Criptomoedas sob análise | Embora tenham apresentado retornos ele...

Edição 299

 

Os investidores institucionais têm acompanhado com atenção os retornos extremamente elevados que têm sido registrados pelas criptomoedas nos últimos meses – a bitcoin, a mais famosa delas, acumula valorização superior a 1200% apenas em 2017 – mas até o momento ainda não entraram no novo nicho informa reportagem da revista americana Pension&Investment. A principal razão é que esse investimento, que começa a despontar de maneira exponencial no mercado, ainda não dispõe de instrumentos adequados para análise e avaliação, pelo menos por enquanto.
Ainda que os ganhos apurados pelas criptomoedas recentemente sejam realmente difíceis de serem ignorados, a natureza especulativa do investimento, assim como a falta de regulação, de infraestrutura centralizada e de informações sólidas que envolvem o negócio devem impedir que os grandes investidores embarquem nessa alternativa no curto prazo.
Muitos consultores de investimentos que atendem o público institucional têm demonstrado desconfiança sobre a possibilidade da adoção das criptomoedas como um investimento alternativo para as carteiras de seus clientes. “Posso estar sendo conservador, mas reluto em aceitar a legitimidade das criptomoedas e questiono qual o nível de responsabilidade dos agentes que atuam nesse mercado”, afirma James McKee, vice-presidente sênior da consultoria norte-americana Callan.
Segundo McKee, “a grande questão é quem está direcionando os investimentos para bitcoin? Quem são os cotistas dos fundos de criptomoedas? Parece que essa indústria está sendo conduzida por especuladores para fazer evasão de divisas e lavagem de dinheiro”. Ele ressalta, no entanto, que até o momento a Callan ainda não tratou de maneira aprofundada sobre investimentos em criptomoedas com seus clientes.
A falta de governança desse novo nicho de mercado é outro fator em potencial a limitar as possíveis estratégias que se mostrem abertas a incluir as criptomoedas em seus portfólios, avalia Andrea McGee, diretora da consultoria Rocaton Investment Advisors. “As criptomoedas parecem muito especulativas para os institucionais neste momento”, diz a consultora.
“Não chega a ser surpreendente o fato de os investidores institucionais estarem se mantendo atualmente afastados do investimento em criptomoedas, já que os seus mandatos são voltados para a busca de ativos que apresentam crescimento estável e preservação de capital, sendo que, até o momento, esse tem sido um negócio altamente volátil”, diz Steven Nadel, sócio do hedge fund Seward & Kissel.
“As criptomoedas ainda não são uma classe de ativo para os institucionais. Talvez até haja algum investimento desse público nas moedas virtuais através de alguns fundos de ações ou algo do tipo, mas ainda não fiquei sabendo e acho improvável”, afirma um gestor de um grande fundo de pensão americano que preferiu ter sua identidade preservada.
Fontes de mercado que acompanham a evolução das criptomoedas reconhecem que a infraestrutura e os processos de due diligence existentes até agora ainda estão aquém dos padrões exigidos pelos institucionais para que eles entrem no negócio.

Custódia – “Nosso time de operações tem acompanhado as criptomoedas como uma eventual modalidade de investimento em resposta às demandas que temos recebido de nossos clientes, e nos demos conta de que ainda não é possível fazer a custódia desse tipo de ativo. Mesmo que descobríssemos uma maneira de fazer isso, ainda assim não seria possível cumprir com os padrões existentes hoje no mercado de custódia”, fala Stephen Nesbitt, CEO da consultoria de investimentos alternativos Cliffwater. “Obter uma simples demonstração financeira auditada de ativos de bitcoin não é um trabalho fácil”, pondera Nesbitt, acrescentando que as criptomoedas “não são um investimento tangível para os institucionais por enquanto”.
Nadel, do hedge fund Seward & Kissel, ressalta que à medida que os gestores de criptomoedas iniciarem a utilização de instrumentos financeiros de proteção, como os contratos de futuros, para reduzir a volatilidade de suas carteiras, permitindo com isso maior previsibilidade sobre seus valuations, e com a custódia estabelecida, “acredito que os institucionais vão começar a se sentir mais confortáveis para olhar com mais atenção para esse negócio”. A relutância de investir em hedge funds que alocam em criptomoedas não significa que os institucionais não estejam questionando os gestores ou mesmo estudando as oportunidades para entrar no segmento, pontua o especialista.
Um recente workshop para clientes e pessoas interessadas em investimentos em criptomoedas promovido pela consultoria especializada em hedge funds Aksia teve grande procura, segundo o analista sênior da casa, Kenneth Chen.
“Definitivamente há muito interesse, mas sou cético sobre fundos que detém criptomoedas como uma opção de investimento para os investidores institucionais no curto prazo”, diz Chen. Ele nota que ainda falta maior confiança por parte dos agentes sobre o universo que congrega as moedas virtuais. “Para que as criptomoedas sejam institucionalizadas, é preciso confiança nas pessoas que atuam nesse mercado e também nos processos da indústria. Atualmente qualquer um poderia carregar consigo um USB e levar embora todo dinheiro dos clientes investidos em criptomoedas”.

Fundos – Em novembro de 2017 foram lançados no mercado dois fundos de investimento que apostam nas criptomoedas e que são adaptados para a entrada de institucionais, os hedge funds 3iQ Global Cryptoasset Fund e o fundo de fundos The Bit Bull Fund. Os veículos tem atualmente cerca de US$ 20 milhões em ativos sob gestão, oriundos principalmente de family offices e investidores do segmento private.
Os CEOs da Bit Bull Capital Management e da 3iQ Corp estão confiantes de que o investimento de institucionais em seus fundos de criptomoedas deve ocorrer nos próximos meses. “Minha previsão é que o primeiro investidor institucional fará um aporte em hedge funds de criptomoedas durante o primeiro trimestre de 2018”, prevê Joseph DiPasquale, CEO da Bit Bull Capital. “O primeiro institucional a entrar no mercado de bitcoin e outras moedas virtuais será o que obterá o maior ganho com esses ativos, como é comum de ocorrer no mercado financeiro quando surgem novas estratégias”, diz o executivo.
Segundo DiPasquale, o fundo da Bit Bull é o primeiro da indústria que investe em criptomoedas na modalidade fundo de fundos. O fundo da asset avaliou 135 hedge funds que investem em moedas virtuais e selecionou sete deles que seguem diversas estratégias, como arbitragem, análises quantitativas e ofertas iniciais de moedas.
O CEO da Bit Bull comenta que os investidores não estão sendo atraídos apenas pelos retornos elevados entregues pelas criptomoedas – os fundos da casa registram valorização superior aos 2000% – mas também pela descorrelação com os outros ativos em suas carteiras, que gera uma redução do risco do portfólio devido à maior diversificação.
Já o CEO da 3iQ, Frederick Pye, explica que o fundo de criptomoedas da gestora segue a estratégia long only, e busca a diversificação através da exposição a diferentes tipos de criptomoedas. O fundo investe 50% de seus ativos em bitcoin, 35% na moeda virtual ethereum, e 15% na moeda virtual litecoin.

Blockchain – Apesar da expectativa otimista dos gestores, Aaron Costello, da consultoria Cambridge Associates, tem recomendado aos seus clientes que evitem investimentos em criptomoedas. “Muito do interesse em criptomoedas é pura especulação, com os novos participantes desse mercado atraídos pela valorização expressiva dos preços”, escreveu Costello, em relatório aos clientes.
Para o consultor, ao invés de investir em criptomoedas os investidores deveriam voltar seus olhares para empresas que vão se beneficiar com o desenvolvimento e o aumento da adoção da tecnologia blockchain, que, por sua vez, vai facilitar as transações das moedas digitais. “A aplicação em potencial do blockchain em uma ampla gama de indústrias sugere que ela pode gerar redução de custos importante para empresas que sejam bem sucedidas em adotar a tecnologia. Como diz o velho ditado, em uma corrida pelo ouro, o dinheiro é feito vendendo picaretas e pás”, diz Costello no relatório.