A redução da taxa Selic em 2019, que chegou a 6,50% ao final do ano, estimulou os investidores institucionais a buscar novas opções de alocação em busca do atingimento das suas metas atuariais. Os fundos multimercados mais centrados em ações e, sobretudo, a renda variável foram as opções preferenciais das fundações de previdência, em razão do bom desempenho da B3, que fechou o último ano com o seu principal índice, o Ibovespa, apresentando valorização de 31,58%, a segunda mais elevada da década. Como reflexo disso, o estoque de ações em poder das gestoras analisadas nesta edição do Top Asset registrou crescimento de 38,92% em 2019, atingindo a cifra de R$ 384,59 bilhões.“A renda variável foi, sem dúvida, o grande destaque do último ano, gerando impacto positivo sobre todos os segmentos de fundos de ações”, comenta Aquiles Mosca, responsável pela área comercial da BNP Paribas Asset Management. “Os multimercados, que podem ser considerados uma porta de entrada para aplicações de maior risco, também atraíram muitas fundações de previdência. Tanto que vários desses fundos interromperam as captações em 2019.”
Em sintonia com os movimentos desses grandes aplicadores, as gestoras trataram de diversificar os seus cardápios. A BB DTVM, a maior asset do país, reforçou a sua grade de produtos em 2019 com cinco novos fundos para entidades fechadas de previdência complementar (EFPCs) e ainda enquadrou outros 11 à Resolução 4.661.
“O mesmo processo foi estendido às entidades dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos, os RPPSs. Além de apresentarmos dois novos fundos específicos para esse público, realizamos ajustes no restante da grade que propiciaram a ampliação do leque de produtos à disposição dos RPPSs”, conta o diretor comercial e de produtos Aroldo Medeiros.
Aplicações em ativos externos também vêm ganhando corpo no mercado. A BB DTVM lançou em 2019 quatro fundos lastreados em ativos estrangeiros, dois de renda fixa e dois de ações, enquanto a Bram – Bradesco Asset Management (Bram) aumentou em 80,95%, para R$ 3,21 bilhões, as suas reservas em bonds.
“Estamos abrindo o raio, para outros mercados, de um fundo antes centrado em renda fixa latino-americana. Além disso, executamos ajustes nos multimercados, que passaram a contar com maiores posições em renda variável e renda fixa internacionais”, diz o superintendente da Bram, Sérgio Magalhães. “É uma busca ditada pelos juros baixos nos cenários interno e externo.”
Esse esforço de diversificação dos multimercados tende a ganhar escala em todo o sistema, atendendo as demandas dos investidores, avalia Mosca. O fenômeno, observa, se manifestou de forma clara em 2019, com vários fundos da classe colhendo resultados expressivos em mercados acionários no exterior, especialmente nos Estados Unidos, bem como em commodities, ouro e moedas. “O quadro atual é bem distinto do observado há alguns anos, quando o chamado ‘kit Brasil’ – formado por bolsa, renda fixa e moeda locais – dava o tom nos multimercados”, diz ele.
A sofisticação em curso, impulsionada no plano doméstico pela queda da remuneração dos títulos públicos federais, também se refletiu num maior interesse dos institucionais por fundos de investimentos no exterior. Já no primeiro trimestre de 2019, assinala Mosca, o mercado foi surpreendido com a realização de diversos processos de seleção de gestores de veículos externos, contrastando com a relativa inércia verificada no segmento nas temporadas anteriores.
“As concorrências se estenderam por todo o ano e, em sua maioria, buscavam multimercados externos de longo prazo”, observa o executivo da BNP Paribas, que destaca um grupo, em particular, entre os demandantes. “Os RPPSs responderam por boa parte dos processos seletivos e da captação de recursos voltados a mercados internacionais. São investidores que, graças ao apoio recebido de consultorias, quase nada ficam a dever atualmente aos fundos de pensão.”
Forte desde o início do ano passado, a busca dos institucionais por aplicações de risco ganhou intensidade a partir de 31 de julho, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central executou o primeiro de uma série de quatro cortes consecutivos na taxa Selic em um período de apenas quatro meses. As entidades de previdência reforçaram, então, as suas apostas em renda variável, com aquisições de papéis e cotas de fundos lastreados nesses papéis. “Com o início de um novo ciclo de queda dos juros, as fundações mais conservadoras não tiveram opção a não ser acelerar a diversificação de suas carteiras, sob pena de não cumprirem as metas atuariais em 2020”, analisa André Cobianchi, head de vendas da Santander Asset Management.
Como, no entanto, o Ibovespa acabara de superar a marca histórica de 100 mil pontos em julho e seguia em alta, as retardatárias tiveram de dosar as suas aplicações em ações, cujos preços, àquela altura, não estavam tão convidativos como no início do ano. A solução, para compensar a queda dos juros, foi buscar outras opções de investimento. “No segundo semestre, vários institucionais começaram a aportar recursos em fundos de investimentos imobiliários, os FIIs”, diz Cobianchi. “A demanda por esses produtos era intensa, e vários deles chegaram a ser negociados na bolsa de valores com prêmios elevados em relação aos patrimônios líquidos.”
Por ironia, passados poucos meses, as entidades que postergaram seus processos de diversificação, mantendo posições significativas em renda fixa, sofreram prejuízos consideravelmente menores com a queda da bolsa na esteira da crise provocada pela pandemia da Covid-19. No quadro atual, a demanda está voltada para títulos de crédito privado, segmento que sofreu um forte ajuste de preços no segundo semestre de 2019, e boas oportunidades em Notas do Tesouro Nacional da série B (NTNs-B) nos mercados primário e secundário.
“Com relação à bolsa de valores, não vejo institucionais desfazendo-se de papéis, pois eles, como têm um horizonte de longo prazo, podem aguardar a recuperação das cotações”, diz Marcelo Pimentel Mello, vice-presidente de Investimentos, Vida e Previdência da SulAmérica Investimentos. “Por outro lado, já registramos aportes significativos em nossos fundos de renda variável de entidades de previdência, que estão se aproveitando dos baixos preços dos papéis.”
Superada a crise causada pelo novo coronavírus, a diversificação das carteiras das entidades de previdência retomará seu curso, prevê Paulo Gala, diretor-geral da Fator Administração de Recursos. Afinal, pondera o executivo, os juros nos cenários interno e externo deverão permanecer em patamares reduzidos por um bom tempo com o intuito de estimular a retomada das atividades econômicas. “As fundações locais terão, portanto, de tomar mais riscos em bolsa e em fundos imobiliários, entre outras opções”, diz Gala. “Começarão, assim, a seguir os exemplos de seus pares nas economias mais desenvolvidas, que, ao contrário do que ocorria até há pouco tempo no Brasil, nunca contaram com grandes retornos proporcionados por títulos públicos.”
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