Edição 136
Adecisão do Conselho Monetário Nacional (CMN), tomada no mês passado – de fixar as metas de inflação para 2004 e 2005 em 5,5% e 3,5%, respectivamente, com margens de variação de até 2,5 pontos percentuais para cima ou para baixo – embora tenha unido no diagnóstico alguns dos maiores gestores de carteiras de renda fixa, provocou diferenças nos prognósticos. Os executivos responsáveis pela performance de vários fundos de investimento voltados para grandes aplicadores estão vendo, agora de forma mais nítida, que a política monetária do novo governo virou terreno fértil para ganho daqueles que forem mais atentos. Nesse cenário, o leque de produtos deve aumentar e as diferenças de retorno ficarão mais claras.
O diretor de renda fixa da Bradesco Asset Management, Carlos Roberto Rabello Otero, cita o ex-ministro e atual deputado federal, Delfim Neto, para justificar o raciocínio de que o Banco Central tornou mais transparente a relação com os agentes econômicos ao abrir a margem dos 2,5 pontos percentuais. “Há uma clara defasagem entre os números da inflação e o calendário, mas a tendência é de queda”, diz Otero referindo-se aos índices de preços. Ele lembra que as projeções de inflação feitas pelo mercado já vinham sinalizando que a meta projetada para este ano deverá ser atingida em junho de 2004. E os 5,5% devem chegar ainda no primeiro semestre de 2005.
“Já havia um entendimento implícito que o Banco Central não estava disposto a jogar a economia na mais profunda recessão para cumprir a meta”, explica Otero. “O CMN apenas tornou essa leitura mais explícita”, diz. Para ele, o Banco Central não vai usar o limite do teto da meta – que chega a 8% em 2004 – para derrubar os juros de forma aguda no curto prazo. Mas, avalia Otero, se houver soluços sazonais nos índices de preços, a tendência de queda de juros não será interrompida.
“O Banco Central não podia jogar uma pá de cal sobre a economia para cumprir a meta”, concorda o diretor executivo da Unibanco Asset Management, Paulo Vaz. “O CMN foi realista”, afirma. A mesma opinião tem a gestora de renda fixa da BankBoston Asset Management, Mônica Dresbach. “O que era a meta ajustada virou agora o centro da meta”, diz ela.
Na mesma linha de raciocínio segue o gestor de renda fixa da Sul América Investimentos, Guilherme Abbud. “O CMN foi realista sem abandonar a política responsável”. E o gestor de renda fixa do ABN AMRO Asset Management, Eduardo Castro, usa as curvas dos juros futuros na Bolsa de Mercadorias & Futuro para sustentar a tese de que o CMN não surpreendeu os agentes do mercado. “Se a decisão tivesse surpreendido, teria sensibilizado a curva na BM&F”, afirma.
Estratégias – Mas o coro dos iguais perde harmonia quando os executivos são chamados a olhar para frente. “Não mudou nada mas, ao mesmo tempo, algumas coisas podem mudar”, afirma o diretor do Bradesco, Carlos Otero. Ele diz que não enxerga uma queda brusca dos juros no curto prazo, mas as margens acima das metas de inflação abrem espaço para um corte mais acentuado da Selic no médio prazo. Por isso mesmo, Otero é um dos gestores que ainda vêem oportunidades com posições em ativos pré-fixados, como a Letras do Tesouro Nacional (LTN) ou os contratos de DI na BM&F. Principalmente em apostas de longo prazo.
Ele avalia, ainda, que os prêmios das Letras Financeiras do Tesouro (LFT) vão cair. Os prêmios dos papéis longos mais líquidos, os que vencem em 2007, por exemplo, chegaram a bater até 2,5% no auge da turbulência provocada pela dupla de acontecimento marcação a mercado-eleições. Hoje, são negociados com prêmios na casa dos 0,90%. “Acho que ainda há espaço para esses prêmios fecharem”, diz Otero, mas com ressalvas. “Não haverá mais ganhos absurdos, como no começo do ano. Agora virão pequenos ajustes”.
Paulo Vaz, do Unibanco segue na mesma linha. Ganhos de até 125% sobre o CDI devem ficar mais escassos. Ele afirma que depois da turbulência do ano passado, provocada pela marcação a mercado, as LFTs voltaram a ser papéis bem estáveis. Para Vaz, há boas oportunidades em posições pré-fixadas para o aplicador que olha o longo prazo. “Mesmo com os cortes de juros esperados, as taxas ainda estão elevadas”. No curto prazo, o executivo da UAM lembra que o mercado já tinha antecipado os cortes de juros e que, por isso, não se justificam grandes apostas nas posições pré – na BM&F ou em LTNs – se o horizonte se limitar ao curto prazo.
O executivo da UAM diz ainda que os CDBs que tinham ocupado parte das posições deixadas pelas LFTs já saíram do mercado. “O primeiro trimestre foi marcado pela reversão do estresse do ano passado. De 60% a 70% das posições em CDBs já voltaram”.
Reformas – Outro que aposta que os prêmios das LFTs podem cair ainda mais é o executivo da ABN AMRO Asset Management, Eduardo Castro. “A situação fiscal positiva e o andamento das reformas podem fechar o prêmio das LFTs”, avalia. Castro também espera que a redução dos compulsórios sobre os depósitos à vista – hoje 60% dos depósitos à vista dos bancos ficam recolhidos no Banco Central – pode liberar recursos que darão fôlego para as instituições financeiras puxarem para cima a demanda pelas LFTs. O que reduziria os prêmios e, assim, a rentabilidade dessas carteiras. Mas ele não ignora o poder das LFTs para alavancar a rentabilidade de algumas carteiras. “Definitivamente, as LFTs deixaram de servir como lastro para virar alternativa de investimento, especialmente para quem fez posição no começo do ano”.
Mônica Dresbach, da BankBoston Asset Management, avalia que as LFTs ainda podem garantir bons números para as carteiras. Ela afirma que depois que o mercado “descobriu” o risco dos fundos DI, as LFTs deixaram de servir como lastro de segurança. “Depende muito do cenário que você traçar para a frente”, exemplifica Mônica. Para clientes que optam por cenários mais pessimistas, a executiva aconselha reduzir a posição em LFTs longas como parte do colchão de segurança da carteira. Nesse tipo de projeção, os papéis pós-fixados longos servem como instrumento para buscar rentabilidade. Mas para aqueles que apostam em cenários otimistas, é possível jogar até 50% dos recursos da carteira em LFTs longas, liberando os outros 50% da carteira para operações mais agressivas.
Mas ela não aposta em uma queda firme dos prêmios das LFTs. Para ela, o mercado agora incorporou os riscos desses papéis – pós marcação à mercado – justamente com prêmios que não voltarão mais para a casa de 0,5%, por exemplo nos títulos de 2007.
O gestor de renda fixa da Sul América Investimentos, Guilherme Abbud, lembra que a marcação à mercado tornou permanente uma mudança de cultura que vinha se solidificando – a que expõem a flutuação dos papéis pós-fixados. Essa cicatriz foi mais forte para os aplicadores que buscam o longo prazo, já que as carteiras assumem posições exatamente nos títulos mais sujeitos à volatilidade, os de prazos mais esticados. “O mercado terá um leque de produtos mais segmentados”, afirma. Assim, o aplicador terá que se definir entre agressivo ou conservador quando deixar para o gestor a tarefa de jogar os recursos no futuro. Algo que não era tão explícito até o ano passado. E que ficou mais forte após a definição das metas de inflação para 2004 e 2005.
Uma vez que o CMN definiu as regras do jogo, cabe agora ao gestor assumir o cenário sem desculpas. E jogar com as ferramentas de que dispõem.
Aplicadores mais ousados poderão apostar em LFTs mais longas, correndo mais riscos. Outros mais cuidadosos terão que se contentar com os títulos mais curtos, de maior liquidez, mas menor retorno potencial.
Ouro das fundações – Os gestores voltam a concordar quando o assunto é NTN-C. As Notas do Tesouro Nacional Série C, indexadas ao ritmo da inflação por meio do Índice Geral de Preços de Mercado, o IGP-M, só recebem elogios. “É um papel excelente, ótimo”, resume a avaliação dos gestores o diretor do Bradesco, Carlos Otero. Qualquer cupom acima de 10% ao ano é um bom negócio”, diz ele, com uma ressalva. O custo de carregamento desses papéis nos próximos dois a três meses está elevado, com cupom negativo. Mais um motivo para que a NTN-C seja uma opção dos Fundos de Pensão.
A executiva do BankBoston, Mônica, lembra que mesmo após as fortes retiradas dos fundos abertos de investimento atrelados ao IGP-M, após os picos de novembro e dezembro do ano passado, o governo não recomprou as NTN-C, fazendo, ao contrário, novas colocações. Para ela, um claro sinal de que as fundações absorveram bem esses títulos e que continuarão demandando. “Com o passivo que os fundos de pensão têm, um papel que oferece o IGP-M mais 6% a 7% é um negócio muito interessante”.