Oportunidades no exterior | CVM edita novas normas de fundos de i...

Edição 285

 

A nova Instrução da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) nº 578, que trata de normas sobre funcionamento e administração de fundos de investimento em participações (FIPs), abriu a possibilidade para investidores diversificarem seus ativos com aplicações fora do país. Entre as diversas mudanças que a instrução traz, foi criada uma subcategoria voltada a investidores profissionais que permite investimentos de até 100% do capital subscrito de um FIP em ativos no exterior, sem a exigência de um percentual mínimo. Já FIPs voltados a outros tipos de investidores podem investir até 20% do capital subscrito fora do Brasil. A novidade deve movimentar o mercado, já que era pleito antigo de gestores a possibilidade de oferecer a seus clientes a oportunidade de aplicar em outros países.
Uma das gestoras que devem aproveitar a nova regra é o BNP Paribas Asset Management. A asset já havia anunciado a estruturação de um fundo de fundos de private equity de empresas de diversos setores e agora, com a possibilidade de expansão do investimento para outros países, os gestores do fundo devem avaliar se a estratégia do mesmo será focada somente em Brasil ou se será um fundo regional. “Esse fundo pode ser focado em América Latina, por exemplo”, diz o responsável pela gestão de investimentos alternativos da asset do BNP Paribas, Luiz Eugênio Figueiredo. “Agora está aberta essa oportunidade, mas vamos estudar o momento e o interesse de clientes para tomar essa decisão”, salienta.
O executivo diz que as novas regras da CVM abrem um grande leque de oportunidades para os fundos do mercado. “Comprar empresas no exterior é uma coisa que vem à cabeça de muita gente quando vê a regulamentação. Mas há muitas outras situações em que essa possibilidade legal é mais aplicável na prática da indústria”, opina Figueiredo. Ele destaca que, como anteriormente havia a vedação para investimento no exterior, direta ou indiretamente, um fundo não poderia investir em uma empresa brasileira que eventualmente quisesse usar parte do recurso para fazer uma expansão internacional.
O vice-presidente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (Abvcap), Francisco Sanchez, salienta que a consequência disso é que o FIP, muitas vezes, comprava uma empresa no Brasil que não podia se expandir mundo afora por conter capital do fundo, limitando, assim, a expansão da indústria de private equity brasileira como um todo. “Com a nova norma, vamos multiplicar multinacionais brasileiras. Isso vai ajudar a fomentar a indústria, agora que serão criados produtos e estratégias para isso”, salienta.
Outro aspecto, apontado por Luiz Eugênio Figueiredo, é que no momento de uma saída de investimento, era limitada a possibilidade de uma empresa estrangeira comprar a empresa local, pois é comum no mercado de private equity e venture capital que algumas transações de compra e venda sejam feitas troca de ações e incorporações. “Se uma empresa estrangeira tivesse interesse na compra de uma brasileira por meio desse tipo de transação, o FIP teria que carregar ações da empresa interessada, o que não era permitido. Isso limitava o desinvestimento”, destaca. “Ou seja, a possibilidade de deter ativos no exterior é muito mais ampla do que simplesmente comprar um empresa internacional”, complementa Figueiredo.

Mais mudanças – Outra novidade importante trazida pela instrução foi a criação das categorias FIP Multiestratégia e FIP Capital Semente. “A multiestratégia é uma categoria que permite investimento em ativo alvo do tipo capital semente, outra categoria criada pela instrução, ou da categoria FIP Empresas Emergentes, usufruindo dos mesmos descontos regulatórios que elas têm”, explica o analista da superintendência de desenvolvimento de mercado da CVM, Bruno Gomes.
Para Francisco Sanchez, da Abvcap, a distinção entre as categorias é importante, pois antes, os fundos de capital semente usavam as regras de um fundo de private equity. “Agora, há uma série de flexibilizações que vão contribuir para que mais gestores criem seus fundos. FIP Multiestratégia, inclusive, é uma categoria híbrida para fazer uso de diversas regras das categorias específicas em um mesmo veículo”, complementa.
Os FIPs poderão também, a partir de agora, investir em debêntures simples, ou seja, debêntures não conversíveis em ações, até o limite de 33% do capital subscrito. “Até então, o fundo poderia investir em ações e, muitas vezes, quando a empresa investida passava por momentos de crise e precisava de uma alocação de capital, o fundo tinha que comprar mais ações, aumentando o capital para poder prover esse financiamento extra. Agora, o fundo pode aplicar mais dinheiro na empresa sem aumentar sua participação acionária”, explica Sanchez.
Bruno Gomes, destaca ainda o fato de que agora, a forma de cálculo dos limites de concentração da carteira passa a ser o capital subscrito, e não mais o patrimônio do fundo. “Faz mais sentido, já que que a integralização de um FIP é feita aos poucos. Outra permissão que foi dada é a possibilidade do FIP realizar adiantamentos para futuro aumento de capital da companhia investida, se ele for acionista da empresa”, destaca Gomes.
Normas contábeis – Por meio de outra instrução, a CVM 579, a autarquia regularizou normas contábeis para os FIPs. As mudanças entram em vigor em 1º de janeiro de 2017. Até então, os FIPs não possuíam regras específicas nesse sentido. “Não existia nenhuma norma que regulasse questões contábeis dos fundos. Tudo era feito por meio dos regulamentos dos próprios FIPs”, diz o gerente de normas contábeis da CVM, Paulo Roberto Ferreira. “Os fundos adotavam critérios bastante questionáveis de mensuração, até porque dificultava fazer qualquer tipo de comparação entre eles. Víamos ainda modelos de negócios distintos debaixo de um único guarda-chuva”, destaca.
Para Luiz Eugênio Figueiredo, fazer a avaliação da carteira a valor justo, conforme a nova instrução exige, é um aspecto operacional importante, pois facilita a comparação entre diferentes fundos e avaliações internacionais. “Agora, passamos a ter um alinhamento com o padrão internacional, o que facilita a atração de recursos estrangeiros, e o BNP Paribas, sendo um banco global com capilaridade e penetração grande, tem mais esse fator positivo para seu negócio”, destaca.
Francisco Sanchez, da Abvcap, salienta que a padronização contábil é mais uma norma que traz as regras para uma esfera global. “Temos quase 800 fundos no mercado, cada um com sua regra específica. Ao se criar uma regra uniforme, cria-se também um ambiente de comparabilidade maior, ou seja, o investidor, quando quer avaliar performance de fundo ou desempenho do gestor, consegue comparar de forma justa”, destaca.

Principais mudanças da instrução

A Instrução CVM 578, que substitui as antigas 209, 391, 406 e 460, é resultado de um processo de audiência aberto pela CVM que recebeu sugestões de 18 participantes. O prazo de adaptação à nova instrução é de 12 meses. Veja os principais pontos da nova Instrução.
• Criação de uma subcategoria dentro do FIP Multiestratégia, que permite investimentos de até 100% do capital subscrito em ativos no exterior;
• Criação da categoria Multiestratégia, a qual permite alocação de recursos em sociedades em diversos estágios de desenvolvimento;
• Criação da categoria Capital Semente;
• Investimento em debêntures simples entre os ativos elegíveis para investimento pelos Fips até o limite de 33% do capital subscrito;
• Adiantamentos para futuro aumento de capital da companhia investida, desde que cumpridas determinadas condições;
• Possibilidade de investimento em sociedades limitadas, desde que essas sociedades apresentem receita bruta anual de até R$ 16 milhões;
• Extinção da categoria FIC-FIP com a permissão para que qualquer Fip possa investir em cotas de outros fundos da mesma categoria;
• Aumento no prazo para divulgação de informações semestrais e anuais, que eram respectivamente de 60 e 120 dias, passando ambos para 150 dias.