Edição 161
Atentos à demanda de investidores que arbitram distorções, instituições como UAM, Fama e Rio Bravo Investimentos lançam fundos de ativos brasileiros no exterior
Écomum que em escândalos políticos os fundos off shore, registrados em paraísos fiscais com baixa regulação e nenhum imposto, surjam como coadjuvantes ou até como protagonistas de operações ilegais. Neste ano, porém, eles não precisavam do empresário Marcos Valério – cuja agência de propaganda também é acusada de lavar dinheiro através desses fundos – para emplacar nos noticiários. Os fundos off shore que investem em ativos brasileiros se tornaram o mais novo alvo dos fundos hedge globais que, após aplicarem mais de US$ 1 trilhão em operações alavancadas em mercados norte-americanos, europeus e asiáticos, vêem na América Latina um vasto território para arbitrar preços desalinhados.
E haja desalinhamento no Brasil. Só em 2005, o principal índice do mercado acionário, o Ibovespa, já variou do mínimo de 23.609 pontos ao máximo de 29.455 pontos, aguçando distorções entre as ações locais e as listadas em Nova York e entre os mercados à vista, à termo, futuro e de opções. Igual situação se verifica nos segmentos de juros e de câmbio, por exemplo.
Por conta disso, algumas instituições financeiras já criaram seus fundos off shore. É o caso da Unibanco Asset Management (UAM), que lançou em maio o Unifund Brazilian Managers. Ele aplica em fundos off shore de seis gestores brasileiros e é oferecido para investidores estrangeiros através dos escritórios da instituição em Nova York, Luxemburgo e Bahamas.
Segundo a superintendente de investimentos da UAM, Aline Leite Sun, esses fundos adotam estratégias macro (com ênfase na análise fundamental das variáveis econômicas) e long-short (onde é explorada a discrepância de preços entre títulos de uma mesma classe de ativos). “O mercado de hedge funds é o que mais cresceu no exterior e, agora, vem para a América Latina porque ficou saturado nas regiões em que operava, com uniformização de preços. Além disso, a liquidez mundial é acentuada e há interesse pelos emergentes. O dinheiro está indo até para a Argen-tina”, diz.
Como a colocação do fundo se deu em junho, o seu volume ainda é pequeno, diz Aline, sem revelar o montante. “Ainda é seed money [capital semente] do próprio banco. Vamos iniciar o esforço de captação em agosto”. O fundo está registrado nas Ilhas Cayman. Também foi listado nessa localidade o primeiro off shore da Fama Investimentos. Lançado no primeiro trimestre do ano, o Fama Brazil Funds já captou US$ 6 milhões e tem cerca de 12 investidores. O fundo aplica em duas classes de ativos, que espelham fundos locais da gestora: uma classe opera ações no médio e longo prazos (composição dos fundos Challenger e Futurewatch) e a outra compra ações e vende índice futuro (fundo Sniper).
“O projeto desse lançamento era antigo. Vínhamos trabalhando nisso há um ano e agora sentimos demanda para produtos diferenciados em nível global”, afirma o diretor da Fama Investimentos, Maurício Levi. A intenção do executivo é chegar a US$ 200 milhões o mais breve possível e então fechar a captação do fundo. Levi avalia que isso é factível pois, além de também perceber grande liquidez global, ele ainda não sente indícios de contaminação da crise política brasileira na decisão dos investidores estrangeiros.
A Rio Bravo Investimentos também estreou esse produto em junho. Lançou o off shore espelho do seu fundo RB Fundamental, que aplica em ações de liquidez reduzida, com potencial de crescimento e governança corporativa. Metade do seu patrimônio está em ações da Eternit, outros 30% em papéis da Bradespar e o restante em títulos da Magnesita. O off shore da Rio Bravo tem dois investidores estrangeiros e cerca de R$ 5 milhões. A meta, segundo o sócio Mário Fleck, é atingir cerca de R$ 35 milhões até o final do ano. “Demanda existe. Apesar da crise política, há elementos econômicos de solidez e novas alternativas no mercado acionário”.
Rodrigo Sancovsky, co-gestor do RB Fundamental, concorda. E acrescenta que, além da forte demanda dos fundos hedge, os papéis da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) ainda estão baratos quando comparados aos de outros países. “Há potencial de crescimento e de rentabilidade que não existem nas bolsas de países desenvolvidos”. O off shore da Rio Bravo foi constituído nas Ilhas Virgens Britânicas. Além de UAM, Fama e Rio Bravo, várias instituições lançaram seus fundos off shore nos últimos meses, como Mauá, ABN Amro, Itaú, entre outros.
Segundo a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), os fundos off shore acumulavam R$ 16,5 bilhões em junho. Mas como nem todas as instituições informam suas posições nesse produto à Anbid – e não há legislação brasileira que leve à isso, dada a diferente jurisdição de atuação – estima-se que esse número alcance mais de R$ 30 bilhões, em cerca de 90 fundos e 30 diferentes gestores. E se essa é a estimativa, colhida a partir do que captam as próprias instituições financeiras nos movimentos umas das outras, o número real pode ser ainda maior.