Uma disputa sem hora para acabar | Batalha dos participantes cont...

Edição 112

Ainda é pouco se comparado ao montante que lhes é devido, mas os mais de 3,4 mil participantes do fundo de pensão da falida Mappin Lojas de Departamento – em liquidação extrajudicial –, já têm o que comemorar. Dos R$ 10 milhões em discussão na Justiça, R$ 3 milhões provenientes de aplicações em fundos imobiliários já foram recuperados. Principal patrocinadora da Sociedade de Previdência Privada Mappin, a Casa Anglo Brasileira S/A, um ícone de São Paulo, sucumbiu, em julho de 1999 sob o peso de um bilhão de reais em dívidas com bancos e fornecedores, impostos atrasados e passivos trabalhistas e cerca de 400 pedidos de falência.
Todavia, a dura batalha da entidade no sentido de recuperar o restante entra no seu terceiro ano e, tudo indica, ainda está longe de terminar. A entidade teve negado em primeira instância seu pedido de habilitação de crédito perante a massa falida da patrocinadora com base em contratos celebrados entre ela e a fundação. “Os juízes e o síndico da massa falida alegaram que houve vício na origem desses créditos”, explica o advogado do Mappin Previdência e especialista em direito previdenciário, André Luiz Marques, que recorreu da decisão.
Agora, a batalha judicial prossegue em duas frentes: contra a massa falida do Mappin Lojas de Departamento e contra o Banco Crefisul, outra empresa do grupo do empresário paulista Ricardo Mansur, adquirida por ele em março de 1996 e liquidada pelo Banco Central três anos depois. Aliás, foi no mesmo ano do Crefisul que Mansur adquiriu a loja de departamentos Mappin, cujo forte era vender eletrodomésticos, eletroeletrônicos, roupas, louças e panelas, e vinha ainda registrando um boom de vendas em função do advento, em 1994, do Plano Real.
Mesmo diante da ressaca dos primeiros anos do real, Mansur insistiu no segmento varejista e comprou a Mesbla, já praticamente falida, sem crédito, sem estoque e com uma dívida superior a R$ 300 milhões. Para revitalizá-la, o empresário passou a utilizar-se dos recursos do Mappin e do seu Crefisul. Não deu outra!

Crédito previdenciário – Em fevereiro próximo, está previsto mais um round nesse imbróglio jurídico envolvendo a fundação: o advogado da Sociedade de Previdência Privada Mappin, André Luiz Marques, desenvolve uma ação com embasamento na responsabilidade objetiva da patrocinadora com a entidade, conforme prevista na lei que rege os fundos de pensão. “Como encontramos dificuldades de habilitar o crédito junto à massa falida do Mappin, vamos buscar esse direito na forma de crédito previdenciário, que se equipara ao crédito trabalhista, portanto com privilégio perante o restante dos credores.”
Em suma, a entidade pretende questionar a responsabilidade do Mappin, principal patrocinador, portanto responsável pelos ativos da entidade, que investiu em créditos do Leasing Crefisul, do próprio grupo Mappin, e que também entrou em liquidação extrajudicial junto com o Banco Crefisul.
O liquidante da fundação, Gilson Ali Ganen, que assumiu em agosto de 1999 indicado pelo Ministério da Previdência Social, explica que a patrocinadora não vinha seguindo as normas de diversificação de investimentos previstas pelo Conselho Monetário Nacional, e investiu R$ 8 milhões em debêntures do Leasing Crefisul.
Pior: desse montante, R$ 5,8 milhões foram aplicados a 20 dias da liquidação do Banco Crefisul. “Um dos motivos que levaram a fundação à insolvência foi a liquidação do Crefisul que, aliás, deixou um rombo substancial em outros fundos de pensão”, comenta Ganen, se referindo à Funcef e CEB (de Brasília), que também movem, individualmente, ações judiciais contra o Crefisul para recuperarem seus investimentos.

Efeito ComShell – Outra boa notícia para os ex-participantes da Fundação Mappin: cerca de R$ 600 mil podem entrar no seu bolso bem mais cedo do que se imagina, provenientes da provisão feita para pagamento do Imposto de Renda. Depois do julgamento do STF no caso da Comshell, que conseguiu a imunidade tributária por contribuir sozinha com o plano de previdência dos funcionários, a fundação do Mappin dá largada a uma ação no sentido de recuperar o dinheiro (100% provisionado), uma vez que, a exemplo da fundação da Shell, apenas o Mappin contribuía para o fundo de pensão dos funcionários.
De qualquer forma, apenas os 50 assistidos, que têm a preferência em caso de ganho das ações ajuizadas, estão vendo a cor do dinheiro não têm do que reclamar. Desde a liquidação da empresa, a entidade vem garantindo a esses aposentados um pagamento mensal bruto a título de adiantamento de reserva matemática, de R$ 70 mil, resultado de aplicações dos ativos da entidade, que somam perto de R$ 3,5 milhões. “Estamos inserindo os 800 ex-funcionários do Mappin, que foram absorvidos pelo Grupo Pão de Açúcar na massa de credores”, diz Ganen.

Conselho de Gestão inocenta ex-dirigentes

Em decisão de dezembro último o Conselho de Gestão da Previdência Complementar (CGPC) isentou de qualquer responsabilidade pela liquidação extrajudicial da Sociedade de Previdência Privada Mappin seis dos seus dez ex-dirigentes. Isso, entretanto, não acaba com os problemas deles, pois tão logo foi publicada a decisão do Conselho de Gestão a Procuradoria do Estado decidiu mover ação de responsabilidade civil e de arresto dos bens contra todos.
No entender do CGPC, os ex-dirigentes Antonio Carlos Rocha, Carlos Antonio Rocca, Eliseu Martins, Marcos Lima Verde Guimarães, Nelson Gebara e Walter Zanatta, foram liberados da acusação de que teriam sido os responsáveis pela liquidação extrajudicial da fundação, decretada em agosto de 1999. Com exceção de Marcos Lima Verde Guimarães, todos os demais executivos se desligaram da fundação entre 1994 e 1997, portanto antes ou logo após a transferência de controle para Ricardo Mansur, no final de 1996, e antes da liquidação extrajudicial da Mappin Previdência, ocorrida em agosto de 1999.
Uma comissão de inquérito constituída pela Secretaria de Previdência Complementar (SPC) reconheceu que a liquidação extra-judicial da MSPP foi causada pela liquidação do Banco Crefisul, em março de 1999, e pela falência da Mappin Lojas de Departamento, em julho de 1999, ambos do Grupo Mansur, que comprometeram quase 75% dos ativos da fundação Mappin Previdência. Esses ativos foram aplicados no segundo semestre de 1998 e no início de 1999, quando os ex-diretores acusados não estavam mais na administração do fundo.
O laudo técnico atuarial, anexado ao recurso, mostrou também que a situação econômica, financeira e atuarial da MSPP foi regular até dezembro de 1997, e inclusive comprovou a existência de superávit técnico no período de 1994 a 1997. A comissão constatou ainda que o único ativo comprado pelo fundo até 1997, quando os ex-diretores ainda comandavam a fundação, era uma carteira de ações da Casa Anglo cujo valor se enquadrava nos limites legais.
A defesa dos ex-dirigentes mostrou que não havia razões para vender as ações da Casa Anglo, que estavam em carteira, entre 1994 e 1997, porque os balanços da empresa mostravam resultados positivos no período. Além disso, os papéis da empresa eram recomendados pelas áreas de pesquisa de instituições financeiras, como a Salomon Brothers e Garantia e a consultoria Lopes Filho.