Edição 78
O apetite dos fundos de pensão por aplicações em papéis privados, em especial em debêntures e commercial papers, vem crescendo desde o início do ano. A queda na taxa de juros e o aperto das metas atuariais está pressionando as fundações a procurarem novas alternativas de investimentos. E para muitas fundações que ainda estão temerosas de um movimento mais consistente em direção à renda variável – temor esse decorrente de crises passadas nas bolsas, de alta nos índices de inflação, de falta de liquidez do mercado acionário ou da cobrança da CPMF –, as debêntures e commercial papers das boas empresas privadas estão sendo uma saída.
“Acreditamos que as debêntures constituem atualmente uma boa alternativa para diversificar nossa carteira de renda fixa, fugindo da alta concentração em títulos públicos”, revela Martin Glogowsky, diretor financeiro da Fundação Cesp. O fundo de pensão das empresas energéticas de São Paulo possui hoje cerca de R$ 35 milhões em recursos aplicados em papéis de emissões privadas, mas este valor pode subir muito mais.
A área financeira da fundação deu sinal verde aos gestores de seus fundos exclusivos para que adquirissem os 10 papéis emitidos nos últimos nove meses. “O volume de debêntures em nossa carteira pode elevar-se até um patamar de 7% do patrimônio”, afirma Glogowsky. Não é pouco, considerando-se que a fundação possui um patrimônio de aproximadamente R$ 2 bilhões.
Glogowsky explica que as debêntures permitem combinações bastante flexíveis de prazos e de taxas, devido à diversidade de papéis que estão sendo emitidos no mercado interno nos últimos meses.
Outra fundação que vem aumentando os investimentos em debêntures é a Valia, fundo de pensão da Vale do Rio Doce, Valesul e Cenibra. A entidade renovou as aplicações em debêntures da empresa ferroviária FCA no início do ano e comprou papéis de emissão da Marlin, que é uma companhia ligada a Petrobrás. A aquisição das debêntures da Marlin foi realizada no último mês de junho e o fundo de pensão está analisando no momento outros papéis de empresas que atuam na área de project finance.
Atualmente a Valia possui cerca de R$ 50 milhões investidos em debêntures e pretende elevar o percentual deste tipo de papel dentro de sua carteira. “Com a rentabilidade decrescente dos títulos públicos e demais papéis de renda fixa tradicionais, as emissões privadas tornam-se uma opção atraente para os fundos de pensão”, declara Manoel Cordeiro, diretor financeiro da Valia. Dentro da carteira de renda fixa da fundação, que concentra 66% de seu patrimônio, os papéis de emissões privadas devem ganhar espaço nos próximos meses.
“Se os parâmetros de rentabilidade, segurança e liquidez estiverem condizentes com nossa estratégia de investimentos, não teremos problema em aumentar os investimentos em debêntures de empresas privadas”, revela Cordeiro. Mas em todos os casos, explica o dirigente, a fundação dará atenção especial à qualidade e solidez da empresa que está emitindo as debêntures, a exemplo do que ocorreu com a Marlin, que possui um baixo risco de crédito por estar vinculada à Petrobrás.
Risco de crédito – Ainda que a taxa oferecida pelo papel de emissão privada seja atraente e o prazo mostre-se condizente com as necessidades da fundação, a maior preocupação na hora de adquirir uma debênture é o risco de crédito. Por isso, os fundos de pensão, assim como outros investidores, sempre recorrem às análises de risco sobre a empresa que está emitindo os papéis. “Primeiro esperamos o aval de nossos gestores externos e depois analisamos os papéis internamente, antes de aprovar a aquisição de debêntures”, revela Martin Glogowsky.
O diretor financeiro da Fundação Cesp explica que apenas autoriza os administradores externos a comprarem determinados papéis, mas não especifica a quantidade que deve ser adquirida. “Apenas dizemos aos gestores de nossos fundos de investimento que ele pode, se quiser, incluir este ou aquele papel à carteira”, afirma.
A Valia também utiliza a análise dos gestores externos para definir quais os papéis que devem entrar na carteira de investimentos da fundação. Para o presidente do fundo de pensão da Vale, Eustáquio Lott, o risco de crédito das debêntures, em geral, tem uma tendência a diminuir devido à própria situação da economia nacional que está incentivando a captação interna de empresas que antes buscavam recursos no exterior. “Estamos torcendo para que se aumente o número de emissões de papéis de empresas mais confiáveis”, afirma Lott.
A desvalorização cambial e a elevação do dólar frente ao real fez com que as empresas reduzissem a prática da captação externa. “A desvalorização de nossa moeda trouxe de volta para o mercado de debêntures empresas saudáveis com risco de crédito menor”, diz Silene Moneta, gerente de distribuição de renda fixa do Bozano, Simonsen. Quando o dólar estava em baixa e a renda fixa em alta, as emissões de debêntures voltadas para os investidores internos tornaram-se muito raras, pois era muito mais vantajoso captar lá fora em dólar.
Contraponto – Outro elemento que é decisivo no processo de análise de uma emissão privada é a taxa oferecida pelo papel e, neste aspecto, o mercado ainda precisa evoluir bastante. “Enquanto não houver curvas de juros mais longas para o mercado, fica difícil saber quanto deve pagar uma emissão privada”, declara Jair Ribeiro, gerente da área de risco da Eletros, fundo de pensão da Eletrobrás. Ele defende que a renda variável, no momento, é o investimento mais adequado para promover a diversificação das carteiras das fundações, porque permite uma melhor mensuração da expectativa de desempenho.
Outro problema da aquisição de debêntures, apontado por Ribeiro, é a ausência de uma prática de rating de papéis de emissões privadas para auxiliar na classificação do crédito da empresa. Enquanto não houver o maior desenvolvimento do mercado de debêntures e commercial papers, o gerente da Eletros acredita que não vale a pena correr riscos neste tipo de papel.
Para o vice-presidente de institucionais do Chase, Adauto Martins, o problema da dificuldade de projetar os juros em um horizonte de tempo mais longo está deixando de existir. Isso porque o Tesouro Nacional já começa a trocar as moedas de privatização por novos títulos com duração de 5 a 7 anos. “O governo começa a dar sinais mais consistentes de como serão as taxas de juros no futuro”, explica.
Por enquanto, a maioria das emissões de debêntures estão sendo realizadas com taxas indexadas ao CDI. Os papéis emitidos pela Klabin, por exemplo, captaram R$ 150 milhões oferecendo 103,5% do CDI. “Com uma taxa que nem era tão alta, as ofertas ultrapassaram a emissão prevista”, conta Martins. Ele ressalta que recebeu propostas de 30 investidores com a taxa de 103,5%, que se situa apenas 1,5% acima do título público do governo.
A próxima rodada de emissões de debêntures, prevê o profissional do Chase, já deverá contar com uma maior quantidade de papéis indexados aos índices de inflação. Para os fundos de pensão que possuem metas atuariais atreladas ao INPC ou ao IGP-M pode ser atraente investir em papéis indexados que ofereçam uma taxa adicional além dos índices. Esta taxa adicional, porém, deverá girar em torno de 15% ou mais para atrair as fundações.