Junte uma boa dose de empreendedorismo e uma virada na carreira. Acrescente conjuntura político-econômica favorável, juros baixos e maior apetite por risco do lado dos investidores. Misture bem, leve ao forno e, na hora de empratar e servir, acrescente as novas plataformas de distribuição que permitem capilarizar o acesso ao mercado de investimentos de uma forma completamente diferente daquela que predominava no passado recente.
A receita acima está em alta quando se fala nas recentes assets management surgidas nos últimos meses no mercado brasileiro. Gente graúda e com currículo de peso, profissionais que poderiam estar empoleirados no ápice de grandes corporações com salários gordos, mas decidiram arregaçar as mangas e tentar algo novo. É o caso da Hieron, capitaneada pelos executivos Robert van Dijk e Reinaldo Lacerda. Criada em junho deste ano, a empresa tem como foco fazer a gestão “do patrimônio familiar e de investimentos” dos clientes. Dois braços compõem a companhia: family-office e asset management, cujo traço em comum é propor soluções através de fundos abertos ou exclusivos que permitam o melhor gerenciamento de patrimônios familiares.
“Nascemos com o propósito de dar uma visão holística às famílias”, diz Robert, em cujo currículo como administrador de empresas constam passagens pelo Banco Votorantim, Bradesco, corretora Schahin Cury, sem contar a ex-presidência da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Os números apurados até aqui são expressivos: a gestão de patrimônio da Hieron está próximo de R$ 2 bilhões, e a expectativa dos sócios é que chegue a R$ 3 bilhões em 2020.
Robert, que se nomeia espiritualista, diz que montar seu próprio negócios foi a “realização do sonho de empreender, de fazer um bom trabalho sem ter como único objetivo o dinheiro”. Ele explica que a Hieron, que já nasceu global com parceiros em Miami e Londres, opera hoje quatro fundos exclusivos que executam soluções personalíssimas aos seus clientes.
O executivo lembra que o embrião deste processo de ter sua própria gestora começou quando ainda estava no Banco Votorantim, em 2014, e foi procurado por uma família para buscar uma solução de gestão patrimonial. A família tinha vendido um negócio e queria usar a liquidez para investir num novo segmento, de energia renovável, com parques eólicos. A solução foi montar um fundo de participações, de R$ 600 milhões, que foi integralizado em parte com recursos da família e no restante com aportes de mais de mil outros investidores.
Conjuntura – A conjuntura político-econômica favorável no País, particularmente os juros baixos na economia e o agudo apetite por risco de parte dos investidores, ajudou também na decisão do executivo Mauro Bergstein e Nilson Teixeira de montarem a Macro Capital. Os dois, com mais de 25 anos de experiência em gestão de patrimônio, possuem em comum uma trajetória profissional no Credit Suisse. “A ideia de fazer algo juntos surgiu lá atrás, ainda no Credit, e culminou agora com um momento pessoal nosso, que se somou a um ambiente favorável dos investidores em tomar mais risco”, explica Mauro.
Com a taxa básica de juros em 5% ao ano, a menor historicamente no País e que deve continuar caindo nas próximas reuniões do Conselho de Política Monetária do Banco Central (Copom), os gestores e investidores terão inevitavelmente que buscar mais risco para suas carteiras, lembra Mauro. Situação, alíás, que já está acontecendo.
De acordo com a consultoria Economática, o volume alocado em renda variável na indústria de fundos em setembro atingiu o maior valor financeiro da história: R$ 379,1 bilhões. Apenas neste ano, a posição dos gestores em bolsa aumentou em R$ 86,8 bilhões, o equivalente a uma alta de 29,7%.
Nilson Teixeira diz que a semente para aglutinar os 17 sócios na Macro Capital, a maior parte deles ligados a um laço de amizade da época do Credit Suisse por mais de uma década, foi a chamada tempestade perfeita (perfect storm), onde a ideia de empreender juntou-se com um tripé: cenário favorável interno – leia-se juros baixos; maior propensão ao risco; realidade novas das plataformas.
Ele lembra que no caso da Macro a ideia foi colocar em mercado logo de início um único fundo multimercado, o Macro Capital One, cujo patrimônio gira hoje em torno de R$ 100 milhões. “Somos um puro sangue com pouco mais de seis meses de vida – ao se referir ao fundo–, o que não nos impede de oferecer outros produtos no futuro”, acrescenta.
Tanto Mauro como Nilson afirmam que o diferencial da Macro Capital está na gestão, quando comparada aos seus pares de mercado no que se refere a alocação de investimentos. “Temos um trabalho pesado, um esforço grande ao montar cenários globais mais longevos ao País como forma de sustentar nossos investimentos. Fazemos uma análise fundamentalista forte, com base na experiência acumulada de anos de mercado, para, só depois de acertado este quadro, selecionarmos os investimentos que vão compor nosso fundo”, explica Nilson Teixeira.
Projeto comum – O senso de equipe afinada e empreendedora com objetivo comum também reuniu um time de peso para formar a ACE Capital. São dez sócios, sendo três economistas, um físico e seis engenheiros, quatro deles formados pelo ITA, com uma média etária entre 35 a 40 anos. A empresa está sob a batuta de Fabrício Taschetto e Ricardo Denadai, ambos executivos de carreira do banco Santander.
”Nossa equipe tinha condições de ir para outros lugares e ganhar muito mais, muita gente abriu mão de excelentes salários e bônus garantidos ao final do ano para apostar em um projeto comum”, afirma Taschetto ao justificar a empreitada.“No Santander havia uma cultura de debate, grande entrosamento entre as pessoas que compõem hoje a ACE, profissionais que trabalharam entre oito a nove anos juntos”, explica. Ele concorda com os seus pares de que o atual momento econômico faz com que cada vez mais os investidores procurem alternativas de risco para rentabilizar seu patrimônio longe do conforto dos títulos públicos, que já não garantem uma rentabilidade como no passado. “O fato é que está cada vez mais difícil bater as metas atuariais dos fundos com a taxa Selic em queda, conseguir uma boa rentabilidade para um passivo de longo prazo. Tudo isto requer profissionais mais qualificados”, afirma.
Ricardo Denadai explica que a opção da ACE neste primeiro momento foi focar em um fundo multimercado, o ACE Capital Fic Fin, que nasceu em setembro e tem hoje um patrimônio de R$ 120 milhões. A capilarização para distribuir o fundo também foi pensada com muito critério, diz o executivo. “Vamos utilizar plataformas de distribuição, até porque acreditamos que o País está entrando em um período muito auspicioso, onde a geração de riqueza ocorrerá aqui dentro mesmo”, diz.
Tempo oportuno – A certeza de que o momento é oportuno para o nascimento de novas assets no Brasil inspirou inclusive o nome de uma delas, a Kairós Capital, fundada em setembro de 2018. Kairós, em grego, quer dizer “tempo oportuno ou momento oportuno”, explica seu fundador, Luiz Fabiano Gomes Godoi. Com uma carreira com passagens marcantes pelo banco Bozano Simonsen e Safra, neste último com a responsabilidade de mais de R$ 100 bilhões sob gestão no Safra Asset Management, Godoi consolidou a Kairós no final do ano passado. Em abril deste ano lançou o seu fundo multimercado, o Kairos Macro, que detém um patrimônio de R$ 630 milhões de reais e já está disponível em quatro plataformas, sendo quatro delas digitais. Plataforma, aliás, diz ele, é fator determinante para o sucesso das novas assets. “Antes ficava-se muito restrito aos clientes de private das agências bancárias, na mão de quatro ou três distribuidores. Hoje não, o mercado se democratizou”, afirma.
No time da Kairós, equipe formada por economistas e engenheiros com Phd em universidades de renome no Brasil e no exterior, consta André Loes, que foi diretor-executivo do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) de 2016 até abril último e economista-chefe de América Latina do HSBC entre 2008 e 2015.
“Meus sócios todos queriam empreender e as condições macroeconômicas do País estavam postas: juros baixos, reformas em andamento no Congresso. Sem contar que o investidor brasileiro estava mal acostumado a uma rentabilidade irreal do CDI nas suas aplicações, o que não existe mais, hoje é preciso correr mais risco”, conclui.