Edição 234
Nunca o Brasil registrou maior nível de formalização do mercado de trabalho em sua história. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o desemprego fechou em 4,7% em 2011, a menor taxa dos últimos 10 anos, o início da série histórica. No mesmo período, a renda média mensal do brasileiro praticamente dobrou, saltando de R$ 1,2 mil para R$ 2,1 mil. Ainda que a evolução não se reflita proporcionalmente no crescimento da previdência complementar fechada, um grande número de fundos de pensão patrocinados tanto por empresas públicas quanto privadas está registrando a adesão de novos participantes ativos. “O número de ativos cresceu muito mais que o de assistidos nos últimos anos, o que está produzindo uma renovação dos participantes das entidades fechadas”, garante Edevaldo Fernandes da Silva, diretor de Assuntos Atuariais, Contábeis e Econômicos da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc).
Simultaneamente ao aumento dos quadros das empresas, o interesse pelos planos de aposentadoria complementar também vem crescendo. Esse interesse é motivado pelas campanhas de adesão aos planos e aos programas de educação financeira realizados pelos fundos de pensão. “Os programas de educação incentivam a adesão tanto de novos quanto de antigos funcionários que estavam fora dos planos”, diz o diretor da Previc. Em alguns casos, também estimulam o aumento dos aportes dos participantes ativos aos planos, por meio de contribuições maiores ou extraordinárias. “É um processo semelhante ao que está ocorrendo com a previdência social, que vem reduzindo o déficit. No caso da previdência fechada, representa maior ingresso de recursos novos, o que ajuda a aumentar a escala e reduzir os custos de administração”, lembra Silva.
Enquanto o número de participantes ativos dos fundos de pensão cresceu 556 mil desde 2001 até o fim do ano passado, a quantidade de assistidos aumentou 110 mil no mesmo período (veja tabela), segundo dados da Previc. O incremento representa uma ampliação de 31% no conjunto de participantes ativos durante uma década. “Não dá para dizer que o sistema rompeu a inércia ou que deu um salto, mas podemos verificar que houve uma evolução na adesão de novos participantes em um ritmo semelhante ao da formalização do mercado de trabalho”, aponta Antônio Gazzoni, sócio-diretor da consultoria Gama. O especialista acredita, porém, que a previdência fechada ainda enfrenta dificuldades para captar novos participantes da classe C, que é o segmento que mais se fortaleceu no País nos últimos anos (leia mais no quadro ao lado).
Renovação – Mesmo com o advento dos planos de instituidores a partir de 2006, o sistema fechado ainda enfrenta o desafio de abrir as portas para os empregados e autônomos que não têm acesso a planos de benefícios patrocinados. Porém, para os fundos de pensão já existentes, o crescimento vem se acentuando nos últimos anos. Fundos de pensão como o Postalis (Correios), Funcef (Caixa Econômica Federal), Fundação Promon e Embraerprev estão passando por um processo de renovação do conjunto de participantes. É um processo que está revertendo a tendência de envelhecimento do sistema que, no início da década passada, apontava que haveria muito mais saída de recursos do que entradas.
Dados da Funcef mostram que o número de participantes praticamente dobrou desde 2002. Na época havia cerca de 60 mil participantes, entre ativos e assistidos. Nos anos seguintes, houve um crescimento vegetativo deste número, mas a partir de 2006 e 2007, com a chegada do novo plano do tipo Contribuição Variável (CV), a Caixa e o fundo de pensão voltaram a incentivar o benefício. Ao mesmo tempo, o banco voltou a contratar funcionários em maior quantidade, o que permitiu que a Funcef chegasse ao fim de 2011 com 116 mil participantes. Em 2012, a direção da Caixa já anunciou contratação de 12 mil novos empregados, para dar conta do projeto de ampliação com 500 novas agências do banco.
“Com o atual nível de adesão na faixa de 95%, prevemos o ingresso de mais de 10 mil novos participantes neste ano”, prevê Geraldo Aparecido da Silva, secretário geral da Funcef. Ele explica que o patamar de adesão era bem mais baixo até 2006, quando havia cerca de 16 mil funcionários da Caixa que não participavam do plano. Ele representavam cerca de 20% do quadro da patrocinadora, mas com a criação do plano CV, foram realizadas campanhas para incentivar a adesão. Atualmente, há apenas 4,5 mil empregados da Caixa que não participam da Funcef.
O fundo de Caixa é considerado amadurecido, pois o pagamento de benefícios ainda supera as entradas de recursos. Mas pelo menos a tendência de descapitalização do fundo está sendo revertida com a mudança do perfil do quadro de participantes. Até 2006, o número de assistidos avançava mais rápido que o de ativos, o que dava a impressão de que o fundo de pensão teria que passar por um forte processo de desinvestimento. Com as campanhas de adesão e as contratações de novos empregados, essa tendência não é mais verificada. “Ainda pagamos mais do que arrecadamos, mas a curva está mudando e tende até para a reversão”, afirma o secretário geral da Funcef.
O dirigente lembra que a fundação registrou forte aumento dos assistidos entre 1998 e 2004, com os programas de demissão voluntária (PDV) promovidos pela Caixa. Hoje a situação é bastante diferente: não houve nenhum PDV nos últimos anos e as contratações foram renovando o quadro de participantes. Isso se reflete diretamente na política de investimentos, que no plano CV, adota uma prática de prazos mais longos. “No Novo Plano, que hoje representa 80% de nossas entradas de recursos, é possível diversificar mais, pensar no médio e longo prazos, com investimentos, por exemplo, em infraestrutura e empresas”, destaca Aparecido da Silva.
Postalis – O fundo de pensão dos Correios, o Postalis, registrou a adesão de 9,2 mil novos participantes para o plano em 2011. A entrada representou aumento de cerca de 10% do quadro de participantes, que saltou de pouco mais de 94 mil no fechamento de 2010 para 103,5 mil um ano depois. Em termos de arrecadação, o crescimento foi ainda maior, saltando de pouco mais de R$ 30 milhões por mês para um montante em torno de R$ 40 milhões. Foi um crescimento de quase 25% nas arrecadações. “Junto com a campanha de adesão, também realizamos uma ação de incentivo para o aumento das contribuições ao plano”, conta Sinecio Jorge Greve, diretor de seguridade do Postalis.
O aumento dos aportes foi verificado principalmente entre os empregados com renda mais baixa, até R$ 2.750 mensais. Enquanto a média de contribuição girava em torno de 2% da remuneração antes da campanha, depois subiu para uma média de 3%. “Os funcionários estão cada vez mais conscientes da importância da previdência complementar, e isso interfere no maior nível de contribuição ao plano”, aponta o diretor de seguridade.
Ainda não foi possível perceber uma significativa revitalização do quadro de participantes. A idade média do conjunto teve um ligeira queda, de 41,35 anos para 41,14 anos em 2011. Mas com a confirmação de novas contratações pela patrocinadora, a tendência é continuar a renovação dos participantes. Em 2012, os Correios planejam contratar pelo menos 50% do número de funcionários contratados no ano passado. “Não verificamos grande redução da idade média, mesmo porque a retenção de funcionários é alta nos Correios, mas com a entrada de novos participantes, a tendência é melhorar a oxigenação dos planos”, diz Greve.
O diretor acredita que o maior volume de aportes gera uma série de vantagens, como a maior escala para as aplicações e a redução proporcional dos custos de administração. O Postalis oferece desde 2005 um plano CV para os novos funcionários e também possui um plano BD, que está fechado.
Setor privado – A Embraerprev é outro exemplo de fundo de pensão que está crescendo com o aquecimento da economia aliado com a realização de campanhas de adesão de participantes. Atualmente com 14 mil participantes entre ativos e assistidos, a fundação registrou a adesão de 1,2 mil funcionários ao plano em 2011. Além dos novos contratados da patrocinadora, também houve a adesão de profissionais que estavam fora do plano. “Conseguimos aumentar o nível de adesão ao plano de 70% para 77% devido a um trabalho de conscientização realizado junto com o RH da empresa”, conta o diretor presidente da Empraerprev, Eléu Magno Baccon.
A Embraer oferece o plano complementar há cerca de 10 anos, mas até 2009 contava com a gestão do fundo multipatrocinado BB Previdência. A partir de agosto daquele ano, a patrocinadora promoveu a criação de uma entidade fechada própria. “Durante o primeiro ano de funcionamento não tivemos oportunidade de incentivar a adesão de participantes, pois estávamos colocando a casa em ordem. Precisávamos nos adaptar aos novos procedimentos”, recorda o diretor presidente. Depois de superada a fase de adaptação, a patrocinadora e a fundação decidiram realizar no ano passado uma série de ações para aumentar a adesão ao plano. “Além das palestras aos funcionários antigos, também participamos de um programa semanal de integração de novos funcionários”, afirma Baccon.
Ele exemplifica que na primeira semana de fevereiro foi realizada uma palestra junto com o RH para 50 novos engenheiros contratados pela Embraer. A empresa já contratou cerca de 200 engenheiros no começo de 2012 e, dependendo dos projetos de produção de aeronaves, o processo de reposição e ampliação do quadro deve continuar aquecido.
Atualmente, a entrada de aportes para o fundo de pensão gira em torno de R$ 8 milhões por mês, o que representa um aumento de cerca de 30% em comparação com o ano anterior. Esse volume de recursos costuma crescer em época de distribuição de bônus e de 13º salário, quando os participantes ampliam as contribuições como forma de conseguir incentivos tributários no Imposto de Renda.
Desde que a entidade própria foi criada, sua direção vem promovendo um processo de reestruturação na gestão dos recursos. Durante o ano de 2010, a fundação contratou seis novos gestores para sua carteira de investimentos, avaliada atualmente em R$ 1 bilhão – antes isso era concentrado em um único gestor. “Apesar da pulverização dos recursos, conseguimos reduzir a taxa de administração dos ativos”, revela Baccon. Ele adianta que o próximo passo será implementar o sistema de escolha de perfis de investimentos, o que deve acontecer até o fim de 2012 ou, no máximo, no início do próximo ano.
Perspectivas – Há também os casos de fundos de pensão que ainda não registraram forte aumento de participantes ativos, mas que apresentam perspectiva de novas adesões para este e para os próximos anos. É o exemplo da Fundação Promon, que atualmente conta com 2,5 mil participantes de suas quatro patrocinadoras. A incorporação de novas empresas ao grupo e os novos projetos nas áreas de energia e óleo e gás devem levar à duplicação do número de patrocinadoras.
É que o grupo Promon está incorporando três empresas mineiras da área de meio-ambiente – a Brandt, a Terravision e a Verti. Além disso, deve constituir pelo menos duas novas empresas por meio dos investimentos do fundo P2 (fundo de participações em parceria com o Pátria). Atualmente o projeto já funciona com duas unidades de negócios, uma delas de energia e a outra no segmento de óleo e gás. “Temos a estimativa de dobrar o número de patrocinadoras, o que vai produzir um aumento do número de participantes ativos”, conclui Mário Sérgio Ribeiro, diretor da Fundação Promon.
O dirigente esclarece, porém, que esse aumento não implica na duplicação do número de participantes, pois isso depende do tamanho do quadro das empresas, que ainda não está definido. “Acredito que é um reflexo do crescimento da economia do País e da expansão dos negócios, o que deve continuar nos próximos anos. As campanhas de educação e conscientização também devem ajudar a acelerar esse crescimento”, afirma o diretor da Promon.
Crescimento poderia ser maior
Apesar da ampliação do número de participantes ativos e da renovação dos quadros das entidades fechadas na última década, especialistas e dirigentes admitem que o crescimento ainda é modesto se comparado com o potencial econômico do País. “Não estamos conseguindo atrair a classe C, que já possui uma renda suficiente para adquirir planos de previdência fechada. Se isso persistir, esse público vai aderir prioritariamente aos plano abertos”, alerta Antônio Gazzoni, da Gama. O atuário acredita que é necessário criar novas modalidades de planos de benefícios, com maior flexibilidade, para incentivar que tanto as empresas quanto seus empregados possam aderir em maior escala.
Uma das apostas do sistema eram os planos de associativos, criados em 2006. São planos instituídos por sindicatos e associações de classe – mas, apesar da multiplicação desta modalidade, ainda não se verifica uma adesão e participação consistente por parte das categorias profissionais. “Estamos estudando novos formatos de planos e novos mecanismos de oferta da previdência fechada para empresas de pequeno e médio porte”, avisa Edevaldo Fernandes da Silva, da Previc.
O dirigente revela que o Ministério da Previdência Social está preparando a regulamentação de um novo tipo de plano, denominado inicialmente Flex Previdência. Além disso, também estuda a criação de fundos de pensão setoriais, que poderiam congregar o patrocínio de diversas empresas de uma mesmo ramo da economia.
Segundo informações prévias, o novo formato de plano amplia as possibilidades de utilização dos recursos poupados para além da finalidade previdenciária. A proposta, ainda em estudo, permitiria o uso para a educação dos filhos ou para gastos com saúde, a exemplo do que já acontece com planos oferecidos pela previdência aberta.