Perdendo do Ibovespa | Volatilidade por juros altos e inflação le...

Ediao 348

Em um ano no qual a Bolsa de Valores local tem sofrido com o cenário de juros altos, inflação pressionada e incertezas por conta das eleições, os gestores de fundos de ações Valor/Crescimento vêm tendo dificuldades para conseguir bater o mercado. Como as carteiras desses fundos são mais sensíveis às mudanças do cenário macro, por investirem em ações mais voltadas à economia doméstica, fundos dessa classe com longo histórico no mercado acabaram ficando para trás na comparação com o Ibovespa –entre outras coisas porque o índice da B3 foi beneficiado por sua exposição relevante ao setor de commodities e pela forte alta nos preços de matérias-primas como o petróleo, com a retomada da atividade em escala global e com a invasão russa à Ucrânia.
Segundo Luis Felipe Amaral, fundador e gestor da Equitas Investimentos, o ano tem sido desafiador para os fundos da casa em termos de performance.
O Equitas Selection FIC FIA, por exemplo, registrou desvalorização de aproximadamente 24% na primeira metade do ano, contra uma queda de 6% do Ibovespa no mesmo intervalo.
No entanto, desde o início do fundo, em julho de 2010, a rentabilidade é positiva em 251%, contra os ganhos de 58,8% do Ibovespa. Amaral afirma que carrega na carteira dos fundos papéis de empresas que concentram suas operações no mercado local. Entre eles, o gestor cita nomes como do grupo varejista Soma, bem como a rede de hospitais Mater Dei, do setor de saúde, além da empresa de tratamento de resíduos ambientais Orizon e da 3tentos, do setor agro.
“Este ano está sendo muito ruim para as empresas de setores mais relacionados à economia local, que acabam sofrendo com as alterações nas perspectivas dos juros de longo prazo”, diz Amaral. Ele acrescenta, contudo, que a queda nas ações foi exagerada, tendo em vista os resultados operacionais apresentados nos últimos balanços trimestrais, e avalia que há boas oportunidades a serem capturadas pelos investidores com visão de longo prazo.
“Faço gestão de recursos há mais de 20 anos, e foram raras as ocasiões em que vi oportunidades tão claras quanto agora. Me parece que estamos em um momento onde o valor das ações está tão barato como estava em 2008”, afirma.

Sócio-diretor responsável pela gestão de renda variável da Quantitas, Wagner Salaverry diz que o desempenho abaixo da média de mercado do fundo Quantitas FIA Montecristo, que caiu 11,35% na primeira metade do ano, também se deve em grande medida à ausência do setor de commodities na carteira.
O gestor da Quantitas afirma que também tem um portfólio mais concentrado em companhias com uma dependência maior da dinâmica econômica local, que, em sua avaliação, estão negociando a preços excessivamente descontados. A farmacêutica Hypera e a calçadista Grendene, bem como a SBF, controladora da rede de artigos esportivos Centauro, e a varejista Lojas Renner, estão entre as principais posições na carteira do fundo de ações da Quantitas.
“São empresas que geram caixa e com baixo endividamento, que reúnem as características que buscamos em empresas para atravessar um ano de Selic mais alta, com eleições e com um cenário externo mais conturbado”, diz Salaverry.
Segundo o gestor da Quantitas, o fato de ter uma exposição relativamente baixa às plataformas digitais voltadas ao varejo, com a base de cotistas formada em sua maioria por investidores com visão de longo prazo, como family offices, contribui para que o fundo consiga atravessar períodos de maior volatilidade sem grandes movimentos de resgate de recursos. Isso ajuda na manutenção em portfólio de papéis de menor liquidez e negociados com níveis elevados de desconto, sem que os gestores se vejam forçados a se desfazer dos ativos para fazer frente aos saques dos investidores, diz Salaverry.
Desde o início da estratégia, em fevereiro de 2011, o fundo da gestora gaúcha acumula um retorno positivo de 126,8%, contra os ganhos de 47,3% do Ibovespa em igual intervalo.

Diretor de investimentos da VWPP (Volkswagen Previdência Privada), Luiz Paulo Brasizza afirma que, frente à forte volatilidade nas Bolsas, tanto no Brasil como no exterior, o fundo de pensão tem buscado aumentar a flexibilidade na gestão das carteiras de renda variável. A fundação oferece aos participantes os perfis de investimento, com 15% e 30% de alocação em ações nos perfis moderado e agressivo, respectivamente.
Segundo Brasizza, de modo a diminuir a exposição ao mercado local e aumentar a diversificação, a fundação optou no início do ano pela inclusão de uma alocação em ações globais, correspondente a 10% em relação ao percentual total destinado à renda variável em cada um dos perfis com esse mandato. A estratégia, contudo, acabou não trazendo os resultados esperados –o índice acionário da Bolsa americana S&P 500 recuou 20,6% no primeiro semestre, o maior tombo para o intervalo desde 1970.
O diretor da VWPP diz que tem trabalhado agora em um novo modelo para a renda variável, no qual a classe deixará de ter um percentual fixo e passa a poder oscilar dentro de uma banda, que pode ser 50% acima ou abaixo da alocação alvo. “O modelo vai dar uma flexibilidade maior para o gestor procurar as melhores estratégias dependendo do movimento que estiver ocorrendo no mercado”, afirma Brasizza, acrescentando que a Itaú Asset é hoje a responsável pela alocação em renda variável da VWPP. O dirigente diz que o objetivo é aprovar o novo formato até o final do ano, com sua implementação prevista para 2023.

Na Real Grandeza, a diretora de investimentos Patrícia Queiroz afirma que a fundação encontra-se neste momento em meio a um processo de mudança na composição da carteira de renda variável. A carteira própria de ações gerida pelo time interno do fundo de pensão deixará de existir, dando lugar para a alocação em estratégias indexadas de ações, seja por meio de ETFs ou através de estratégias de gestão ativa.
Segundo a diretora, a opção pelos fundos de índices visa criar um colchão de liquidez, trazendo uma agilidade maior para a entrada e a saída dos investimentos em ações, a depender da conjuntura de mercado, além de trazer uma economia de custos. Já os gestores de fundos contribuirão com a expertise de profissionais 100% dedicados ao segmento de renda variável.
Patrícia afirma que, embora os momentos de queda generalizada dos mercados geralmente representem oportunidades de entrada para investidores de longo prazo, não há a intenção por parte da Real Grandeza de promover modificações no espaço dedicado às ações neste momento.
“Até porque nossa alocação em Bolsa já é historicamente elevada”, diz a dirigente. No plano BD (Benefício Definido), a parcela da carteira de ações está ao redor de 17%, chegando a 24%, no caso do plano CD (Contribuição Definida), bem próxima dos patamares indicados pelo estudo de ALM (Asset Liability Management).
Em cada um dos planos, a carteira própria de ações representa entre 4% e 5% do total, e serão gradualmente substituídas por estratégias em ETFs ou por meio de gestores de fundos. “De um modo geral, as fundações têm um limite de estrutura, e para manter uma carteira própria para fazer a seleção de ativos, precisaríamos de uma estrutura maior para gerar um alpha consistente”, afirma a diretora de investimentos.