Sinais não são claros para 2023 | Para as empresas de gestão, a g...

Edição 353

Com R$ 1,3 bilhão em portfólios de investment solutions para institucionais e cerca de R$ 3,2 bilhões ao todo em investimentos internacionais, a Schroders vê o desempenho desse mercado em 2022 como reflexo de uma conjunção negativa que não ocorria há muito tempo no mundo e espera em 2023 um ano melhor, mas destaca o fato de que a recessão americana ainda não está precificada, segundo explica o country head e CFA da gestora no Brasil, Daniel Celano. “Quando olhamos para a renda fixa, é possível enxergar estratégias com baixo risco (títulos soberanos) que pagam 4% a 5% ao ano, mas em relação à renda variável é impossível cravar resultados porque ninguém sabe dizer qual será a dimensão da recessão dos EUA”, aponta. Se a retração não for muito severa, o mercado retomará o apetite por esses investimentos. “Este ano deverá ser melhor do que o passado, então é importante estar alocado em exterior, ainda que seja aos poucos”, sugere. Como a recessão americana é uma variável em aberto, o ideal é apostar em estratégias multimercados quantitativas, que têm ido bem ao menos neste primeiro mês do ano.
Os fatores externos a serem considerados incluem a equação inflação/juros/recessão; mas também a questão geopolítica, longe de ser resolvida, e a incógnita sobre a abertura efetiva ou não da economia chinesa. “O mercado demonstra hoje vontade de ter esse rally e em janeiro já vimos algumas propostas para mandatos internacionais começarem a andar porque o cenário local preocupa em relação à inflação e à situação fiscal do País e o mercado não gosta de incertezas”, diz.
Responsável pela gestão de fundos internacionais diversificados -exclusivos, abertos ou de solutions, para bancos, alocadores e institucionais-, a gestora perdeu recursos por conta dos retornos negativos de alguns portfólios e da redução da captação no ano passado, em linha com o que aconteceu nesse mercado de modo geral, mas “teve um pouco de tudo nos portfólios e, na comparação com os nossos pares, perdemos menos”, diz Celano.
Ele lembra que o movimento feito pela Vivest logo no início de 2022, ao vender a maior parte de sua posição no exterior, abalou esse mercado. Excluído esse impacto e olhando apenas para a área de solutions, a gestora conclui que teve um saldo positivo em US 40 milhões no ano, com performances bastante diferenciadas para os diversos fundos. “O nosso negativo foi em linha com o mercado e os resultados positivos vieram de decisões acertadas que tomamos, além de termos uma base de fundos muito diversificada”, afirma. As carteiras da gestora estão um pouco mais defensivas em relação aos EUA devido à dificuldade para reprecificar a recessão.
Avaliado como muito difícil para estratégias internacionais, 2022 trouxe uma dose extra de sofrimento para os investidores que mantinham portfólios tradicionais, com o mix básico de 40% e 60% entre renda fixa e renda variável e amargaram retornos negativos de dois dígitos, avalia Luiz Fernando Pedrinha, head da área de institucionais da casa. “Já nas carteiras exclusivas, que usam estratégias mais sofisticadas, o ano foi favorável”, diz. No segmento de global equities e de tecnologia, os resultados foram fracos, mas os mandatos de solutions da gestora são mais defensivos e alguns deles conseguiram retornos positivos entre 3% e 5%. “Em 2022 ficamos underrated em ações de tecnologia e agora estamos cortando isso para retomar esses ativos aos poucos, à medida em que eles têm seus preços penalizados, mas a seleção é feita como cherry picking, não em busca de beta mas sim de alfa, com mais setores de growth”, explica Pedrinha.
Alguns portfólios da casa aumentaram mais o crédito/renda fixa porque a visão é de risco soberano baixo, e há ainda 10% das estratégias dedicadas a temas específicos, como a alocação em ativos ligados à transição energética. “Estamos menos otimistas em relação à Europa e a visão geral é não ficar muito exposto a beta porque falta certeza também sobre a China mas não se trata de ter zero beta. Nossa visão é um pouco mais construtiva para este ano”, afirma Celano.

O investimento no exterior viveu uma reversão de expectativas entre o período muito bom de 2020/2021, com expressiva captação de recursos de pessoas físicas e institucionais, e o ano de 2022, em que essa parte da indústria de fundos deu alguns passos para trás e reduziu volumes. “Deixaram de entrar recursos e uma parte deles saiu. As alocações estavam muito concentradas em EUA e Europa, que sofreram muito; aumentou a percepção global de risco para os países desenvolvidos e de março em diante começaram os resgates líquidos”, observa Aquiles Mosca, diretor comercial, de marketing e digital da BNP Paribas Asset Management no Brasil. A asset, que tinha patrimônio líquido pouco superior a R$ 1 bilhão em três fundos de exterior em 2021, viu esse volume ser reduzido para R$ 600 milhões atualmente.
Em 2023, ele lembra que há alguns pontos favoráveis mas também ventos contrários. Entre os aspectos a favor da diversificação global, do lado doméstico brasileiro há ainda muita incerteza quanto à nova âncora fiscal e muita discussão sobre inflação e possível novo aumento de juros no futuro. “Isso pode motivar uma busca por ativos que sejam um porto seguro lá fora e o comportamento do mercado em janeiro também jogou nesse sentido”, diz.
Os ventos contrários, contudo, seguem fortes. Entre eles, o juro real ainda muito elevado no mercado local, com uma taxa real de 6% ao ano, o que garante as metas atuariais de quase todas as fundações e tende a seguir prevalente. “Recomendamos aos nossos clientes, porém, que não saiam completamente de suas posições mas que as vejam como alocações estratégicas, estruturais, porque se os fatores de risco doméstico se materializarem, o exterior tende a proteger as carteiras, até pela descorrelação”, afirma. Se a parcela investida for muito pequena, há espaço para aumentar um pouco e, para quem está zerado, o momento é interessante para fazer uma pequena posição e “colocar o pé lá fora”.
Se a inflação e o aumento de juros no cenário global preocupam, há outros fatores que podem abrir oportunidades, como os fundos temáticos de sustentabilidade (ESG),voltados à transição energética. “Na Europa, esses projetos aceleraram muito e tanto a rentabilidade quanto às margens do setor estão elevadas”, diz. Tanto é que a asset no Brasil prepara um fundo que irá comprar, a partir de fevereiro, cotas de um de seus fundos que já existe na Europa e investe 100% no tema de energy transition.

A surpresa inflacionária que derrubou os mercados de renda fixa e renda variável em 2022 dá lugar a um cenário mais positivo este ano, com sinais de término do ciclo de aperto monetário pelos bancos centrais nos próximos meses, acredita Marcelo Guterman, especialista em investimentos de renda fixa e crédito da Western Asset no Brasil. “Ainda que o Banco Central Europeu demore um pouco mais, porque eles estão seis meses atrasados em relação ao Fed, o ciclo de alta do juro americano deverá terminar no final deste primeiro trimestre e, quando isso acontecer, o mercado naturalmente começará a se perguntar quando terá início o ciclo de queda dos juros, o que é muito mais interessante”, diz. A casa aposta em cenário mais positivo para os ativos globais, até porque a reabertura da China projeta uma recuperação forte da economia global, que aliás já se reflete nos preços das commodities.
Ele admite que o rally verificado neste início de ano no mercado de bonds poderá não manter o mesmo ritmo ao longo dos próximos meses. E no mercado acionário, a retomada levará um pouco mais de tempo porque ainda há muita incerteza sobre se haverá de fato recessão. “Acreditamos que haverá uma pequena recessão, mas nada que comprometa as empresas a longo prazo”, diz. Apesar dos sinais favoráveis, o desempenho negativo dos ativos em 2022 machucou muito o investidor que optou pela diversificação internacional, que sofreu perdas significativas. “Além disso, o investidor aqui tem o juro real dos títulos públicos como competidor, então fica difícil manter a fé na importância de diversificar em outros mercados”, reconhece. Olhando pelo ângulo do risco, a situação muda de figura porque a Selic não está elevada sem motivo. “Há maior risco de inflação e de descontrole fiscal e é nesse ponto que entra a diversificação internacional, como proteção contra volatilidade nas carteiras locais”, afirma.
Com dois fundos de ações – um de BDR e outro de S&P -, a gestora considera que a maioria das fundações manteve suas posições globais, até porque sair nos patamares mais baixos de preços não seria muito adequado. “Algumas delas reviram suas alocações e então ainda lambendo as feridas provocadas pelas perdas, é verdade, mas a maioria manteve e agora a renda fixa está se recuperando. A renda variável também reagirá, porque ambos os mercados sofreram bastante, em especial nos ativos das empresas de crescimento”, diz.
A questão geopolítica criada pela guerra entre Rússia e Ucrânia já está devidamente precificada pelo mercado, acredita Guterman. “Temas como os preços do petróleo e o impacto das sanções contra a Rússia estão precificados e o conflito agora só poderá escalar caso sejam usados armamentos não convencionais, o que levaria a uma mudança de patamar na guerra”, diz. Exceto por essa complexa possibilidade, a avaliação é de que os agentes econômicos já se adaptaram aos efeitos econômicos do conflito, em especial a Alemanha, que equacionou as dificuldades no fornecimento de energia. “A guerra agora é de desgaste e poderá durar anos, mas não mudará nada para os mercados globais”, avalia.

O balanço recente dos investimentos no exterior mostra resultados muito bons em 2021 e uma forte correção em 2022, por conta das mudanças nas políticas monetárias dos EUA e outras economias. “A atuação do Fed provocou uma reprecificação que fez sofrerem ativos de renda variável e de renda fixa ao mesmo tempo, com o aumento dos prêmios de risco, mas em 2023 já está visível um certo alívio dos riscos que estavam embutidos nos preços”, avalia Daniel Dantas de Castro, portfolio manager da Santander Asset Brasil.
Havia uma previsão de que o Fed elevasse o juro acima de 6%, mas isso não se materializou, diz o gestor, e os mercados estão saindo de um cenário mais pessimista. Há até quem diga que não haverá recessão. “Em janeiro, vieram boas notícias e a revisão dos dados da atividade econômica é positiva, o juro não está tão alto como se previa e os preços de energia estão um pouco mais baixos do que no ano passado, com algum alívio na inflação”, destaca. As bolsas europeias têm reagido bem à reabertura da China e o inverno na Europa tem sido mais quente do que se esperava, ajudando os países a lidarem melhor com a questão energética. Como resultado, pode-se dizer que a Europa fez a sua lição de casa e teve um bom começo de ano, mas o mundo segue com o juro real positivo, em termos nominais e reais. “Ainda assim, a expectativa é de que haja apenas uma alta do juro no primeiro trimestre, que será seguida por estabilidade e esse cenário mais otimista já está bem precificado”, acredita o gestor.
Um ponto de atenção é o acompanhamento “com lupa” dos lucros e receitas das empresas no quarto trimestre de 2022 para avaliar impactos de uma possível recessão sobre a saúde das companhias. “Até agora, os reports mostram bancos e empresas de tecnologia mais fracos, mas ainda é um número muito pequeno de balanços do S&P que foram divulgados (72 até o momento desta análise).
Uma das principais estratégias da Santander Asset em global equities é feita por meio de um fundo de fundos (FoF) com patrimônio líquido de R$ 1 bilhão que prioriza setores defensivos (utilidades públicas, saúde e consumo básico) para investir em grandes empresas dos países desenvolvidos e segue o MSCI World. O portfólio, exposto à variação cambial, segue igual, com um ganho de importância para a gestão ativa. Além disso, a casa tem dois outros fundos globais, esses hedgeados. “Ter gestão ativa em momentos como este é essencial porque quando começar a discussão sobre o ciclo de juros nos EUA, o mercado se antecipa e a carteira precisa estar alocada em setores que se beneficiarão da queda das taxas, mesmo que elas ainda fiquem altas no primeiro trimestre”, observa. Outro segmento relevante é dos FoFs temáticos de exterior, com foco em ativos ligados a tecnologia e mudanças climáticas, entre outros.
Para quem já aloca em exterior, ele lembra que pode ser interessante manter posições pois o S&P tem todas as condições de voltar aos 4.800 pontos. Vale lembrar, porém, que será um S&P muito diferente do que era no passado porque o mundo hoje é de juros positivos e isso beneficia os setores de value em detrimento dos papéis de growth. “As empresas já fazem seus ajustes a esse novo momento para adequar seu tamanho e área de atuação”, explica. Para o investidor institucional brasileiro, o exterior ainda é o grande ponto de diversificação, seja com ou sem hedge cambial, por minimizar riscos.

A elevação do juro foi a principal força por trás do desempenho negativo de ativos e renda fixa e de renda variável em 2022, que impactou de modo mais severo os papéis de setores como o de tecnologia e empresas consideradas de crescimento (growth), observa Daniel Popovich, estrategista de investimentos da Franklin Templeton Investment Solutions. A despeito desse ambiente, os mandatos de exterior conseguiram performar melhor do que os benchmarks designados, o que mostra a importância da profissionalização da gestão. A gestora tem, no Brasil, mandatos totais contratados de investimento no exterior de R$ 1,6 bilhão e R$ 414 milhões nos feeder funds.
Em 2022, a gestora manteve posicionamento mais defensivo em seus portfólios de exterior e ficou underrated em renda variável, privilegiando a renda fixa. “Mas isso depende muito dos objetivos de cada cliente porque fazemos customização das estratégias”, diz. Ao mesmo tempo, a gestão privilegiou ativos de value em lugar de growth e buscou empresas com maior qualidade e fundamentos mais sólidos, que tivessem uma geração de caixa mais consistente. Foram feitas posições táticas em curva de juros nos EUA e em ativos corporativos high grade. “O desempenho das estratégias foi negativo mas ficou acima dos índices”, conta.
Este ano, a gestão segue defensiva na renda variável e identificam mais oportunidades em renda fixa, que está melhor precificada, com um carrego interessante principalmente em EUA. Há um potencial de oportunidades criado pela gestão ativa para investir na renda fixa americana e outros mercados desenvolvidos, como Europa e Japão. “A liquidez abundante dos últimos dez anos começa agora a diminuir, mas isso permite uma melhor formação de preços e, se o gestor fizer um trabalho hábil e cuidadoso, vai conseguir gerar alfa em diferentes mercados”, pondera.
A visão da casa difere da corrente do mercado que vê possibilidade de corte do juro americano pelo Fed este ano. “Não vemos um corte das taxas em 2023, isso só acontecerá quando os sinais ficarem mais claros a respeito da inflação, o que dará maior conforto ao Fed para começar a cortar juros. Essa avaliação tem balizado a nossa estratégia em renda fixa”, diz. Por enquanto, os EUA seguem como a geografia de preferência, porque os dados de alavancagem das empresas são baixos e os riscos são menores do que na Europa. “Não há previsão de término da guerra na Ucrânia e, apesar dos sinais de resiliência energética da Europa, há um risco. Por isso, a nossa visão para os mercados europeus é relativamente negativa hoje”, explica.
Na renda variável, as ações de value e qualidade ainda prevalecem e a gestão segue defensiva porque leva em conta que o mercado vê uma política monetária menos restritiva, mas há alguns fatores a considerar. “Os dados do quarto trimestre de 2022 podem trazer uma revisão para baixo dos lucros e receitas das companhias americanas e isso não está bem precificado.É importante lembrar que os efeitos da inflação comprimem as margens e alguns setores são mais afetados pelo custo elevado da mão de obra”, pondera. Além disso, há uma mudança evidente na postura do consumidor nos EUA, mais apreensivo com a alta do juro e isso deverá impactar lucros das empresas ao longo do ano.
“O mercado está mais atrativo para o institucional brasileiro que tem exposição muito baixa ao exterior, porque já começam a se formar pontos de entrada interessantes e retornos esperados de longo prazo superiores aos dos últimos anos”, afirma. A gestora discute, inclusive, a oferta de soluções semi-customizadas para fundos de pensão brasileiros de porte não tão grande e que queiram ter acesso aos gestores globais.