Edição 264
Após as perdas ocorridas no ano passado no mercado doméstico de renda fixa, tanto por conta da elevação da taxa Selic como também pela perspectiva de retirada dos estímulos por parte do Federal Reserve, eventos que puxaram para cima a curva de juros, os investidores adotaram uma postura mais cautelosa no primeiro semestre de 2014. Com isso, fundos de prazos mais curtos, e uma migração dos IMAs para títulos de crédito privado foram os principais movimentos dos investidores institucionais observados pelos gestores do mercado de janeiro a junho deste ano.
O Santander, empatado com o HSBC, ficou na liderança do ranking dos melhores fundos para os institucionais na categoria de renda fixa, com 11 fundos verdes sob a metodologia da LUZ, dentro de um universo de 20 fundos analisados. O mais rentável, com uma valorização de 10,57% nos 12 meses encerrados em 31 de junho, foi o Santander IMA-B 5 Títulos Públicos Renda Fixa.
Embora o cenário que acabou se concretizando ao longo do primeiro semestre até tenha favorecido apostas em prazos mais distantes da curva, como os investimentos das fundações são em grande parte definidos no início do ano, as aplicações do primeiro semestre se concentraram mesmo em ativos mais curtos e conservadores, e também de rentabilidade menor. “Claramente percebemos uma redução do risco na duração das carteiras, com menor exposição aos IMAs”, afirma Eduardo Castro, superintendente executivo de fundos de investimento do Santander. “As estratégias de crédito privado foram as mais demandadas, principalmente quando ajustadas ao risco”.
Ainda que a volatilidade tenha se feito presente no mercado de renda fixa de janeiro a junho, quando ela ocorreu foi em um sentido mais uniforme e favorável à maior parte dos institucionais, que têm percentual relevante de suas carteiras marcadas a mercado, ao contrário do que ocorreu na renda variável, que viu momentos erráticos de queda e alta da Bolsa ao longo dos últimos meses.
“De janeiro a março a Bolsa caiu bastante, de março a junho ela também subiu bastante, mas na renda variável realmente teve mais volatilidade do que na renda fixa. Na renda fixa a volatilidade também foi grande, mas se olharmos para os resultados das NTN-Bs, temos uma piora do mercado mais recentemente, mas no primeiro semestre o movimento foi muito positivo. No primeiro semestre o resultado na renda fixa foi mais óbvio que na renda variável”, fala o superintendente do Santander.
Para o segundo semestre, as eleições aumentaram sua influência sobre o desempenho da curva de juros, que chegou a abrir nos momentos em que a presidente Dilma aparecia como favorita, mas Castro ressalta que os próximos passos do Fed tem importância maior para os movimentos futuros do mercado doméstico de renda fixa. “Há uma tendência mais simplista de achar que as questões internas relacionadas com a economia tem a ver com o processo eleitoral, mas na verdade não é. Há um processo mundial importante de correção, que fez com que o dólar se fortalecesse perante qualquer moeda do mundo”, comenta o executivo do Santander.
Seleção – A Votorantim Asset Management (VAM) teve oito fundos verdes na renda fixa, de nove analisados, o que lhe deu a terceira colocação no segmento, e assim como no Santander, o movimento dos clientes foi por opções mais conservadoras, de prazos mais curtos, e também de crédito privado. Dos oito, o mais rentável em 12 meses até junho foi o Votorantim FI Banks FGC Renda Fixa Crédito Privado, com valorização de 10,37%. A questão é que, como a demanda foi semelhante entre os diversos agentes do mercado, em alguns momentos tornou-se uma missão complexa encontrar na praça ativos que fossem adequados aos anseios dos investidores.
“Tiveram períodos em que passamos com o caixa um pouco maior, porque na nossa avaliação a relação risco retorno desses títulos de crédito, tanto de instituições financeiras quanto de corporates, em alguns momentos não estava remunerando adequadamente pelo prazo que os títulos se propõem”, explica Sandra Petrovsky, diretora da asset do Votorantim.
Os prazos desses títulos de crédito privado, fala a especialista, aumentaram bastante ao longo dos últimos anos, e em alguns casos, entre os corporates principalmente, chegaram a bater até na casa dos sete anos há alguns meses, sendo que, em um passado não tão distante, dificilmente esses prazos chegavam sequer aos dois anos. “Então temos de avaliar muito bem, porque, apesar de serem títulos de baixo risco de crédito, são riscos de crédito, merecem ter um prêmio sobre a curva de juros. Muitas vezes esse prêmio de risco está bastante exprimido, e às vezes esse prêmio de risco aumenta um pouco. No primeiro semestre isso aconteceu”, afirma Petrovsky.
“A demanda acaba forçando o prêmio do risco de crédito para baixo. Na renda variável tem o stock picking, a gente está fazendo o debênture picking. Não dá pra sair comprando a torto e a direito simplesmente porque está entrando dinheiro no fundo”, comenta a diretora da VAM.
Sandra Petrovsky também entende que a elevação dos juros nos Estados Unidos pode até abrir oportunidades para os investidores no Brasil. “Se é que já não está abrindo agora. A curva de juros está com um prêmio bastante bom nesse momento, então de repente existem oportunidades de aplicação, o mercado sempre antecipa ao fato”, fala a especialista.
Alongamento – Embora já esperasse por forte volatilidade no mercado, em linha com seus pares, na Bradesco Asset Management (Bram) a leitura no início de 2014 já era a de que as maiores turbulências nos ativos de renda fixa deveriam ocorrer com mais intensidade a partir do segundo semestre, que foi o que realmente acabou por se confirmar.
Diante dessa leitura do cenário, a instituição pôde adotar uma postura um pouco menos conservadora nos seis primeiros meses do ano, que resultou em um alongamento dos prazos de seus títulos ao longo da curva.
“Apesar de no médio prazo termos a certeza de que vai ter aperto na política, avaliamos no começo do ano que o cenário para essa implementação da política monetária americana de normalização seria mais cautelosa, mais gradual do que o mercado estava precificando”, diz Reinaldo Le Grazie, diretor de renda fixa da Bram. “Voltamos nossa estratégia considerando que as taxas de juros iam subir mais devagar, que o dólar ia se valorizar mais vagarosamente. Fizemos posições que aproveitaram a manutenção, e até queda, da taxa de juros local”, pondera Le Grazie.
Dos sete fundos verdes da Bram na renda fixa, entre 12 analisados, foi justamente o que se aproveita do maior alongamento dos prazos o de maior rentabilidade – o Bram FI Renda Fixa IMA-B 5 apreciou 11% nos 12 meses encerrados em junho.
“Sem a alta da taxa de juros americana, o dólar não se fortaleceu tanto quanto esperamos que vá acontecer no médio prazo. Com isso o real se manteve praticamente estável entre R$ 2,25 e R$ 2,30, também com o auxilio do BC, mas principalmente por conta do movimento internacional. Com o real nesses preços, as taxas de juros longas no Brasil caíram”, diz o diretor, sobre a dinâmica que favoreceu apostas um pouco mais arrojadas na casa.
A partir de junho, nota Le Grazie, a volatilidade passou a ganhar tração, com a valorização global do dólar, após sinais mais claros de fortalecimento da economia americana, fenômeno que deve ser seguido pela elevação gradual das taxas ao redor do mundo. “Hoje a curva está muito ‘flat’, os vértices 2022 e 2050 estão no mesmo preço, provavelmente a inclinação da curva em algum momento vai deixar de ficar tão flat, e volta a ter uma inclinação positiva, isso é natural”, afima o diretor da Bram.