Mercado em transformação | Gestores preveem fortalecimento dos FI...

Os desafios e perspectivas criados pela Resolução 4.661 do Conselho Monetário Nacional (CMN), que estabeleceu, em maio último, o fim dos investimentos diretos dos fundos de pensão em imóveis até 2030, seguem em plena discussão no sistema formado pelas entidades fechadas de previdência complementar (EFPCs). Não por acaso, mais de 50 dirigentes de EFPCs participaram, na manhã de 27 de setembro, do 3º Encontro de Investimentos Imobiliários promovido pela revista Investidor Institucional.
A divergência deu o tom logo no primeiro painel do evento. Em sua apresentação, o advogado Matheus Corredato Rossi, sócio da Bocater Camargo, Costa e Silva, Rodrigues Advogados, embora destacando os esforços do CMN e da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) no sentido de aperfeiçoar os procedimentos de análise de investimentos pelos agentes do segmento, considerou que o Conselho pode ter exagerado na dose ao impor a constituição de fundos de investimento imobiliário (FIIs) para abrigar os ativos das fundações de previdência que desejarem manter suas aplicações no mercado imobiliário, ainda que de forma indireta.
“A Lei Complementar 109, marco regulatório da previdência fechada, veda o estabelecimento de aplicações compulsórias para os fundos de pensão no segundo parágrafo do nono artigo. A tese imposta pela Resolução 4.661 tolhe a liberdade dos gestores dos fundos de pensão de escolher as opções mais adequadas às suas metas e políticas de investimento”, observou Rossi.
Diretor jurídico do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o advogado não revelou se já há alguma EFPCs disposta a contestar a imposição nos tribunais. Mas comentou que há um forte precedente na área. O episódio ocorreu em 1991, quando o Executivo federal, por meio do Banco Central (BC), determinou a compra obrigatória de certificados de privatização pelas entidades do setor. “A exigência deu origem a uma ação de inconstitucionalidade que, graças à concessão de uma liminar, frustrou por completo a pretensão governamental”, contou ele. “A liminar acabou não sendo julgada e perdeu o seu objeto com a entrada em vigor, dez anos depois, das Leis Complementares 108 e 109.”

Cotas em lugar de imóveis – Questões legais e jurídicas à parte, os potenciais benefícios e vantagens da troca, pelos fundos de pensão, de investimentos diretos em imóveis por cotas de FIIs foram destacados pelos outros dois palestrantes do primeiro painel do evento. Alexandre Rodrigues, gestor de fundos imobiliários da Rio Bravo Investimentos – asset que contabiliza 83,3% de sua carteira, de R$ 12 bilhões, em ativos imobiliários –, salientou a maior segurança e agilidade proporcionadas pelos FIIs. “Além de serem bem mais simples, os fundos imobiliários proporcionam liquidez infinitamente maior do que as tradicionais aplicações em tijolo e cimento”, comentou Rodriguez. “Isso permite rápidas migrações dentro do próprio segmento, tirando proveito das oscilações do mercado. Seria o caso, por exemplo, de trocar posições em fundos lastreados em shopping centers por cotas de carteiras baseadas em lajes corporativas, ou vice-versa.”
As perspectivas para essa parcela da chamada “indústria de fundos”, na avaliação do executivo, são positivas. Apesar da forte recessão que se abateu sobre o país entre 2015 e 2017, o volume de recursos dos FIIs cresceu 150% nos últimos cinco anos, atingindo hoje a marca de R$ 30 bilhões, e o contingente de investidores, em igual período, saltou de 100 mil para 160 mil.
Também especializada no mercado imobiliário, a RBR Asset Management identifica outros nichos promissores de mercado para investimentos. Criada em 2013, a gestora conta com três FIIs, dois deles listados em bolsa e lançados a partir de setembro de 2017, e dois fundos de participações (FIPs) diretamente ligados à indústria da construção: o RDP RBR, de 2013, e o RBR Desenvolvimento, criado em 2016, ambos baseados em habitações de baixo e médio padrões, inclusive projetos do programa Minha Casa Minha Vida. “Moradias populares, ao lado de lajes corporativas e centros de distribuição logística, são os segmentos com maior potencial no momento”, assinalou Guilherme Bueno Netto, sócio da RBR. “No outro extremo, projetos residenciais para a classe média e hotéis não oferecem, hoje, boas perspectivas de retorno.”

Descasamento – Já o sócio da Hedge Investments, Alexandre Machado, traçou um panorama sobre o mercado de fundos imobiliários nos últimos anos e seu estágio atual. Machado destacou que é comum no mercado imobiliário um descasamento entre oferta e demanda, uma vez que ao perceber a procura por imóveis aquecida, os incorporadores iniciam as obras que, no entanto, estarão prontas somente em um prazo de dois a cinco anos, quando o momento econômico já pode estar bastante diferente. “Mesmo que não tivesse ocorrido a recessão dos últimos anos, ainda assim provavelmente teríamos um descasamento entre oferta e demanda como temos notado”, afirmou o especialista.
Na avaliação do sócio da Hedge, o mercado de ativos corporativos triple A em São Paulo é dentro do segmento imobiliário o que começa a apresentar sinais mais claros de recuperação, com redução da vacância e até mesmo aumento real, acima da inflação, nos preços dos aluguéis.

Participação tímida – Por sua vez, a associada da RB Capital responsável pela área de produtos da asset, Mayra Padua, destacou em sua apresentação sobre a participação ainda bastante tímida dos institucionais no mercado de fundos imobiliários, que segue amplamente dominado pelas pessoas físicas atraídas pela isenção tributária, e o potencial de crescimento que esse público pode representar a esse nicho de mercado nos próximos anos em decorrência da obrigatoriedade trazida pela Resolução 4.661 de que as fundações vendam seus imóveis ou os transfiram para fundos nos próximos doze anos.
“Do total de 159 fundos imobiliários em bolsa, apenas 57 contam com investidores fundos de pensão. São 36 fundações que investem através de fundos imobiliários, que respondem por apenas 0,2% do volume desse mercado. Ainda são números muito pequenos, o que ressalta o potencial de crescimento com a possível entrada mais forte dos institucionais no nicho”, pontuou a especialista.
Segundo cálculos da própria RB, citados por Mayra, com base em uma análise dos balanços patrimoniais dos grandes fundos de pensão, caso eles transfiram os imóveis atualmente em suas carteiras para fundos, o mercado de fundos imobiliários pode registrar um crescimento da ordem de 38%.
A executiva da RB Capital disse também que enxerga como vantagem para os eventuais institucionais interessados em ingressar nesse segmento a governança já existente nele. Como esse é um mercado hoje predominantemente formado por investidores pessoa física, que em alguns casos não estão tão acostumados com algumas particularidades do mercado, os órgãos reguladores tiveram um cuidado maior em estabelecer regras claras e impôr aos players a necessidade de transparência e periodicidade dos informes sobre as operações nos fundos imobiliários, explicou a especialista da RB Capital.
Por fim, o sócio responsável pela área de avaliações de imóveis da Prime Yield, José Antonio dos Santos, comentou sobre a importância de se fazer uma avaliação detalhada a respeito do cenário macroeconômico e suas tendências no longo prazo, para ter condições de assim fazer uma leitura acurada também a respeito das potenciais oportunidades, ou riscos, no mercado imobiliário.