Edição 157
Depois de uma Medida Provisória (nº 209), uma Lei (nº 11.053) e pouco mais de meio ano de discussões acaloradas, saiu a Instrução Normativa (IN) nº 524 que dá a última palavra sobre como será a aplicação do novo regime tributário criado pela Re-ceita Federal para incentivar aplicações de longo prazo nos planos de previdência. Mas isso não quer dizer que o bate-cabeça teve fim. A IN agradou a alguns, decepcio-nou a outros, e só atingiu a unanimidade no que tange à complexidade.
A norma estabelece dois critérios de contagem de prazo: um para o período de acumulação e outro para o período de benefício (dependendo se o plano é estruturado em regime atuarial ou não). Quando o participante de um plano de previdência estiver na fase de acumulação, e optar pela tabela regressiva de Imposto de Renda (IR), ele poderá fazer resgates programados pelo regime conhecido como “Peps” – Primeiro (recurso) que Entra é o Primeiro (recurso) que Sai.
Isto quer dizer que, sob o saque, incidirá tributação que toma por base a data do primeiro aporte feito ao plano: se este ocorreu há dez anos ou mais, o IR será de 10%; se foi feito entre oito e dez anos, será de 15%; se entre seis e oito anos, de 20%; entre quatro e seis anos; de 25%; entre dois e quatro anos, de 20%; e abaixo de dois anos, de 35%. A mesma regra valerá para a fase de benefícios, se o pla-no não for estruturado em regime atuarial (ou seja, se a contratação do benefício for por tempo determinado – a chamada renda de estrutura financeira).
Já se o plano for estruturado em regime atuarial (aquele cuja manutenção dos benefícios concedidos tenha por premissa o mutualismo dos respectivos recursos garantidores, ou, em outras palavras, aquele que leva em consideração a estimativa de vida do participante), o imposto a ser extraído dos benefícios será calculado através do chamado Prazo Médio Ponderado (PMP). Para se chegar a este número será aplicada uma fórmula gigantesca que levará em conta cada contribuição do participante e o seu respectivo tempo de permanência no plano (veja a forma de cálculo no anexo da IN nº 524, no site www.investidoronline.com.br).
Exemplo: se o PMP corresponder a sete anos e meio o participante estará situado na faixa de 20% da tabela regressiva de imposto. Porém, ele não deverá pagar sempre 20%, mas apenas por meio ano. Depois disso, a cada dois anos, o IR que incide sobre os saques vai decrescendo em cinco pontos porcentuais até chegar ao mínimo de 10%. Ou seja, da sétima parcela até a trigésima ele pagará 15% e, a partir dela, entra na faixa dos 10%.
A IN, que foi escrita a seis mãos pela Receita Federal, ex-Secretaria de Previdência Complementar (SPC) e Superintendência de Seguros Privados (Susep), determina que o participante é quem deve escolher que regime tributário seguir. Isto é, ele pode escolher pela tabela regressiva de IR ou pela tabela atual, que determina apenas três faixas de pagamento: isenção para renda mensal de até R$ 1.164,00; imposto de 15% para renda entre R$ 1.164,01 e R$ 2.326,00; e de 27,5% para renda superior a R$ 2.326,01.
Detalhe primeiro: feita a escolha, não tem volta. Detalhe segundo: quem optar pela tabela regressiva de IR não terá faixa de isenção e o imposto pago não poderá ser deduzido da declaração de ajuste anual – como ocorre com a tabela progressiva de imposto de renda.
Vale lembrar, ainda, que os planos de previdência já existentes antes da Lei também poderão optar – até 1º de julho – por uma das duas tabelas, porém o prazo de acumulação só será retroativo a 1º de janeiro de 2005. Para os novos planos, o prazo se inicia a partir do primeiro aporte. No caso da previdência complementar fechada, a nova tabela de IR só valerá para os planos de Contribuição Definida (CD) e de Contribuição Variável (CV). Os planos de Benefício Definido (BD) só poderão utilizar a tabela antiga de imposto de renda.
Repercussão – O presidente da Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão (Anapar), José Ricardo Sasseron, não se entusiasmou com a Instrução. Segundo ele, a média dos benefícios pagos pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) é, hoje, de R$ 2.393,00. Entretanto, se for excluída a participação dos planos de BD patrocinados por estatais – que distorcem esta média para cima – chega-se à conclusão de que a média dos benefícios pagos pelos planos de CD é muito próxima ou até inferior à faixa de isenção da tabela progressiva de imposto de renda. Dessa forma, a nova tabela agraciaria a poucos casos, que contribuem há muito tempo e que, por terem renda elevada, caíam nos 27,5% da tabela antiga de IR.
Sasseron também ficou inconformado com o fato de a opção pelo regime por parte do participante ser irrevogável. “No ato de adesão ao plano, ele tem que optar por um dos dois regimes tributários sem ter qualquer conhecimento de qual dos dois lhe é mais vantajoso e sem ter a mínima idéia de sua evolução salarial na empresa que o admitiu, do tempo que permanecerá na empresa, nem de seu benefício projetado para a data de aposentadoria. Diante de todas estas incertezas, ele terá de tomar uma decisão irretratável. É um absurdo e típico de quem não entende nada de previdência e tem como único objetivo aumentar a arrecadação de tributos”, diz. A Anapar reivindicará na ex-SPC que seja concedido, pelo menos, um prazo de seis meses a partir da adesão ao plano para o participante optar por um dos dois regimes.
Já o presidente da Associação Nacional de Previdência Privada (Anapar), Osvaldo do Nascimento, concorda com a escolha definitiva, uma vez que, se assim não fosse, “a pessoa ficaria arbitrando com o imposto”. Nascimento diz que essa questão pode ser facilmente resolvida, como já vem acontecendo, se forem criados dois planos – um pelo regime tributário progressivo e outro pelo regressivo. Além disso, a Anapp já está em negociações com a Susep para criar a figura do empréstimo lastreado em reservas. Assim, caso o poupador passe por um imprevisto e precise de recursos imediatamente, ele poderá tomar um empréstimo por um custo bem menor do que se, eventualmente, caísse na penalidade de 35% de IR. É dessa forma que funciona o modelo norte-americano de previdência complementar.
Osvaldo do Nascimento avalia que a Instrução nº 524 ficou em linha com o que foi discutido na Receita Federal. “É o que eu sempre digo: o documento saiu dentro do que pôde ser feito, mas tudo pode ser melhorado”. Ele apoiou a contagem do prazo a partir do primeiro aporte na fase de acumulação, mas avalia que a regulamentação feita para a fase de benefício (que considera o cálculo da PMP) poderia ter sido melhor. A intenção da Anapp era de que, no momento da aposentadoria, o IR fosse sempre de 10% – independentemente do tempo e dos valores de acumulação. “Mas isso o mercado vai pleitear através de uma nova Lei”, considera ele.
Por ora, a orientação da Anapp é de que a pessoa avalie o seu PMP. Se ele for, por exemplo, de oito anos, o conselho é de que sejam feitos resgates mensais até o enquadramento à tabela regressiva e, depois, a pessoa poderá optar pela renda vitalícia. Já para quem ainda tem dúvidas entre optar por uma ou outra tabela, Nascimento orienta: “quem pretende deixar os recursos por, pelo menos, quatro anos deve ir para o regime regressivo, pois neste período a pessoa já estaria pagando 25% de IR, ante os 27,5% do modelo progressivo. Do contrário, não”.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA IN nº 524
• Introduziu as conceituações de regime atuarial (aquele cuja manutenção dos benefícios concedidos tenha por premissa o mutualismo dos respectivos recursos garantidores, ou seja, com formato de Benefício Definido na fase de concessão dos benefícios) e de período de acumulação (aquele que antecede o pagamento do resgate ou o início do gozo do benefício pelo participante ou pelo beneficiário do participante não assistido).
• Criou dois conjuntos de regras, sendo um para pagamentos de resgates e benefícios não estruturados em regime atuarial, e outro para pagamento de benefícios estruturados em regime atuarial.
• No caso de pagamento de resgates e benefícios não estruturados em regime atuarial: “os valores pagos serão considerados como sendo relativos às primeiras contribuições efetuadas durante o período de acumulação, atualizadas conforme o valor das quotas em que está referenciado o plano ou com base nos critérios estabelecidos no regulamento do plano de benefícios, contando-se o prazo referido no art. 1º desta Instrução a partir da data do aporte das referidas contribuições”. Ou seja, nessas situações, o prazo de acumulação será contado a partir da data do aporte das primeiras contribuições ao plano, após a opção do participante pelo regime das alíquotas regressivas (arts. 1º e 2º da Lei 11.053/2004).
• No caso de pagamento de benefícios estruturados em regime atuarial: “será calculado com base em Prazo Médio Ponderado (PMP), a ser obtido nos termos do Anexo Único, considerando-se Fração Ideal (FI) do patrimônio de cada plano representada por quotas, na forma das disposições regulamentares e contratuais, ou, exclusivamente calculadas para os efeitos da presente Instrução”. Nessa situação, o cálculo do prazo de acumulação é mais complexo, devendo ser realizado de acordo com metodologia própria, constante do Anexo Único da Instrução Normativa.
• No caso do pagamento de benefícios oriundos de reversão em pecúlio por morte ou em pensão por morte do participante assistido, “a tributação será determinada considerando o prazo de acumulação apurado para o benefício que vinha sendo pago ao participante falecido, adotando-se a redução progressiva da alíquota aplicada à última prestação de benefício em razão do decurso do prazo de pagamento do benefício”.