Boa perspectiva para as bolsas | Perspectiva de queda da Selic e ...

Edição 357

Diante da perspectiva de que o juro internacional interrompa o ciclo de alta e frente às condições vantajosas do Brasil em relação a países que são seus pares, tanto em algumas variáveis econômicas quanto em estabilidade política, a bolsa brasileira é candidata a receber a próxima onda de migração do capital estrangeiro. Essa perspectiva precisa ser levada em conta nas decisões de asset allocation dos investidores locais,avalia Marcelo Rabbat, sócio responsável pelo relacionamento com investidores institucionais da gestora Vinci Partners. “Daqui para a frente, a chegada dos “gringos” é um fator importante para os institucionais brasileiros, que hoje têm uma alocação muito baixa em bolsa, na média de apenas 9%”, avisa.
Em apresentação feita aos gestores de instituições do RPPS, durante o Congresso da Abipem em Foz do Iguaçu, ele lembrou que a renda variável precisa voltar ao foco dos gestores de RPPS e dos institucionais como um todo. “Além da vantagem econômica da exportação de commodities, o Brasil está se mostrando muito melhor do que países como Índia, China e Rússia, entre outros, inclusive na questão da estabilidade democrática. Até porque, por aqui, não há ninguém ameaçando invadir o país vizinho, uma coisa que incomoda sensivelmente o investidor estrangeiro”, afirma. No momento em que o juro internacional começar a cair, será preciso ver para onde o capital irá migrar, mas ele acredita que o Brasil seja um sério candidato a receber esses recursos. “Na hora em que o estrangeiro chegar, haverá impacto importante na bolsa e nas diversas classes de ativos”, diz
O ritmo de atração do capital internacional dependerá, a curto prazo,de um dever de casa do governo federal que inclui a reforma fiscal e, a médio e longo prazos, de maior clareza sobre o cumprimento das metas de inflação e do aumento da produtividade. Ele ressalta, porém, que a preocupação com a meta de inflação precisa ser melhor qualificada, uma vez que o País seguiu o regime de metas durante 12 anos, mas elas só foram cumpridas em dois deles. O mais importante é que a nova meta seja crível.
Os últimos três anos foram, mais recentemente, talvez um dos piores períodos para a renda variável no Brasil, avalia Rabbat. E os motivos são claros: o juro real saiu de -1% para 8% e o juro nominal saiu de 3% para quase 14% num intervalo de menos de três anos, algo que nunca havia acontecido. Mas o humor mudou e isso deve acabar, seja por bem ou por mal, enfatiza o gestor. “Estamos no início de um ciclo de queda dos juros porque, se isso não acontecer, as empresas não vão aguentar”, diz.
Basta ter alguma interface com o setor real da economia para enxergar isso, até porque o juro para uma empresa listada em bolsa não é de 14% mas sim de 20%, principalmente depois do caso da Americanas. Nessa conjuntura, ele lembra que o IGPM, por exemplo, que há dois ou três anos subiu 32% em 12 meses, caminha para registrar deflação este ano. “As gestoras que trabalham com coleta diária de dados já estão começando a capturar também deflação no IPCA, o que indica a redução do juro pelo Banco Central”, afirma.
Uma fotografia da asset allocation do setor de RPPS, em dezembro de 2022, mostra patrimônio de R$ 55 bilhões, dos quais 40% estavam em títulos públicos na curva, 10% em renda variável, 21% em IMA-B,18% em DI, além de percentuais menores em crédito, exterior e estruturados. Essa alocação foi racional, até porque refletiu o aumento dos juros, mas daqui para a frente a leitura será diferente, mais positiva. “Teremos um refresco na política monetária. É importante compreender que o que aconteceu com o juro real aqui não tem paralelo na literatura econômica mundial: multiplicar por oito o juro real em três anos não existe. A situação do juro no Brasil lembra o caso de uma pessoa que foi fazer radiografia do pé e esqueceram a máquina ligada por três anos”, observa.

Para o institucional, a questão da renda variável se coloca como essencial no momento em que a alocação em bolsa está historicamente baixa. Além disso, toda vez que a expectativa de rentabilidade da bolsa está em alta, a alocação institucional está no mínimo. “Há quase uma reta decrescente nesse gráfico. Isso mostra que não dá para tentar adivinhar se a bolsa vai subir ou cair, mas é preciso ter uma alocação basal, quase permanente em renda variável”, diz Rabatt.
O processo de alta já está em curso, o mercado fala em 120 a 130 mil pontos no Ibovespa e o estrangeiro está acompanhando isso uma vez que há sinais fortes de que o juro lá fora vai parar de subir. “A alta recente na bolsa aqui, contudo, não tem acontecido como resultado da alocação da pessoa física nem do RPPS mas sim dos fundos de pensão, cuja alocação nesse mercado estava no mínimo do minimo”, ressalta.
A volatilidade da bolsa incomoda o participante do RPPS e dificulta as decisões da gestão em relação a essa classe. Para entrar de forma organizada na bolsa, Rabbat sugere um tripé de fatores que funcionem como proteção: tomar a decisão de alocar na classe de renda variável – seja diretamente ou escolhendo gestores; avaliar a capacidade da gestão fazer caixa rapidamente e, em terceiro lugar, a compra de proteção,via derivativos, para mitigar o impacto das piores quedas do mercado. Esse tripé consegue assegurar uma redução de volatilidade na gestão de renda variável.
Ter agilidade para fazer uma gestão adequada de caixa é essencial, mas isso não pode ser feito via fundo, porque o resgate aí acontece em D+30 a D+60, tempo demais caso seja preciso sair da bolsa.” O ideal portanto é alocar um pedaço em gestores, um pedaço em ETFs, que têm prazo de resgate em D+2 e D+3 e garantem a liquidez que for necessária, com a vantagem adicional de poderem ser alugados, com rentabilidade de 2% a 4% ao ano”, afirma. A terceira perna é a compra de proteção via derivativos, que precisa ser feita por meio de uma política ao longo do tempo. Essa proteção, diz Rabbat, fica barata porque é feita contra sinistros remotos, eventos de pouquíssima probabilidade.
No período de 2013 a 2022, o resultado acumulado em renda variável mostra os retornos das diferentes classes de fundos oferecidos pelos gestores. Os fundos long biased (que podem ficar comprados e vendidos em bolsa) renderam 309%, os fundos de dividendos renderam 144% e os fundos long only, com 137%, os fundos Ibovespa com 93% e os fundos small caps com 67%. “Os fundos long biased ainda são uma questão difícil para os RPPS, mas os demais tiveram resultados relevantes também. O importante é olhar para essas janelas, além de ter as proteções por meio de caixa e derivativos”, afirma.

Na avaliação feita por Clayton Calixto, especialista de portfólio da Santander Asset Management, “o atual cenário ainda é de incertezas muito grandes aqui e lá fora, com juros elevados tanto no Brasil como em outros países, mas o próximo passo que enxergamos é uma redução de juros no Brasil iminente nos próximos meses”, afirmou durante o mesmo painel. Uma perspectiva que aumenta a importância da diversificação de investimentos por meio da asset allocation. “É preciso colocar a diversificação em primeiro plano e saber como balancear isso no dia a dia. A principal questão é saber como reduzir o risco da carteira por meio de uma alocação em produtos bem diversificados dentro de um mesmo veículo”, diz.
Na asset, esse processo leva em conta três fontes de retorno, de curto, médio e longo prazos. No longo prazo (três a cinco anos), essas fontes são consideradas estruturais, olham para a economia local e para o exterior, e definem a base das teses de investimento. A médio prazo (18 a 24 meses) o viés é conjuntural e no curto prazo (de semanas até dois a três meses), a visão é tática, em busca de oportunidades abertas pela política monetária.
Uma carteira diversificada, usada como exercício para avaliar os resultados da asset allocation ao longo dos últimos cinco anos, tem 30% dos ativos aplicados em CDI; 20% atrelados ao IMAB5 e 20% ao IRFM, ou seja parcela atrelada aos juros totalizou 70%. Os outros 30% são mais diversificados: 10% em cada uma das três classes: hedge funds/multimercados, bolsa local e 10% bolsa externa. “Em cinco anos passados (desde 2018) essa carteira mostra queda muito forte da bolsa por causa da Covid, ocorrida entre janeiro e março de 2020, mas com recuperação ao longo do tempo, e a diversificação garantiu melhor retorno nesse horizonte de tempo”, diz. A carteira rendeu 51,6% contra 39,9% do CDI nesse período.

A adoção de estratégias adequadas de asset allocation pelas instituições do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) é um dos fatores que podem ajudar a equilibrar melhor as possibilidades de retorno dos investimentos dentro das bandas de alocação permitidas pela regulação do setor. A avaliação é de Jefferson Veiga, responsável pelo segmento institucional para clientes regulados da Itaú Asset Management, que participou de painel sobre o tema durante o 56º Congresso da Abipem em Foz do Iguaçu.
Na comparação entre as oportunidades de ganho e de defesa (hedge) dos investimentos entre os fundos de pensão e os RPPS, ele observa que os fundos de pensão possuem hoje mais ferramentas para poder transitar no mercado, enquanto os RPPS sofrem os efeitos de mais amarras regulatórias. “Por outro lado, os RPPS contam com uma graduação da legislação que permite a cada um deles atuar de forma diferente em cada um dos segmentos de ativos, desde que cumpram determinados pré-requisitos. Alguns deles podem investir mais em exterior ou renda variável do que outros, por exemplo”, diz.
Essas amarras compõem um desafio muito maior para os RPPS explorarem determinados temas de investimento que não são permitidos pela legislação. Além disso, de forma secundária, a legislação também exige que eles sejam qualificados, de acordo com critérios legais, para que possam seguir determinadas estratégias, o que restringe a diversificação. ”Daqui para a frente, como resultado da regulação, veremos um descolamento entre aqueles que estão qualificados para atuar em mais mercados, e os demais, não qualificados, que ficarão para trás”, afirma.
Sem discutir o acerto da legislação, Veiga lembra que os gestores dos institutos precisam saber como agir dentro desse modelo e buscar equilibrar a situação por meio dos próprios investimentos. Como a maior parte dos RPPS está com alocação muito baixa em renda variável, por exemplo, seria possível usar mais essa banda de alocação. “O asset allocation resolve isso de alguma forma, ainda que não seja possível alocar 30% ou 35% nessa classe, mas são poucos os que estão full alocados em renda variável hoje, até porque é necessário também fazer a ancoragem do portfólio de acordo com as condições macroeconômicas”, diz. Utilizar limites maiores depende também do desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro, então não há uma resposta certa única.
O asset allocation, assim como a leitura correta dos cenários, é essencial para proteger o portfólio em momentos de turbulência como a pandemia e a volta da pandemia. “Normalmente nos períodos em que ocorrem eventos desse tipo há receio de manter posições e manter posições às vezes é o que salva o resultado da alocação de longo prazo”, afirma.