Edição 242
Aproximidade do anúncio de encerramento de operações de asset de instituições globais no Brasil como o Goldman Sachs e o Banif trouxeram à tona novamente a questão das dificuldades de sobreviver no mercado de gestão de recursos doméstico. Mais especificamente: está cada vez mais difícil ganhar escala junto aos institucionais e demais investidores qualificados, o que faz com que algumas empresas globais que montaram suas operações do zero nos últimos anos sejam levadas a redirecionar o foco de atuação no país.
O mês de outubro foi especialmente agitado neste sentido. A americana Goldman Sachs anunciou a descontinuidade da operação local de sua asset, que existia desde 2008. Segundo especulações do mercado a equipe está sendo dispensada, devendo ficar apenas o diretor da área comercial, Adriano Koelle, que irá para Nova Iorque, e a diretora de gestão, Gabriella Antici, que coodenará a gestão dos fundos globais de Brasil. A emprea está encerrando o trabalho de gestão de doze fundos de investimentos em moeda local, que acumulavam patrimônio líquido de aproximadamente R$ 350 milhões, segundo dados do ranking Top Asset referente ao primeiro semestre de 2012. Já o português Banif anunciou a venda da gestão de seus fundos abertos que totalizavam patrimônio de R$ 130 milhões para a Mapfre Investimentos.
As duas notícias fizeram aumentar as especulações sobre as próximas vítimas. Entre as assets globais que montaram operações depois da crise de 2008 no Brasil encontra-se a sul-coreana Mirae, que efetivamente passou por um processo de redução da equipe comercial. A Mirae Asset cortou dois de seus seis profissionais da área, inclusive o diretor Jorge Sierra. “Fizemos apenas uma readequação da área comercial que estava muito grande para um gestor independente como é o nosso caso. Agora estamos com uma estrutura mais enxuta, mas continuamos focados nos institucionais”, diz Marcos Colombo, gerente de clientes institucionais da Mirae.
Compromisso – O executivo não confirma nenhuma intenção de descontinuidade da operação da asset que está no Brasil desde 2008. “A Mirae continua totalmente comprometida com a operação brasileira. Prova disso é que mantém vários investimentos proprietários em imóveis comerciais no país”, diz Colombo. Ele comenta que os fundos da Mirae voltados para institucionais e demais investidores não estão passando por mudanças. E a busca pelo aumento da carteira de clientes continua da mesma forma de antes, com a diferença é que a equipe, agora menor, está tendo que se desdobrar para atender as mesmas demandas de antes.
O gerente da Mirae admite porém que não está nada fácil ganhar escala na gestão de recursos dos institucionas. “Existe uma grande dificuldade para os gestores que começam a operar do zero no Brasil que tem a ver com a quantidade de exigências impostas pelos fundos de pensão, tais como patrimônio líquido mínimo e histórico de rentabilidade de fundos. São barreiras que temos que superar, mas faz parte do jogo”, diz Colombo. Ele mantém o otimismo e reforça a visão de longo prazo que norteia a atuação da Mirae no Brasil. “Aos poucos vamos superando as barreiras e logo teremos escala para crescer mais rapidamente”, diz.
O vice-presidente da Mapfre Investimentos, Elíseo Viciana, coincide nas análise das dificuldades impostas pelos clientes institucionais, principalmente pelos fundos de pensão. “O segmento de institucionais e fundos de pensão foi o último que deixamos para entrar. É o mais exigente e onde há maior competitividade entre os gestores especializados”, diz. A Mapfre é um caso de asset que adotou uma estratégia diferente para tentar crescer com a operação de asset no Brasil. Ao invés de começar pelos fundos de pensão, que é uma opção bastante comum, deixou o segmento para o final.
“Procuramos crescer primeiro em outros segmentos como previdência aberta, private e corporate. Foi de dois anos para cá que reforçamos a atuação junto aos fundos de pensão”, diz Viciana. A operação da asset da Mapfre foi montada no Brasil em 2002, mas foi a partir de 2006 que passou a oferecer fundos abertos. E a partir de 2010 que entrou na disputa pelos recursos dos clientes institucionais, com a estruturação de fundos de renda variável, multimercado e mais recentemente, um produto com índice IMA-B.
Com o foco em um crescimento orgânico e consistente, a asset não deixava de olhar oportunidades de aquisição com o objetivo de ganhar escala. Foi então que decidiu adquirir os fundos abertos do Banif, com quem já mantinha uma parceria. Dos três fundos adquiridos, um fundo DI, um de renda variável FGTS Petrobras e outro multimercado de crédito privado, este último será adaptado para o segmento institucional. “O fundo multimercado de crédito privado era um produto que nos faltava na grade de produtos para fundos de pensão”, diz o vice-presidente.
Com a aquisição dos fundos do Banif, o volume de recursos sob gestão de fundos de pensão cresce cerca de R$ 40 milhões, saltando para algo próximo de R$ 790 milhões. “Acredito que uma boa escala para crescer mais rapidamente com clientes fundos de pensão é acima de R$ 1 bilhão”, diz Viciana. A Mapfre realiza atualmente a gestão de R$ 11 bilhões em recursos, com a captação de R$ 4 bilhões em 2012, dos quais cerca de 10% vieram de fundos de pensão e regimes próprios.
Derrocada do Banif – Os negócios da asset do Banif começaram a azedar no início de 2010 quando perdeu a gestão de dois fundos de private equity, que juntos somavam patrimônio de R$ 1 bilhão. Os FIPs Brasil Governança Corporativa, que havia captado R$ 600 milhões, e o Caixa Ambiental, de R$ 400 milhões contava com recursos de grandes fundos de pensão – Previ, Petros, Valia e Funcef. Quando o Banif decidiu trocar o gestor dos fundos, o executivo Marcos Rechtman, as fundações ficaram insatisfeitas e não concordaram com os novos nomes sugeridos pela asset.
Foi então que os cotistas se organizaram para decidir pela substituição da asset na gestão dos fundos. Então, o Banif foi destituído e praticamente teve sua área de private equity encerrada no Brasil. Pouco menos de um ano depois, a instituição de desfez também do negócio da corretora, vendendo a unidade para a também portuguesa Caixa Geral de Depósitos (CGD). As dificuldades da casa continuavam se acumulando, agravadas pela crise da matriz portuguesa, e não passou muito tempo para o Banif colocar a venda também a operação de asset no país, que acabou agora nas mãos da Mapfre.
Acima do bilhão – A cifra acima da casa de um bilhão de reais de recursos de investidores locais parece ser um número mágico que garante a sobrevivência e o impulso para as operações de uma asset no país. Quem está abaixo deste montante, ainda depende de investimentos das matrizes lá de fora. Como o cenário internacional continua em crise, o alto custo para a manutenção de equipes cada vez mais caras e as operações mais custosas em virtude das exigências regulatórias pode levar a decisões de encerrar o negócio de asset no Brasil.
“As exigências dos órgãos regulatórios e as baixas taxas de administração pagas pelos fundos de pensão tornam as operações pouco rentáveis”, diz um consultor que pediu para não se identificar. Por outro lado, as operações bancárias podem ser muito mais lucrativas para uma asset global que tenha uma plataforma de serviços reconhecida mundialmente.É o que pode explicar, pelo menos em parte, a reestruturação das operações do Goldman Sachs no Brasil.
O Goldman fechou a atividade de gestão de fundos domésticos, mas em compensação, anunciou o aumento do capital, de R$ 200 milhões para R$ 400 milhões, para reforçar a atividade banco de investimento. “Estamos muito satisfeitos com a operação do banco no Brasil, tanto é que vamos dobrar o capital com o objetivo de preparar um crescimento da divisão de security e produtos estruturados”, diz Paulo Leme, diretor do conselho de administração do Goldman Sachs no Brasil.
No setor de banco de investimento, a questão da escala parece não ter um peso tão grande quanto na operação de asset management. O problema da falta de escala explica a dificuldade para participar dos processos de seleção para disputar as carteiras dos maiores fundos de pensão do país, ao mesmo tempo, que não geram receitas para mater equipes competitivas de ponta.
O diretor do conselho do Goldman explica que a escala dos fundos globais no Brasil, que não serão descontinuados, é muito maior que os fundos domésticos. “Apenas um dos fundos globais de renda fixa representava cerca de 20 vezes o patrimônio de todos os fundos locais no Brasil”, diz Leme. O executivo explica que a falta de escala pesou na hora de sair da gestão dos fundos locais. Os recursos de investidores estrangeiros em fundos do Goldman no Brasil somam R$ 6,5 bilhões, segundo dados do ranking Top Asset (até junho de 2012).
Fundos do Goldman Sachs devem trocar de gestor
A asset do Goldman vinha realizando a gestão de doze fundos de investimentos, dos quais, três eram exclusivos para fundos de pensão.
No caso dos fundos exclusivos, fica a critério do cliente o encerramento ou a mudança de gestor. Dos nove restantes, quatro contavam apenas com capital próprio e serão fechados. Os cinco fundos abertos restantes, que tinham recursos de terceiros, devem passar por processo de troca de gestores, em um processo que ainda não foi definido.
Já os fundos globais, também chamados de global to local, que contam com recursos de investidores estrangeiros, continuam sob gestão do Goldman. A diretora da asset, Gabriela Antici, e mais três analistas, irão continuar atuando na gestão de tais fundos, que permitem o acesso de investidores estrangeiros a produtos do mercado doméstico brasileiro.
O responsável pelos clientes institucionais locais, Peterson Paz, está deixando a asset no final do mês, enquanto o head comercial, Adriano Koelle, ainda está com o destino incerto. É possível que seja remanejado para o escritório de Nova York em uma função relacionada à captação de recursos para investimentos no exterior, o que não foi confirmado ainda pelo Goldman no Brasil.