Fundos ilimitados na pauta

Edição 160

Abrapp espera audiência pública que vai alterar a Instrução 409 para propor a criação do “fundo específico”, que não terá as mesmas restrições que imperam nos fundos exclusivos

Em tempos de lobby, cada um defende o que é de seu interesse. Por isso, assim que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) colocar em audiência pública a revisão da Instrução 409 – que regula os fundos de investimentos no País –, a Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) pretende apresentar um conjunto de sugestões que inclui a criação de um fundo de investimento previdenciário chamado de “específico”.
A idéia chegou a ser discutida entre a entidade e a comissão de técnicos da autarquia nos dias que precederam a publicação da 409, em agosto de 2004. Mas a iniciativa não teria ido em frente porque existiam outras prioridades na pauta, segundo relata o diretor de investimentos da Abrapp, Antônio Jorge Vasconcelos da Cruz. “Preferimos buscar o que havia de mais urgente e dentro dos nossos interesses”, diz.
O executivo, que também é diretor da Previma, a fundação da Associação Nacional dos Investidores do Mercado Aberto (Andima), garante que, na ocasião, a CVM não colocou qualquer obstáculo à proposta. Pela sugestão, a patrocinadora colocaria nesse “fundo específico” seus aportes e os dos funcionários de modo segregado.
Sempre de acordo com o perfil, o objetivo e as necessidades pré-estabelecidas por cada um, garantindo mais liberdade para direcionar uma política própria e diferenciada – com possibilidade de ser mais ou menos conservadora e até se prefere aplicar em imóveis ou derivativos. Tudo, porém, de acordo com a Resolução 3.121.
Por não ter sido ainda divulgada e analisada com profundidade – ao que parece, sequer existe um texto formalizado –, a proposta da Abrapp confunde pela semelhança com o conceito do fundo de investimento exclusivo. Pela Instrução 409, este modelo aparece de forma sucinta no artigo 116. Diz apenas que “exclusivos” são aqueles constituídos para receber aplicações de um único cotista. E o parágrafo único estabelece que só investidores qualificados podem ser cotistas dos exclusivos.
Cruz admite que o fundo exclusivo é, de fato, bem próximo do que pedem agora os fundos de pensão, mas que o primeiro se revela limitado quanto a aceitar certos tipos de investimentos. Segundo o diretor, o objetivo do fundo “específico” é dar mais transparência e até mesmo servir de fomento para o setor de previdência complementar. Com isso, os investidores poderão criar políticas adequadas a cada padrão de fundo estabelecido.
“Hoje, o fundo exclusivo não permite, por exemplo, que se invista em cotas de fundo imobiliário. A gente propõe que o fundo específico abarque todos os tipos de aplicações”, diz. Na sua opinião, a iniciativa da Abrapp pretende atender à solicitação de algumas patrocinadoras interessadas em políticas diferenciadas. “O grande charme da idéia está em segregar recursos com política de investimentos para cada patrocinador”. Assim, ilustra ele, para dez patrocinadoras existiriam dez fundos.
A revisão da 409 está prevista para ir à audiência pública neste mês. Apesar de a CVM se limitar a dizer que tem recebido duas propostas em média por semana para mudanças na 409 e que só se pronuncia sobre qualquer questão depois de a mesma ser discutida e aprovada pelo colegiado, o presidente da autarquia, Marcelo Trindade, admite que a instituição irá rever o “esclarecimento” e a “disciplina” dos fundos exclusivos. Quanto à proposta do fundo “específico”, Trindade desconversa e diz que quem tem que falar sobre isso é mesmo a Abrapp, já que a proposta ainda não teria chegado oficialmente à autarquia.

CVM arma bote
As administradoras de fundos de investimentos já foram informadas que, no decorrer de agosto, a CVM iniciará uma ampla operação de fiscalização. Ninguém, portanto, será pego de surpresa. Foram contratados 70 inspetores que estão sendo treinados para ações por amostragem que a comissão chama de “preventivas”. A escolha dos alvos será feita por meio de sorteios. “A idéia é estabelecer um esquema de averiguação de rotina que durará todo o ano em forma de rodízio e será reiniciada ao final de cada doze meses”, explica o superintendente de relações com mercado intermediário, Waldir de Jesus Nobre.
Até o momento, o trabalho de fiscalização da CVM está centrado na demanda. Isto é, a partir de alguma suspeita identificada, seus auditores vão até o fundo ou à empresa para averiguar se algo está errado. “Pretendemos agir de forma preventiva em comitês de investimentos, áreas de compras e de valorização de ativos”, diz Nobre. Pela ordem já estabelecida, depois dos fundos de investimentos, serão averiguados as empresas e os corretores. A operação deve alcançar cada segmento ao menos uma vez por ano.

Acompanhamento – O aprimoramento do sistema de fiscalização da CVM não pára aí. No início de 2006, espera-se que entre em funcionamento um novo modelo de busca, ancorado num amplo banco de dados que pretende reduzir à metade o tempo gasto pelos fiscais. É o chamado Sistema de Acompanhamento de Mercado. O que está em vigor hoje foi desenvolvido dentro da própria comissão e o novo programa está sendo criado pela Athos Euronext, segundo informou o presidente da CVM, Marcelo Trindade. O novo programa tem um prazo de oito meses para concluí-lo, contado a partir de junho. “Contratamos essa empresa para aperfei-
çoar nosso trabalho por meio de concorrência internacional”, ressalta Nobre.
Por enquanto, o ponto de partida da investigação é a filtragem a partir de fatos relevantes identificados pelos fiscais. No momento, 32 profissionais fazem esse trabalho, divididos em 22 acompanhantes de mercado e nove de fundos. O problema está na lentidão para reunir, comparar, checar e avaliar o volume expressivo de dados. “Vamos trazer todas as informações para um único banco de dados para que gastemos mais tempo somente analisando os dados e não na coleta dos mesmos”.
A expectativa é de que a capacidade de produção seja dobrada. Hoje, são feitas cem análises por ano, em média. “Pode ser que nem cheguemos a isso, mas, se necessário, teremos condições de atender 200”. O programa permitirá também que a CVM se volte mais para outros mercados cuja demanda aumentou muito depois de 2001, por causa de mudanças na legislação, como o mercado de derivativos.