Curva acentuada pela frente | Gestores lançam fundos com NTN–B ma...

Sergio Bini, da CEFEdição 257

 

Com o aumento da volatilidade dos juros no ano passado, período em que a taxa média de retorno da NTN-B saiu de um patamar de 3% para mais de 7% em poucos meses, os regimes próprios de previdência tiveram sérias dificuldades em bater meta atuarial. Para mitigar o efeito “sanfona” dos juros nas carteiras dos RPPS, instituições como a Caixa Econômica Federal e a BB DTVM estão apostando na oferta de fundos marcados na curva para este segmento. As primeiras famílias de fundos com essa característica entraram em operação em fevereiro deste ano, e captaram, juntas, mais de R$ 2,2 bilhões no mês.
Via de regra, os RPPS não podem marcar ativos na curva em carteira própria, conforme determina a portaria MPS 402. Entretanto, após consultarem o Ministério da Previdência, os gestores conseguiram um aval para o lançamento de produtos que fogem à tradicional marcação a mercado.
Segundo explica Sérgio Bini, gerente nacional de investimentos corporativos da Caixa Econômica Federal, o ministério confirmou a possibilidade de marcar os ativos na curva por intermédio de fundos de investimentos. Esses fundos entram na categoria de renda fixa da resolução 3922. Nesse aspecto, os regimes próprios teriam uma limitação de aporte de até 30% de seu patrimônio.
Para tornar possível o lançamento de um produto com marcação na curva para os regimes próprios, foi necessário exigir dos cotistas a assinatura de um termo de capacidade financeira, atestando que eles terão condições de manter os recursos no fundo até o fim do prazo de carência – que coincide com o vencimento das NTN-Bs. Não há, portanto, possibilidade de resgates antes do encerramento do fundo.
A expectativa do mercado, inclusive, é de que o ministério publique, em breve, uma portaria esclarecendo a legitimidade do produto. Procurado pela reportagem, contudo, o ministério não se manifestou sobre o assunto.
Oportunidade – Segundo o executivo da Caixa, com o atual cenário de alta de juros, abriu-se uma “janela de oportunidades” para papéis marcados na curva, motivo pelo qual a instituição decidiu lançar uma família de fundos com essa característica este ano. “O produto nasceu de uma forte demanda dos regimes próprios, que amargaram perdas significativas no ano passado por conta da alta volatilidade no mercado de renda fixa. Marcando ativos na curva é possível fugir desses altos e baixos, garantindo rentabilidade acima da meta atuarial”, explica.
A família lançada pela CEF se concentra em NTN-Bs, com vencimentos em 2018, 2020 e 2022, e rentabilidade de 6% acima da inflação, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
O primeiro fundo lançado, o Caixa Brasil 2018 I Títulos Públicos Renda Fixa, captou R$ 1,002 bilhão, somando 163 cotistas, a maior parte composta por regimes próprios. “Os fundos de pensão podem marcar ativos de carteira própria na curva, então a maior demanda é proveniente dos RPPS”, complementa.
Antes de ingressar no fundo marcado na curva, portanto, Bini recomenda que as instituições façam um levantamento da real capacidade de alocação, já que o recurso aplicado não poderá ser movimentado até o encerramento. “Lançamos a família com vértices relativamente curtos, o que não deve gerar problema de caixa para os RPPS. Mas vamos testar a demanda do mercado com a criação de um fundo marcado na curva com vencimento mais longo, 2024 ou 2030, ainda este semestre”, diz.
Outras gestoras, como a BB DTVM por exemplo, também lançaram fundos marcados na curva no mês passado. O primeiro fundo marcado na curva para institucionais foi o BB Previdenciário Renda Fixa Títulos Públicos IPCA III. Durante o período de captação, de 11 a 17 de fevereiro, foram aportados R$ 795,7 milhões, provenientes de 143 cotistas. Já o segundo, IPCA IV, captou R$ 387 milhões de 116 cotistas, entre os dias 18 e 25.
A atratividade desse tipo de marcação depende do nível de maturidade do regime próprio, sendo interessante principalmente para os RPPS que começaram a operar recentemente, pois podem capitalizar por mais tempo e possuem um fluxo de benefícios a pagar menor. Segundo análises de consultores, antes de ingressar em um fundo marcado a mercado é necessário fazer um estudo de viabilidade para se certificar que o investimento esteja dentro da realidade e da capacidade financeira do RPPS.
Por conta da carência, o investimento no fundo marcado a mercado é considerado de médio e longo prazo. Isso garante que a estratégia do fundo esteja alinhada com o objetivo dos regimes próprios. Ainda de acordo com análises de empresas de consultorias, “em função da abertura dos juros, vários gestores identificaram oportunidades de desenvolver fundos marcados na curva para investidores institucionais”.
Contraponto – Embora a marcação a mercado seja considerada a melhor forma de contabilizar os ativos dos regimes próprios, pois espelha o real preço dos papéis no balanço, Miguel Amantea, gerente de análise de investimentos da Trinus Capital, acredita que a retomada de alta dos juros tornou a modalidade uma boa opção para atingir metas. “É uma aplicação de baixo risco e volatilidade, evitando rendimentos negativos como os do ano passado”, destaca.
Ainda assim, Amantea alerta para os custos de oportunidade desse tipo de operação. “O momento pode ser ideal para um produto marcado na curva, mas, se por algum motivo o cenário mudar e os juros passarem a subir mais, os regimes próprios sairão perdendo, já que poderiam ter gerado rendimentos maiores realocando ativos em vez de deixá-los parados”, complementa.
Além disso, a própria trajetória da inflação pode fazer com que essas aplicações percam atratividade com o passar do tempo. “O ganho real permanece, independentemente do que acontecerá com o índice inflacionário. Entretanto, em um possível cenário de desaceleração do IPCA, o rendimento dos papéis pode ficar menos interessante em comparação ao CDI, por exemplo”, analisa.
Para analistas do mercado, a marcação a mercado é importante para evitar a chamada “transferência de riqueza” entre os cotistas. Entretanto, os fundos marcados na curva excluem a volatilidade dos ativos durante todo o período do investimento de forma segura, em conformidade com a regulamentação do setor. “Os regimes próprios geralmente têm um fluxo de caixa de mais longo prazo, pois deles depende a aposentadoria dos servidores. Como o cotista será obrigado a ficar no fundo até o final, não haverá prejuízo algum”, defende um desses analistas.
Com o aumento da volatilidade da renda fixa, há uma necessidade cada vez maior de diversificar o portfólio. Segundo Sérgio Bini, da Caixa, para fugir da volatilidade, muitos regimes próprios têm recorrido a aplicações em fundos DI ou IRF-M, alocações insuficientes para bater meta, porém, seguras. Mesmo com a taxa básica de juros, Selic, a 10,75% ao ano, com um fundo que promete rentabilidade de 6% acima da inflação é possível se aproximar de 12% de rendimento.
“A NTN-B chegou a 7% de ganho real, então existe um certo prêmio na curva. Mas o ano de 2014 também será marcado por alguma volatilidade, visto o cenário macroeconômico e o externo. Quem conseguir investir agora e carregar até o final certamente será beneficiado”, destaca Bini.
Paraná – Para reduzir os efeitos da volatilidade no balanço, a Paraná Previdência resolveu investir nos novos fundos marcados na curva. Em fevereiro, aplicou R$ 30 milhões em um produto da BB DTVM e R$ 50 milhões em um da Caixa Econômica. O valor total, de R$ 80 milhões, representa pouco mais de 1% do patrimônio líquido da instituição, estimado em R$ 7,3 bilhões.
“O ano passado não foi bom para ninguém. Mesmo conseguindo manter superávit financeiro, de cerca de R$ 200 milhões, ficamos bem abaixo da nossa meta atuarial de IPCA + 5,75%”, afirma Antônio Carlos Pereira de Araújo, diretor de finanças e patrimônio da instituição. O RPPS encerrou 2013 com rentabilidade real de 1,8%, estima Araújo – o balanço oficial ainda não foi divulgado.
Para aplicar nos fundos marcados na curva, foi exigida a assinatura de um termo de capacidade financeira. “Nossa equipe econômica fez uma análise de quanto poderíamos comprometer do patrimônio com essa operação, já que o recurso ficará bloqueado por um tempo. Optamos por fazer um aporte mais conservador no momento, pois ainda estamos esperando para ver o que acontecerá com a economia”, explica.
Ao todo, 73% do patrimônio do regime próprio está alocado em títulos públicos, marcados a mercado. Apenas 20% está aplicado em fundos de investimento, com destaque para Fidcs (direitos creditórios), FIPs (participação) e FII (imobiliário). Cerca de 6% está em renda variável.
Seguindo essa estratégia, em 2013, a carteira de investimentos da Paraná Previdência fechou em R$ 6,62 bilhões. “Para nós, marcar na curva é interessante porque evita a alta volatilidade da renda fixa, fator que nos prejudicou muito no ano passado. O risco é baixo e nos ajuda a bater meta”, diz Araújo.