Edição 238
Os consultores de investimen-tos que prestam serviços para entidades fechadas de previdência complementar terão mais trabalho daqui em diante. Com a queda da taxa de juros e a necessidade de diversificação das carteiras, esses profissionais terão de auxiliar seus clientes a analisar e selecionar produtos cada vez mais sofisticados. Entre as classes de ativos destacadas por especialistas como destino de novos fluxos de recursos dos institucionais estão crédito privado e fundos estruturados, além da Bolsa quando houver sinais mais claros de para onde o mundo caminha.
Gustavo Melo, Chief Operating Officer (COO) da Risk Office, acrescenta que há uma tendência de alongamento das posições dos fundos de pensão em títulos públicos federais. “As fundações estarão mais posicionadas em toda a curva longa de juros, e não somente no curto prazo como era no passado. Deve haver um aumento da compra de títulos públicos longos, principalmente NTN-Bs”, ressalta. Ele diz que as posições mais curtas dos institucionais devem se concentrar no segmento de crédito privado.
O COO da Risk Office lembra que um ativo que andou bastante em evidência recentemente foram os papéis com garantia do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), como os Depósitos a Prazo com Garantia Especial (DPGEs). Ele pondera que essa é uma modalidade de investimento que, apesar de ter atraído o interesse dos institucionais pelo prêmio oferecido e pela garantia do FGC, não terá uma participação tão relevante nas carteiras das fundações até pela própria capacidade do Fundo, que acaba limitando um pouco a emissão desses títulos. “Por outro lado, os créditos securitizados, que são principalmente os Fidcs, tendem a ter um reforço em função da expansão do crédito para pessoa fisica. Deve haver o surgimento de produtos que carregarão o estoque de dívida das pessoas, desonerando os balanços dos bancos”, estima Melo, dando como exemplos possíveis de securitização os recebíveis de cartão de crédito, carnês de parcelamento de compras em lojas e financiamento de veículos. “A expansão do crédito pode gerar ofertas interessantes nessa área.”
Melo explica que os Fidcs se destacam como opção para os institucionais no segmento de crédito privado porque as grandes companhias emitem muito pouca dívida no mercado e as empresas de menor porte acabam se financiando por meio do sistema bancário. De fato, dados da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) mostram que a carteira de crédito das fundações ainda tem um grau relevante de concentração em uma dezena de emissores, com os papéis emitidos por bancos (principalmente CDBs) sendo parte predominante dos portfólios (leia mais na página 33).
Guilherme Benites, sócio da Aditus Consultoria Financeira, concorda que, apesar de haver bastante demanda, há pouco crédito vindo a mercado. “Muitas empresas grandes usam hoje linhas de financiamento do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e outros bancos de fomento. Já as empresas de menor porte não conseguem captar no mercado e acabam tomando crédito nos bancos”, reforça o consultor. Benites acredita, porém, que com a queda do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI), a taxa para emissões de crédito privado pode começar a se tornar competitiva para as empresas.
Estruturados – De acordo com Benites, além do crédito, outra classe que deve atrair investimentos das entidades fechadas de previdência complementar é a de ativos imobiliários para renda. Para o consultor, o mercado de imóveis será cada vez mais acessado pelas fundações por meio de fundos imobiliários, e não tanto pelo investimento direto. “A legislação já diminuiu muito o limite máximo permitido para a aplicação direta em imóveis”, lembra. Pela Resolução número 3.792 do Conselho Monetário Nacional (CMN), em vigor atualmente, esse limite está em 8%. A regra anterior (CMN 3.456), de 2007, permitia a aplicação de até 11% dos recursos dos planos no segmento, mas estabelecia que a partir de janeiro de 2009 esse limite cairia para o patamar atual de 8%. Já a CMN 3.121, de 2003, previa um limite de 14% para aquele ano, reduzindo para 11% a partir de 2006 e para 8% em 2009. Apesar de manter o limite de 8%, a CMN 3.792 trouxe um espaço a mais para a exposição ao segmento de imóveis. Isso porque os fundos imobiliários passaram a ser classificados como investimentos estruturados, com um limite à parte de 10%.
Benites acrescenta que uma vantagem de investir no setor imobiliário por fundos é que, deste forma, as entidades conseguem fazer aplicações diversificadas – e, muitas vezes, com o mesmo volume de recursos que alocariam em um único empreendimento.
Melo, da Risk Office, acredita que haja espaço para os investimentos estruturados nas carteiras das fundações, mas em termos percentuais não chega a ser tão significativo. Vale lembrar que, pela CMN 3.792, o limite de alocação no segmento de estruturados é de 20% dos recursos dos planos, com exceção dos fundos imobiliários (10%) e multimercados (10%). Também são classificados como estruturados os Fundos de Investimento em Participações (FIPs) e os Fundos Mútuos de Investimento em Empresas Emergentes (Fmiee). “O espaço é grande em termos absolutos, mas em percentuais não. Marginalmente, o segmento de estruturados está sendo demandado, mas o volume em sob o ponto de vista de macroalocação nunca será muito elevado. Essa carteira terá sempre um caráter de diversificação para dar uma turbinada e diferenciar um pouco o rendimento dos planos”, opina.
Ele diz que, atualmente, a maior dificuldade para uma fundação que não seja de grande porte é conseguir diversificar os investimentos em vários fundos – como os FIPs, por exemplo. “Uma fundação grande, que tem dezenas de milhões de reais para colocar em um único produto, não tem dificuldade. Mas para uma entidade pequena, o acesso é mais complicado, porque com R$ 5 milhões não dá para comprar o ingresso de muitos produtos que existem por aí”, aponta Melo. Ele sugere que uma solução seria o desenvolvimento de veículos como fundos de fundos, que podem comprar cotas de outros produtos e promover a diversificação com tickets menores. “De todo jeito, a alocação total nesses veículos muitas vezes não pode ser tão alta, por causa da liquidez. Em fundações que têm planos mais maduros, o espaço é menor. Já aquelas que têm planos novos, muita receita de contribuição e muitos participantes ativos, podem carregar por mais tempo o investimento”, pondera Melo.
Cenário turbulento – Já em relação à Bolsa, os especialistas concordam que o momento é bastante delicado. “Estamos em uma situação muito incomum, negociando em múltiplos não tão distantes dos de países bem mais desenvolvidos do que o nosso”, observa o COO da Risk Office. Ele diz que, como os investidores em geral costumam analisar a questão da valorização relativa e já é possível ver algumas oportunidades lá fora se tornando interessantes em termos de múltiplo, o movimento geral na Bolsa brasileira acaba perdendo um pouco de intensidade.
Guilherme Benites, da Aditus, afirma que um possível aumento da alocação em renda variável é um assunto bastante comentado e estudado pelas fundações, mas o incremento efetivo da exposição a Bolsa não tem sido muito visto até agora. “Uma diminuição de toda essa turbulência certamente poderia ajudar”, estima.
Melo, da Risk Office, admite que o cenário não é muito encorajador. “Carregar os investimentos as fundações vão, ninguém vai vender posições nesse momento. Mas dinheiro novo para bolsa não sei se vai ter agora. Acredito que leve mais um tempo para que se aumente a alocação, até porque a expectativa que nós temos é de um cenário global muito complexo. Mas também é preciso estar atento às oportunidades – se aparecer alguma boa, o negócio é comprar.”