Edição 231
O primeiro semestre de 2011 foi bastante complicado para os gestores. Na renda fixa, as dúvidas quanto à conduta do novo Banco Central brasileiro e a ameaça de inflação em ascendência prejudicaram os ganhos. Na renda variável, o mau humor no mercado internacional já causava seus efeitos, apesar de os impactos terem sido, nos seis primeiros meses do ano, relativamente menores do que os que vêm abalando a Bolsa na segunda metade de 2011. Já nos multimercados, tudo dependeu do tipo dos fundos e do grau de especialização dos gestores em cada segmento.
“Não está fácil fazer gestão de recursos”, constata Viviane Werneck, consultora sênior de investimentos e risco da Luz Engenharia Financeira. A consultoria elaborou, junto com Investidor Institucional, esta edição do ranking de melhores fundos. Foram 714 produtos analisados, dos quais 235 foram considerados excelentes, enquanto 240 receberam o sinal amarelo e 239 o vermelho.
Viviane lembra que os três primeiros meses de 2011 foram ruins tanto na renda fixa quanto na renda variável. “Foi um período de muita incerteza. A gestão de renda fixa foi penalizada pelas dúvidas do mercado em relação à postura que seria tomada pelo novo Banco Central. Já na renda variável, a Bolsa fechou o primeiro trimestre em terreno negativo. Para ter um bom resultado, os gestores tiveram que suar bastante”, resume a consultora.
Em linhas gerais quanto ao desempenho no período, ela comenta que os gestores maiores conseguiram obter uma performance melhor nas estratégias mais conservadoras, assim como já vem acontecendo nos últimos anos. “Por outro lado, as assets independentes se destacam na gestão mais agressiva e alavancada”, compara.
Renda fixa – Dos 193 fundos de renda fixa analisados pelo ranking, 63 receberam o selo verde, 64 o amarelo e 66 o vermelho. Um dado interessante, segundo Viviane, é que os fundos de crédito vêm ganhando espaço nesse segmento. “Na amostra do levantamento há 13 fundos puramente de crédito privado. Isso mostra que o mercado está tentando encontrar ferramentas alternativas à renda fixa tradicional, saindo da acomodação”, observa. Outro destaque tem sido os fundos atrelados a índices como o IMA-B e o IRFM. “Esses fundos também estão mais presentes no segmento institucional”, indica a consultora.
Viviane recorda que o segundo trimestre já foi um pouco mais favorável para a renda fixa do que o primeiro. Isso porque o mercado passou a contar com um entendimento melhor em relação ao comportamento do Banco Central e, assim, teve chance de montar estratégias mais consistentes e obter ganhos.
Mesmo assim, ninguém foi poupado de levar sustos nos meses seguintes. “Quando o mercado trabalhava com uma expectativa de Selic na casa dos 14% para conter a subida da inflação, veio o Banco Central e cortou os juros em meio ponto”, diz Viviane. No fim de agosto, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC decidiu reduzir os juros de 12,5% ao ano para 12% ao ano. Segundo a consultora, há cerca de três meses as perspectivas em relação à taxa básica eram totalmente diferentes, e diante da decisão do Copom o mercado teve de rever projeções e estratégias.
Renda variável – Na renda variável, as surpresas desagradáveis marcaram presença ao longo de todo o período. Em janeiro, o Ibovespa ficou negativo em 4,6%. Em fevereiro e março, o índice ficou positivo (1,6% e 5,8%, respectivamente), mas voltou a cair em abril (4%), maio (6,6%) e junho (3,3%). “O cenário está muito difícil de trabalhar. Há muita incerteza e muitos fatores políticos influenciando o mercado financeiro”, analisa Viviane.
Ela detalha que, no caso dos fundos indexados (ativos ou passivos), a performance relativamente melhor foi registrada entre as gestoras de maior porte, ligadas a grandes bancos. “Por terem uma estrutura maior, esses gestores conseguem replicar melhor os índices, mantendo uma aderência ao Ibovespa ou ao IBrX de forma mais eficiente”, argumenta a consultora. Ela acrescenta que, uma vez que as decisões de investimento dessas casas são tomadas a partir de discussões em comitês, dificilmente um gestor “se apega” a determinado papel.
Viviane atenta, porém, ao fato de que muitos fundos que se dizem ativos são, na prática, passivos. “O fundo ativo pode, com base nas convicções do gestor, dar mais ou menos peso às ações na comparação com a composição do índice de referência, o que leva a um descolamento de até 7% entre as carteiras. Isso exige um esforço maior de análise e um controle maior dos papéis, o que acarreta na cobrança de um preço maior – ou seja, taxas de administração e performance mais caras. Mas tem muitos fundos que se classificam como ativos e, na realidade, apenas replicam os índices”, contesta Viviane. Segundo ela, isso prejudica não só o investidor, que paga mais caro por um tipo de gestão que na verdade não é feito, mas também a própria avaliação dos produtos. “Isso confunde o processo de seleção dos fundos e dificulta até a elaboração de rankings como este, porque a classe de fundos ativos acaba ficando poluída por produtos passivos e o resultado do segmento sofre distorções”, aponta.
Quando o assunto são os chamados “fundos de ações livre”, o destaque fica por conta das assets independentes. “É notável a predominância de casas menores na categoria de fundos descorrelacionados a índices. Isso porque elas são bastante focadas, têm poucos fundos para gerir e uma estratégia mais definida”, justifica Viviane. A consultora completa que assets com este perfil costumam olhar um universo menor de empresas e acompanhá-las mais de perto, extraindo bons resultados. O ranking analisou 241 fundos de renda variável, dos quais 79 tiveram classificação verde, 83 a amarela e 79 a vermelha.
Multimercados – “Quem soube trabalhar com a volatilidade ganhou nesse primeiro semestre.” Foi assim que Viviane resumiu o comportamento dos multimercados, acrescentando que nas categorias de long and short e multiestratégia foi possível encontrar gestores vitoriosos no período. Dos 280 multimercados avaliados pelo ranking, 93 receberam o selo verde, 93 o amarelo e 94 o vermelho.
Segundo a consultora, houve vários fundos long and short com desempenho bom no período e volatilidade “dentro do esperado”. “Gestores especializados, que souberam aproveitar as oscilações do mercado em seu favor, se deram bem mesmo em um período de tanta incerteza”, reforça ela.
No caso dos fundos do tipo multiestratégia também houve bons desempenhos, com resultados bastante acima do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) e volatilidade baixa. Já na categoria “juros e moedas”, o comportamento foi bastante semelhante ao dos fundos de renda fixa. “Alguns ficaram abaixo do CDI, ou no máximo com 105% do CDI. A volatilidade, em geral, ficou perto de zero. Esses fundos não apresentaram muita diferença em relação aos de renda fixa, e acabaram virando na verdade um grande instrumento de caixa”, sublinha.
Por fim, Viviane diz que os fundos macro sofreram bastante por conta das incertezas. “Foi uma categoria prejudicada por trabalhar com estratégias mais de médio ou longo prazo estruturadas com base em cenários. O contexto macroeconômico ficou muito difícil, sem uma sinalização clara de como a inflação e os juros se comportariam em uma janela mais longa”, aponta.
Perspectivas – Viviane estima que o cenário vai continuar turbulento para as gestoras de recursos, principalmente no que se refere a renda variável. “Não podemos esquecer que, ao contrário de 2011, 2008 não foi um ano inteiro de crise. Antes do pior momento estourar, a Bolsa vinha bem – o Brasil tinha virado investment grade e o Ibovespa tinha rompido os 70 mil pontos, com a expectativa de chegar a 80 mil. Agora, é diferente. Estamos em outubro e a Bolsa já ficou abaixo dos 50 mil”, compara a consultora. A grande preocupação na renda variável é até que ponto os problemas na Europa vão se alastrar e quais as consequências da crise soberana na zona do euro, além das questões referentes à desaceleração da economia norte-americana.
Na opinião da consultora, “está claro que no Brasil o crescimento está sendo priorizado” em detrimento de um controle maior da inflação. Prova disso é o já comentado corte na Selic em 31 de agosto. “Diante de uma estagnação na Europa e das incertezas quanto à recuperação dos Estados Unidos, o Brasil prefere incentivar o crescimento interno e considera que não faz sentido manter uma taxa de juros tão alta. O preço que se paga por isso é a inflação, que em 12 meses já supera o teto da meta”, pondera Viviane.