Edição 75
Enquanto a maioria das fundações vem aumentando sua exposição em renda variável, o fundo de pensão dos funcionários da Petrobrás optou por um caminho alternativo para driblar a queda das taxas de juros: investir em project finance. A Petros vai retirar R$ 2 bilhões de sua carteira de renda fixa, atualmente com R$ 3,8 bilhões, para aplicar paulatinamente em project finance. Mas não deve parar por aí. A fundação já descobriu uma outra fonte potencial de recursos para despejar nestes projetos: o passivo da Petrobrás com a fundação, estimado hoje em R$ 4,4 bilhões. “Queremos usar parte desta dívida como fonte de participações em project finance”, diz o presidente da Petros, Carlos Henrique Flory.
O foco inicial da Petros será o setor de energia, especialmente os projetos que envolverem a Petrobrás. “No momento, estamos estudando termelétricas a gás, que devem sair mais rápido”, diz o presidente do fundo de pensão. Diante do perigo de concentração excessiva em um único segmento, Flory acredita que há alternativas para evitar altos níveis de exposição a risco. “Há muitos projetos necessários para o desenvolvimento da infra-estrutura do País. Além da área de energia, também vamos olhar outros setores, como mineração e siderurgia”, afirma. “Além disso, à medida que o tempo for passando, vão surgir outros projetos que hoje nem seriam imaginados.”
Mas por que não optar por investimentos em Bolsa, como vêm fazendo muitas outras fundações? De acordo com o presidente da Petros, ampliar excessivamente a exposição em renda variável não é um caminho muito saudável para um fundo de pensão, pois qualquer oscilação brusca no mercado de capitais pode prejudicar o cumprimento da meta atuarial. Com base neste raciocínio, a Petros deve manter praticamente inalterado o seu nível atual de exposição em ações, ou seja, cerca de 25% da carteira de ativos. “Consideramos este um patamar bom para um fundo de pensão”, afirmou Flory.
O congelamento de sua exposição no mercado de capitais não significa que ela reduzirá sua movimentação nos pregões nos próximos meses. Ao contrário, no momento a Petros está justamente reavaliando todo o seu portfólio de ações para realizar algumas trocas de posições. Uma hipótese em estudo é, por exemplo, a venda de papéis da Telefónica por causa das dúvidas em relação à troca por Brazilian Depositary Receipts (BDRs), proposta em janeiro pela multinacional espanhola.
Caminhão de dinheiro – Os R$ 2 bilhões da Petros que migrarão da renda fixa para project finance neste ano serão mais do que suficientes para dar andamento aos primeiros projetos, avalia o presidente da fundação. Segundo ele, cada sócio de um project finance pode entrar com 20% do total, no máximo, o que quer dizer que os investimentos globais programados somam cerca de R$ 10 bilhões. “Temos agora de procurar os parceiros”, diz Flory.
Mais para frente, a Petros pretende adquirir participações em outros project finance da Petrobrás em troca do abatimento de parte do passivo da patrocinadora com o fundo de pensão. Atualmente estimado em R$ 4,4 bilhões, este passivo era de R$ 6 bilhões há poucos meses. Trata-se de um débito referente a benefícios de funcionários contratados pela estatal antes da criação da Petros, em 1970. O passivo só foi reconhecido pela Petrobrás no ano passado, tendo sido incluído no seu balanço contábil do último trimestre de 1999.
Embora tenha sido estabelecido um acordo para o pagamento desse passivo em um prazo de 21 anos, a Petrobrás decidiu fazer algumas antecipações. Em dezembro, a Petros recebeu R$ 400 milhões em dinheiro e, em janeiro, outros R$ 379 milhões chegaram à fundação na forma de títulos da dívida da Siderbrás e Eletrobrás. O fundo de pensão tem a opção de carregá-los até o seu vencimento, em 2005, ou então pode trocá-los por títulos do Tesouro.
Mais antecipações – E novas antecipações já estão acertadas entre a patrocinadora e a fundação, dependendo apenas da aprovação do Conselho de Administração da Petrobrás. Segundo Flory, assim que o Conselho aprovar a empresa deve transferir ações da BR Distribuidora para a Petros. Apesar de a fundação estar próxima do limite de enquadramento de 5% em ações da Petrobrás, o mesmo não acontece com os ativos da BR Distribuidora. O acordo também prevê que a patrocinadora fará, pelos próximos dois anos, aportes mensais superiores aos previstos anteriormente para o fundo de pensão. Essas duas medidas representarão cerca de R$ 850 milhões em aportes extras aos cofres da fundação, que somados com os R$ 779 milhões recebidos entre o final do ano passado e início deste totalizam nada menos de R$ 1,6 bilhão em antecipações.
De acordo com o presidente da Petros, novas antecipações do passivo acontecerão toda a vez que forem identificadas oportunidades de interesse mútuo entre a patrocinadora e o fundo de pensão. “A Petrobrás tem ativos que, para ela, não são fundamentais e que são interessantes para nós”, explicou Flory.
Para o analista de petróleo do Banco Santander Bozano, Rodrigo Marques, a transferência dos ativos é interessante para ambas as partes. “A Petros recebe as dívidas e a Petrobrás se livra de alguns ativos que não fazem parte de seu core business, como por exemplo títulos da Siderbrás”, diz.
Aliás, o momento é propício para este tipo de acordo uma vez que a estatal do petróleo está se preparando para lançar American Depositary Receipts (ADRs) em Wall Street. A adaptação aos princípios contábeis do mercado norte-americano, o US GAPP, está exigindo que a empresa faça diversas adaptações em seu balanço. “Nesta preparação, talvez a Petrobrás ache interessante transferir outros ativos”, comentou Flory. O lançamento dos ADRs em Nova York deve ocorrer simultaneamente à oferta de venda de um lote de ações ordinárias da estatal, o que está previsto para julho.
Modelo utilizado em Marlim será reproduzido
A primeira experiência da Petros com project finance foi a exploração do campo de Marlim. Até agora, o fundo de pensão já aplicou R$ 35 milhões nesse projeto, ou seja, 11% do capital total na Companhia Petrolífera Marlim. O retorno do investimento está diretamente vinculado à variação do preço do petróleo. Como o preço do barril está visitando a casa dos 30 dólares, os sócios da Petrobrás em Marlim, como é o caso da Petros, estão obtendo a rentabilidade máxima prevista no contrato.
Quando o valor do barril do petróleo cai abaixo dos 13 dólares, o retorno mínimo estabelecido é a taxa da Anbid. Com o barril a 16 dólares, atinge-se a média de rentabilidade do projeto: Anbid mais 3,5%. A partir dos 19 dólares de cotação do barril do petróleo, o retorno sobre o investimento passa a ser o máximo previsto no contrato: Anbid mais 7%. “Isso corresponde a um rentabilidade de 130% do CDI”, comemora Flory. “Enquanto isso, fundos de mercado dão 102%, 103% e já fica todo o mundo satisfeito.”
Para os próximos projetos, a Petros pretende manter o modelo utilizado em Marlim, ou seja, vai exigir sempre uma garantia contratual de retorno mínimo sobre o investimento. “Queremos ter a certeza de que a rentabilidade conseguirá pelo menos igualar a nossa meta atuarial”, afirmou Flory. A expectativa de retorno médio para os próximos projetos fica entre 15% e 20% ao ano. Dentro de um cenário otimista traçado na Petros, que prevê uma taxa de juros de um dígito em 2001, isso significaria um retorno considerável. “Esta situação nos daria uma rentabilidade de cerca de 150% do CDI”, comentou o presidente do fundo de pensão.