O mercado brasileiro de gestão de recursos tem atravessado nos últimos meses uma verdadeira onda empreendedora, com executivos que amealharam experiência e reputação em grandes casas e resolveram, com base em suas experiências e histórias, colocar de pé suas próprias assets. Um conceito fundamental para entender o movimento, citado pela maioria deles ao falar dos novos negócios, é o de partnership; por ele, os principais executivos são sócios da empresa e ganham com seu crescimento, algo que raramente é observado nos conglomerados financeiros globais de onde muitos deles vieram.
Entre outras, casas como Investment One Partners, de Bernardo Parnes (ex-Deutsche Bank, Merrill Lynch, Bradesco BBI e JSI); Hedge Investments, de André Freitas, (ex-CSHG); Quasar Asset, de Carlos Maggioli (ex-Itaú BBA); e Starboard Restructuring Partners, de Warley Pimentel e Fábio Vassel (ex-Brasil Plural) já foram lançadas e estão em operação. Também compõem a lista de novas gestoras a Monte Equity Partners, que tem em seu quadro Carlos Takahashi (ex-BB DTVM), e a Rapier, de Mauricio Bicalho (ex-Merrill Lynch e UBS), mas essas duas últimas, procuradas pela Investidor Institucional para falar sobre seus planos, não quiseram se manifestar.
Lançada em janeiro de 2017, a Investment One Partners tem como CEO Bernardo Parnes, executivo com longa trajetória no mercado brasileiro, tendo ocupado nos últimos anos os cargos de CEO em empresas como a Merrill Lynch na América Latina (na década de 90), JSI (family office da família Safra) e Bradesco BBI (que ajudou a estruturar). Nos últimos sete anos o executivo esteve à frente do Deutsche Bank na América Latina, de onde saiu no ano passado quando o banco alemão comunicou a decisão de reduzir suas operações na região. Com isso, Parnes se viu livre para tocar um projeto que vinha sendo gestado há muitos anos, já que não era de seu interesse ser transferido para trabalhar no Deutsche em outro país. “Eu poderia ter ficado em casa esperando outro emprego, o que teria seu mérito, mas sinceramente entendo que o Brasil tem oportunidades excepcionais e era o momento de empreender ”, afirma Parnes.
A Investment One Partners terá três áreas segregadas e independentes entre si – gestão de recursos para o público wealth, asset management e advisory e banco de investimento. A área de wealth já conta com R$ 800 milhões em ativos sob gestão. Parnes conta que a ideia da casa é ter um número restrito de clientes, mas com tickets unitários elevados; para a área de wealth, por exemplo, o ticket médio deve ser ao redor dos R$ 50 milhões, prevê o executivo à frente da nova casa.
A área de wealth da One tem como os principais sócios Sergio Penchas, que foi nos últimos anos o CEO do grupo Safra em Mônaco; Ricardo Valente, que era o responsável pelos fundos indexados da CSHG; e Raphael Zagury, que mais recentemente ocupava o posto de diretor do Deutsche em Nova York.
Para a área de asset management Parnes trouxe Thomas Souza, com quem já havia trabalhado no Merrill Lynch e no family office do Safra. Souza foi o responsável pela estruturação de outra gestora, a Águas Claras, que foi adquirida pela Gávea em 2011. Com o fim da parceria entre Gávea e JP Morgan em 2015, Souza esteve no último ano no banco americano, de onde saiu para participar da Investment One Partners. E para a área de advisory, o principal sócio é Fabio Jung, que também já havia trabalhado com Parnes no Deutsche, e que antes da Investment One Partners estava no Merrill Lynch.
“A maioria dos nossos sócios já trabalhou junto no passado, e tínhamos a vontade de fazer um projeto amplo em parceria”, explica Parnes, que ressalta a importância do conceito de ‘partnership’, adotado pela Investment One Partners.
Souza explica que vai replicar a estratégia já utilizada nas casas anteriores em um novo fundo de ações que a área de asset management da One vai lançar nos próximos 30 a 60 dias, a depender da conclusão dos trâmites burocráticos. Souza prefere não cravar um número exato de quanto o fundo deve levantar nos próximos anos, mas aponta como referência o fundo de ações que era gerido por ele na Gávea, que chegou a ter mais de R$ 1 bilhão. “Acreditamos que podemos replicar o sucesso que tivemos lá, ou até superar, já que o time e o produto serão os mesmos, com a mesma filosofia e processo de investimento. Esperamos captar um volume significativo dado a qualidade do time e a performance que entregamos nos últimos dez anos”. A equipe de oito profissionais que trabalhava com ele no JP Morgan foi junto para a Investment One Partners.
Imobiliário – Já a Hedge Investments era uma asset que existia no mercado desde dezembro de 2014, mas com apenas um fundo multimercado que era tocado por ex-sócios da Hedging Griffo. No início de 2017, André Freitas, que foi um dos fundadores da corretora independente adquirida pelo Credit Suisse, e dez profissionais que trabalhavam com ele na CSHG deixaram a asset e foram para a Hedge, para onde levaram R$ 1 bilhão em fundos imobiliários que eram geridos por eles na antiga casa, correspondente a 20% da área da instituição financeira suíça.
“Montamos a Hedge buscando resgatar uma experiência que tivemos no passado quando ajudei a fundar a Hedging Griffo”, pondera Freitas, que ressalta a importância do modelo de partnership adotado na Hedge, que já havia sido adotado em outras empresas por qual passou mas não na CSHG. “Apresentei essa ideia à equipe que trabalhava junto na CSHG e deixei aberto para quem quisesse me acompanhar no projeto”, afirma Freitas.
A Hedge tem hoje cerca de R$ 1,6 bilhão em ativos sob gestão e cinco fundos, todos voltados para a área imobiliária – dois fundos de fundos, um fundo imobiliário, um FIP, além do multimercado que permaneceu na grade e investe em commodities e real estate. Desses produtos, apenas o multimercado não veio da CSHG. Entre os produtos imobiliários da Hedge está também um fundo que veio da Gávea, que nem ela nem o JP Morgan tinham interesse em manter após o fim da parceria e com isso a CSHG o assumiu. “A equipe que veio da CSHG era a responsável pela gestão desses fundos, e quando anunciamos a intenção de mudar de casa os cotistas realizaram assembleia e decidiram migrar com a gente”, explica Freitas, que ressalta que não houve compensação financeira para a CSHG por parte da Hedge pela transferência dos fundos. Entre os clientes da Hedge vindos da CSHG a maior parte é do private, mas também com uma parcela menor de institucionais.
Freitas revela que a Hedge está em processo avançado da compra de uma DTVM, no aguardo apenas de aprovação do BC, que ficará responsável pela administração de seus fundos que hoje ainda continuam sob a guarda do CSHG. “Achamos que é mais fácil comprar uma DTVM já pronta do que montar do zero”, pontua o executivo, que acrescenta que, ao menos no momento, a Hedge não tem a intenção de oferecer o serviço de administração de fundos a terceiros.
Crédito – Por sua vez, a Quasar Asset é uma gestora voltada exclusivamente ao mercado corporativo de crédito privado ‘high yield’, fundada em janeiro de 2016 por Carlos Maggioli. Antes de abrir a Quasar, com recursos proprietários, ele foi sócio do Itaú BBA e gestor de portfólio do Merrill Lynch em Londres. A captação do primeiro fundo da Quasar, no entanto, só foi iniciada no mês passado, em agosto de 2017, e deve ser encerrada em outubro com R$ 500 milhões levantados, para iniciar em novembro os investimentos. Maggioli explica que nesse período, além dos aspectos legais junto aos órgãos reguladores para poder atuar no mercado, trabalhou na estruturação de oito áreas dentro da asset: risco, compliance, jurídico, originação, captação, estruturação, crédito e monitoramento de crédito. “Estou criando uma empresa extremamente disciplinada, baseada em processos, até pela experiência adquirida no Itaú. Tanto é que me dei ao luxo de demorar quase dois anos para fazer a captação porque queria ter toda essa estrutura já pronta antes”.
Com a cultura do Itaú BBA enraizada, Maggioli formou o ‘board’ da Quasar com quatro ex-diretores do banco de investimentos – Guilherme Vasconcelos, Paulo de Paula Abreu, Marcelo Maziero e Michael Viriato. Além deles, a casa conta com treze profissionais, sendo que três deles também acumulam passagem pelo Itaú BBA – Fabiano Romano, Marcelo Souza Lima e Eduardo Telles.
Maggioli avalia que a retomada do crescimento do crédito vai passar, em parte, pela mão dos agentes usuais como os grandes bancos, mas não na mesma intensidade de antes. “Uma parte desse mercado foi estruturalmente ‘desintermediado’, e quem tem de ocupar essa lacuna são as gestoras”, prevê o executivo.
O fundo da Quasar é um multimercado fechado que vai originar operações de crédito e também comprar títulos privados de terceiros. O foco do fundo serão papéis ‘high yield’ com 100% de garantia e com expectativa de retorno aos investidores de 150% líquidos do CDI. O BNY Mellon será o administrador e custodiante dos fundos da Quasar. Maggioli explica que o modelo de fundo fechado foi o escolhido por conta da restrição de liquidez que ainda se faz presente no mercado doméstico de crédito. Ele lembra ainda que nos fundos abertos, pela política de investimento, é necessário que o veículo tenha um nível de liquidez razoável para permitir a entrada e saída dos investidores, o que leva os gestores desses veículos a adicionarem ativos grau de investimento em seus portfólios. E o fato do fundo da Quasar ter apenas ativos ‘high yield’ também pesou para a decisão de estruturar um veículo fechado.
Reestruturação – Já a Starboard Restructuring Partners foi montada em janeiro de 2017 por 15 executivos egressos do Brasil Plural, capitaneados por Warley Pimentel e Fábio Vassel, em uma equipe que já atuava conjuntamente dentro do banco na área de reestruturação de empresas nos últimos três anos. Com o crescimento da área dentro do banco, os executivos entenderam que seria melhor realizar uma segregação formal para evitar potenciais situações de conflitos de interesse, já que um eventual investimento em uma empresa em situação delicada poderia gerar ruídos com um credor que também tenha outros negócios com o Brasil Plural, afirma Pimentel.
A Starboard prepara no momento a captação de seu segundo fundo para investir em empresas que precisam de reestruturação, que deve iniciar roadshow ainda em 2017 para levantar até R$ 1 bilhão; Pimentel conta que já conseguiu o compromisso de um investidor institucional estrangeiro, que vai atuar como âncora da operação com US$ 250 milhões. O primeiro fundo com essas características, de R$ 120 milhões, foi captado quando a equipe da Starboard ainda trabalhava no Brasil Plural; inclusive a gestão desse primeiro fundo é compartilhada entre Pimentel e Brasil Plural. Já o segundo fundo, a ser captado, será exclusivo da Starboard. “O primeiro foi um fundo de testes, para entendermos a dinâmica desse mercado, e agora estamos prontos para captar um fundo bem maior”.
Pimentel ressalta que a Starboard não vai atuar na compra de carteiras estressadas de outros investidores; o foco exclusivo da asset será na compra de empresas que enfrentaram dificuldades nos últimos anos por conta da recessão, mas que possuem bons fundamentos e podem voltar a crescer após o trabalho de reestruturação. “Temos visto muita coisa na área de construção, de concessões, o setor industrial, que vem de fase muito complicada, além da cadeia do agronegócio. Teremos boas oportunidades para o fundo”, diz o gestor.
Além da área de gestão de fundos, a Starboard atua também na assessoria de empresas que precisam renegociar suas dívidas junto aos bancos. A empresa fez recentemente esse trabalho para a dívida de R$ 300 milhões da loja de materiais esportivos Centauro, e acabou de ganhar o mandato da UTC, empreiteira envolvida na operação Lava Jato.