Retorno ao risco será gradual

Edição 382

Kfouri,Gilberto(BNP) 23mar
“O mercado de crédito será um pouco sacrificado devido aos spreads muito comprimidos em 2025 e pode ver uma parte dos recursos migrando para a renda variável local e off-shore”, diz Gilberto Kfouri Jr., da BNP Paribas Asset Management

A renda fixa deverá continuar a ser beneficiada pelos investimentos institucionais no próximo ano, levando-se em conta o fato de que a base de juros ainda é bem elevada apesar do esperado ciclo de queda entre os meses de janeiro e março, observa Gilberto Kfouri Jr. , CIO da BNP Paribas Asset Management no Brasil. “Em 2026 a renda fixa “não CDI”, ou seja, prefixada ou indexada ao IPCA, deve ter performance atrativa, ainda que o CDI continue a entregar um bom desempenho em ambiente com juro real em torno de 9%. Os investimentos de renda fixa com duration, porém, terão desempenho acima do CDI”, avalia o gestor.

A diversificação por meio de investimentos globais deverá ser posicionada o mais alto possível nas carteiras dos fundos de pensão, acredita Kfouri, uma vez que o mundo hoje está numa fase risk-on, com os investidores mais positivos em relação à economia e à tomada de risco. Nessas carteiras é preciso levar em conta que, embora os EUA continuem relevantes para investimentos, a Europa, China e Japão oferecem uma diversificação geográfica interessante.

“Já o mercado de crédito será um pouco sacrificado devido aos spreads muito comprimidos em 2025 e pode ver uma parte dos recursos migrando para a renda variável local e off-shore”, aponta. Uma abertura dos spreads pode favorecer a demanda por esse mercado, diz o gestor, mas ele acredita que se houver alta deverá ser pequena e mais concentrada no segmento de high yield.. Na asset, essa classe tem foco nos ativos high grade.

Há uma tendência visível de ampliação na renda variável e apesar da recente correção na bolsa ainda há espaço para que essa carteira cresça. “A questão, porém, é a volatilidade, que tende a ser maior no próximo ano”, diz.

A asset, pioneira no lançamento de fundos de investimento em crédito com características de sustentabilidade e o selo ESG, viu essa temática perder um pouco de fôlego ao longo de 2025, mas aposta numa mudança de cenário por conta das mudanças regulatórias anunciadas pela Previc. “A demanda por esses produtos deve voltar a aumentar e estamos preparados para isso. Este houve uma redução nas emissões de green bonds, mas agora a tendência é de aumento”, analisa Kfouri.

“O cenário de volta ao risco é interessante, mas o custo de oportunidade ainda é muito alto”, diz Fernando Henrique Palermo, da Icatu Vanguarda

Ciclo favorável ao risco – Um componente que mantém sua importância graças ao juro real próximo a 8% ou 9%, a renda fixa tende a ser mais favorecida ainda nas políticas de investimento pelas incertezas do ano eleitoral, diz Fernando Henrique Palermo, head de macroalocação e FoFs na Icatu Vanguarda. “Entretanto, olhando para os ciclos econômicos, vemos um corte de juro nos EUA que ajuda os mercados emergentes, favorece a queda da inflação e a redução do juro pelo Banco Central aqui, então esse ciclo pode ajudar os ativos de mais risco”, avalia.

O caminho mais razoável dessa migração para o risco é por meio de um movimento gradual, aponta o gestor. A tendência seria haver um pouco mais de bolsa e de NTN-Bs mais longas, mas nada super radical. “É um movimento cauteloso mas que não deixa de ser uma boa notícia depois de anos de redução do risco nas carteiras. Fica claro que o cenário hoje é puxado pelos ciclos monetários” diz.

 A asset participa das discussões sobre as políticas de investimento de seus clientes e, embora não tivesse recebido essas políticas aprovadas até os primeiros dias de dezembro, o sentimento é de um aumento cuidadoso do risco. “O investimento no exterior, que estava um pouco de lado, agora voltou à agenda, até porque o atual patamar de alocação está muito pequeno nas carteiras e qualquer aumento pode dobrar as posições”,observa.

Para os investidores que olham objetivos de longo prazo, como os fundos de pensão, o cenário de volta ao risco é interessante, mas o custo de oportunidade ainda é muito alto e os participantes dos planos costumam olhar para resultados de curto prazo e para o CDI, lembra Palermo.

No crédito, o mercado passou por uma evolução brutal em seus spreads mas os fluxos seguem elevados. “Gostamos dessa classe, ela faz parte das carteiras e o carrego é positivo”,pondera. Se houver uma melhora no cenário local e o ciclo monetário irá ajudar as empresas, ele vê a possibilidade de um ano interessante para esse mercado.

Iorio,Marcos(Integral) 24out
Queda da Selic trará alívio nas despesas financeiras das empresas mais alavancadas”, diz Marcos Iório, da Integral Investimentos

Juro trará alívio no crédito – A atenção do investidor ao crédito privado vai continuar em 2026, até porque o CDI segue jogando a favor, com um carrego interessante para bater metas, afirma Marcos Iório, gestor de fundos de crédito privado da Integral Investimentos. Ele vê uma tendência de continuidade nas políticas para 2026 e, no caso do crédito privado, observa que há pouco espaço para fechar mais os spreads no high grade.

A expectativa é também de uma melhora do risco envolvido nas operações graças à queda da Selic, o que será um indicativo importante. “Isso não estará refletido nos balanços das empresas num primeiro momento, mas sinalizará um alívio das despesas financeiras para as que estão mais alavancadas”,afirma. Essa conjuntura tende a ser positiva para os ativos high grade, sem uma abertura expressiva dos spreads. “Não vejo espaço generalizado para essa abertura, apenas casos pontuais. O mercado passou pelos recentes episódios da Braskem e da Ambipar, mas os números das empresas, na média do mercado, estão positivos. Em geral, as empresas estão saudáveis”, diz Iório.

Mateus,Thiago(Itau) 24fev
“Já há um pouco mais de apetite por renda fixa pré e títulos indexados à inflação”, diz Thiago Lemos Mateus, da Itaú Asset

Renda fixa ativa e multimercados – A percepção ainda é de investidores muito cautelosos em relação a um aumento do risco, diane do CDI muito elevado e da preocupação com a volatilidade produzida pelo cenário eleitoral, observa Thiago Lemos Mateus, superintendente de soluções de investimentos da Itaú Asset para o Brasil. “As políticas de investimento tendem a seguir mais atreladas ao CDI uma vez que falta maior clareza sobre a condução da política econômica e fiscal a partir de 2027, no próximo governo”, diz.

No primeiro trimestre de 2026, o BC terá uma janela de oportunidade oferecida pela menor pressão inflacionária para começar o corte do juro em março. “Os ativos mais sensíveis a esse indicador poderão ter uma performance melhor, o que poderá trazer um pouco mais de risco por meio da renda fixa prefixada e dos títulos indexados à inflação”, avalia Mateus. Ele observa que já há um pouco mais de apetite nesse sentido, mas nada que seja muito expressivo.

“Vemos muitos clientes institucionais atentos à queda da Selic, mas também à volatilidade. A renda fixa ativa, por exemplo, é um caminho para trazer alpha e que encaixa bem nesse cenário, casa com o horizonte que temos para 2026”, afirma.

Na renda variável, falta maior previsibilidade para direcionar mais as políticas e o CDI ainda é o grande concorrente, lembra o gestor. O crédito privado, por sua vez, tem uma relação risco/retorno menos favorável hoje e a seletividade é essencial neste momento, para encontrar boas oportunidades. “Mas a classe não vai entregar o mesmo risco/retorno que teve nos últimos dois anos”,diz Mateus.

As políticas de investimento vêm com pouca alteração na direção de assumir maior risco, mas algumas delas trazem mudanças na renda variável para buscar produtos mais aderentes ao Ibovespa e menos fundos descorrelacionados, afirma Jefferson Veiga, head do segmento institucional na Itaú Asset.

Há também alguma demanda por multimercados estruturados, fundos que sofreram muito nos últimos três anos. “De um ano e meio para cá, já vemos algumas fundações grandes buscando esses fundos, um movimento que foi acelerado há três meses, então não é só um desejo mas um movimento efetivo”, diz Veiga. Apesar disso, as fundações continuam priorizando a renda fixa ativa, a renda variável mais indexada ao Ibovespa e seguem tímidas em relação aos estruturados.

Conservadorismo e atração pelo exterior – As decisões dos investidores institucionais para 2026 enfrentam o dilema de montar estratégias frente a um cenário otimista porém ao mesmo tempo desafiador, avalia Marc Forster, head de distribuição da Western Asset Management no Brasil. “É difícil diferenciar essas duas possibilidades porque não há muita convicção em nenhum lado. Quando olhamos para o ambiente global, nos EUA a política monetária é o fator mais relevante e a principal tendência é de manutenção do atual rumo de queda do juro, então a economia lá deve desacelerar de modo suave”, afirma.

No Brasil, a eleição será um fator forte de influência mas ainda não há uma opinião clara sobre os candidatos ou mesmo quem serão os candidatos, mas a expectativa é de que será um pleito bastante apertado. “Os mercados vão começar a olhar mais para as pesquisas a partir de 2026, para decidir seus investimentos”, diz Forster.

Na asset, a percepção é de que as fundações não deverão aumentar fortemente o risco de suas carteiras no próximo ano. “Há muitas delas que oferecem perfis de investimentos e nesse caso elas estão mais estáveis, as mudanças de política serão marginais”, avalia. Em função dos perfis, alguns clientes institucionais da asset já mostram demanda, por exemplo, para aumentar um pouco o percentual de IMA-B5 porque talvez o juro real ceda um pouco.

O início do ciclo de queda da Selic será relevante para os mercados, mas os fundos de pensão não devem mudar sua alocação estratégica e sim fazer movimentos táticos na direção da bolsa. “Há muitas variáveis envolvidas, mas eu ficarei surpreso se houver mudanças drásticas”, afirma Forster.

“As carteiras de alocação no exterior vieram muito fortes nas pautas de discussão das políticas, o que nos surpreendeu um pouco”, diz. Mas não há mudanças de estrutura já que a tendência é a manutenção de fundos de renda fixa com hedge cambial e de renda variável sem hedge. O movimento de enfraquecimento do dólar é um fator a ser considerado para fugir das posições nessa moeda.

A projeção de Selic que pode cair até 10,5% para uma inflação de 4,5% , indicaria um juro real de 6% acima do IPCA, lembra Forster. “Ainda há muito juro real, o que é um tremendo atrator capaz de levar as políticas de investimento para mais um período de conservadorismo”,diz.

“As fundações não querem pegar a primeira onda da volta ao risco porque isso sai muito caro para elas”, diz Marcelo Rabbat, da Vinci Compass

Longe da primeira onda – Independente do cenário, a premissa da liquidez é essencial para os investimentos dos fundos de pensão e, por conta das diferentes características de seus passivos, é mais relevante para essas entidades do que para os RPPS, lembra Marcelo Rabbat, head de investimentos institucionais da Vinci Compass. “As fundações têm situações atuariais distintas entre si mas as metas hoje têm uma mediana de 4,5% mais IPCA, o que mostra que essas entidades fizeram sua lição de casa”,diz.

Com o juro elevado pago pelos títulos públicos, que cobre essas metas com folga, há uma predisposição grande a fugir do risco. “As fundações não querem pegar a primeira onda da volta ao risco porque isso sai muito caro para elas”, lembra o gestor.

“Há uma predominância total de renda fixa nas carteiras e a capacidade de colocar ativos marcados na curva em suas carteiras reforça isso”, diz Rabbat. A eventual diversificação fora da renda fixa aponta uma tendência para as classes mais “óbvias” hoje por serem as mais líquidas, que são a renda variável local e no exterior e os fundos multimercados estruturados.