Edição 131
Até o final do ano passado, a definição dos nomes para ocupar as diretorias e conselhos dos bilionários fundos de pensão das estatais era totalmente polarizada. De um lado, o governo federal sob o comando do então presidente Fernando Henrique Cardoso escolhia os representantes das patrocinadoras entre membros dos partidos da base aliada ou no mercado. Do outro, os sindicalistas e membros de partidos de esquerda, a maioria ligada ao PT, costumavam ganhar as eleições para conselheiros e para algumas diretorias executivas das fundações. A discussão começava depois que os dois blocos tomavam posse e passavam a se degladiar na administração dos fundos.
Com o governo Lula, a polarização acabou. Agora, os petistas estão sentados dos dois lados da mesa de negociação e, por isso, estão dominando a direção dos fundos de estatais. O motivo é simples: eles já estão representados nas vagas dos eleitos e agora também têm a possibilidade de indicar os dirigentes através das patrocinadoras. Isso está acontecendo com a indicação dos presidentes da Previ (Banco do Brasil), Sérgio Rosa, e da Petros (Petrobrás e outras), Wagner Pinheiro. “A direção dos fundos de patrocinadoras públicas federais deve ficar nas mãos de um bloco hegemônico”, afirma Cecília Garcez Siqueira, conselheira eleita da Previ do Banco do Brasil.
A dúvida que permanece é se o governo conseguirá pessoas que, ao mesmo tempo, possuam vínculo político com sua base de sustentação e capacitação profissional para ocupar a grande quantidade de vagas que estão se abrindo nas diretorias e conselhos dos mais de 40 fundos ligados às estatais federais. Considerando uma média de 3 indicações da patrocinadora para a diretoria e 3 para os conselhos deliberativos, deverão ser preenchidas mais de 200 vagas. Isso pode explicar a demora para definir os novos indicados dos fundos menores que ainda deve se prolongar por algumas semanas ou meses.
A primeira definição veio para a presidência da Previ do Banco do Brasil, que foi para Sérgio Rosa. Atual diretor administrativo da Previ, ele chegou a ser cotado para a vaga de titular da Secretaria de Previdência Complementar (SPC), ocupada atualmente por Adacir Reis. O dirigente já havia ocupado a vaga de diretor de participações da Previ, através de eleição direta dos participantes. Rosa foi dirigente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e presidente da Confederação Nacional dos Bancários e tem uma relação próxima com o articulador da equipe de transição na questão previdenciária, Luiz Gushiken.
O segundo nome definido para direção de uma grande fundação é o de Wagner Pinheiro, ex-diretor do Banesprev, fundo de pensão do Banespa. Primeiramente, ele tinha assumido interinamente a vaga de diretor financeiro da Petros, no lugar de Eliane Lustosa, que colocou o cargo à disposição no mês passado. Em seguida, foi confirmado para ocupar a presidência do fundo, além de acumular a diretoria de benefícios (ver quadro ao lado). Pinheiro também possui um histórico de participação no Sindicato dos Bancários, de onde se originou o grupo comandado por Gushiken e do atual ministro da previdência e assistência social, Ricardo Berzoini. Todos eles possuem um vínculo com a corrente Articulação do PT, da qual também faz parte o presidente Lula.
Apesar das discussões serem dominadas por um bloco predominante, o processo de definição dos novos nomes não está sendo tão simples. Em um processo de discussão que já dura mais de dois meses, até meados deste mês de fevereiro, pouquíssimos nomes estavam definidos para dirigir os fundos de pensão. O debate para definir os novos dirigentes foi bastante aberto na etapa inicial, coordenada pela equipe de transição do governo, e envolveu sindicalistas, dirigentes eleitos, associações de participantes e assistidos e a Anapar (Associação Nacional dos Participantes dos Fundos de Pensão). Agora, na etapa final, a discussão está mais restrita a alguns membros que participaram da equipe de transição e as novas diretorias das patrocinadoras.
A Anapar pediu a todos os atuais conselheiros e diretores eleitos dos fundos de pensão que fizessem sugestões de nomes para ocupar as vagas que devem ser indicadas pelas patrocinadoras. Alguns requisitos eram necessários para os indicados: nível superior, experiência na administração de fundo de pensão e apoio dos participantes. “Mandamos cinco nomes e seus currículos para a Anapar como postulantes às vagas de diretores e conselheiros do fundo”, diz Paulo Figueiredo, diretor eleito de benefícios do Nucleos.
O fundo de pensão Nucleos ainda não teve sua nova diretoria definida, pois duas de suas três patrocinadoras ainda não tiveram a diretoria nomeada. Apenas a diretoria da Eletros Nuclear já tomou posse, enquanto a Nuclep e a INB continuam com as mesmas direções do ano passado. A questão deve ser resolvida até o final de março, quando tomam posse os novos membros do conselho indicados pelas patrocinadoras. “Acredito que os novos indicados devem assumir após o término do mandato do atual conselho”, prevê Figueiredo.
Os problemas maiores podem surgir em fundos nos quais os mandatos dos conselheiros ainda estão longe do término. Na Eletros, fundo de pensão da Eletrobrás, o mandato vai até o final de 2004. “Ainda não houve nenhum movimento no sentido de substituir os atuais conselheiros e diretores”, afirma Márcio Cavour, diretor financeiro eleito da Eletros. Ele acredita que existe a possibilidade de manutenção dos atuais conselheiros. “Nosso fundo não sofre muita influência de disputas político-partidárias e, por isso, acredito que existe a possibilidade de continuarmos sem muitas mudanças”, diz. Cavour explica que o fundo de pensão possui pequena quantidade de participantes e que os sindicatos têm pouco influência na escolha dos eleitos para diretor e conselho.
No conselho da Funcef, fundo de pensão da Caixa Econômica Federal, existe a expectativa que os conselheiros indicados pela antiga gestão da Caixa renunciem aos seus mandatos. Até agora, dos 3 conselheiros nomeados pela patrocinadora, apenas um colocou o mandato à disposição. “É natural que os conselheiros cedam a vaga para novos indicados, mas a rigor, a legislação garante a estabilidade do mandato”, explica Antônio Bráulio de Carvalho, conselheiro eleito da Funcef.
Nomes de outros partidos – Um dos dilemas enfrentado pelo governo petista é a nomeação de membros de outros partidos para alguns cargos nas diretorias das fundações. Na Funcef, por exemplo, o nome de José Renato Correa de Lima, um dos atuais vice-presidentes do banco e pertencente ao grupo político do governador Aécio Neves (PSDB-MG), estaria cotado para a presidência da fundação ou alguma de suas diretorias. A nomeação faria parte de uma negociação entre o grupo do governador tucano e o governo Lula com intenção de conseguir apoio para aprovar o novo projeto de Reforma da Previdência.
Se confirmada, a negociação não deve agradar os representantes dos participantes da Funcef, que apóiam outro nome para a presidência. Carlos Caser, atual diretor de controladoria, foi o nome sugerido pelos representantes dos participantes para assumir o comando do fundo de pensão da Caixa. Caser foi eleito para o conselho da Funcef no ano passado e depois de um processo de negociação entre a patrocinadora e as associações de participantes, passou a ocupar uma das diretorias do fundo.
Na Previ do Banco do Brasil, o maior fundo de pensão brasileiro, também existe a possibilidade de nomeação de representantes de outros partidos para a diretoria executiva. “O processo ainda está indefinido, com a discussão de diversos nomes, entre eles os de membros de partidos como o PPS e o PMDB”, revela uma fonte ligada ao fundo de pensão.
Em geral, os eleitos posicionam-se contra a realização de nomeações com interesses meramente político-partidárias. “O novo governo deve tomar cuidado para não repetir práticas de gestões anteriores, negociando a direção dos fundos de pensão em troca de acordos políticos”, afirma Paulo Teixeira Brandão, conselheiro fiscal eleito da Petros. Para ele, uma parte dos diretores deveria ser eleita pelos participantes e a outra, indicada pela patrocinadora com preferência para a nomeação de profissionais com experiência e capacitação técnica para os cargos.
Bancário e economista, na presidência da Petros
O economista Wagner Pinheiro, 41 anos, resume em uma frase os motivos para sua indicação para a presidência da Petros, fundo de pensão da Petrobrás e outras patrocinadoras. “Confiança política e experiência profissional”, diz. A Petros é o primeiro fundo de estatal a definir toda a composição de sua diretoria e conselho após a posse de Lula. “Foram nomeadas pessoas que possuem afinidade política com o novo governo, além de comprovada experiência e capacitação na previdência complementar”, explica. No caso da Petros também se procurou indicar nomes que representem os funcionários e entidades ligadas à Petrobrás.
Para a diretoria financeira, foi nomeado o economista Luiz Carlos Afonso, ex-secretário de finanças das administrações petistas de Santo André e Campinas. Junto com Pinheiro, são os dois indicados que não são petroleiros. Maurício França foi o nome escolhido para comandar a diretoria administrativa. Ele já foi diretor da Federação Única dos Petroleiros e agora representa a categoria na direção do fundo de pensão. A diretoria de benefícios, por enquanto, será ocupada também pelo novo presidente até a definição de um novo nome.
Para o conselho, foram nomeadas pessoas com larga atuação na Petrobrás. Wilson Santarosa é o chefe de comunicação da estatal, enquanto José Lima de Andrade Neto trabalhou como profissional de carreira na área de recursos humanos da empresa. O terceiro nome indicado pela patrocinadora é o atual chefe de gabinete da presidência da Petrobrás, Diego Hernandes.
Um dos desafios da nova equipe será a retomada das discussões em torno à migração de planos dos participantes da Petros. A migração iniciada no ano passado foi paralisada porque acabou na Justiça. “Queremos discutir as mudanças no fundo com as associações, sindicatos e patrocinadoras. A intenção é realmente realizar uma gestão compartilhada, ética e transparente”, diz Wagner Pinheiro.
Bloco dos fundos – Uma das intenções do novo presidente da Petros é a formação de um grupo de dirigentes de fundos de pensão para discutir algumas temas e implementar ações conjuntas. Um dos pontos a ser abordado pelo grupo é o incentivo à criação e desenvolvimento de fundos éticos de investimentos. Pinheiro diz que já conversou com Sérgio Rosa, indicado para a presidência da Previ do Banco do Brasil, para acertar a atuação conjunta dos dois maiores fundos de pensão brasileiros neste ponto.
Outra iniciativa que o grupo pode levar adiante é a implantação de um programa de capacitação e formação de empregados das patrocinadoras para participarem da gestão dos fundos de pensão. “Assim como nos preparamos nos últimos anos para dirigir os fundos, agora pretendemos formar outras pessoas que possam participar da gestão compartilhada das entidades”, revela Pinheiro. Ele lembra que teve a oportunidade de atuar junto com Luiz Gushiken no ano passado na realização de palestras educativas dirigidas para sindicalistas sobre a questão da previdência complementar.
A relação de Gushiken com Pinheiro e outros nomes que ocupam postos centrais da previdência no governo Lula não é recente. Tanto o atual ministro da previdência Ricardo Berzoini, como Sérgio Rosa e Wagner Pinheiro já foram dirigentes do Sindicato dos Bancários. Quando Gushiken era deputado federal, ele acabou se especializando na questão previdenciária e todo o grupo acabou se capacitando para atuar na área.
Depois quando Berzoini também foi deputado federal continuou tratando do tema, contando na época com a assessoria de Adacir Reis, atual secretário de previdência complementar. Carlos Caser é outro dirigente de um grande fundo de pensão, a Funcef que também é ligado ao grupo. “A experiência acumulada em mais de uma década de atuação com o tema da previdência vai nos ajudar muito nesta nova etapa”, afirma Wagner Pinheiro.