Edição 225
Ao que tudo indica, os fundos de pensão brasileiros estão prestes a dar os primeiros passos rumo aos investimentos no exterior. A possibilidade de fazer aplicações fora do Brasil ganhou força no final de 2009, quando o segmento passou a ser contemplado na legislação (CMN 3.792) com um limite máximo de 10% dos recursos das fundações. Mesmo assim, muitas dúvidas ainda pairavam no ar e, apesar de concordar que o caminho para além das fronteiras do País era inevitável, os fundos de pensão consideravam que não era chegada a hora de partir nessa direção, já que o Brasil ainda oferecia muitas oportunidades. Aos poucos, porém, as discussões sobre o tema foram amadurecendo nas cúpulas das entidades e, apesar de tímido, o início efetivo desse movimento está bem próximo.
Pelo menos isso é o que garante a Schroders, que está com um fundo de investimento no exterior saindo do forno. O produto terá, de início, um patrimônio da ordem de R$ 15 milhões, e contará com capital da própria gestora e de ao menos uma entidade fechada de previdência complementar. Pelo fato de ainda não ter “assinado o cheque” até o fechamento desta edição, o fundo de pensão preferiu não ter seu nome revelado. Pode-se adiantar, porém, que uma fundação patrocinada por um grupo estrangeiro será cotista do fundo da Schroders com 25% do patrimônio do produto. “Infelizmente, a legislação veda a criação de fundos exclusivos nessa classe de ativos. Do contrário, a fundação teria apetite para criar um fundo exclusivo e investir muito mais do que está aportando agora no exterior”, afirma um dirigente desta entidade.
De fato, a Resolução número 3.792 do Conselho Monetário Nacional (CMN) estabelece que as fundações “devem observar, considerada a soma dos recursos por ela administrados, o limite de até 25% do patrimônio líquido de um mesmo fundo de investimento constituído no Brasil que tenha em sua carteira ativos classificados no segmento de investimentos no exterior”. Essa obrigatoriedade chegou a desanimar fundações e gestores, uma vez que é preciso haver um número mínimo de cotistas em cada fundo – e, se um deles fizer um grande saque, os outros podem ser prejudicados.
Vale lembrar que, há pouco mais de dois anos, fundações que tentaram iniciar suas aplicações fora do País acabaram surpreendidas pelo desenquadramento passivo. Três entidades investiram em um multimercado da Gems com investimento no exterior. Lançado em abril de 2008, o Fundo de Investimento Multimercado Gems Low Vol Longo Prazo – Investimento no Exterior teve sua liquidação acordada em assembleia de cotistas realizada em 19 de janeiro de 2009, data em que seu patrimônio batia na casa dos R$ 48 milhões. O fundo chegou a atingir um PL de R$ 90 milhões em agosto de 2008, antes do agravamento da crise global. Na época da liquidação, os executivos da Gems explicaram que houve uma onda de saques por parte de cotistas de private banking, o que acabaria gerando o desenquadramento passivo das fundações que aplicavam no produto e, por isso, as entidades foram recomendadas a também pedir o resgate de suas aplicações.
Base pulverizada – Por enquanto, o trunfo da Schroders para evitar um desenquadramento é a aplicação de capital próprio no fundo que está lançando. “A Schroders nunca fez um aporte tão grande em um produto dela aqui no Brasil. Isso, além de mostrar o nosso compromisso com esse fundo, viabiliza a entrada de nosso primeiro cliente”, comemora Eduardo Mendes, presidente da asset no País. Ele estima, com base nas conversas que a gestora vem tendo com investidores institucionais, que o fundo terá entre cinco e 10 clientes nos próximos três a seis meses. “Sabemos que esse é um processo longo e que o fundo vai levar anos para ser grande.
Se encerrarmos o ano com R$ 100 milhões, ficarei feliz. Mas esse é um fundo para R$ 1 bilhão”, aponta o executivo.
Mendes explica que, mais do que ao volume de recursos, a Schroders está voltada para a conquista de um grande número de clientes. Tanto que, para ele, a empreitada pode ser considerada de sucesso se, no curto prazo, de 10 a 15 investidores aplicarem entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões no produto. O executivo acrescenta que a ideia é que o fundo ocupe cerca de 10% do que o investidor tem em renda variável, o que mostra que o objetivo é realmente ter vários cotistas com um montante relativamente pequeno de recursos aplicados. “Apesar de o investimento inicial não ser muito grande, estamos criando uma base interessante para diversificação, eliminando o risco de os cotistas terem de realizar resgates por inadequação à legislação”, reforça Mendes. E apesar de os fundos de pensão serem alvo do primeiro esforço de vendas do fundo, o canal de distribuidores também será contemplado na comercialização do produto.
Igino Mattos, responsável pelo canal com clientes institucionais da Schroders, completa que, no caso das fundações, ainda é preciso romper algumas barreiras para que o fluxo de aplicações no exterior se intensifique. “Muitos deles ainda têm restrição ao segmento em suas políticas de investimento. Outros permitem as aplicações, mas não estabelecem um percentual para isso. Por isso, às vezes batemos na porta de clientes que dizem que a possibilidade de investir fora nem está na política para 2011. Nosso trabalho, então, é para que ela passe a constar no ano que vem. É um processo que também tem um lado educacional”, comenta Mattos. Ele revela que pelo menos 10 clientes estão analisando firmemente a possibilidade de aplicar recursos no fundo, dos quais três ou quatro encontram-se em estágio bastante avançado de aprovação do investimento.
O fundo – O multimercado de investimento no exterior da Schroders aplicará em cotas de um produto da gestora sediado em Luxemburgo e gerido a partir da asset em Londres. Trata-se do Schroder Global Equity Alpha, lançado em novembro de 2003 e que já conta com US$ 2,6 bilhões de patrimônio. O produto tem como benchmark o MSCI World, índice que o Schroder Global Equity Alpha tem por objetivo superar entre 3,5% e 4,5%. E a meta tem sido cumprida. “Desde seu início, o fundo ficou 3,9% acima do benchmark; em cinco anos, superou em 4,2%; e em três anos, em 5%”, informa o executivo, citando dados acumulados até dezembro de 2010 (veja mais no gráfico). Uma das diferenças entre o produto e o índice que serve como parâmetro para ele é que, enquanto o MSCI World não contempla ações listadas em mercados emergentes, o fundo pode ter exposição de até 20% do patrimônio a esses ativos. Hoje, esse patamar está em 18%.
A estratégia de investimento do Schroder Global Equity Alpha segue três temas: super ciclo, mudanças demográficas e mudanças climáticas. Em resumo, a ideia é buscar empresas que se beneficiarão, no longo prazo, do aumento populacional, da expansão do consumo e do aquecimento da demanda por investimentos em infraestrutura nos países emergentes. “Mais de 95% do crescimento da população até 2050 virá dos países emergentes. Isso muda o padrão de consumo e, por consequência, a economia e a produtividade. A demanda por investimentos em infraestrutura – seja de transportes, energia, telecomunicações ou saneamento –, apesar de já estar aquecida, vai continuar em alta por muito tempo, e é isso que chamamos de super ciclo. Todos esses fatores impactam o fluxo de caixa das empresas, além de, naturalmente, as mudanças climáticas. É a eles que estamos atentos para selecionar as ações desse fundo”, detalha Eduardo Mendes.
O executivo completa que, por outro lado, muitas empresas ganham dinheiro nos mercados emergentes mas estão listadas nos países desenvolvidos. Por isso a internacionalização dos investimentos se torna importante. Há empresas de setores que se beneficiarão desses temas no Brasil, mas não têm ações negociadas por aqui”, endossa.
Mendes completa que, após três anos de resultados fortes na renda variável de países emergentes, os investidores já passam a olhar com mais atenção para o mercado global de forma mais ampla. “Em 2010, com exceção do Brasil, os emergentes se saíram muito melhor que os países desenvolvidos em termos de bolsa. Nos últimos meses, porém, a diferença de performance começou a diminuir. Já é possível ver o começo da saída de investidores dos emergentes para os mercados desenvolvidos, como os Estados Unidos, onde a bolsa andou bem e as perspectivas para a economia estão melhores”, argumenta.
Esse “alinhamento maior” do cenário ajudou a Schroders a decidir fazer o lançamento do fundo local agora, após dois anos de estudos e conversas com clientes e consultores. Após diversas análises, a escolha do Schroder Global Equity Alpha se deveu ao fato de ser um produto considerado simples. “Existe mercado potencial para todos os produtos globais da Schroders, apesar de uns fazerem mais sentido do que outros para determinados mercados. Como nossa ideia é atingir uma base larga de clientes, resolvemos começar pelo que é de mais fácil entendimento. O processo e a estratégia de investimento são similares a fundos de ações aqui do Brasil. É um produto long only, sem opções ou derivativos. O investidor fica mais confortável em iniciar o investimento no exterior por meio de um produto que ele entende perfeitamente”, conclui o executivo.
Resultado positivo A área de asset management da Schroders encerrou 2010 com receita líquida de 996,2 milhões de libras (o equivalente a cerca de US$ 1,55 bilhão, pela cotação de 31 de dezembro de 2010), o que indica uma expansão de mais de 45% em relação ao montante verificado no ano anterior, de 679,2 milhões de libras. O lucro antes de impostos da asset management ficou em 381 milhões de libras no ano passado, contra 174,7 milhões de libras em 2009.
A captação líquida da asset bateu 24,7 bilhões de libras em 2010, com entrada de 51,6 bilhões de libras e saída de 26,9 bilhões de libras. Em 2009, a captação líquida foi de 14,5 bilhões de libras, com 35,9 bilhões de libras em aportes e 21,4 bilhões de libras em saques. A Schroders gere mais de US$ 300 bilhões globalmente. A asset local da companhia tem R$ 4,2 bilhões sob os seus cuidados.