Juros altos, metas cumpridas | As fundações adiaram a tão esperad...

Edição 101

A migração dos fundos de pensão da renda fixa para a variável, cantada em verso e prosa por grande número de assets durante os primeiros meses deste ano, terá que esperar. Com as seguidas puxadas nas taxas de juros, determinadas pelo Banco Central para frear o câmbio e desarmar uma potencial alta inflacionária, os fundos de pensão resolveram abandonar temporariamente os planos de migração para o risco e ficar mesmo na renda fixa, majoritariamente em posições pós-fixadas. Afinal, hoje eles estão levando nada menos que 19% ao mês para comprar os títulos do governo, o que deve dar para superar com folga sua meta atuarial do ano sem correr riscos.
O mercado está projetando um IGP-M em torno de 9% e um INPC na casa dos 6% para este ano, que somados a uma taxa de juros de 6% representam uma meta atuarial entre 12% e 14% para a maioria das fundações. Como os títulos do governo seguem a taxa Selic, que está dando em torno de 19%, a escolha ficou fácil para as fundações.
No ano passado, quando decidiram dar uma guinada na sua política de investimentos em direção à renda variável, a maioria das fundações estava amargando prejuízos na renda fixa com a consistente queda das taxas de juros, que não dava sequer para cobrir as metas atuariais. Em 2000, para cumprir o IGP-M mais 6% (o índice que corrige uma grande parte das metas atuariais), as fundações tiveram que dar 15,95%, um patamar difícil sobretudo para aquelas que dependiam do comportamento da taxa Selic, que encerrou o ano passado em 15,25%.
“Agora, com a alta dos juros, não é preciso correr riscos para atingir as metas atuariais”, diz o consultor da William M. Mercer, Lauro Araújo. Ele está recomendando aos seus clientes a compra de papéis pós-fixados, e pré-fixados apenas se estiverem atreladas a índices de inflação.
A recomendação do consultor da William M. Mercer significa, na verdade, um alerta contra a tomada de posições mais arriscadas e uma opção pelo conservadorismo em decorrência do cenário incerto da Argentina. Não por acaso, os ingressos líquidos aos fundos DI já somam R$ 3,5 bilhões desde abril, enquanto a renda fixa pré-fixada perdeu R$ 6,2 billhões no mesmo período, segundo dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid).

Desnecessários – A Valia é uma das fundações que claramente optou pelo pós-fixado. Com investimentos na casa dos R$ 3 bilhões, dos quais cerca de 60% na carteira de renda fixa, a fundação tem alocado em pós-fixado quase a totalidade dessa carteira.
Segundo o gerente financeiro da fundação da Vale do Rio Doce, Maurício Rosa, mesmo com taxas de 27% ao ano, a compra de papéis pré-fixados é muito arriscada. “Estamos evitando assumir riscos desnecessários”, diz.
Outra que optou pelo conservadorismo foi a Previhab, fundo de pensão do extinto BNH. No início de julho a fundação transformou toda a sua carteira de renda fixa, de R$ 160 milhões, em investimentos pós-fixados.
Até o final de junho a fundação tinha 20% da carteira de renda fixa em fundos de perfil mais agressivo, com papéis pré-fixados. “Estamos priorizando o ganho no curto prazo. A previsão de novas altas das taxas de juros motivou a mudança para uma posição mais conservadora”, diz o diretor da Previhab, Maurício Werneck.
Uma das justificativas para a mudança é o perfil dos participantes da fundação, majoritariamente de assistidos. Dos 710 participantes da Previhab, 580 são assistidos e apenas 130 encontram-se na ativa, o que exige a permanência de uma carteira líquida, explica Werneck.
Por motivos bastante semelhantes, embora em proporção bem menor, a Fasern também optou por ser conservadora nas aplicações. Com um terço de seus participantes já assistidos, o fundo de pensão da Companhia de Eletricidade do Rio Grande do Norte (Cosern) decidiu, no segundo semestre do ano passado, realocar toda sua renda fixa para pós-fixados – até então era 50% em pré e 50% em pós-fixados.
As aplicações em bolsa também foram reduzidas, de um total de 30% no primeiro semestre de 2000 para os 19% atuais. Segundo o diretor financeiro da Fasern, Cássio Valério Medeiros, a fundação entendia que a política de redução das taxas de juros do Banco Central vinha se esgotando e o cenário externo vinha apontando, desde meados do ano passado, para um risco maior.
“Embora ainda não existisse o risco de uma quebra concreta da Argentina, nem o fantasma do racionamento de energia, a previsão era de um quadro econômico mundial mais recessivo e de possíveis turbulências na Argentina, o que tornaria o crédito mais caro e restritivo aos países emergentes. Dentro do nosso quadro de assistidos, que requer a adoção de uma política de investimentos conservadora, as aplicações em bolsa foram reduzidas e os investimentos em pré-fixados foram zerados”, explica Medeiros.
Contra a corrente – Apesar da recomendação de cautela da maioria dos especialistas, algumas fundações estão apostando que as turbulências que afetam a economia da Argentina deverão se dissipar logo e as taxas de juros brasileiras tendem a retomar uma trajetória de queda, dando uma boa margem a quem tiver comprado papéis pré-fixados às taxas atuais, que chegaram a atingir 27% para vencimento em outubro.
A Forluz é uma das fundações que aposta nisso. Com uma carteira de investimentos de R$ 2,1 bilhões, a fundação possui mais de 80% em renda fixa, dos quais apenas 10% estavam em DI no início de julho, contra 50% no início do ano. Já a exposição aos ativos pré-fixados aumentou de 50% no início do ano para 70% em julho.
“Não acreditamos que a alta dos juros deverá se estender por muito tempo, nem que o câmbio deverá permanecer nos atuais níveis de preços”, ressalta o diretor financeiro da Forluz, Helmer de Paula. “E, quando os juros começarem a cair de novo, a nossa expectativa é a de que poderemos conseguir níveis de ganhos bastante interessantes”.