O ETF de renda fixa do mercado brasileiro finalmente caminha para seu lançamento, após o Tesouro Nacional ter aberto em maio o edital para receber propostas de gestoras interessadas em estruturar o produto. As discussões sobre esse instrumento começaram em 2013 e, desde então, o governo tem trabalhado na regulamentação operacional e tributária para fazer a abertura do processo concorrencial.
A seleção para escolha do gestor faz parte de um programa do Banco Mundial (BM) para apoiar o desenvolvimento do mercado de capitais em economias emergentes. “O Tesouro e o Banco Mundial entram no projeto como fomentadores desse mercado”, afirma a gerente de estratégia da dívida pública e mercado financeiro do Tesouro Nacional, Márcia Paim. Ela explica que, no entendimento do BM, para que o ETF de renda fixa possa se desenvolver em mercados emergentes, que nem sempre dispõem de liquidez e concorrência suficientemente elevadas, ele precisaria do apoio do próprio emissor dos ativos que servirão como lastro para o fundo, o que no caso será o Tesouro Nacional. O ETF RF terá como benchmark o IMA-B.
O Tesouro vai levar em conta, no momento da escolha da gestora, sua capacidade técnica e a taxa de administração a ser cobrada pelo fundo. Márcia ressalta que a licitação aberta com o edital vai dar um peso de 70% para a experiência que as casas demonstrarem para operar o produto no mercado brasileiro. Ela ressalta, no entanto, que esse enfoque no histórico das assets não vai necessariamente concentrar a disputa apenas entre as quatro que já oferecem em suas grades os ETFs de renda variável.
“Além da experiência com o ETF, vamos considerar outros fatores como a capacidade de distribuição da gestora e também aspectos de educação financeira”, afirma a especialista. Segundo ela, a experiência de gestores com fundos indexados também será considerada.
Concorrente – “A Caixa, por ser um dos principais players do mercado brasileiro de renda fixa, tanto em volume como em expertise no segmento, está avaliando e trabalhando em cima do edital para eventualmente apresentar uma proposta e oferecer o produto aos investidores”, afirma o superintendente nacional de gestão de ativos de terceiros da Caixa, Sérgio Bini.
O superintendente entende que a experiência obtida pela Caixa com seu ETF de renda variável atrelado ao Ibovespa, lançado em novembro de 2012, pode ajudar o banco na estruturação do veículo de renda fixa. “A experiência que já temos com ETF pode nos ajudar nas questões operacionais, em como fazer a gestão do instrumento, assim como nas questões de relacionamento uma vez que conversamos sobre produto semelhante com cotistas e com nossa força de vendas”, diz Bini.
Segundo ele, a taxa de administração cobrada pelo ETF de renda variável da Caixa, de 0,50% ao ano, pode servir como uma baliza para a definição da que será cobrada pelo ETF de renda fixa. O ETF de renda variável do banco soma aproximadamente R$ 43 milhões de patrimônio líquido, volume que deverá ser muito maior no caso do ETF de renda fixa uma vez que essa classe de ativos está muito mais disseminada na carteira de investimentos dos aplicadores brasileiros.
Embora admita que a Selic, na sua mínima histórica, possa reduzir um pouco o apetite dos investidores pelo novo veículo, Bini pondera que o produto poderá servir para que os aplicadores assumam mais risco mesmo dentro da renda fixa. “Muitos investidores ainda têm boa parte das carteiras com ativos indexados ao CDI, e com o ETF poderão migrar para ativos de maior retorno e risco dentro da própria renda fixa”.
Na avaliação do superintendente da Caixa, os institucionais estão entre os potenciais investidores que mais devem demonstrar apetite pelo ETF de renda fixa. “Os institucionais já são os principais investidores dos ETFs de renda variável, com cerca de 61% do total desse mercado, ou seja, eles gostam de utilizar esse tipo de instrumento”.
Experiência – Já o diretor executivo da BB DTVM, Carlos André, afirma que a gestora está no momento avaliando os requisitos estabelecidos pelo edital, ainda sem uma posição definida quanto à sua participação no processo concorrencial.
Carlos André lembra que, ao lançar o ETF de ações, em novembro de 2014, um dos objetivos da BB DTVM era testar esse mercado para verificar as condições e necessidades operacionais para trabalhar de maneira eficiente produtos do tipo. “A experiência obtida com o ETF de renda variável vai nos ajudar bastante durante a avaliação do edital e eventual interesse em participar do processo para estruturar o ETF de renda fixa”.
Entre as possíveis vantagens que o novo veículo poderá trazer ao mercado de renda fixa, o diretor da BB DTVM aponta uma maior transparência na formação dos preços dos ativos que compõem o índice IMA-B, além da possibilidade de alugar ou tomar emprestado cotas do fundo (o que tende a facilitar algumas operações no mercado).
Carlos André lembra que, pelo edital, o ETF de renda fixa deve ter um volume mínimo de R$ 300 milhões, podendo chegar à casa dos R$ 2 bilhões a depender da demanda dos investidores. O PL do ETF de ações da gestora do BB, atualmente, não passa dos R$ 22 milhões.
O diretor lembra que um dos requisitos impostos pelo edital do Tesouro é promover a divulgação do fundo de índice, assim como promover eventos educacionais, familiarizando o público investidor sobre esse veículo que possui ativos de renda fixa mas é negociado num ambiente de bolsa. “O número de investidores cadastrados em bolsa é relativamente limitado, e um dos objetivos indiretos com o novo produto, principalmente por parte da B3, é que o instrumento seja um potencial catalisador para que novos participantes passem a operar nesse segmento do mercado”, lembra André.
Assim como o ETF de renda variável da Caixa, o da BB DTVM também cobra uma taxa de administração de 0,50% ao ano. No entanto André não acredita que essa taxa possa servir como referência para o novo veículo. “Como o ETF de renda fixa será oriundo de um processo concorrencial, é mais complicado fazer uma comparação direta com um produto que já está na prateleira e não passou pelo mesmo procedimento”. O especialista ressalta que o edital prevê alguns parâmetros pré-estabelecidos referentes aos custos do veículo, como uma taxa de administração mínima de 0,15% e comissão de 0,01% ao Banco Mundial e de 0,02% à Anbima à título de royalties pela utilização do IMA-B. “Essas taxas vão influenciar na decisão do participante do edital de quanto cobrar no ETF de renda fixa”.
O diretor executivo da BB DTVM lembra ainda que o prazo do edital para a entrega de propostas vai até o início de agosto, com outros 18 meses após o encerramento do processo concorrencial para que seja realizada a estruturação efetiva do produto. “O ETF de renda fixa terá um prazo de gestação bastante razoável daqui para frente”.
Entre as demais gestoras que já trabalham com ETFs no mercado brasileiro, a Blackrock disse que preferia não se manifestar enquanto o Itaú informou que pelo fato do edital ter sido publicado há pouco tempo ainda está em fase de análise do documento.