Edição 280
Ainda que não calcada em uma melhora dos fundamentos econômicos, mas impulsionada essencialmente por especulações do âmbito político, o Ibovespa registrou no mês de março uma valorização de 16,9%, a maior alta mensal desde outubro de 2002. No acumulado do primeiro trimestre, os ganhos do principal benchmark da bolsa doméstica alcançaram 15,4%, os maiores desde o terceiro trimestre de 2009. O movimento teve impacto expressivo para as entidades que mantêm parcela relevante de suas carteiras alocadas no segmento de renda variável, e que sofreram nos últimos anos por conta dessa estratégia.
No maior fundo de pensão do país, a Previ, a recuperação dos ativos de bolsa em 2016 gerou um impacto positivo de aproximadamente R$ 5 bilhões nos investimentos em renda variável. “O mercado continua muito volátil, o que pode gerar ainda fortes oscilações, impactando tanto positiva quanto negativamente as carteiras de investimentos”, afirma Marcus Moreira de Almeida, diretor de investimentos da Previ.
O fundo de pensão do Banco do Brasil encerrou 2015 com um déficit de R$ 13,91 bilhões em seu Plano 1, de Benefício Definido (BD), o que obriga a fundação a elaborar um plano de equacionamento até o fim do ano. O patrimônio do maior plano da entidade também sofreu queda acentuada durante o ano passado, de 9,1%, ao cair de R$ 162,4 bilhões para R$ 148,8 bilhões. E o maior responsável por esses resultados negativos recentes foi justamente a bolsa no período – a rentabilidade da renda variável do Plano 1 foi negativa em 18,16%, o que levou à um resultado consolidado negativo de 2,84% em 2015, ante uma meta de 16,84%. As perdas só não foram maiores pela compensação que veio da renda fixa, que apresentou um retorno positivo de 14,68% no período.
Ao final do ano passado, o Plano 1 da Previ contabilizava R$ 146 bilhões em ativos, sendo que a parcela investida em ações representava 48% do total. Nos últimos cinco anos, esse percentual oscilou entre 62% e 48%. “A redução desse percentual é consequência tanto de desinvestimentos efetuados nesse período para pagamento de benefícios, quanto pela própria oscilação no mercado doméstico de renda variável, como se pode verificar pelo desempenho do Ibovespa no período”, explica o diretor de investimentos da entidade.
A política de investimento do Plano 1 da Previ, explica Almeida, orienta para uma diminuição gradual dos investimentos em renda variável, em linha com o momento atual do plano, que por ser maduro e fechado, possui uma expectativa crescente de pagamento de benefícios. “A execução dessa estratégia ocorre com observância das avaliações quanto aos melhores preços e momentos para os desinvestimentos, evitando impactos em sua carteira e no mercado acionário brasileiro”, pontua o especialista. “A Previ avalia constantemente o cenário econômico e seu impacto no mercado bursátil bem como o valor das empresas e suas perspectivas futuras”.
Realização – A alta recente da bolsa, de acordo com o diretor da Previ, ainda que expressiva, não chegou a ser suficiente para que o mercado tenha alcançado um patamar de preços avaliado como justo pela equipe de investimentos do maior fundo de pensão do país. “Não podemos afirmar que a recente valorização da bolsa gerou oportunidade de realização de lucros, pois os preços de algumas ações continuam, a nosso ver, ainda depreciados”, diz o diretor. “A Previ sempre avalia as oportunidades de realização de ganhos, dentro das estratégias traçadas nas políticas de investimento de seus planos”, acrescenta o executivo, no cargo desde novembro do ano passado.
Para Almeida, a bolsa de valores tem sido influenciada em maior grau pelas indefinições relacionadas tanto ao momento político quanto pelo atual estágio da economia brasileira. “Atualmente essas indefinições estão com um peso maior do que os fundamentos econômicos das companhias brasileiras, embora estes ainda sejam preponderantes para o desempenho de longo prazo da bolsa”, comenta o diretor.
O diretor de investimentos da Previ destaca também que, apesar dos últimos anos terem sido ruins para os investimentos em ações, a estratégia do fundo de pensão foca no longo prazo, o que levou a carteira de renda variável do Plano 1 a superar a meta atuarial no acumulado dos últimos dez anos – a carteira da entidade subiu 275,92% no período, contra uma meta de 236,86%. Nesse invervalo o Ibovespa avançou 65,48%. “Esta estratégia proporcionou sucessivos superávits que foram convertidos em benefícios aos participantes, tais como suspensão de cobrança de contribuições e distribuição de benefícios extras temporários”, recorda o especialista.
Fundamento – A Real Grandeza também viu seu retorno consolidado no ano passado ser puxado para baixo devido à exposição da entidade na renda variável. A rentabilidade em 2015 foi de 4,8%, frente a uma meta de 17,4%. A carteira de renda variável da fundação apresentou uma queda de 15,1% no período, parcialmente compensada pela valorização de 9,9% da renda fixa. Já nos três primeiros meses de 2016, a parcela de ações na carteira da Real Grandeza apresentou evolução de 14,42%, fortemente influenciada pelo retorno positivo de 15,75% somente no mês de março. A entidade mantém sua exposição em renda variável ao redor dos 15%, ante os 20% no início do ano passado. Apesar da diminuição, trata-se ainda de um percentual relativamente alto, principalmente se comparado com outras entidades, que em muitos casos praticamente zeraram sua posição em bolsa.
“Essa valorização da bolsa contribuiu de forma importante para a rentabilidade acima da meta que temos neste momento”, afirma Eduardo Garcia, diretor de investimentos da Real Grandeza. De janeiro a março, o retorno consolidado do plano BD do fundo de pensão ficou em 9,71%, contra uma meta atuarial de 4,40% para o período. No caso do CD, a rentabilidade global foi de 12,15%, frente a uma meta de 4,18%. “Esperamos que essa tendência prossiga até o fim do ano. O ano passado foi muito complicado”.
O diretor da fundação ressalta que a entidade não promoveu e nem promove alterações em sua estratégia de bolsa no curto prazo, para que pudesse se beneficiar do ‘rally do impeachment’ promovido pelos especuladores nos últimos meses. “Nossa estratégia é focada em fundamentos, apostamos na história de empresas que têm chance de gerar ganhos para nossa carteira no longo prazo”, comenta Garcia. Ele diz que não houve troca de posições e nem maiores movimentações em função de um momento mais favorável da bolsa. “Somos investidores de longo prazo, e não fazemos ajustes na bolsa em função de variações no curto prazo”, diz.
Diversificação – Apesar do histórico recente negativo da bolsa, Garcia explica que a entidade continua considerando o investimento em ações uma boa forma de diversificação para sua carteira de investimento. “Entendemos que valia a pena manter um percentual ainda expressivo da nossa carteira em bolsa, e tivemos uma grata surpresa nesse momento, com o investimento acumulando ganhos bastante expressivos em um período muito curto, com valorização superior ao das bolsas internacionais”, pondera o diretor.
A expectativa da equipe de investimentos da Real Grandeza é a de que o movimento recente positivo do mercado doméstico de ações prossiga nos próximos meses. “Os ativos da economia brasileira continuam baratos no nosso entendimento”, pondera o especialista. “Esperamos que o movimento do mercado prossiga e consiga recuperar a deterioração do valor verificada nos últimos anos”, afirma o diretor de investimentos da entidade.
Perfis – Por se tratar de uma entidade com uma duration de longo prazo, a estratégia do Fundo Paraná privilegia a exposição em renda variável, hoje na casa dos 35%. No primeiro trimestre, a rentabilidade do fundo foi de 6,33%, ante uma meta de INPC mais 4,5%. Em 2015, o retorno consolidado da entidade foi de 5,87%, contra uma meta de 16,24%. “Nossa política sempre foi agressiva, visando o longo prazo, já que nossa massa de participantes ainda é nova”, afirma Thiago Nieweglowski, diretor administrativo e financeiro do Fundo Paraná.
No entanto, como desde o início da década a bolsa não tem entregue retornos satisfatórios, a estratégia começou a ser questionada por uma parcela dos participantes. Com isso, a saída encontrada foi implementar os perfis de investimento, que passaram a ser utilizados desde o segundo semestre do ano passado. “Por mais que fizéssemos um trabalho de educação financeira, mostrando se tratar de um investimento de longo prazo, existem perfis diferentes, com participantes que preferem ganhar menos do que ter uma volatilidade grande no curto prazo”. O Fundo Paraná optou pela divisão em três perfis, conservador, com zero de renda variável, moderado, com 15% de exposição em bolsa, e agressivo, com 40% em ações. “Apenas 6% dos participantes optaram por alterar o perfil. Identificamos que os participantes que mais nos questionavam sobre os resultados eram os que estavam mais próximos da aposentadoria”.
Por já imaginar que boa parte da massa não faria opção por nenhum dos perfis, ao mesmo tempo em que implementou os perfis, a entidade iniciou o projeto ‘Fases da Vida’, também chamado de ciclo de vida, no qual a alocação dos recursos se adapta de acordo com a idade do participante – aqueles entre 18 a 39 anos são direcionados ao perfil agressivo; dos 40 aos 50 anos fica no moderado, e acima dos 50 anos passa para o conservador. “Quanto mais próximo da aposentadoria, menor o risco”, explica Nieweglowski. Os participantes que não fizeram opção por nenhum dos três perfis foram automaticamente migrados para o projeto que relaciona a exposição ao risco à idade do participante.