equalização de déficit?
A gente ainda não sabe o resultado de 2024, só ficará pronto no final de março, mas eu acho que como teve um desempenho pior do que 2023, deve ter novas equalizações sim. Mas em cada plano, individualmente, tem uma regra da Resolução 30 com um limite de tolerância, calculado pelo duration e pelas reservas do plano, que determina se você deve aplicar ou não um plano de enquadramento. Se deu déficit em 2024, e não passar na regra de tolerância até o final de 2025, terá que ter um plano de enquadramento para funcionar em 2026.