Edição 261
O mercado viu com bons olhos a regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para os fundos de investimento em ações – mercado de acesso (FMA). A instrução nº 549/14 agradou gestores que já participavam de discussões com a CVM para criação de normas que estimulassem a entrada de empresas de pequeno e médio porte na bolsa de valores por meio do mercado de acesso, que hoje é representado pelo Bovespa Mais. E a partir dessa nova modalidade de fundos, novos produtos devem entrar no mercado, além de fundações, como a Funcef, avaliarem parcerias com gestores interessados em lançar veículos nos moldes dos FMA.
Para Rodrigo Souza, coordenador da área de mercado de capitais da Funcef, o resultado da nova regulamentação é positivo, principalmente porque o mercado de capitais brasileiro é pequeno em relação ao número de empresas listadas e de empresas com liquidez para fazer alocação. “Trazer novas empresas ajudam os gestores. Temos mandato de alocação em renda variável, pela necessidade de alocação desses investimentos. Quando o mercado fica maduro, a tendência é migrar de títulos públicos para a economia real. E é importante o acesso ao mercado de capitais”, ressalta.
O gestor da Funcef revela que a fundação já recebeu sondagens dos gestores, mas ainda está avaliando. “Buscamos conhecer o mercado, analisar as propostas de investimentos, e estamos acompanhando bem de perto esse movimento da CVM. E vamos acompanhar os gestores terceirizados. Provavelmente entrará em um processo de análise nossa”, explica Souza.
Um dos pontos da instrução elogiados pelo executivo foi a possibilidade dos FMA investirem até um terço de seu patrimônio em companhias fechadas, desde que atuem na governança dessas companhias nos mesmos moldes exigidos dos fundos de investimento em participação (Fips). Para ele, isso mostra que a instrução traz alguns mecanismos de proteção ao cotista. “O normativo do aumento da governança é positivo. Vemos isso com bons olhos, principalmente para nós, investidores institucionais, que esse aumento na governança seja mandatório”, destaca Souza.
Gestoras – Há algum tempo se discute a importância de estimular a entrada de pequenas e médias empresas na bolsa de valores, já que a presença de grandes companhias ainda é dominante. A instrução traz aos gestores oportunidades de lançarem novos produtos no mercado, podendo assim estimular o crescimento do mercado de acesso com maior segurança. A instituição dos FMA é resultado de debates realizados com a CVM pelo comitê técnico de ofertas menores, que engloba diversos atores do mercado.
Na opinião de Bruno Constantino, diretor de mercado de capitais XP Investimentos, o Bovespa Mais ainda não deslanchou, e essas iniciativas visam destravar esse mercado. “É uma oportunidade para quem atua na gestão de ativos ter um fundo para essa finalidade”, diz Constantino. “Outros países já desenvolvidos, como Inglaterra, Austrália, Canadá, Estados Unidos, têm dentro do mercado de bolsa o mercado de acesso para prover capital a companhias menores, que possuem grande potencial de crescimento. No Brasil isso existe, mas ainda não acontece de forma satisfatória”.
Participante do comitê técnico de ofertas menores há um ano meio, o sócio da Leblon Equities, Pedro Rudge, defende que a instrução é essencial, pois foi preciso pensar em uma nova categoria para alinhar o perfil de investidores com o perfil de empresas com menor liquidez. “O fundo precisa ser de horizonte de investimento menor”, salienta Rudge. A gestora já trabalhava com fundos de ações com foco em pequenas e médias empresas e pretende aumentar sua atuação. “Parte do nosso atual portfólio já tem algumas características dessa nova legislação”, diz.
Um dos principais pontos da norma destacado como positivo pelos executivos é a possibilidade das cotas do fundo serem recompradas caso sejam negociadas no mercado abaixo do seu valor patrimonial. “Essa permissão dá uma margem ao gestor do fundo de gerar valor aos cotistas, caso tenham uma desvalorização das cotas que não reflitam o valor dos ativos investidos pelo fundo”, explica Bruno Constantino.
A possibilidade de recomprar cotas quando as ações das empresas estão muito baratas é um benefício que existe no mundo inteiro, de acordo com Pedro Rudge. “Como esses fundos podem ser fechados, com duração de 10 anos, e podem ser negociados em bolsa, é positivo ter essa possibilidade. É um avanço importante”. Rudge também destaca como ponto positivo a possibilidade de investimento em empresas fechadas e já listadas. “Até então existiam fundos de ações normais para empresas abertas, e quem quisesse investir em empresas fechadas, era preciso entrar em um fundo de private equity. Essa legislação permite investir em um produto que reúne os dois tipos de ativos”, diz o sócio da Leblon Equities.
A instrução também permite que os fundos de investimentos em cotas de Fips invistam nos FMA. Para Bruno Constantino, ficou faltando ampliar a permissão de compra de cotas de Fips por investidores pessoa física. “Na minha visão, a questão principal de ter um fundo fechado com cotas negociadas em bolsa é garantir a liquidez. Para ter essa liquidez, é necessário alcançar uma boa dispersão entre os investidores pessoa física”, avalia.
Produtos – Por se tratar de uma instrução muito recente, a maior parte das gestoras ainda não têm planos concretos de lançamento de novos fundos nos mercado que contemplem as novas regras. Para Frederico Sampaio, diretor de investimentos de renda variável a Franklin Templeton, ainda é cedo para falar sobre criação de produtos com esses moldes, mas é importante que o mercado de acesso receba esse incentivo. “Estamos analisando a perspectiva do mercado e as oportunidades podem aparecer nesse processo”, declara Sampaio. Contudo, o executivo ressalta que a trajetória econômica precisa ser mais positiva para atrair os gestores. “As taxas de juros estão muito altas, o que é um desincentivo para esse tipo de investimento”.
Já a Leblon Equities continuará seu trabalho focado em empresas menores e mercado de acesso, mas agora aproveitará os benefícios que a instrução da CVM traz para lançamento de novos produtos no mercado. “Estamos pensando em lançar um produto com esses moldes. A bolsa tem um potencial grande de crescimento e entendemos que esse crescimento está focado nessas pequenas e medias empresas”, diz Pedro Rudge. “Se tivermos um ambiente de taxas de juros mais normalizados, teremos uma migração de renda fixa para variável. Pessoas estão mais propensas em investir na economia real, e essas empresas são candidatas muito fortes”. A gestora já tem em seu portfólio empresas de pequeno e médio porte, entre elas a Senior Solution, uma das estreantes do Bovespa Mais.
Pontos principais do novo fundo (FMA)
Divulgada em 26 de junho, a instrução 549/14 cria os fundos de investimentos em ações – mercado de acesso (FMA) com base em alterações na instrução 409/04, que dispõe sobre a constituição, o funcionamento e a administração dos fundos de investimento. Entre os pontos principais da norma estão:
• Os FMA terão como política de investimento aplicar pelo menos dois terços do seu patrimônio em ações de companhias listadas no mercado de acesso;
• Os fundos poderão investir até um terço do patrimônio em companhias fechadas, desde que tenham ingerência na gestão dessas companhias;
• Os FMA, constituídos sob a forma de condomínio fechado, podem recomprar cotas do próprio fundo quando estiverem sendo negociadas em mercado abaixo do seu valor patrimonial;
• É permitida a cobrança de taxa de performance sobre retornos absolutos, pois não há qualquer índice de renda variável que reflita de forma adequada a evolução de companhias de menor porte;
• Os novos fundos podem utilizar o mecanismo de chamada de capital, desde que constituídos sob a forma de condomínio fechado e destinados a investidores qualificados;
• Os Fundos de Investimento em Cotas de Fundos de Investimento em Participações podem investir nos FMA.