De olho nas garantias reais

Edição 378

“Os ativos podem ser indexados ao CDI ou ao IPCA, mas sempre com risco comedido e garantias de imóveis reais”, afirma Luis Stacchini, da Navi Capital

O risco moderado, a qualidade das garantias e o rigor na seleção de operações pelo comitê de investimentos estão na base da performance dos FII da Navi Capital, afirma Luis Stacchini, sócio e gestor da área imobiliária da casa. A área de ativos de “papel” soma hoje R$ 650 milhões sob gestão, além de R$ 200 milhões em fundos “de tijolo” voltados ao segmento residencial.

No NCRI11, um fundo “puro sangue” de recebíveis imobiliários cuja característica conceitual é não ser high yield, a performance tem a ver com a composição da carteira, comprometida com a diversificação mas sem pulverização excessiva. “Os ativos podem ser indexados ao CDI ou ao IPCA, mas sempre com risco comedido e garantias de imóveis reais. Graças a isso, o fundo nunca teve qualquer défault”, explica Stacchini.

A gestão dá muito valor às garantias reais e não busca apenas as maiores taxas, o que aumentaria muito a assimetria. “Fazemos coisas mais óbvias e o nosso limite é o financiamento de terrenos”, diz.

Outro ponto de atenção é o acompanhamento constante de todos os ativos, “na vírgula”, inclusive na velocidade de vendas e em todos os aspectos que estão por trás do ativo. “Por conta disso, preferimos concentrar a carteira e não pulverizar tanto, porque isso dificultaria o acompanhamento. O fundo não passa de um máximo de vinte ativos, número que hoje está em 14 no caso do NCRI11”, afirma Stacchini.

Na margem, o fundo tem feito alocações mais curtas em CDI, para travar a rentabilidade nominal mais alta, e ao mesmo tempo alongou os ativos em IPCA. “A grande dificuldade hoje é acertar o spread das operações em IPCA” diz. Ele lembra que as expectativas de corte de juros já trouxeram grandes frustrações ao mercado. “Hoje as incertezas são grandes, um bom cenário para estar comprado em ativos de crédito”, afirma Stacchini.

Com a queda vertiginosa de recursos da poupança para financiar projetos e uma oferta de FII que não está grande, o mercado imobiliário vive um momento interessante para o investidor. “A indústria de FII está rodando principalmente com amortizações de investimentos dos fundos, não há dinheiro suficiente nos bancos e o número de lançamentos cresce”, observa. A asset faz reuniões de comitê para definir o pipeline a cada duas semanas e trabalha com um ecossistema enorme de contatos, diz Stacchini. “O comitê prefere ter acesso a centenas de oportunidades para excluir e aprofundar análises”, conta.

“Temos um alto nível de colaterais, o que significa que se acontecer um eventual défault, o fundo não vai perder muito dinheiro”, lembra Gustavo Ribas, sócio e gestor da área imobiliária da asset. As decisões de alocação passam por comitês internos que montam cenários e testam hipóteses. “Em operações indexadas ao IPCA, usamos cenários passados para avaliar se a operação é ou não à prova de crises. Em períodos de juro mais alto, como o atual, priorizamos as operações em CDI, mais curtas, ou as mais longas em IPCA mais um spread”, diz Ribas.

A experiência dos dois gestores, ex-analistas do mercado de ações, contribui para combinar a análise macro com uma avaliação micro e o cuidadoso stock picking de ativos que compõem as carteiras. “A exemplo da análise de ações, o trabalho de gestão de FII inclui gastar muita sola de sapato em visitas para fazer a modelagem financeira dos fundos e projetar seus números”, observa Ribas. Também é preciso entender o mundo macro, que move muito o nível dos ativos no Brasil.

Com o juro no patamar de 15%, como o atual, a renda fixa atrai mais os investidores em FII, mas em momentos de euforia os fundos que investem em ativos de tijolo e em ações têm maior valorização. Essa foi a base para a criação do fundo de fundos da asset, o FoF NAVT11, que pode investir não apenas em FII mas também em ações e em CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários), mas hoje tem principalmente CRI. “A escolha é fácil em muitos momentos, quando conseguimos enxergar oportunidades maiores. As reuniões dos nossos comitês de investimento costumam ser bem interessantes”, diz Ribas.

Fora do óbvio – Com uma carteira que não acessa as operações mais comuns do mercado e prefere apostar na curadoria, seleção e acompanhamento próximo dos ativos, o fundo de recebíveis imobiliários da Éxes Investimentos não precisa colocar a pulverização como seu principal fator mitigador de risco, explica Artur Carneiro, sócio-fundador da casa. A mitigação fica por conta do processo rigoroso de seleção e monitoramento.

A asset, que tem R$ 1,5 bilhão sob gestão entre FII, FIDC, Fiagro e fundos de crédito privado, faz originação de créditos e tem a sua securitizadora própria para ter uma interface direta com as operações. “Isso nos permite fazer um acompanhamento bem apurado, diz Carneiro.

O FII EXES11, criado em 2021, é um fundo de risco middle grade e não acessa operações com empresas listadas, nas quais o spread de risco teria pouco a agregar ao investimento, diz o gestor. A carteira procura ficar fora dos “nomes óbvios do mercado, com um nível de risco controlado, ativos de originação própria e bem estruturados, que acessem diretamente os empreendedores, um fator importante para a performance do investimento”, explica. Essa estratégia acaba por assegurar condições mais interessantes de risco/retorno.

Com a maior parte do portfólio atualmente composto por CRI, o desempenho do fundo está ligado ao diferencial de originação e estruturação proprietária.
Em 2024, diante da perspectiva de elevação da Selic, a gestão passou a direcionar o fundo para os ativos indexados ao CDI, que hoje superam a parte atrelada à inflação, respectivamente na proporção de 60% e 40% do total de ativos. A tendência é de que as operações com CRI lastreados em CDI continuem a ser o foco dos investimentos, diz o gestor.

“A carteira é madura, tem vários ativos já com o “habite-se” e outros perto de recebê-lo e o pipeline de ativos também privilegia as operações em CDI, que oferecem retorno superior ao da inflação”, afirma. Em junho, havia 14 ativos distribuídos em seis subsetores imobiliários, sendo 54% deles de empreendimentos localizados no estado de São Paulo.

A asset enxerga a possibilidade de uma nova janela de emissão, com um follow-on do próprio fundo. “O FII tem um passivo adequado de longo prazo e um caminho produtivo para crescer junto ao investidor de varejo. Hoje ele é concentrado nos investidores profissionais, em especial family offices e assets.

Antes que seja iniciado um ciclo de baixa da Selic, a atividade econômica sofrerá restrições que tendem a manter o mercado mais seletivo em relação aos lançamentos imobiliários, avalia Carneiro. “No entanto, a falta de alternativas subsidiadas para o financiamento imobiliário via poupança ajuda a estimular as operações do mercado de capitais. As novas regras para o lastro dos CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários) restringem as operações, mas também acabam privilegiando quem tem acesso direto a esse mercado”, acredita.

Um pouco mais de pimenta – Depois das dificuldades ocasionadas pelos ruídos econômicos e políticos, os FII conseguiram uma recuperação ao longo dos últimos 12 meses, como uma alternativa relevante de funding para financiamento imobiliário. “Mas ainda não se desvincularam do impacto provocado pelos ruídos fiscais, atrelados à permanência da taxa de juros elevada por mais tempo”, avalia Lucas Torres, gestor de crédito imobiliário da Santander Asset Management.

Para o gestor, falta ainda maior clareza sobre como vai ficar a tributação dos fundos que já existem e de suas novas emissões. “Os principais segmentos do mercado imobiliário já mostram uma volatilidade menor do que no passado, mas a maioria dos FII continua abaixo de suas cotas patrimoniais, um “desconto” que mantêm travado o mercado para novas emissões”, diz.

Lançado em 2019, o fundo SADI11 é um pilar forte da asset para investimento em CRI high grade, que adota garantias reais como forma de reduzir o risco das operações. “Para isso, buscamos garantias reais e trabalhamos em conjunto com os times de crédito e de compliance da asset”, explica Torres. A carteira, que aloca mais em ativos indexados ao CDI, sofreu durante o período em que esse indicador ficou abaixo da inflação, “mas com a Selic em alta, ele passou a ser um FII como deveria”, diz.

Os dividendos são recorrentes, sem muitas flutuações e o fundo, a exemplo dos demais FII da casa, não registrou qualquer défault desde o início, devido ao modelo de aprovação de créditos. “Com isso, o SADI11 tem conseguido surfar bem a Selic mais alta, com um retorno total de 32% em 24 meses (preço de tela mais dividendos), bem acima do CDI bruto no período”, informa.

Além dos investidores pessoa física, que predominam, o passivo inclui institucionais, que tentam fazer movimentos prévios aos da curva de juros. “Mas nesse caso a opção pelos fundos de recebíveis ainda não é tão latente e quando investem em FII preferem ter mais tijolo porque aí a diferença de carrego ainda é relevante”, diz Torres.

A maioria dos fundos de pensão, contudo, prefere não entrar em FII de recebíveis e, nos de tijolo, os retornos ainda não estão suficientemente atrativos. “O maior apetite desse investidor vai depender do corte do juros e por enquanto não há horizonte para um fluxo muito expressivo”, avalia.

Com três FII em sua grade, sendo dois de recebíveis e um “fundo de tijolo”, voltado a lajes corporativas mas atualmente em fase de desinvestimentos, a casa tem AuM de R$ 310 milhões nessa classe. “É um segmento de produtos alternativos em que queremos ter uma elevação, com foco em FII de CRI”, afirma.

Além do SADI11,a asset lançou em 2023 o SAPI11, também com nível de risco high grade. “Mas esse segundo fundo tem um pouco mais de pimenta porque aloca em papéis de operações que entram em risco de desenvolvimento, mas sempre com risco aceitável dentro de seu mandato”, explica Torres. Ambos os FII são negociados hoje com descontos entre 10% e 12%. “Queremos agora fazer uma comunicação mais fluida com os clientes para mostrar o potencial de ganho uma vez que esses descontos tendem a ser reduzidos ao longo do tempo”, diz.