Luiz Eugênio Figueiredo, da BNP Paribas Carlos Fagundes, da Integral André Germanos Carlos Frederico Aires Duque, da Infraprev Walter Maciel, da AZQuest
A perspectiva de mudança de governo gerou nos últimos meses um rali na bolsa de valores, que subiu 7,7% em abril, acumulando no ano uma alta de 24,36%. A melhora das expectativas para a recuperação da economia repercutiu mais sobre os ativos reais líquidos, ou seja, em ações na bolsa de valores, ainda que os fundamentos de boa parte de papéis e setores ainda estejam enfraquecidos. Outros ativos reais e de risco, por não terem liquidez, como participações em empresas fechadas – por meio do private equity – e imóveis, seguem sob observação dos gestores, que ainda precisam de sinais concretos para avaliar os fundamentos da economia no longo prazo.
Os mais cautelosos querem saber como serão colocadas em prática as desafiadoras reformas, como a da Previdência, e medidas de ajuste fiscal para tirar a economia brasileira do atoleiro. Só assim passarão a avaliar melhor quais empresas, setores da economia e segmentos do mercado imobiliário terão capacidade de sobreviver não só ao ajuste que precisa ser feito na economia brasileira, mas também à própria recessão em curso, que já tornou alto o endividamento das empresas, que têm menos acesso ao crédito, reduziu fortemente o consumo das famílias e elevou a vacância de imóveis comerciais, diminuindo o valor de locação e o lucro de investidores. Por enquanto, as fundações estão mais ativas na gestão da renda fixa e da renda variável, e observam outros ativos reais.
Especulações à parte sobre como será o novo governo, a agência internacional de classificação de risco Fitch também adotou um certo ceticismo e rebaixou mais uma vez o rating brasileiro, de BB- para BB, mantendo a perspectiva negativa. O que pesou na decisão foi o aprofundamento da recessão econômica, com a possibilidade da dívida pública chegar a 80% no próximo ano.
O fato é que a mudança recente de expectativas ainda não trouxe de volta a previsibilidade, na avaliação de Arthur Lencastre, líder de investimentos da Willis Towers Watson. Para ele, ainda é difícil identificar qual ativo real menos líquido tende a ser uma oportunidade nesse cenário que ainda carece de sinais concretos e que apontem quanto tempo levará para a retomada do crescimento econômico.
Cautela com private equity – A experiência com investimentos alternativos, como o private equity, para superar metas atuariais em um passado recente, como o de forte queda dos juros em 2012 – período que foi seguido de uma reversão na economia – deixou a cautela como uma marca nos gestores de fundações, que ainda se reflete no momento atual. Mesmo com o consenso de mercado de que a taxa Selic comece a cair neste ano. A projeção do início de maio da pesquisa Focus aponta para 13% ao fim deste ano e de 11,75% em 2017. “Os prêmios de riscos estavam tão altos no mercado brasileiro que, mesmo com a redução, as taxas ainda estão elevadas”, afirma Lencastre.
Para Luiz Eugênio Figueiredo, responsável pela gestão de investimentos alternativos da BNP Paribas Asset Management, os investimentos em private equity foram impactados de forma relevante pelos desafios econômicos e políticos, mas há fundamentos para o longo prazo, já que esse tipo de alocação é cíclico.
Mesmo na recessão, ele lembra que o apetite continua por parte do estrangeiro. “No Brasil, a taxa de juros interna é muito alta, o que reduz a propensão de alocar em ativos alternativos no longo prazo. O momento atual é desafiador, mas possível de fazer boas alocações”, afirma Figueiredo, que disse que a asset está estruturando um fundo de fundos de private equity de empresas de diversos setores, estratégia que depois será estendida para ativos de infraestrutura e imobiliário.
Segundo ele, o momento atual está sendo mais difícil para os fundos de private equity iniciados em 2010 e que estão em fase de desinvestimento, já que as possibilidades de saída se concentram em fusões e aquisições. “Para investir é um momento positivo por uma questão de safra e de empresas baratas e boas, que podem oferecer retorno maior em 6 anos, porque há setores na economia que estão muito penalizados e outros muito menos. Algumas empresas se prepararam para a recessão. O investidor deve ter disciplina para escolher e buscar uma boa firma, com bom track record”, afirma.
Ele explica que esse compasso de espera pode fazer o investidor perder a janela de investimento, já que muitos fundos que captaram de 2014 a 2016 só voltarão a captar em 2019, e essa decisão não pode ser tomada rapidamente, já que é preciso negociar o regulamento, as cláusulas e fazer a due diligence do fundo fechado.
Carlos Fagundes, sócio-diretor da Integral Investimentos, diz que está acompanhando de perto Fundos de Investimentos em Participações (Fips) de empresas do setor da construção civil. “Montamos um Fip e captamos R$ 50 milhões no ano passado, com uma carteira de empreendimentos de boa qualidade. Também consideramos o momento bom para a entrada em fundos imobiliários, desde que sejam bem selecionados. O preço da propriedade comercial embutida no veículo está com preço baixo, mas é preciso uma análise técnica detalhada por causa do custo de manutenção”, afirma.
Oportunidades na crise – A máxima de que os momentos de crise são sempre de oportunidades para entrar em ativos no preço mais baixo é uma teoria com pouco efeito prático nesse momento, na avaliação de Francisca Brasileiro, consultora sênior de investimentos da Willis Towers Watson.
“Será preciso identificar oportunidades e visualizar espaço no portfólio para assumir mais riscos, que foram reduzidos nas carteiras nos últimos anos”, afirma. Segundo ela, os conselhos das fundações resistem à ideia de fazer uma nova viagem ao risco por causa do momento, que ainda é de turbulência. Por outro lado, existe um estudo para identificar a diversificação, mas sem intenção de investir nesse momento.
Na renda variável, ela recomenda seletividade para identificar as melhores ações, desde que o investidor tenha espaço para isso no orçamento. Francisca diz que tem sugerido aos fundos de pensão que adiantem a discussão sobre a política de investimentos para o início do segundo semestre, quando parte das incertezas em relação ao novo governo tiverem se dissipado.
Guilherme Benites, sócio da Aditus Consultoria, segue a mesma linha de raciocínio e recomenda que posições em ativos de risco só sejam assumidas caso o gestor tenha condições para tal, de forma paulatina. “É difícil acertar o mínimo. Portanto, esses movimentos devem ser feitos com cautela e análise, já que ainda há muita incerteza no caminho, inclusive em relação à taxa de juros de longo prazo. A taxa vai guiar o risco. Eu olharia para a NTN-B mais longa, verificaria o comportamento da taxa, antes de ir para o risco”, afirma.
Segundo ele, os ativos reais, como o private equity e os imóveis, só poderão ser observados em uma segunda etapa da mudança política, após verificar o que vai ocorrer com os ativos financeiros, como juros e bolsa. “O efeito em ativos reais será mais demorado. Independente da perspectiva de um novo governo, os fundamentos estão muito fracos porque a retomada da economia real demorará um tempo. A volta para os ativos reais não será imediata pelos fundos de pensão, mas eles merecem estudo e análise”, afirma.
Quem está seguindo a cartilha de observar esse momento de mercado atentamente é Jorge Simino, diretor de Investimentos e Patrimônio da Funcesp. Ele diz que a maior parte da carteira continua em renda fixa e que fez um aumento de posição bem tímido na renda variável. “O grosso da carteira está em título NTN-C e NTN-B. O momento é de cautela, já que há fundamento para a queda dos juros, com a expectativa de inflação em queda e de apreciação cambial. A questão é que há opiniões ainda divergentes sobre o tamanho da redução da Selic, alguns acham que vai a 10% e eu sou da turma que acredita que possa ir a 12% ou 12,50%, uma taxa real ainda alta. Outra questão é a velocidade da redução”, diz.
Mais renda variável – Simino diz que fez uma pequena aposta em bolsa, com um aumento de posição que não chega a 1%, em estratégia beta. Hoje, 10% do patrimônio da fundação estão alocados em ações. Após o ajuste de expectativa e de fluxo de dinheiro, os fundamentos ainda não estão sólidos porque há muitas perguntas carentes de respostas no cenário externo e no doméstico. Esse raciocínio se aplica à posição da fundação em private equity, que é de R$ 20 milhões, o equivalente a 0,1% do patrimônio. “Esse tipo de investimento dependerá de aspectos do ponto de vista regulatório e é cedo para dizer se vamos mudar a posição. Está em suspenso”, afirma.
O investimento em imóveis, que equivalem a 3,5% do patrimônio da fundação, está com posição enxuta e consolidada, com presença maior em participações em shopping center e poucas lajes corporativas. “É um ativo que está sofrendo um pouco nesse cenário. Não temos preocupação de ampliar no curto e no médio prazos”, diz.
Carlos Frederico Aires Duque, diretor-superintendente da Infraprev, diz que o investidor institucional não deve perder de vista o ALM na hora de diversificar a carteira, de forma a potencializar o casamento de fluxos de longo prazo, mesmo diante de oportunidades que venham a surgir em uma mudança de ambiente econômico e político.
“Hoje a nossa visão é de cautela. Estamos acompanhando o rating de companhias e observamos um crescente movimento de downgrade delas. A posição tem sido defensiva e de redução de crédito privado na carteira de renda fixa”, diz.
A Infraprev deve ter uma posição mais ativa em renda fixa e em renda variável nos próximos 12 meses para ter geração de alfa. Em private equity e imóveis, que correspondem a 12,78% e 5,94% da carteira, respectivamente, o plano é manter essa participação, com ativos que estão em fase de desinvestimento.
“Nesse caso há também uma questão interna, já que a patrocinadora tem um plano de incentivo à aposentadoria e ao desligamento. Nossa estratégia é de menor imobilização de recursos, com alocação em classes de ativos mais líquidas para fazer frente a esse movimento. É importante que os investidores institucionais não esqueçam a missão do pagamento de benefícios”, afirma.
Na renda variável, que está em um patamar mínimo de exposição atualmente, de 7,53% da carteira, o plano é aumentar a exposição para 10 a 12%. “Vamos olhar para setores econômicos que tendem a se beneficiar em um contexto macroeconômico com uma estratégia de dividendos, que ajuda a reduzir o custo médio da carteira, com posições de beta. Além disso, estratégias que permitam um giro estratégico e de velocidade para a carteira com ETFs e contratos de índices futuros de bolsa. Para posições de longo prazo, ações de geração de valor, mas os fundamentos só ficarão mais claros após mudança de governo”, afirma.
A janela para entrar em ativos de risco de modo geral, com foco no longo prazo, pode levar um pouco mais de tempo, mas isso é questionável. De um lado, o impedimento da presidente Dilma Rousseff está precificado, mas um novo governo Temer ainda não, já que ele precisará de uma equipe muito competente para dar um choque de credibilidade e colocar a economia nos trilhos, na opinião de Walter Maciel, presidente da gestora AZQuest. Segundo ele, apesar da aprovação da nova equipe econômica comandada por Henrique Meirelles, o mercado ainda espera sinais concretos de um plano bem feito e que possa ser executado.
“Há um ciclo de investimento bom para a renda variável e espaço para a valorização das ações. Num primeiro momento, as blue chips lideraram a alta, mas há uma perspectiva de valorização do Ibovespa. O investidor está olhando os riscos neste momento de reversão de expectativas, mas observar apenas os resultados das empresas contaminado por uma perspectiva negativa pode ser um erro. Existem oportunidades no longo prazo, mas alguns setores ainda vão levar mais tempo para recuperar, como o imobiliário, automotivo e varejista”, afirma Maciel. Segundo ele, a gestora tem exposição a ações small caps, além de empresas de média e grande capitalização.
Já para Frederico Tralli, diretor de renda variável para América Latina da BNP Paribas Asset Management, o consenso de mercado é que a taxa de juros deve entrar em um ciclo de redução. “Estamos mais cautelosos. Projetamos um corte da Selic para 12,75% ao fim deste ano, chegando ao redor de 10% em 2017. Contemplamos isso, mas não uma reversão do PIB. O cenário ainda é de dificuldade para o lucro das empresas em 2016 e em 2017. Uma recuperação mais significativa é esperada em 2018”, afirma.
Tralli diz que esse cenário traz um alento para a renda variável, no sentido de trazer para baixo o custo de financiamento das empresas, que estava muito alto. Os spreads menores podem aliviar o balanço de companhias alavancadas, tanto por queda de receita quanto pelo alto custo do crédito. “Se não houver uma surpresa negativa do lado da sustentabilidade do governo de transição, surgirá uma oportunidade para os fundos de pensão voltarem a aumentar a exposição na renda variável, mas isso será de forma gradual”, afirma.
Ele diz que os setores que continuam atrativos para o longo prazo, mesmo diante de incertezas, são o financeiro em geral, incluindo seguros e adquirência, além de infraestrutura e o de utilities, em especial companhias de energia e transmissão. “São papéis de risco menor em relação ao retorno, com receita previsível e que oferecem taxas de retorno real superiores as da NTN-B longa. São setores para investidores com longo prazo”, completa.
Investimento imobiliário deve ficar no radar, mas recuperação será lenta
Um dos setores mais atingidos pela recessão foi o imobiliário, que também passou por um ciclo de baixa causado por um excesso de oferta. A avaliação de especialistas é que a recuperação será mais lenta por depender de uma série de reversões na macroeconomia, como a melhora do emprego e do acesso ao crédito, além de bases mais sólidas para o investimento de empresas.
A expectativa de Rossano Nonino, chefe da área real estate da JP Morgan, é que esse mercado volte a passar por um momento favorável de pico em 2021 ou 2022. Para o próximo ano ele espera uma recuperação gradual, dado o atual momento de baixa. Para aproveitá-lo, diz que é preciso ter um processo de seleção bem assessorado para evitar regiões com excesso de oferta, que hoje já sofrem com a demanda retraída, tanto no segmento de escritórios, como de shoppings e condomínios logísticos.
André Germanos, associado de Capital Markets da Cushman & Wakefield, avalia que o mercado imobiliário está chegando ao ponto mais baixo do ciclo. Houve um ápice de grandes lançamentos até 2013, movimento que resultou no aumento de imóveis disponíveis, seguido por uma queda na demanda, intensificada pela recessão.
Dados da Cushman mostram que de uma média de 120 mil m2 de empreendimentos entregues em 2012, o volume passou para 300 mil m2 em 2015, causando uma sobreoferta. A expectativa é que o mercado absorva de 100 a 150 mil m2 ao ano entre 2016 e 2018, zerando esse estoque excedente. Com nenhuma entrega prevista para 2018, este seria o ano no qual o mercado começaria a observar um equilíbrio e redução da vacância – que se encontra no patamar de 25,9%, segundo dados do primeiro trimestre deste ano. Segundo ele, o preço médio de aluguéis comerciais caiu 3,8% para R$ 106,4 por m2 em 2015 na comparação com 2014.
Para Edoardo Dalla Fina, gerente executivo de Capital Market e Investimento da Colliers, o investidor institucional ainda não está investindo, mas isso será inevitável quando a taxa de juros começar a cair, em um cenário de inflação baixa. No entanto, também observa um delay entre a recuperação econômica e a do mercado imobiliário, já que a precificação não é rápida e depende da própria velocidade do ciclo dos imóveis.
“Para o institucional, a vacância pesa mais porque um ativo que gerava renda passa a ter custo de carregamento. Para eles, talvez esteja passando da hora de entrar em fundos imobiliários, pois muitos estão precificados abaixo do valor patrimonial. Nesse caso, é importante entender os ativos que compõem o fundo e avaliar a taxa de gestão”, afirma.
Quem está investindo em condomínios logísticos, de olho no longo prazo, é a gestora de recursos de family office V2 Investimentos. “Nesse segmento também há vacância em regiões com excesso de oferta. Mas o Brasil é carente em infraestrutura. Investimos em projetos sob medida (Built to Suit) para os inquilinos, que assinam um contrato para permanecer no imóvel por 10 a 15 anos. Quem investe nisso agora pode ter um retorno em dois ou três anos”, afirma Vítor Grünpeter Correa, sócio fundador e gestor da V2 Investimentos, que faz a gestão de R$ 600 milhões de clientes.