Edição 251
A valorização do dólar frente ao real em 2013, que já bateu picos de 18,1%, e que tem chances de prosseguir no curto e médio prazo com a expectativa de retirada dos estímulos por parte do Fed (Federal Reserve, o Banco Central dos EUA) à economia norte-americana, pode beneficiar as fundações que estiverem preparadas para esse movimento. Uma das opções é o aumento da exposição a ativos indexados à inflação, que devem ganhar com a apreciação cambial.
“A alta do dólar impacta o IGP-M, que depois passa para outros indicadores, uma vez que o avanço dos preços sai do atacado e vai para o varejo, e acaba atingindo a inflação oficial. No médio e longo prazo ainda faz sentido apostar na inflação”, afirma Juliano Sartório, diretor financeiro da Sarahprev.
Com o avanço na cotação da moeda americana, os custos dos comerciantes com a compra de produtos importados aumenta, e a elevação deverá ser repassada ao consumidor final e fomentar a inflação. As projeções adotadas pelo Banco Central (BC) apontam para um repasse de 0,6 ponto percentual no IPCA para cada elevação de 10% da taxa cambial.
“Em um cenário como esse, os investidores devem buscar ativos mais correlacionados com a inflação, que exerçam maior proteção contra a alta dos preços”, pondera Mário Amigo, diretor de investimentos do HSBC.
Nos últimos meses, com o início do ciclo de aperto monetário, as NTN-Bs, títulos públicos atrelados à variação de preços, tornaram-se uma espécie de “menina dos olhos” para os fundos de pensão, ao entregar taxas de retorno próxima aos 5,5%, quase o dobro do verificado até o ano passado.
Além da proteção mais segura via papéis do governo, outros ativos do mercado financeiro também oferecem boas oportunidades aos investidores atentos às variações do câmbio. “Nossos gestores de renda variável, obviamente, estão aproveitando a situação do câmbio para comprar empresas que tendem a se beneficiar das exportações, ou vender aquelas que tem elevado endividamento em dólar”, pontua Ruy Costa Neto, gerente de investimentos da Nucleos.
A análise apresenta forte variação dependendo da empresa. A calçadista Grendene, por exemplo, que exporta cerca de 25% de seus produtos, vê suas ações ordinárias (GRND3) com uma alta superior aos 30% no acumulado do ano corrente. O Ibovespa registra baixa acima dos 20% no período.
Na outra ponta dessa história aparece a Petrobras. A presidente da companhia, Maria das Graças Foster, chegou a dizer que o atual patamar do dólar não é bom e preocupa a petrolífera nacional, uma vez que aproximadamente 80% de sua dívida está atrelada à moeda americana. Nesse contexto, as ações ordinárias (PETR3) da empresa recuam cerca de 17% no ano corrente.
Opção dos BDRs – Além das ações de empresas brasileiras, os Brazilian Depositary Receipt (BDRs), que tiveram um dos melhores desempenhos no mercado doméstico nos seis primeiros meses de 2013, também aparecem como uma alternativa como consequência da alta do dólar.
“Tivemos no primeiro semestre a combinação do aumento da Bolsa americana e mais a variação do câmbio, que foi muito positiva para os BDRs. Olhando para frente, o câmbio é uma incógnita, mas não é provável que o dólar venha a diminuir muito de valor”, pontua Joaquim Levy, diretor superintendente da Bradesco Asset Manegement (Bram). O índice da BM&FBovespa que segue o desempenho desses ativos apontou crescimento de 23% no primeiro semestre do ano, contra uma queda de 22% do Ibovespa em igual período.
O índice americano S&P 500, que acumulou alta de 12,6% de janeiro a junho, em função da performance inspiradora da maior economia mundial, pode ainda não ter alcançado seu ponto máximo. “Não sabemos o quanto o S&P antecipou a aceleração da economia, mas podemos ter uma surpresa boa”, fala Levy.
Outra sugestão do diretor da Bram para que as fundações façam bom proveito do movimento cambial são os bonds de companhias brasileiras negociados no exterior, que tem pago yields de 3% a 4%. “Tem um pouco do Risco Brasil por serem empresas brasileiras, mas o investimento está em dólar. Os fundos de pensão tem que usar o espaço de poder fazer alocações no exterior, estratégias que criam um hedge que no médio prazo pode ser interessante”. Levy entende que, para as apostas de longo prazo, ativos locais ainda têm atratividade suficiente para que as fundações não necessitem sair do país, mas, para períodos mais curtos, a diversificação internacional se mostra uma alternativa interessante.
Moedas – Os gestores das fundações enfrentam dificuldades para cumprir as metas atuariais em 2013 por conta da falta de oportunidades no mercado interno, o que torna atrativa a alocação em ativos ainda pouco utilizados, como são as moedas.
“Acredito que os clientes devem considerar opções em moedas sim. A renda fixa está difícil, a variável está difícil, nos imóveis parece que chegamos ao fim de um ciclo, então outras classes de ativos ficam muito importantes para os fundos de pensão”, pondera Lauro Araújo, consultor da Luz Soluções Financeiras.
“A decisão de ficar vendido [aposta na queda da divisa] em moedas que dependem muito de commodities deu bastante resultado. Continuamos vendidos no dólar australiano e no real”, diz Luis Roberto Zaratin, superintendente de gestão de investimentos da Besaf, gestora do Banco Espírito Santo.
A apreciação na taxa do câmbio gera opiniões divergentes entre os agentes sobre as vantagens ou dificuldades a serem enfrentadas em uma possível saída ao exterior em busca de novas alternativas de investimento.
Na Funepp, a tendência é que nos próximos seis meses tenha inicio uma operação além fronteiras, e Tiago Ribeiro Costa, diretor de controle de investimentos da fundação, diz que a alta do dólar trabalha a favor da empreitada.
“Normalmente quando se observa uma valorização do dólar, temos uma tendência de queda na Bolsa. Será um hedge nesse sentido, pode ocorrer uma perda com alocações no mercado de Bolsa, mas teria a possibilidade de ganhos lá fora só pela valorização cambial”, nota Costa.
Visão diferente em relação ao mesmo assunto tem Juliano Sartório, da SarahPrev. “Um aporte no exterior nesse momento seria de certa forma ruim, já que conseguiria comprar menos dólares com o real”, fala o diretor.
Salto de patamar – Um fenômeno relativamente comum que ocorre no mercado de moedas, e que não pode ser ignorado, alerta Lauro Araújo, da Luz, é o salto de patamar. O especialista explica que as divisas tendem a trabalhar em um túnel de tendência, no qual a volatilidade é menor, mas que por vezes sofre algumas correções, que podem gerar perdas significativas aos que estiverem posicionados na ponta errada, e ganhos nas mesmas proporções àqueles que escolheram a ponta vencedora do momento.
“Quando o câmbio está dentro do túnel de tendência, a volatilidade é muito baixa, o que faz com que os investidores aumentem as posições, e de repente a volatilidade pula. Essa é uma característica em moedas, o fator salto. A cotação salta de patamares muito facilmente”, fala Araújo.
A teoria a que se refere o consultor encontra respaldo recente na própria relação dólar/real – em março, a divisa dos Estados Unidos girava ao redor de R$ 1,94, e foi para R$ 2,40 no início de agosto, incremento de 23,7% em cinco meses. “A posição percebida do risco é muito baixa para o risco real que a posição tem”, afirma o consultor.
Além disso, outro ponto que merece ser destacado, na visão de Araújo, trata do universo político no qual o câmbio está inserido. “O governo tem US$ 300 bilhões de reservas que não rendem praticamente nada. Até que ponto o governo estaria disposto a se desfazer das reservas para segurar a inflação? Se a população começar a reclamar, pode ser que o governo tente controlar a alta do dólar um pouco mais”, diz. O consultor afirma que o governo tem poder para isso hoje, mas podemos chegar a um novo patamar para o dólar, não só no Brasil mas também no mundo todo.
Na opinião de Luis Zaratin, da Besaf, o governo não deve usar grande parte das reservas para conter o dólar. “Não dá para queimar as reservas enquanto o motivo é o momento dos Estados Unidos, que sinaliza uma mudança no perfil de sua política monetária”, diz Zaratin, da Besaf. As reservas internacionais do Banco Central (BC) somavam US$ 371,96 bilhões ao final de julho, contra US$ 376,15 bilhões em igual período do ano passado.