Edição 243
Os administradores de fundos de investimentos que tinham alta concentração de ativos do banco BVA tiveram que calcular os possíveis prejuízos após a intervenção decretada pelo Banco Central. Alguns fundos como o Diferencial e o Elo tiveram que realizar provisões de perdas, que impactaram de imediato na desvalorização de suas cotas. Outros fundos como o VIX Institucional IMA-B e o LMX IMA-B Renda Fixa, que também apresentam concentração de Letras Financeiras do BVA, não tiveram o mesmo problema, devido à garantia oferecida na época da emissão do ativo. Em grande número, os regimes próprios de previdência que eram cotistas de tais fundos, enfrentam questionamento em relação às prestações de contas nos estados e municípios.
Um dos mais problemáticos é o Fundo Diferencial, cujo administrador, o BNY Mellon, lançou uma provisão de perda de 36,4% de seu patrimônio líquido, avaliado em R$ 630 milhões. O valor da provisão foi de R$ 240 milhões, equivalente ao valor dos papéis do BVA – maior parte eram CDBs e LFs da instituição sob intervenção. O fundo de investimento já enfrentava dificuldades desde o anúncio da liquidação de sua antiga gestora, a Corretora Diferencial, também decretada pelo Banco Central em agosto passado. O fundo conseguiu se manter com relativa solvência e substituiu a gestora antiga pela Drachma Investimentos.
Porém, o golpe mais duro veio pouco antes da intervenção no BVA, quando seus papéis começaram a perder liquidez no mercado a partir do início de setembro. Os CDBs e LFs presentes no fundo possuem cobertura de apenas R$ 70 mil pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC). O fundo conta com 42 cotistas e todos são regimes próprios de previdência de estados ou municípios. Um dos afetados foi o Igeprev dos servidores do estado de Tocantins, que tinha cerca de R$ 150 milhões (5% de seu patrimônio) aplicados no Fundo Diferencial. Contando com a provisão de perdas, o regime próprio de Tocantins já viu sua aplicação desvalorizar mais de R$ 50 milhões. Outro instituto estadual que realizou aplicação no produto é o dos servidores de Roraima (ver box).
Quando ocorreu a liquidação da Corretora Diferencial, os cotistas do fundo tiveram dificuldades para contratar uma nova gestora. Devido ao relacionamento mais próximo com a Drachma, que tem foco mais especializado em fundos imobiliários, a empresa concordou em assumir a gestão do fundo. Porém, os novos gestores já sabiam que enfrentariam problemas mais sérios devido à composição dos ativos do fundo. Agora a asset trabalha na gestão do que sobrou do patrimônio do fundo, pouco menos de R$ 400 milhões para tentar reverter parte das perdas.
Outro produto que vem enfrentando problemas com ativos do BVA é o Fundo de Renda Fixa Elo, cuja administradora, a BRL, teve que provisionar perdas da ordem de 16% do patrimônio do fundo, avaliado em R$ 394 milhões. O fundo tinha 28 cotistas e cerca de R$ 70 milhões aplicados em papéis do BVA. Um dos cotistas é o Instituto dos Servidores de Serra, município do estado do Espírito Santo, que aplicou R$ 40 milhões no fundo em setembro de 2012. Procurado pela reportagem, a direção do instituto não quis se pronunciar.
A gestão do fundo ELO é realizada pela Vitória Asset Management, empresa que era controlada até outubro do ano passado pelo próprio banco BVA. A administradora BRL também permaneceu um período curto de tempo, desde o final de 2011 até meados de 2012, sob controle acionário do BVA, que depois desfez o negócio. O Banco Central está investigando se houve irregularidades advindas da falta de segregação entre gestora e administradora no caso de fundos como o Elo, por se tratar de empresas que passaram pelo controle do BVA.
O banco BVA tinha forte penetração no segmento de regimes próprios de previdência. Costumava patrocinar eventos das duas principais associações de RPPS, a Abipem e a Aneprem. Desta última, o BVA foi um dos patrocinadores do congresso nacional da entidade, realizado em julho de 2012 na cidade de Campo Grande (MS). “Para quem adota uma análise criteriosa de investimentos e verifica os balanços das instituições, dava para perceber que o BVA não vinha bem desde o ano passado”, diz Herickson Rubim Rangel, diretor-tesoureiro da Aneprem e diretor financeiro do Instituto de Previdência de Vitória (ES).
O dirigente diz que chegou a analisar propostas de fundos de investimentos do BVA ou com ativos da instituição, mas que não direcionou aplicações de seu instituto para nenhum deles, até mesmo porque o Tribunal de Contas do Espírito Santo tem uma orientação que veda os investimentos em bancos com controle privado. Mas mesmo que não existisse tal determinação, Rangel explica que não teria realizado nenhuma aplicação em fundos do BVA. “Qualquer consultoria ou análise mais rigorosa perceberia os altos riscos dos produtos do banco”, diz.
A Aneprem não tem um levantamento de quantos regimes próprios têm aplicações em fundos e papéis do BVA, mas estimativas do mercado apontam para um número ao redor de 160 institutos.
Letras com garantia – Outros fundos de investimentos voltados para regimes próprios, como o LMX IMA-B Renda Fixa, apesar de contar com ativos do BVA, não devem enfrentar problemas de perdas nem no caso de liquidação da instituição. O fundo conta com 12 regimes próprios como cotistas e tinha patrimônio de R$ 46,82 milhões em outubro passado e R$ 9,6 milhões em papéis do BVA. A diferença dos fundos citados anteriormente é que neste caso os ativos são Letras Financeiras que possuem garantia de até 165% de seu valor.
A cobertura é garantida pelo Fundo BRL Renda Fixa Hungria. Em caso de liquidação do BVA, os ativos são trocados por cotas do fundo Hungria. “Decidimos aplicar nas Letras Financeiras do BVA porque tinha rating duplo A justamente pela excelente garantia oferecida pelo emissor. É uma aplicação segura que garante bom retorno para nosso fundo”, diz Marcus Vinícius Esteves Nunes, diretor executivo da LMX, referindo-se à nota atribuída pela Austin aos papéis. O fundo apresentava rentabilidade de 22% até outubro passado, apesar do congelamento do valor das LFs do BVA após o início da intervenção.
Com dez cotistas, o fundo VIX IMA-B também possui LFs do BVA. Do patrimônio líquido de R$ 25 milhões, cerca de 16% está concentrado nesta espécie de ativo do banco. “As garantias das LFs são sólidas uma vez que garantem 165% do valor do principal. Existe uma fundo de direitos creditórios que cobre esta garantia em caso de default dos papéis do BVA”, explica Alexandre Klabin, diretor da VIX Capital. O executivo se refere à cobertura oferecida pelo Fundo Hungria que, por sua vez, teve que realizar uma provisão de perdas por volta de 7% de seu patrimônio.
O diretor da VIX explica que a maior parte do fundo Hungria são operações de CCBs de empresas que têm fluxo de caixa com garantias reais. Como a cobertura é alta, de até 165%, seria necessário um desequilíbrio muito acentuado no fundo para afetar a garantia. “Também é importante ressaltar que o banco não foi liquidado, portanto não houve default nos papéis. Tem problemas de alavancagem e de caixa mas até onde sabemos não há fraudes”, diz Klabin. Os processos de intervenção do Banco Central costumam durar 60 dias, no caso do BVA vão até final de dezembro. Caso não seja vendido para outra instituição, o caminho natural deve ser a liquidação.