Os planos de Trindade para dirigir a CVM | Marcelo Trindade é ind...

Edição 144

Os boatos de que Luiz Leonardo Cantidiano, ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), não tinha relações das mais amistosas com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, parecem ter-se confirmado. Cantidiano entregou a sua carta de demissão no início de março ao ministro Palocci, que indicou para seu lugar o advogado Marcelo Trindade, que ainda deve ser sabatinado pelo Senado antes de sentar na cadeira mais importante da autarquia.
A autarquia não será uma tarefa nova na vida de Trindade. Entre novembro de 2000 e abril de 2002 ele foi diretor da CVM, durante a gestão do presidente José Luiz Osório. No entanto, resolveu voltar para a iniciativa privada por questões financeiras. “Dois anos dentro de um órgão público é muito tempo para quem tem pouca poupança”, diz o próprio Trindade.
Depois dessa passagem pela CVM, o advogado foi para o escritório Tozzini Freire Teixeira & Silva Advogados, de onde saiu recentemente para montar seu próprio escritório, Trindade & Advogados, plano que agora será engavetado.
Trindade afirma que volta à CVM gostando e entendendo ainda mais a dinâmica da autarquia do que durante sua primeira passagem por lá. “Estando de fora, como advogado, a impressão que se tem é que a CVM nega tudo o que pedimos. E, na realidade, é o contrário. O mercado não sabe como pedir e a CVM acaba sem saber o que se quer”, diz Trindade.
Sem dar grandes detalhes, e tomando cuidado para não melindrar o Senado, até porque ainda não foi confirmado como presidente, Trindade afirma que seus principais planos são modernizar e agilizar a análise dos processos dentro da autarquia. “A CVM precisa de mais estrutura para pôr em prática todo o arcabouço legal que foi criada por ela própria”, diz Trindade. Ele acredita que a melhora do mercado deve aumentar o nível de arrecadação da autarquia, justificando a liberação de mais recursos para a CVM, por parte do governo.
Na opinião do advogado, não há muito mais o que se fazer na parte de legislação e os números provam isso. No último ano e meio, a CVM editou 31 Instruções, algumas bastante importantes, como a de debêntures padronizadas e a reedição da norma sobre emissões de ações. Para Trindade, as regras mais importantes, e que ainda estão em andamento, são as de fundos de investimentos (a primeira que vai unificar a legislação dos fundos de renda fixa, antes nas mãos do Banco Central, e renda variável), além da regra que cria níveis diferenciados de companhia aberta, dependendo do tipo de papel que irá lançar no mercado. Na opinião do futuro presidente da CVM, no entanto, a segmentação de empresas abertas pode acabar reduzindo a liquidez dos papéis.

Pressão Política – Trindade deve assumir a CVM em um momento no mínimo complicado para a autarquia. Nos últimos dois anos, sob o comando de Cantidiano, o órgão foi acusado por uma parte do mercado e até por membros do próprio governo de trabalhar em prol dos controladores.
Para Trindade, pressões políticas são normais em órgãos públicos. No entanto, avisa que não está disposto a trabalhar em um clima de guerra declarada. “No momento em que isso me deixar desconfortável e atrapalhar meu trabalho, vou avaliar se vale a pena permanecer.” Trindade também afirma que profissionais experientes que ocuparem cargos na CVM, inevitavelmente serão acusados de protegerem seus ex-clientes. “As acusações serão sempre descabidas, contanto que o executivo não vote em questões que envolvam ex-clientes seus.”
A saída para tanta polêmica então seria ter na CVM apenas pessoas voltadas para a vida acadêmica? O futuro presidente da autarquia lembra que, nas duas CVMs mais importantes do mundo (a americana e a espanhola), há um mix: alguns diretores são do meio acadêmico e outros vieram da iniciativa privada.
Além de toda a pendenga política que corre nos bastidores, Trindade deve chegar na CVM com a espinhosa missão de resolver dois casos complicados: a venda da Embratel para a Telmex e a operação entre AmBev e Interbrew. Trindade não quis adiantar qual será sua estratégia para tocar negócios polêmicos como esses. Mas quem o conhece acredita que os controladores dificilmente sairão impunes, se ficar comprovado algum tipo de prejuízo aos minoritários.