Edição 252
As mudanças que estão prestes a ocorrer na metodologia do Ibovespa, por conta das distorções ocasionadas por alguns de seus ativos aliadas ao seu fraco desempenho nos últimos meses, têm afastado investidores do principal índice acionário do mercado brasileiro. Ainda sem abandoná-lo por completo, no curto prazo ganham atração outros índices da Bolsa brasileira, e mesmo de outras praças financeiras. Neste momento os ETFs (Exchange Traded Funds) podem ser um instrumento adequado, principalmente para as estratégias passivas das fundações.
“Trabalhamos com os ETFs há cerca de três anos, e estamos fazendo uma reestruturação da nossa renda variável, que tinha maior exposição ao BOVA11”, afirma Marcos Litz, gerente financeiro da Fibra (Fundação Itaipu). “Achamos por bem fazer essa revisão por conta da nova metodologia do Ibovespa, e a questão das empresas X também pesou na decisão”.
O presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, falou recentemente que, até o final do mês de setembro, deve ser apresentado pela Bolsa um estudo com sugestões para a alteração na composição do índice, muito por conta das ações do grupo X, do empresário Eike Batista. As ações da OGX (OGXP3), por exemplo, caíam quase 90% em 2013, até o final de agosto, e como o atual critério para entrar no Ibovespa é o de maior negociabilidade, a representatividade do ativo torna-se desproporcional à sua real importância na economia – o papel da empresa de petróleo é hoje o quarto de maior peso dentro do Ibovespa, com participação de 4,3%. No ano, a queda do Ibovespa está em torno dos 17%.
“Continuamos com a estratégia de ETFs, mas em outros, como o PIB11 [atrelado ao IBrX-50], o BRAX11 [vinculado ao IBrX-100] e o SMALL11 [carteira composta por ações das companhias de menor valor de capitalização listadas]”, diz o gerente da Fibra. No BOVA11, a fundação optou por zerar sua posição, que correspondia a 10% do total desses ativos, que movimentaram R$ 14,1 bilhões de janeiro a julho. “O Ibovespa não espelha a economia real”, pondera Litz, que não descarta uma volta ao índice daqui algum tempo. “Entendemos que o índice deve ser revisto, por isso fizemos o reposicionamento, até que o Ibovespa tenha uma nova metodologia mais adequada”.
Da carteira de renda variável da Fibra, de R$ 420 milhões, aproximadamente 19% está nos ETFs. “O interessante do produto não é só a facilidade operacional, mas estar aderente a um benchmark sem necessariamente comprar os ativos”.
Embora o Ibovespa tenha perdido um pouco de seu prestígio, especialistas não enxergam um cenário no qual o que tem sido o maior balizador dos investidores domésticos nas últimas décadas vá cair em desuso. “É difícil a indústria não ter referência em índices. Em mercados maduros como o americano índices sempre foram referência, até mesmo para medir o investimento em stock picking”, pondera Erick Carvalho, diretor da Citi DTVM.
Os ETFs, na visão dos próprios agentes de mercado, têm apresentado uma evolução em termos de volume negociado um pouco aquém das expectativas, o que não quer dizer que o produto não vai crescer, seja em negociabilidade, seja em novos ETFs. No Brasil temos 15 fundos de índices, contra os 1,3 mil dos Estados Unidos. Mesmo entre outros emergentes a quantia já é bem maior – são 457 os ETFs no México.
“Os ETFs vão ganhar corpo ao longo dos anos. Todos falam de crise, de mau humor, mas no futuro a tendência é do mercado de capitais brasileiro se aproximar do mercado de capitais desenvolvidos. Quem fizer uma aposta diferente vai errar. Se isso vai acontecer em dois, dez ou vinte anos não interessa, o que interessa é que o caminho é esse. A aposta tem que ser nessa direção”, fala Márcio Veronese, diretor da área de serviços qualificados ao mercado de capitais do Citi.
O Citi foi o primeiro banco a operacionalizar os ETFs no país, que são os que estão hoje sob a gestão da BlackRock, mas que continuam administrados pela instituição americana. “O longo prazo sempre foi nossa abordagem. Acreditávamos no ETF como um instrumento importante para os investidores brasileiros, optamos por trabalhar com ele visando o longo prazo, e não acho que erramos. Olhando os últimos dez anos a partir de agora, não trocaria nossas apostas”, fala Veronese.
Novidades – Para fazer esse mercado crescer, a Bolsa prepara o lançamento de novos ETFs, que incluem um de renda fixa, um de commodities, e um outro, que deve estar pronto ainda neste ano, que será referenciado no índice acionário americano S&P 500.
“Um ETF do S&P 500 em dólares faz sentido para nossa fundação, mas se for em reais perde sentido na estratégia de diversificação de moedas”, afirma Gabriel Amado de Moura, diretor de investimentos da Fundação Itaú Unibanco. Como o produto não está pronto, ainda não se sabe se o ETF poderá ter aplicações em reais ou em dólares.
“Parece que a recuperação da economia americana está ocorrendo mais rápido do que o esperado, e conseguimos achar excelentes empresas com múltiplos atraentes na Bolsa americana”, pontua Moura. A fundação do banco privado deu início há pouco tempo às compras de ações em outros países, e o foco está voltado para a maior economia do globo. “Estamos olhando para os Estados Unidos mais do que para qualquer região do mundo neste momento”.
Para a Fundação Itaú, que não se desfez de seus ETFs vinculados ao Ibovespa, um outro ganho possível de se obter com o produto, lembra seu diretor de investimentos, é via o aluguel do ativo. “Consigo ter uma rentabilidade além do mercado com o aluguel”. A opção pelo fundo referenciado no tradicional Ibovespa, explica Moura, tem relação com o aluguel. “Gostamos do BOVA11 pela liquidez, que permite fazer o aluguel”. Da carteira de renda variável do fundo de pensão da instituição financeira, de R$ 1,5 bilhão, aproximadamente 30% está em ETFs.
Barreira – Um ponto que ainda dificulta a maior disseminação dos ETFs entre os investidores institucionais, na visão de Fábio Galdino de Carvalho, operador sênior do BI&P Indusval & Partners Corretora, é a própria facilidade operacional do produto, que acarreta em menores taxas de administração cobradas pelos gestores.
“O mercado vem crescendo nos últimos anos, mas a gente percebe que o volume negociado não acompanha o que esperávamos. De certa forma há uma concorrência com a indústria de fundos locais. Na média, os fundos cobram taxas de administração de 3% a 4%, o que gera uma receita interessante para o administrador de recursos locais, enquanto nos ETFs a taxa de cobrança gira ao redor de 0,5%”, diz Carvalho, que faz uso dos ETFs em aproximadamente 50% das operações que desenvolve no Indusval.
“Os administradores acabam canibalizando o próprio produto. O mercado tem que se abrir para novas alternativas. Vai demandar algum tempo até o mercado ganhar maturidade e entender que o crescimento passa pela redução das tarifas”, nota o operador do banco.
Além da questão das taxas, outro fator que ainda afasta os investidores dos ETFs é a própria cultura que prevalece no Brasil. Mesmo porque o fundo de índice ainda é recente localmente, está no Brasil há pouco mais de quatro anos.
“Ao comprar uma carteira referenciada em algum índice, em detrimento a um fundo de ações que está mais exposto às variações microeconômicas, o investidor compra mais estabilidade em termos de investimento. Ainda não é muito da cultura do investidor por aqui apostas um pouco mais qualificadas. O costume do investidor é comprar ações individuais, não se pensa em comprar o ETF, que é extremamente simples e qualificado para desenvolver diversos tipos de estratégias”, afirma Carvalho.