Surfando em juros e moedas | O ano passado os multimercados ganha...

Edição 354

As posições compradas em juros e moedas foram as que mais se beneficiaram da inflação global em alta e dos ajustes de taxas feitos pelos bancos centrais dos países desenvolvidos em 2022, observa Bruno Pandolfi, sócio e responsável pela área de moedas da SPX Capital. Na casa, as estratégias da família de fundos multimercados classificados como excelentes, todos feeders da família Nimitz e que têm diferentes distribuidores, refletem isso. A exposição aos mercados globais e locais está respectivamente em 70% e 30%, não muito longe da média de 75% a 25% que a casa mantém há cinco anos. “Temos trabalhado cada vez mais para que o Brasil seja apenas um país a mais em que operamos” diz. A asset inaugurou este ano o seu primeiro escritório na Ásia, em Singapura, com o objetivo de intensificar sua atuação no mercado asiático.
“O ano começou com a guerra entre Rússia e Ucrânia e o mercado, que estava saindo de um período de medidas expansionistas adotadas durante a pandemia de Covid, já percebia o choque de demanda, que foi agravado pelo choque da guerra”, lembra. Em 2023 o cenário está mais indefinido e é preciso saber em que ponto será estabilizada a inflação no EUA.
Há posições mais relativas em moedas e juros porque o mundo já fez um grande movimento de ajuste dos juros. “Nossa visão para as moedas é mais estrutural, estamos comprados em dólar global mas com posições direcionais e relativamente pequenas”, diz. A expectativa é de fortalecimento para o dólar frente a outras moedas porque o impacto sobre o financiamento nos EUA é mais prefixado e o efeito da alta de juros sobre o mercado de imóveis será mais de longo prazo. A ação do Fed tende a impactar outros países antes de chegar ao bolso do consumidor americano, acredita.
“O pouso suave – soft landing – é muito difícil de acontecer e é mais provável que os EUA passem por um hard landing, então vejo que o mercado em geral está mais otimista do que a realidade mas também não tenho grandes alocações nessa nossa convicção”, afirma. A tendência a médio prazo seria de fortalecimento do dólar, queda das bolsas e mais desaceleração da atividade econômica. No Brasil, o juro elevado e os eventos de crédito no varejo levarão o BC a cortar juros mesmo com a inflação não tão perto da meta e o trabalho para levá-la à meta será desafiador, acredita o gestor.

A inflação americana, que atingiu níveis como não se via nos EUA há pelo menos 40 anos, seguida pela reação dos bancos centrais, foi o grande tema do ano nos mercados, avalia Fernando Cavalette, especialista de portfólio da Itaú Asset. Segundo ele, o aperto monetário e o fim do quantitative easing transformou 2022 num período particularmente desafiador para a gestão de fundos de investimento. “O juro elevado tem sido o remédio amargo para reverter o ciclo de aceleração dos preços e a taxa terminal hoje nos EUA está precificada em 5,5% pelo mercado, o que leva o fluxo de recursos de todo o mundo para lá”, observa. Enquanto os mercados acionários sofreram, os fundos multimercados e os de renda fixa que investem no exterior tiveram oportunidades únicas.
Na asset, os multimercados foram o destaque do ano e permitiram à casa apropriar receita com taxas de performance recorde. “A gestão de multimercados e o modelo multi-mesas tiveram um grande papel nesse resultado”, diz Cavalette. No Itaú Global Dynamics Plus, que integra o multi-mesas, boa parte das estratégias no ano colheram os frutos do aperto monetário por meio de posições compradas em juros nos EUA, México, Chile, Alemanha e Colômbia. “O dólar também foi fortalecido porque, apesar da alta do juro, a atividade econômica nos EUA mostrou resiliência e a revisão do crescimento para baixo foi mais pronunciada no resto do mundo do que lá, o que levou o dólar à sua maior apreciação histórica”, afirma.
Os multimercados e os fundos de renda fixa unconstrained, que são geridos pelos mesmos times de multi-mesas, também investem no exterior e em geral não têm crédito privado local, captaram excepcionalmente bem, segundo Cavalette, graças à gestão especializada que pode aplicar em todas as teses exceto bolsa.
Do final do ano para cá, os temas ficaram um pouco mais complicados porque a China abriu mão de sua política de Covid-zero e agora o crescimento do país surpreende para cima. “A China puxa diversas economias para cima com ela, incluindo os exportadores de commodities, os fabricantes de chips, os países que se beneficiam do turismo chinês e a Ásia como um todo”, diz.

As duas mais antigas e diversificadas estratégias da Kapitalo Investimentos – Kappa e Zeta -, conseguiram capturar em 2022 a tendência de alta dos juros nos países desenvolvidos, que já ocorria nos emergentes em 2021. No fundo Zeta, o retorno foi de 19,67% sendo que 14,88% vieram dos juros, com alocação bem distribuída entre os juros globais e locais, explica Bernardo Feijó, sócio e head de RI. As duas seguem o viés global da asset, de 70% em posições internacionais e 30% Brasil.
Os movimentos nos mercados de juros foram explorados tanto por meio de posições direcionais como de curvatura, no Brasil e em outros países, particularmente EUA , Reino Unido e zona do euro. “Nos EUA, entendemos que as posições em curvas de juros tiveram retornos um pouco melhores”, detalha.
A estratégia está evoluindo mais para curvatura e prevê o risco de recessão global. “Estamos convictos de que a recessão é inevitável porque o Fed precisa criar condições para enfraquecer o mercado de trabalho nos EUA e assim reduzir os indicadores de consumo e a pressão sobre a inflação”, explica.
Na estratégia K-10, do retorno total de 21,5% exatos 9,6% vieram as posições em juros. Para a indústria de multimercados macro como um todo, o tema dos juros globais foi o mais relevante do ano. “Muitas casas aproveitaram para surfar a onda”, afirma. O ambiente rico em assuntos permitiu aos fundos macro atingirem um retorno excepcional porque havia diversas fontes de incerteza, incluindo as eleições no mercado local.
Em março de 2023, os fundos Kappa e Zeta estão com os menores níveis de alocação em risco de ativos domésticos de sua história, em torno de 15% a 20%, um pouco abaixo até mesmo do que havia em 2022, embora o Brasil esteja barato em moedas, ações e juros diferenciados.

Os três fundos multimercados da Gávea Investimentos classificados como excelentes seguem a mesma estratégia, com variações entre eles apenas no nível de risco e no perfil dos investidores, explica Bernardo Carvalho, diretor executivo e CRO. “Os mercados de renda fixa global proporcionaram a maior contribuição para a carteira, devido ao aumento expressivo da inflação e ao aperto monetário nos EUA, Brasil, Chile, União Européia e leste europeu (Polônia e República Checa)”, diz.
No primeiro semestre foram feitas posições a favor da alta e, no segundo semestre, a gestão foi na mesma direção, porém com posições mais táticas e o portfólio mais diversificado para poder operar melhor a diferenciação entre os estágios de alta das taxas nos diversos países.
“Nos mercados de moedas os ganhos vieram da Ásia e do Chile, por exemplo, mas as posições mais defensivas no Brasil sofreram um pouco, então a carteira de moedas não foi tão bem”, afirma. No mercado de ações, as posições compradas no Brasil sofreram mas a carteira ganhou com as posições em bolsa dos EUA, tanto compradas quanto vendidas, por meio de operações táticas.
Em 2023, as posições em moedas, juro e bolsas cresceram um pouco, com posições mais direcionais. “O cenário global trouxe surpresas recentes, como os números do payroll nos EUA, que levam o mercado a considerar ciclos mais longos de juros”, diz. Para a gestão, permanece a postura mais defensiva porque os juros serão mais altos por mais tempo e será preciso ter um olhar diferenciado para as economias.
No Brasil, por sua vez, o risco fiscal pode levar a mais prêmio na curva de juros, o que também poderá pressionar o câmbio aqui. “Do lado do investidor institucional, temos tido mais captação porque vários deles estão revisando suas posições estruturais em multimercados e temos visto mais fluxo de algumas casas grandes”, afirma.

Sofremos como todos os gestores em 2022 e este ano também está difícil, mas a cultura do banco tem como diferencial preservar o capital dos investidores e a gestão não costuma se encantar com ondas de mercado, observa Sérgio Cutolo, sócio do BTG Pactual. Ele observa que em 2022, a BTG Pactual Asset Management teve uma captação robusta fora do Brasil, que acaba não sendo capturada pelos números da Anbima mas no ranking geral fechou o ano com mais de R$ 280 bilhões e como o sexto maior gestor de fundos do Brasil. Em fundos multimercados, a casa opera também em mercados globais, dependendo do fundo, e aproveita a estrutura que inclui bancos no Chile e Colômbia, além de posições no México e nos EUA.
Apesar dos números totais de crescimento, o ano foi difícil. Os multimercados tiveram captação negativa na indústria como um todo, que registrou saldo de R$ 30 bilhões negativos. “Aqui não foi tão mal e chegamos a ter captação positiva”, diz. Ele informa que todos os fundos multimercados e de renda fixa da asset performaram acima do CDI, apesar do mercado desafiador principalmente no segundo semestre de 2022 e deve continuar nessa toada este ano.
Os multimercados do BTG Pactual têm forte pegada macro e conseguiram antecipar movimentos importantes. O crescimento da gestora, diz Cutolo ocorreu por agregar novos produtos no segmento de multimercados, nas linha macro e tradicional, com a ampliação das equipes e maiores volumes.

Melhores gestores em Multimercados (arquivo em pdf)