Inteligência artificial nas EFPCs | EFPCs começam a implementar s...

Edição 362

A inteligência artificial ensaia os primeiros passos na gestão dos fundos de pensão. Ainda tímidos, é verdade, mas com potencial de expansão acelerado. Motivos não faltam. Maior eficiência nos processos de decisão, incorrendo em melhores retornos dos investimentos, redução de custos e identificação de riscos futuros são algumas das contribuições que modelos envolvendo IA trarão às fundações. Mais que isso. A ferramenta, segundo especialistas, pode ser usada na criação de carteiras personalizadas e, ainda, para detectar anomalias no mercado, embora ainda não seja capaz de prever seus movimentos.
Apesar dos méritos, ainda são poucas as entidades no Brasil que adentraram nesse novo universo tecnológico, e não se pode dizer que aquelas que se aventuraram têm o mesmo perfil. Enquanto a Valia tem um patrimônio de R$ 29,8 bilhões, 10 planos e 110 mil participantes ativos, a EnergisaPrev tem patrimônio de R$ 1,1 bilhão e 14,8 mil participantes.
Por enquanto, as aplicações da IA ainda estão sendo estudadas nos fundos de pensão. A expansão de planos família, instituídos e o crescente ingresso da chamada geração Z no mercado de trabalho, trazendo demanda por agilidade e digitalização, aumenta a necessidade de atualização constante de produtos e serviços.
Atenta a essas questões, a Valia começou a investir em ferramentas de IA há cerca de três anos e vem ampliando investimentos, desde então. No fim das contas, a médio prazo a meta é permitir que os processos passem a atuar como espécie de consultor previdenciário de investimentos. Isso, a partir da análise das características do participante, com base em seus inputs via texto, interpretação de dados e, por fim, com a estruturação de planos sob medida para cada perfil de cliente. “É como se tivéssemos um consultor, só que é um robô. É um objetivo que temos para democratizar a consultoria previdenciária. Hoje o grande problema é escala. Precisamos ter especialistas. Se conseguirmos automatizar esse processo com inteligência artificial, ele se tornará muito mais disseminado. Todo participante poderia ter seu consultor previdenciário”, diz Daniel Swerts, gerente de Inovação da Valia.
Não é meta para amanhã, nem mesmo para depois de amanhã. Ainda levará algum tempo para se chegar a esse ponto, mas é onde a Valia quer chegar. Até porque, sem IA os planos de expansão da base de participantes para os próximos anos ficará comprometido.

Aplicações – No momento, as primeiras iniciativas foram em investimentos voltados para segurança da informação e atendimento aos participantes, com a criação de chatbot, atualmente em fase de atualização para versão 100% interativa; de biometria facial para o processo de cadastramento; e da categorização automática de e-mail por temas, direcionado a mensagem ao setor adequado. “Aumentou muito a eficiência dos processos. Parte da demanda consegue ser atendida por procedimentos automáticos. Por isso, vamos investir ainda mais no ano que vem”, diz Swerts.
Outro uso da IA está voltado para segurança da informação. O fundo investiu em ferramentas específicas para monitoramento de vazamento de dados e de eventos no mercado que possam representar riscos para a Valia, além de análise inteligente que dimensiona a vulnerabilidade dos produtos da fundação. O impacto, segundo Swerts, se traduziu em aumento de eficiência dos processos.
O mesmo ocorre em segurança da informação. “Melhorou muito a assertividade das soluções. Antigamente, precisávamos de pessoas testando e monitorando. Hoje, fazemos tudo de forma automática”, diz. O uso mais recente da IA ocorreu no setor de marketing, onde ferramentas já dão conta da produção de conteúdo. “Começamos a utilizar geração de conteúdo automática e só depois fazemos o refinamento das informações. Foi um grande ganho de eficiência e de tempo”, diz.
Para 2024, os projetos incluem iniciativas nas áreas de crédito e segurança, nesse caso visando incorporar cofre de senhas inteligentes, aumentando a proteção de acesso e melhoria do nível de segurança das soluções. Nas atividades de empréstimos, serão duas as aplicações de AI nos modelos de projeção, visando atingir maior assertividade tanto na concessão de crédito quanto na recuperação de inadimplência.
Em segurança, a Valia aumentará a proteção de credenciais de acesso. No processo de seguridade, o fundo tem projeto piloto de leitura automática do documento, substituindo o trabalho humano de digitação e validação das informações, checando se os dados correspondem aos dos beneficiários.
O setor jurídico é outro que tem obtidos ganhos de eficiência com as ferramentas de AI. “Estamos em fase de implementação. A AI analisa e resume contratos e processos judiciais, melhorando nossa gestão no contencioso”, diz o executivo de inovação, área recém-criada na Valia, e para quem a experiência com IA tem assegurado tomadas de decisão a partir de informações mais precisas e com maior nível de detalhamento. No fim da linha, o conjunto de ações poderá levar a melhores retornos de investimento aos beneficiários.
Para atingir tais objetivos, a Valia vem investindo em capacitação da equipe, na contratação de profissionais especializados e em parcerias com empresas de tecnologia. Soluções de biometria, de análise de inteligência artificial de texto na área jurídica, bem como o uso de ferramentas preditivas no setor de marketing são algumas das que demandaram parcerias. “Estamos atacando por todos os lados, com processos mais rápidos e custos menores”, diz. Segundo ele, o planejamento estratégico da Valia prevê a disseminação contínua de processos inteligentes nas diversas áreas de fundação, de modo a que todos os setores consigam identificar ações que possam ser automatizadas, além da busca de novas soluções e novos serviços.
Nesse sentido, mecanismos de concessão de empréstimos, por exemplo, estarão sujeitos a contínuos aprimoramentos. Dentro da solução de crédito, partindo da primeira etapa de validação, a gerência de inovação já trabalha com a possibilidade de uma segunda etapa, que seria a concessão de crédito personalizado. “Como o maior risco é a inadimplência, se fizermos uma projeção muito assertiva, podemos ter taxa diferenciada para cada cliente em vez de seguir uma taxa padrão. Isso, porque estaríamos avaliando o risco daquele participante”, diz Swerts. O projeto é para 2025.

Chatbot de atendimento – Na EnergisaPrev, o uso de IA nos processos é recente, com apenas poucos meses de uso. O fundo acaba de adotar um chatbot para atendimento, optando por priorizar investimentos na melhora da experiência com o participante. “Estamos aprimorando todas as funcionalidades que têm interface com o cliente. Hoje, nosso atendimento trabalha com recursos humanos, com a IA será automatizado”, diz Welyton Pinto, diretor financeiro e presidente interino da fundação. O chatGpt já está no radar.
Tais investimentos visam, também, adequar a estrutura para a entrada de novos participantes. A fundação prevê lançar seu plano família em 2024, com ingresso de público diferenciado e exigente. A meta é atingir cinco mil clientes com os produtos futuros. Além do atendimento, Pinto enfatiza que as ferramentas de IA serão utilizadas em análise de investimentos e em leitura de dados e informações. “Hoje, a avaliação de investimentos demora algum tempo, com a inteligência artificial essas atividades de análise poderão ser substituídas em até 40%. Em fundos de participações (FIPs) será bastante usado, principalmente em novos ativos”, diz Pinto.
Embora ainda tímido no setor, é um movimento sem volta. A Previc está selecionando empresas para desenvolver sistemas com tecnologia de inteligência artificial. Os investimentos disponíveis podem chegar R$ 6,5 milhões. Com isso, será possível identificar operações atípicas em fundos de pensão. Apesar da revolução que está por vir, uma coisa é certa: Sempre haverá necessidade de supervisão humana. Relatório global da Mercer, de 2023, chama atenção para o fato de que o uso de IA não deixa as fundações imune a riscos. O texto ressalta a relevância de forte governança no desenvolvimento destes sistemas a fim de que os planos de pensões mantenham a confiança dos seus membros a longo prazo.
Sem o olhar humano, os riscos são consideráveis. Stuart Russell, professor de ciência da computação na Universidade da Califórnia, em Berkeley, e um dos maiores pensadores da atualidade sobre inteligência artificial, cita exemplo clássico da ameaça da IA sem supervisão. Segundo um de seus exemplos, um robô-babá que esteja cuidando das crianças na ausência dos pais recebe ordem dos donos da casa para preparar uma comida. Abre a geladeira e não vê nada. Calcula o valor nutricional do gato da casa, verifica que é adequado, e a família terá um felino assado no jantar.