Consultor prega transparência | Regulação mais severa fez cair o ...

Edição 357

O interesse dos RPPS pelo investimento em Fundos de Investimento em Participação (FIPs) passa pela necessidade de transparência nas informações das empresas investidas e dos fundos, assim como pelo comprometimento dos gestores com as exigências legais, agora medidas por uma régua mais alta do que no passado. Para Vitor Leitão, sócio da consultoria Lema Economia & Negócios, o ambiente regulatório trouxe, desde 2018, uma situação mais tranquila em relação aos gestores “aventureiros” do passado e aos casos de fraudes que deixaram muitos fundos com patrimônio negativo.
“De lá para cá não temos tido mais casos desse tipo, o nível regulatório ficou mais elevado e estamos mais tranquilos, mas de fato era uma possibilidade real que precisava ser barrada. No passado houve fundos que chegaram a zero”, observou durante painel com gestores no 56º Congresso da Abipem. Apesar do avanço regulatório, ele recomenda que as auditorias e os próprios gestores dos RPPS sejam rigorosos na avaliação prévia desses investimentos e no seu acompanhamento.
No caso das auditorias, é importante que os questionamentos possam ir além do que estabelece o padrão para essas avaliações. Ele cita um caso recente de auditoria de fundo estruturado para RPPS que levantou questões adicionais importantes. Como por exemplo saber se o gestor fez avaliação da saúde financeira dos emissores de ativos na carteira dos fundos. “A decisão de investir cabe aos gestores mas eu, como RPPS, também preciso saber e devo fazer esse acompanhamento”, defende. Outra pergunta essencial é se houve uma consideração sobre possibilidades de perdas significativas e de aportes adicionais no caso de patrimônio negativo do fundo.
Entre os questionamentos relevantes, Leitão destaca perguntas sobre a eventual realização de análises prévias e pesquisas sobre notícias relevantes recentes na mídia sobre o fundo, seus administradores e gestores. “É preciso ter segurança de que o processo seja feito corretamente e siga o regramento completo. Entre outros pontos, a auditoria também perguntou se foram feitas análises prévias junto à CVM sobre processos sancionadores de administradores e gestores dos fundos”, observa. É essencial ainda saber se houve análise de compatibilidade com o passivo, para atestar se a instituição pode ficar sem liquidez durante o período de investimento do fundo.
Limitados a investir no máximo 5% de seu patrimônio em fundos estruturados, em particular nos Fundos de Investimento em Participações (FIPs), os RPPS que aderem ao Pró-Gestão podem ter esse teto ampliado. Diferente do que ocorre em outras classes de ativos, porém, para investir em FIPs até 10% ou 15% de seu patrimônio eles precisam estar respectivamente nos níveis III e IV desse programa, enquanto os que estiverem nos níveis I e II não têm qualquer diferenciação e permanecem sujeitos ao limite de 5%.
“Há ainda uma série de contingências da regulação que subordinam esse investimento e que devem estar incluídas no regulamento do fundo”, lembra o consultor. Entre as exigências legais, está a de que o valor justo dos ativos seja respaldado por laudo de avaliação e de que os gestores tenham pelo menos 5% investidos. Além disso, os gestores do fundo escolhido precisam ter realizado pelo menos três desinvestimentos integrais nos últimos dez anos. “Isso significa que ele deve devolver o capital integral, com a rentabilidade almejada. É importante para subir um pouco mais o nível e evitar os problemas que aconteceram no passado”, diz Leitão.

As realidades dos RPPS são as mais diversas, até porque alguns já são considerados qualificados para fazer determinados investimentos e outros não, afirma Rodrigo Rocha, diretor da BTG Pactual Asset Management. “Atualmente, há 150 RPPS que já investem na classe e houve 25% de crescimento no volume sob gestão em três anos”, diz. Além disso, surgiram novos fundos com retornos acima da meta atuarial dos planos. “A entrada em vigor da Resolução CVM 175, em outubro, vai trazer ainda maior segurança e transparência a esse mercado, com um anexo específico para a indústria de FIPs”, diz.
O cenário também ajuda, em função da perspectiva de redução do juro, o que costuma ser um momento benéfico para selecionar investimentos e significa que os institutos devem começar a se preparar previamente para enfrentar os novos movimentos dos mercados. Como exemplo de janela aberta pela política monetária, ele lembra que um dos FIPs da casa comprou, em 2016, a linha de transmissão de energia Tropicália, na Bahia. “Ganhamos o leilão naquele ano, quando o juro estava em 14,25%, taxa que depois caiu para 2%. Como resultado, vendemos o ativo depois de cinco anos com um ganho de 5,5 vezes. Um terço do retorno veio só pela compressão das taxas de juros”, afirma Rocha.
Por enquanto, a busca por maior transparência continua a ser um ponto vital para os investidores regulados, que nem sempre encontram as informações necessárias sobre as empresas investidas pelos fundos. Para quem faz relatórios semestrais de diligências, a dificuldade de acesso aos dados pode ser um problema grave. A falta de remarcação diária reduz a volatilidade dos FIPs, observa Rocha, mas, por outro lado, faz com que os preços das cotas não reflitam a real situação da gestão das empresas.
“É uma dificuldade do setor como um todo porque os RPPS, assim como os fundos de pensão, são bem regulados e nada pode sair dos trilhos”, ressalta. “Prezamos pela transparência, até porque, pelas características dos FIPs, podemos passar o ano todo sem saber se a empresa vai bem ou mal porque isso não é dado apenas pelo preço da cota”, afirma Rocha. Para contornar o problema, o gestor precisa ampliar suas ferramentas de comunicação. “Fazemos comunicação direta com investidores por meio de reuniões anuais para abrir a “porta da cozinha” da empresa e temos comunicações para atender investidores e relatórios trimestrais sobre as empresas e os fundos que gerimos”, diz. Esse trabalho ajuda a demonstrar que as diretrizes do investimento são seguidas e fornece dados para os RPPS usarem tanto em reports internos como para eventuais auditorias de órgãos reguladores.

Na Pátria Investimentos, gestora especializada em investimentos alternativos com quase R$ 140 bilhões sob gestão, o problema da transparência precisou ser enfrentado desde o princípio de sua operação, diz Roberto Cerdeira, sócio responsável pela área de novos investimentos em Logística e Transportes. “Cerca de 90% dos nossos investidores são internacionais – fundos de pensão e fundos soberanos entre outros – e desde o início tivemos que nos adaptar às demandas de transparência deles”, afirma. O que significa manter um portal, fazer relatórios trimestrais dos fundos e ter auditoria externa para validar as avaliações do gestor. “O mais importante, porém, é que na hora de selecionar gestores de FIPs o investidor verifique sua capacidade de devolver capital porque isso prova que sua avaliação estava correta”, diz. No caso da gestora, ele conta que o fundo mais antigo da casa já devolveu mais de duas vezes o capital investido.

Na área de infraestrutura, diz Cerdeira, um ativo maduro de infra pode oferecer retorno real de 7% a 10% dependendo do momento da indústria, do país e dos juros. Um ativo maduro que não tenha risco relevante nem muita coisa para ser feita na empresa, vai ficar nisso. Mas um ativo que traga risco de construção de obras (desenvolvimento), tenha uma alavancagem com estrutura que gere ganhos de capital, além de uma plataforma de crescimento futuro, é possível obter alfa e chegar a retornos de 20% a 25% reais. “Nesses casos há um prêmio de desenvolvimento, alavancagem, ganhos operacionais, crescimento e valor da plataforma porque o comprador do ativo vai olhar para a estabilidade e para as perspectivas futuras de crescimento”, explica Cerdeira.
O pipeline para os próximos cinco a sete anos enxerga um número grande de oportunidades em infra no País, informa Cerdeira. Em energia, considerando os projetos que há no mercado e a quantidade de investimento que deve ser feita, o volume necessário é de R$ 85 bilhões. Logística e Transporte soma mais de R$ 60 bi; infraestrutura de dados demanda R$ 25 bilhões e a área de serviços ambientais equivale a R$ 110 bilhões. “Não vemos um número de players relevantes com essa capacidade (empresas) de olhar oportunidades e investir, então é um período de muito gargalo para ser resolvido no País, muito projeto e pouco investidor capacitado e qualificado o que amplia o potencial de retorno”, afirma Cerdeira.