Resgates de R$ 32 bi em 40 dias | Saques começaram por causa do R...

Edição 120

Os gestores de recursos de terceiros estão apavorados com o rumo do mercado. Só em junho os fundos de investimento apresentaram saques de R$ 26 bilhões e nos primeiros 10 dias de julho as perdas somavam mais R$ 6 bilhões. No total, R$ 32 bilhões em 40 dias. E, pior de tudo, ninguém podia respirar aliviado e garantir que o olho do furação já tinha passado.
Muitas assets viram os seus melhores produtos, que ostentaram aos principais clientes durante os últimos anos, estamparem resultados negativos de até dois dígitos, alguns perdendo acima de 20% e outros chegando a 30% de perdas. A caderneta de poupança, desdenhada nos últimos anos como uma velhinha caquética, mostrou que ainda está em campo e jogando, tendo captado mais de R$ 6 bilhões em junho.
Mais do que as perdas da indústria, o que está em jogo é a imagem das assets como gestoras competentes. Muitos fundos de pensão, que tinham suas reservas em fundos perdedores, estão questionando a eficiência da indústria de gestão de recursos. “Imaginávamos que todos os nossos fundos DI eram marcados a mercado, mas não eram”, afirma o gerente de investimentos da Fundiágua, João Fernando Cravos (ver reportagem na página seguinte).
A história das últimas perdas da indústria de fundos é resultado de uma sucessão de problemas, que começou no início de ano com a cobrança do Imposto de Renda dos fundos de pensão. Para fazer face a pagamentos que somariam cerca de R$ 6,5 bilhões num curto espaço de tempo, as fundações começaram a sacar dos seus fundos de investimento, principalmente os DI, que tinham mais liquidez e não estavam em baixa como os fundos de ações. Aí começou a pressão sobre esses fundos.

Prévias eleitorais – O movimento seguinte foi a intranqüilidade gerada pela entrada em cena do novo Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB), introduzido como uma grande incógnita e que acabou gerando expectativas de erros no sistema financeiro e eventuais prejuízos para os fundos de investimento (que não se confirmaram), levando muitos aplicadores a sacar seus recursos deles. Resultado: mais pressão sobre os papéis das carteiras dos fundos. A seguir vieram as notícias de que a Cia Energética do Maranhão (Cemar) não honraria o pagamento de R$ 150 milhões em debêntures e que a BCP não tinha como pagar a dívida de R$ 1,7 bilhão.
Já assustado, o mercado recebeu as primeiras prévias eleitorais confirmando a subida da candidatura Lula, com direito a análises catastrofistas no exterior e agravamento do risco político no país. Isso afastou muitos investidores não apenas dos fundos de investimento mas também dos papéis mais longos do governo, obrigando o BC a leiloar papéis cada vez de prazos mais curtos. Com o aumento crescente da instabilidade política, o BC resolveu antecipar para o final de maio uma medida prevista originalmente para o final de setembro, achando que isso poderia acalmar os agentes: a marcação a mercado dos papéis de renda fixa (na verdade, acabou incluindo também, de contrabando, a marcação dos papéis cambiais). Aí o caldo entornou!

Ilíquido – Os fundos começaram a apresentar cotas negativas, pois para fazer face aos resgates as assets começaram a vender num mercado totalmente ilíquido. Mais vendas, mais cotas negativas e mais pedidos de resgate. “Foi uma loucura, os clientes não estavam entendendo o que estava acontecendo e começaram a sacar”, conta o diretor executivo do ABN AMRO, Fernando Meiback. O ABN perdeu, de abril a junho, pouco mais de R$ 1,5 bilhão dos R$ 15 bilhões que tinha sob gestão. Apenas em junho, mês no qual se concentraram as perdas, os resgates foram de R$ 1 bilhão.
Para Meiback, “o pior já passou, não tem dinheiro novo entrando, mas o ritmo dos saques já diminuiu”. Será? Segundo o diretor executivo da Sul América Investimentos (que incorporou recentemente os fundos do ING), Renato Russo, “minha visão é de que o risco político e a volatilidade continuam”.
Ele acha que uma melhora na situação depende de dois fatores: 1 – o mercado avaliar que a precificação dos ativos para baixo por conta de uma vitória da oposição nas eleições presidenciais foi exagerada, e resolver reprecificá-los para cima por conta de uma subida nas pesquisas do candidato oficial; 2 – o governo conseguir consolidar junto aos investidores estrangeiros uma visão de que nenhum candidato, de situação ou oposição, tem interesse em afundar o país caso ganhe. “Isso poderia acalmar o mercado”, analisa Russo.
Porém, ele sabe que mesmo com isso as coisas não estariam um mar de rosas. Além da situação política interna instável, não se pode ignorar que o mercado externo está jogando contra, vendendo ativos no Brasil para fazer face a prejuízos em outros países emergentes e mesmo nos EUA. “Acho que o mercado continuará volátil”, diz Russo.