Edição 74
A partir do ano que vem, as empresas de capital aberto terão de declarar nos seus balanços contábeis as suas obrigações com os fundos de pensão. A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) está elaborando uma norma que estabelece os critérios de apresentação dos passivos atuariais das fundações nos balanços, a qual deverá ser concluída e publicada até meados deste ano. A minuta da regulamentação já está sendo discutida com entidades representativas das partes envolvidas – como Abrapp e Abrasca –, que terão até o final de abril para sugerir mudanças ou aperfeiçoamentos.
Os demonstrativos não se limitarão a registrar os déficits atuariais, mas incluirão também o financiamento do serviço passado dos funcionários (contribuições para amortizar a reserva referente ao tempo que o empregado trabalhou na empresa antes da criação do fundo) e o próprio custo do plano, entre outros itens. “Certamente, muita coisa mudará na demonstração do endividamento das empresas com fundos de pensão, principalmente de benefício definido”, comenta o presidente do Instituto Brasileiro de Contadores – Ibracon, Ariovaldo Guello.
A nova norma visa adequar os balanços contábeis brasileiros aos dos países desenvolvidos, em especial aos Estados Unidos, explica o superintendente de normas contábeis da CVM, Antônio Carlos Santana. Segundo ele, as novas normas estão sendo estudadas desde o final de 1998, como resultado de um acordo firmado pelos integrantes da Organização Internacional de Comissões de Valores Mobiliários (IOSCO). “Com a globalização dos investimentos, é preciso dar uniformidade aos padrões de contabilização, de maneira que investidores sejam capazes de entender os balanços de empresas em todo o mundo”, justifica.
A minuta da regulamentação ficou pronta no início desse ano, fruto de um trabalho de cerca de um ano feito por especialistas do Ibracon com assentos na comissão consultiva de contabilidade da CVM. O instituto, embora não tenha caráter normatizador nem fiscalizador, profere pareceres sobre temas que lhe são pertinentes, os quais costumam ser adotados pelos profissionais dessa área. Por isso, espera-se que também as empresas fechadas venham a aderir às novas regras.
Segundo o presidente do Instituto, a adaptação dos padrões internacionais à realidade brasileira tem alguns pontos polêmicos. Um deles é que o critério de cálculo atuarial utilizado mundialmente diverge do utilizado por alguns atuários brasileiros. “Vamos ter que discutir com os atuários, que são outra categoria profissional, uma maneira de contornar esse problema, uma vez que não existe no Brasil uniformização do cálculo atuarial”, explica Santana. “O principal problema é que as diferenças na forma de calcular o passivo atuarial podem levar a cifras díspares”.
Ao que tudo indica, entretanto, o critério utilizado lá fora deve prevalecer por dois motivos. Em primeiro lugar, porque cada vez mais as empresas brasileiras se preparam para captar recursos no Exterior. Sendo assim, por motivos óbvios, nenhuma empresa vai querer pagar dois atuários com metodologias distintas, um para o seu próprio balanço e outro para a fundação. “A tendência é de que as companhias queiram se enquadrar nessa norma”, comenta Guello.
Por esse motivo é que os próprios fundos de pensão devem ser afetados com a nova regulamentação contábil. O presidente da Abrapp – Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Privada, Carlos Caldas, defende regras de transição. “Todo tipo de transparência é boa para o desenvolvimento do mercado de capitais, mas tudo o que é aplicado de maneira abrupta pode levar a situações indesejadas”, opina.
Superávit – Outro ponto controvertido da minuta se refere à apropriação contábil do superávit do fundo, quando houver, ao ativo da patrocinadora, como é feito lá fora. “O que preocupa é essa flutuação da bolsa, o que não acontece em outros países na mesma intensidade que aqui”, argumenta o presidente do Ibracon.
Santana, da CVM, acrescenta que poderia não ter sentido lançar o superávit no balanço de uma empresa com passivo referente a serviços passados, por exemplo. “Estamos tentando definir em que momento e quais os limites para que isso possa ocorrer”, informa.
De qualquer maneira, esse ponto terá de ser discutido detalhadamente com a Secretaria de Previdência Complementar, que deverá ser consultada após o término do prazo para sugestões do mercado, no final de abril, na fase final de elaboração da nova norma.