A importância de ser prudente | Agências de classificação de risc...

MOZZEO: avaliações internas e terceirizadas fortalecem gestãoSANTORO: pressão por custos e aversão a bancosEdição 239

 

A mais famosa astróloga do planeta, Susan Miller, previu que o mês de  junho seria muito positivo para questões relacionadas a dinheiro para os nascidos sobre o signo de Escorpião. E ela errou feio. O empresário Eike Batista passou os últimos dias do mês dando explicações sobre suas empresas e viu sua posição, entre os mais ricos do mundo, despencar da 7ª para a 46ª sexta posição. No caso de Luis Octavio Índio da Costa, dono do banco Cruzeiro do Sul, Susan Miller foi bem mais certeira. Sugeriu que os nascidos sobre o signo de Touro poderiam vivenciar problemas com credores. Coincidência ou não, no início do mês, o Banco Central decretou a intervenção da instituição carioca, depois de verificado fraude avaliada em R$ 1,3 bilhão. Grosso modo, a astróloga acertou metade de seus prognósticos, enquanto que as empresas de rating não fizeram qualquer alerta antecipado.

Essa desconfiança em relação aos ratings ampliou fiscalização das agências de classificação de risco.Tanto que a Comissão de Valores Mobiliários editou, em março, uma resolução que demonstrou a preocupação em ampliar a transparência do setor. Umas das preocupações foi a de evitar o chamado rating shopping, em que uma companhia contata as agências de risco, mas contrata e publica apenas a avaliação mais favorável. Agora, o órgão regulador exige que as agências que não forem contratadas também tenham suas avaliações publicadas, assim que a operação for divulgada no mercado. Como medida de transparência, a CVM passou a exigir também que as agências comuniquem ao mercado a relação de clientes que representem, individualmente, mais do que 5% do faturamento.

Mais recentemente,o Comitê de Regulação e Fiscalização dos Mercados Financeiro, de Capitais, de Seguros, de Previdência e Capitalização (Coremec) aprovou proposta que reduz o peso das classificações de risco emitidas por agências nas normas para ofertas públicas e ativos securitizados. Na securitização, a proposta é extinguir a exigência do rating, desde que sejam apresentadas informações trimestrais sobre operações. Em relação aos fundos de investimento que direcionam recursos para ativos securitizados, a responsabilidade pela avaliação de risco será exclusivamente do administrador e do gestor.

Nos casos de fundos de pensão, embora haja certo entendimento de que as políticas de investimento são, muitas vezes, embasadas em ratings, há percepção do governo de que a classificação de risco deve ser apenas um dos balizadores para decisões de investimento e, dessa forma, a legislação prudencial na Previdência mais avançada em relação a outros setores do mercado financeiro. Para a Previc, a legislação exige dos gestores a responsabilidade plena e a análise de um ativo ou empresa deve ser mais ampla do que apenas um rating, com avaliação constante, e não apenas na emissão, de diversos parâmetros, como emissor, custodiante, gestor e critérios de precificação.

Por esse motivo, a avaliação é que a questão do uso do rating para o setor previdenciário passa mais por ações de orientação do que mudanças efetivas na regulamentação existente. “O gestor não pode achar que pode basear suas decisões em uma avaliação de uma empresa de classificação de risco, mas deve exibir seu conjunto próprio de análises, critérios de precificação e avaliação de qualidade”, comenta uma fonte ligada à agencia reguladora.

Críticas – “As agências de rating não estão servindo para nada. Até parece piada porque só depois que um banco entra em intervenção e toda a fraude se torna pública, elas reavaliam e rebaixam a classificação”, desabafa o presidente do Metrus, o fundo de pensão dos funcionários do Metrô de São Paulo, Fábio Mazzeo. Segundo ele, os problemas recentes levaram a fundação a  contratar uma empresa externa para acompanhar periodicamente o risco de todos os ativos em carteira. “Isso já era comum em grandes fundações, mas agora deverá ser uma realidade entre as pequenas e médias”, afirma.

Também nesta linha está a Fundação Ceres. Segundo o diretor de investimentos, Dante Scolari, o fundo de pensão analisa as classificações de risco de crédito oferecidas por empresas especializadas apenas para uma pré-seleção de ativos. “Nós nem analisamos empresas sem rating AA”, diz. A partir daí, conta, as aplicações são avaliadas de acordo com os critérios internos da fundação e só após extensa análise receberiam aportes.

Como exemplo de cautela necessária, ele afirma que a fundação não aplica em títulos de bancos com patrimônio inferior a R$ 1 bilhão. Ele também revela que a fundação desconsidera segmentos considerados arriscados, independente de ratings, como hotéis ou qualquer tipo de crédito privado relacionado à venda de veículos. Para o executivo, a redução das taxas de juros vai exigir mais proatividade de reguladores e gestores diante da necessidade de busca por ativos de maior risco e, consequentemente, maior retorno.

Para executivos do setor, o peso sobre a regulamentação pode ser crescente. “Só vamos conseguir uma boa gestão se tivemos confiança de que cada participante do mercado, cada órgão regulador, está cumprindo o seu papel”, diz Mazzeo. Segundo ele, as fundações precisam de ter confiança na fiscalização de órgãos reguladores para garantir a diversificação das carteiras. “Como a gente vai saber que um banco com bom rating e que teve autorização para comprar outro está repleto de fraudes”, indaga, referindo-se ao Cruzeiro do Sul.

“Precisamos acreditar nos dados do BC, da CVM, das agências, dos auditores, das consultorias, dos custodiantes. A regulação precisa ficar mais rígida porque as fundações terão que correr mais risco para atingirem suas metas atuariais diante do cenário de queda forte da taxa real de juro”, destaca. “Claro que vamos olhar e analisar tudo, mas não posso responder por tudo”, completa. De acordo com Mazzeo, as fundações avaliam seus enquadramentos, rentabilidades, fluxos e realizam due dilligence dos investimentos realizados. Mas essa demanda por análise vai aumentar, pressionando a estrutura de custos.  “Precisamos aumentar a qualidade e a quantidade das análises, mas se eu for esperar que todo o investimento seja AAA, eu não vou conseguir investir em nada”, afirma.

O consultor de investimentos da Mercer Investment Consulting, Raphael Santoro, destaca que as fundações não são obrigadas a contratar classificação de risco para realizar investimentos, mas ressalta que o custo de uma classificação interna pode inviabilizar algumas aplicações. Segundo ele, a tendência das fundações de pequeno e médio portes é de terceirização do serviço de análise.

 “Os fundos de previdência estão particularmente atentos ao risco dos bancos médios, principalmente devido aos Certificados de Depósito Bancário (CDBs) em carteira”, complementa o consultor. No mercado, a avaliação em relação a aplicações em títulos de bancos médios é que as fundações não descumpriram a legislação vigente, mas que aplicaram um porcentual de seus ativos maior do que seria prudente em um banco com relevância no sistema e porte do Cruzeiro do Sul.

Recentemente, o Banco Central, que fiscaliza o setor bancário, passou a exigir provisões adicionais para os bancos médios, o que reduziu as operações de crédito dessas instituições nos últimos meses. Em algumas instituições, as provisões exigidas passariam de R$ 1 bilhão.