Uma conta que não fecha | Justiça resiste à cobrança de contribui...

Edição 118

Bem que o Paraná, a Bahia e alguns poucos estados tentaram resistir, mas ao final dos mandatos dos seus governadores a cobrança das contribuições dos inativos está deixando de ser recolhida. O Paraná vem sofrendo sucessivas derrotas na Justiça e diversas categorias já conseguiram vetar a cobrança. Por isso, o governo paranaense deverá deixar de recolher a contribuição nos próximos meses. “Estamos propondo a suspensão da cobrança para todas as categorias”, afirma Mauro Ribeiro Borges, diretor jurídico da Paraná Previdência, fundo dos servidores públicos do Paraná.
O Paraná foi um dos estados que continuaram arrecadando as contribuições dos inativos, apesar da guerra de liminares com o Supremo Tribunal Federal (STF) e demais instâncias, que se desenrola desde 1999. A contribuição deveria representar a arrecadação de 11,2% da folha de pagamentos com os inativos, mas, devido às derrotas na Justiça, os valores recolhidos já não chegam aos 3%. “Não está valendo a pena. Até para evitar o desgaste devemos deixar de recolher a contribuição”, revela Mauro Borges.
Com isso, o estado deixará de recolher cerca de R$ 10 milhões mensais, um impacto e tanto no caixa do tesouro estadual. A ausência de contribuição também afetará o equilíbrio atuarial da Paraná Previdência que não conseguirá cobrir o pagamento dos benefícios dos futuros aposentados. “Se continuar esta situação, a contribuição dos ativos deverá subir de 11% para 15% e o custeio do estado deverá estourar”, afirma Borges.
Até há pouco, a Bahia era o único que ainda não tinha sofrido uma derrota na Justiça. Contudo, no final de março o Tribunal de Justiça local acatou por unanimidade 13 mandados de segurança impetrados por sindicatos, associações e pessoas físicas.
A decisão do TJ beneficia cerca de 500 pessoas e abre precedente para que todo aposentado e pensionista da Bahia recorra à Justiça contra a cobrança do Fundo Previdenciário da Bahia (Funprev), o que já vem ocorrendo entre diversas categorias de servidores inativos. A alíquota de contribuição passou a ser cobrada em 1996, junto com o novo plano de saúde dos servidores, o Planserv.
O projeto do governo estadual baiano era de que o desconto fosse progressivo e atingisse 17% em 2005. Atualmente, o desconto em folha de pagamento é de 9,5%, incluindo o Planserv, uma arrecadação mensal de cerca de R$ 6,2 milhões.

Reversão – As últimas esperanças dos estados para manter ou voltar a recolher alíquotas dos inativos seriam o julgamento de mérito do STF da liminar, que impede a cobrança, ou a aprovação de nova regra no Congresso Nacional. Mas as perspectivas para reversão da situação ainda este ano não são nada boas. O Supremo não apresenta nenhuma previsão para analisar o tema. E a situação do cenário político está extremamente desfavorável.
Em ano eleitoral as matérias impopulares costumam sair da pauta do Congresso Nacional. Com a polêmica questão da contribuição dos servidores inativos não é diferente. O governo federal, que tenta viabilizar a contribuição desde 1995, dá mostras de que desistiu de aprovar a Proposta de Emenda Constitucional PEC 136, que propõe a regulamentação da cobrança. Depois de sucessivas derrotas no Congresso e no STF, parece não disposto a insistir na questão.
Com isso, governo federal, estados e municípios deixam de arrecadar entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões por ano. “Não há perspectiva de voltar a discutir o tema no Congresso ainda este ano e acredito que ninguém defenderá abertamente a cobrança dos inativos durante a campanha”, prevê Vinícius Pinheiro, secretário de previdência social do Ministério da Previdência e Assistência Social.
Desta forma, quem quer que vença a disputa eleitoral não deixará de lado a questão. “Independentemente do partido na presidência, a cobrança dos servidores inativos terá de ser regulamentada”, prevê Flávio Martins Rodrigues, presidente do Instituto Cultural de Seguridade Social (ICSS).
Rodrigues explica que a ausência de contribuição é um incentivo à inatividade dos servidores, o que contraria a tendência mundial que aponta para uma aposentadoria mais tardia. Ele próprio enfrentou a questão quando presidia o Rio Previdência, fundo dos servidores do estado do Rio de Janeiro. O estado foi obrigado a deixar de recolher a contribuição dos inativos, uma prática de muitos anos, devido a uma liminar do Supremo Tribunal Federal concedida em setembro de 2000.
O Supremo Tribunal Federal já havia derrubado a cobrança em meados de 1999 através de liminar que impedia o recolhimento dos inativos da União. O que o governo federal não esperava era a proibição do recolhimento para os servidores inativos dos estados, o que era praticado há muitos anos.
Desta forma, o Supremo começou a conceder liminares vetando a cobrança nos estados durante o ano 2000. Isso provocou uma reação dos governadores que se reuniram para pedir reversão da situação. Eles chegaram a produzir uma carta para pedir a volta da cobrança e enviaram para o Ministério da Previdência e Assistência Social, mas não houve resultado prático com tal atitude.

Discussão – Do ponto de vista legal, a ausência de cobrança dos inativos contraria a regra constitucional que determina a paridade entre os rendimentos dos servidores públicos. “Na condição de servidor ativo, estou me sentindo injustiçado porque o benefício de um inativo é maior que o meu rendimento”, exemplifica Mauro Borges, da Paraná Previdência.
Já do ponto de vista atuarial, a concessão do benefício integral para o inativo representa uma conta que não fecha. Quem se aposenta hoje contribuiu, na melhor das hipóteses, com 10% do salário durante 30 anos. “Se o aposentado tiver sobrevida superior a 25 anos, sem a contribuição não há sistema de capitalização que possa cobrir os benefícios”, explica o professor e consultor Benedito Passos, da Coppetec do Rio de Janeiro. Passos defende o princípio da justiça contributiva, no qual o benefício varia segundo a reserva acumulada do servidor público.
O consenso dos estados em torno da importância da contribuição dos inativos parece transcender até as diferenças partidárias. Até alguns governos estaduais de oposição concordam com a posição da administração federal e defendem a necessidade de recolher as contribuições dos inativos.
Alagoas, cujo governador pertence ao PSB, está criando um fundo de previdência e seu cálculo atuarial conta com a entrada de recursos das alíquotas dos inativos. “Sem a contribuição dos inativos ficará difícil viabilizar o fundo previdenciário”, acredita Valter Oliveira Silva, secretário de administração de Alagoas.