Edição 224
Parece difícil acreditar, mas o caminho mais curto entre uma empresa brasileira de médio porte e o mercado acionário pode passar pelos Estados Unidos. Confiando no potencial de atratividade desses negócios, companhias norte-americanas como bancos de investimento, boutiques e consultorias têm vindo ao Brasil buscar candidatas a abrir capital lá fora, geralmente em Nova York. A prática já foi muito utilizada na China nos últimos anos e, diante de um certo esgotamento da fonte chinesa, as empresas brasileiras passaram a ocupar o topo da lista de prioridades dos players deste mercado. Além do bom momento da economia nacional e das perspectivas positivas de crescimento, conta a favor das corporações brasileiras o sentimento de que o mercado acionário nacional é um tanto restrito para o ingresso de empresas de menor porte.
Entre os estrangeiros que estão de olho em negócios desse tipo está o Geo Genesis Group, companhia de investimentos e consultoria que oferece assessoria estratégica para empresas baseadas em mercados emergentes que buscam levantar capital nos Estados Unidos ou na Europa. Em um primeiro momento, o grupo era focado na China, mas agora está estendendo sua atuação para o Brasil. Prova disso é que, no final de fevereiro, executivos do Geo Genesis passaram uma semana no País conversando com parceiros e empresas locais. “O mercado acionário brasileiro é para empresas grandes, por isso acredito que haja oportunidades para levar o acesso a capital para empresas menores. Nós estamos interessados nisso. Fizemos bastante isso na China, com companhias chinesas que chegaram ao mercado norte-americano por meio de reverse merger”, afirma Roger Emile Bendelac, chief executive officer (CEO) do Geo Genesis. Reverse merger, em tradução literal, seria uma “fusão reversa”. Na prática, uma companhia aberta listada lá fora e sem operações se funde com uma companhia operacional, mas privada, brasileira. No final das contas, essa corporação fechada acaba se tornando pública a partir da estrutura estabelecida lá fora. Algumas vezes, essas empresas não operacionais já existem, mas também podem ser criadas justamente com esse propósito de fazer fusões e aquisições. “O fato é que a companhia real é incorporada pela não operacional. E esse é um caminho mais rápido para uma empresa se tornar pública”, defende Roger.
Brasil – Para prospectar negócios no Brasil, o Geo Genesis conta com a colaboração de um parceiro local: a Acceleraction, empresa que atua na consultoria, assessoria e orientação de estruturações financeiras, fusões e aquisições, governança corporativa e planejamento estratégico. Philippe Allain, co-chairman do Geo Genesis Group, conta que na mais recente visita ao Brasil foi possível conversar com algumas companhias que podem vir a abrir capital no exterior. “Passamos dois dias entrevistando empresas e algumas delas estão bastante interessadas em levantar recursos tornando- se públicas. Mas muitas vezes é complicado fazer isso aqui no Brasil por conta dos pré-requisitos da BM&FBovespa, e até do Bovespa Mais. Nos Estados Unidos, ou mesmo na Europa, isso pode ser feito de forma mais rápida e barata”, compara.
Há cerca de um ano, o Geo Genesis começou a olhar com mais interesse para o mercado brasileiro. No final de 2010, o grupo firmou uma parceria com a Acceleraction para buscar empresas que poderiam querer abrir capital no exterior. Francisco Eduardo Parreira, presidente da Acceleraction, conta que a consultoria fez um trabalho prévio de seleção de empresas e setores para apresentar aos executivos do Geo Genesis nesta última semana de fevereiro. “Conversamos com mais de 30 empresas, das quais quatro foram selecionadas. Muitas têm interesse mas ainda têm que fazer uma lição de casa”, conta Parreira. Essa, segundo ele, foi uma aproximação inicial com as companhias. Após essa “reunião oficial”, vem uma etapa de análise mais aprofundada, incluindo o encaminhamento de documentações. “Firmamos acordo com essas quatro empresas para tocar o processo adiante. Tudo vai depender dos dados e números das empresas, da sua necessidade de capital, enfim, é um conjunto de informações que precisamos coletar a analisar”, reforça Parreira. O executivo informa que é possível fazer uma abertura de capital lá fora dentro de um período de três a seis meses.
Em um primeiro momento, a companhia passa a ser listada no OTC Bulletin Board, sistema eletrônico que disponibiliza informações sobre cotas, volume negociado e preços de compra e venda de ações negociadas no mercado de balcão. “Essa será a porta de entrada. Depois, faremos a migração para bolsas como Nasdaq ou Amex [American Stock Exchange].
Para subir de nível de negociação, as empresas terão de se adequar a certas regras”, esclarece Parreira.
Peneira – Roger Bendelac, do Geo Genesis, resume que a companhia está de olho em empresas de menor porte que estão crescendo e, consequentemente, necessitando de capital. “São corporações com boas perspectivas de crescimento e uma boa gestão. Temos bastante interesse por empresas cuja atuação seja voltada para o mercado interno brasileiro.
Esse é um espectro muito amplo, é verdade, e muitas vezes ele se move devido a novos produtos e serviços e novas necessidades por parte dos consumidores”, afirma. Apesar do foco em empresas menores, a intenção do grupo não é se envolver com projetos muito iniciantes. “Não costumamos trabalhar com start-ups. Buscamos empresas já operacionais”, ressalta.
Parreira, da Acceleration, detalha que estão na mira companhia com faturamento anual a partir de R$ 35 milhões, com no mínimo dois ou três anos de atividade. Entre os setores de atuação, são selecionados aqueles com potencial de crescimento maior. “Um deles é o de saúde, incluindo clínicas privadas e outros ramos ligados a health care, como o de lavanderias especializadas no mercado hospitalar, por exemplo. Outro é o de infraestrutura em geral, que abrange a parte tecnológica, como os data- centers. Essa é uma área em que há muita demanda por investimentos no Brasil. Por fim, há o setor de óleo e gás, em que há várias empresas nascendo e crescendo”, enumera o executivo. Parreira revela que, em cada uma dessas três grandes áreas da economia, foram selecionadas 10 empresas. Entre as quatro empresas eleitas, está uma de health care, uma de óleo e gás e duas de infraestrutura.
Reverse merge é possível saída para FIP da Atlântica Na visita que fizeram ao Brasil no final de fevereiro, Roger Emile Bendelac e Philippe Allain estiveram na Atlântica Investimentos. A gestora de recursos se interessou pelo reverse merge como alternativa de saída das empresas do seu Fundo de Investimento em Participações (FIP) voltado para a área de saúde. “Começamos a olhar essa possibilidade diante da necessidade de desenvolver estratégias de saída do nosso FIP”, conta André Barbieri, diretor presidente da Atlântica.
O FIP Atlântica Saúde foi aberto para captação em fevereiro do ano passado e deve encerrar a fase de levantamento de recursos até o meio deste ano. Com patrimônio de R$ 160 milhões, o fundo deve investir em cinco empresas. “É preciso pensar nas possibilidades de saída das empresas. Vamos imaginar que daqui a sete anos, que é o prazo do fundo, por algum motivo o mercado brasileiro não esteja receptivo para um IPO ou mesmo para a venda das empresas. Nesse caso, o reverse merge surge como uma alternativa”, aponta Barbieri. Ele acrescenta que a Atlântica procurou especialistas em aberturas de capital no exterior e, assim, chegou até o Geo Genesis.
Segundo informações disponíveis no site da Atlântica, o FIP em questão tem como foco companhias “cujo objeto social seja a prestação de serviços na área de saúde complementar, tais como: complexos hospitalares; clínicas especializadas; centros de diagnósticos, empresas prestadoras de serviços na área de administração e gestão de saúde”. O fundo, fechado, tem três anos para investimento (podendo se estender por mais um) e quatro de desinvestimento (podendo se estender por mais dois).