De olho na segunda linha | A forte valorização do Ibovespa desde ...

A alta acumulada do Ibovespa entre 2016 a 2018, que alcançou 102,74% (38,93% em 2016, 26,86% em 2017 e 15% em 2018), torna mais desafiador o trabalho dos gestores ativos de renda variável. Para entregar alpha aos clientes ele precisam não só encontrar papéis de qualidade, mas ainda torcer para que esses não estejam no radar da maior parte dos investidores.
O gestor da BNP Paribas Asset, Frederico Tralli, nota que após os acentuados ganhos recentes da bolsa, principalmente após o resultado das eleições, quando os papéis mais ‘óbvios’ já subiram de maneira relevante, papéis de empresas que ainda não estão em seu melhor momento operacional também começam a entrar no radar das gestoras. Até por conta disso, esses papéis ainda não estão com os preços tão esticados. No entanto, caso o cenário positivo projetado se confirme, são cases que devem no curto e médio prazo apresentar melhorias em seus balanços, prevê o especialista. “Companhias dos setores de educação, construção civil e distribuição de combustíveis são alguns exemplos”, fala Tralli sem nominá-las. “O mercado está com maior apetite ao risco, estendendo o horizonte de investimento em busca de novas alternativas, até de menor liquidez”, pondera o gestor.
O gestor da Far – Fator Administração de Recursos, Daniel Utsch, avalia que diante das perspectivas positivas para o cenário doméstico, e menos benignas do que foram no passado recente para o ambiente global, a tendência é que as ações mais ligadas à economia local e de menor capitalização tenham melhor desempenho em comparação com as large caps da Bovespa mais atreladas ao front global.
“Em 2018, empresas como Petrobras e Vale, que ainda tem representação importante nos benchmarks, tiveram uma boa performance pelo cenário externo positivo. Em 2019 podemos ter um cenário mais parecido com o que foi 2017, quando as small caps ligadas ao cenário doméstico foram muito bem, com alpha de aproximadamente 30% em relação ao Ibovespa”, analisa o gestor da Far.
Mesmo no ano passado, quando o cenário global favoreceu o desempenho das large caps brasileiras, a carteira de ações da Far conseguiu superar os benchmarks com papéis de menor calibre e mais ligados à economia local, como as varejistas Magazine Luiza e B2W, e as empresas relacionadas ao setor automotivo Randon e Tegma. “Conseguimos superar os benchmarks sem as ‘blue chips’ globais e as estatais que também foram muito bem pela melhoria de governança”, diz Utsch.

Antecipação – A projeção do cenário de retomada da economia, que tem levado os investidores a apostar em empresas que ainda não chegaram ao seu melhor momento, depende de novos avanços na reforma da previdência. Por isso, se e quando a reforma for aprovada, os papéis mais negociados da bolsa podem já não ter muito espaço para andar, reconhece Tralli. “Talvez a bolsa não chegue a cair, mas pode ser que fique estável porque o mercado já antecipou boa parte dessa expectativa”. Ele ressalta, por outro lado, que a aprovação da reforma tende a atrair um importante fluxo de capital, principalmente de investidores estrangeiros mas também de locais, o que pode dar um fôlego adicional à Bovespa.

Classe C – Entre as teses de investimentos que o superintendente executivo da Santander Asset, Roberto Reis, entende que podem representar um diferencial nas carteiras dos investidores para geração de alpha em 2018 está o reaquecimento do consumo pela classe C e as empresas que mais devem tirar proveito do fenômeno.
“Empresas mais focadas nas classes A e B foram muito bem nos últimos anos porque o desemprego nessa faixa já normalizou, mas na classe C o desemprego ainda é muito alto”, destaca Reis. Segundo ele, existem na bolsa algumas empresas de consumo, educação, bebidas e alimentos voltadas para essa faixa da população que, se de fato apresentar uma retomada do poder de compra, devem voltar a ter uma boa performance. “Importante ressaltar que é uma tese que ainda precisa ser confirmada, por enquanto o que temos são apenas expectativas”, fala Reis.
O executivo pondera, no entanto, que está otimista com a bolsa, tendo em vista o cenário base da casa, que prevê a aprovação da reforma da previdência. “A bolsa nos últimos três anos foi o melhor investimento do mercado brasileiro, e acreditamos que neste ano a história deve se repetir”. A Santander Asset trabalha com uma estimativa para o Ibovespa de 120 mil pontos no final do ano, apoiada em uma projeção do banco de crescimento de 3% do PIB.

Big data – Na Schroders, o head de renda variável para Brasil e América Latina, Pablo Riveroll, exalta a estruturação recente de um time com 20 cientistas da tecnologia responsáveis por um trabalho de análise de big data, que filtra as infindáveis informações disponíveis por meio das mais diversas fontes, e as levam ‘mastigadas’ ao time de gestão que toma as decisões de investimento. “A análise de big data é um diferencial de uma casa com o porte da Schroders, que tem recursos para fazer esse tipo de investimento em comparação com gestoras menores”, afirma Riveroll.
O executivo, que fica baseado em Londres, aponta o mercado acionário brasileiro como a melhor oportunidade de investimento entre os emergentes em seu radar atualmente. “As projeções de crescimento de lucro das empresas com ações listadas na Bovespa estão ao redor de 20%, com viés de alta, enquanto nos demais emergentes a expectativa é por uma queda de 10% nos lucros, e com viés de baixa”, ressalta o gestor.

Restrições – Na Fama Investimentos, alguns princípios estabelecidos desde a constituição da asset, há 25 anos, norteiam a composição da carteira e fazem com que ela tenha sempre uma forte descorrelação em comparação com os principais benchmarks da bolsa. Os fundos não podem investir em empresas reguladas ou estatais, e tampouco naquelas com valor de mercado acima de R$ 50 bilhões, ou ainda nas que dependam mais de fatores macro do que micro para ter bom desempenho. “Empresas de commodities, por exemplo, não entram nas nossas carteiras, já que não faço ideia de qual vai ser o preço do petróleo daqui há dois anos”, pontua o gestor Fabio Alperowitch. Segundo ele, empresas sem uma clara visão de ética e boa governança também são barradas.
Por conta dos fatores elencados, os principais nomes da bolsa, como Petrobras, Vale, Itaú e Bradesco não entram no portfólio da Fama, o que contribuiu para que o retorno da carteira da asset ficasse em 10% em 2018, abaixo dos 15% do Ibovespa. Em 2017, no entanto, quando o Ibovespa subiu 26,9% os fundos da Fama renderam 45%, e em 2016 subiram 55,2% para um Ibovespa de 38,9%. “Pela característica da nossa gestão, a opinião que temos sobre o desempenho da economia e sobre Brasil é pouco relevante para a distância entre Ibovespa e nosso portfólio”, conta o especialista.
Alperowitch diz ainda que a mudança de governo, com nomes mais pró-mercado na equipe econômica, não altera os parâmetros colocados pela Fama na seleção das ações. “Princípios são princípios, não se alteram com mudanças de governo”. Entre os nomes que compõem a carteira da Fama constam nomes como Sul América, Localiza, Multiplan, M Dias Branco e CVC. “Temos foco em empresas com modelos de negócios que miram os próximos 20 anos. A estatal tem um modelo de negócio hoje, mas daqui quatro anos pode ser completamente alterado”.

Na cola dos benchmarks – Na Western Asset, a estratégia de valor absoluto ficou um pouco abaixo do retorno dos índices em 2018, mas os fundos da gestora que se propõem a acompanhar os benchmarks conseguiram gerar alpha.
O head de renda variável da Western, Fábio Motta, explica que os fundos de valor foram prejudicados pela falta de alguns papéis nos índices que subiram muito. “No setor bancário, preferimos manter Itaú em carteira, só que o Bradesco, que também está nos benchmarks, subiu bastante”, pondera o especialista.
Motta diz que uma decisão bem sucedida entre as estratégias adotadas nos fundos voltados para superar os benchmarks foi dar um peso maior a algumas ações do índice nas quais enxergava maior potencial. “B2W e Rumo são dois casos de empresas em que ficamos com uma exposição duas vezes acima do benchmark”, afirma o gestor.
Além disso, o especialista da asset diz que outra forma de obtenção de alpha em relação aos benchmarks em 2018 foi incluir ações que não estavam no índice de referência, por terem feito seus IPOs recentemente, como Hapvida e IRB.

Reiventar – “O empresário brasileiro é um dos mais dinâmicos do mundo, ele consegue se reinventar, o que foi comprovado durante a recessão, quando os ajustes promovidos por algumas empresas fizeram com que elas conseguissem apresentar melhorias nos resultados mesmo em um cenário adverso”, pondera o CIO da AZ Quest, Alexandre Silvério. Entre as empresas que não tiveram resultados tão bons no ano passado recente, mas devem retomar a trajetória positiva nos próximos meses, ele cita Raia Drogasil, Natura, BRF e Ultrapar.