Fundações longe da meta | Com a subida da inflação e a queda da r...

Edição 125

A alta das taxas de inflação estão fazendo acender as luzes de alerta entre os dirigentes de fundos de pensão, que já prevêem grandes dificuldades para cumprir a meta atuarial deste ano. Até o último dia de setembro o IGP-M já acumulava alta de 10,54% e superava, inclusive, a taxa do ano de 2001 inteiro, que ficou em 10,37%. No caso do IGP-DI a taxa acumulada até setembro era de 11,60%, contra 10,40% em 2001. O INPC, que embora esteja bastante abaixo do IGP-M e do IGP-DI, acumulava 6,39% nos nove primeiros meses de 2002 mas deve subir bastante até o final do ano, por conta dos efeitos da alta do dólar sobre os preços dos bens e serviços.
Como a meta atuarial é, em geral, seis pontos percentuais acima desses indicadores, isso permite prever que as fundações terão que obter uma rentabilidade mínima de 16% a 20% para conseguir cumprir a meta neste ano. Bem, o problema é que conseguir uma rentabilidade nesses níveis será uma proeza e tanto em 2002, ano em que as bolsas acumulam perdas substanciais e as aplicações em renda fixa foram fortemente afetadas pela marcação a mercado dos papéis.
“Das 70 fundações que atendemos, 90% não vão conseguir bater a meta atuarial neste ano”, confidencia o diretor da área de investimentos da consultoria Mercer Human Resource, Lauro Araújo. “E para mais de 50% dessas 70 fundações, será o segundo ano consecutivo que ficam abaixo da meta”.
Segundo ele, as fundações acompanhadas pela consultoria estão seguindo uma estratégia de reduzir sistematicamente sua participação em renda variável, preferindo as aplicações em renda fixa. Na média, elas desceram de 20% para 14% sua participação em renda variável, do começo do ano até o final de setembro. “Mas, mesmo quem está 100% em CDI vai ter dificuldades de cumprir a meta, principalmente se perdeu com a marcação a mercado”, diz Araújo.
Embora estejam reduzindo as participações em renda variável, as perdas acumuladas nesse tipo de ativo são bastante pesadas e podem afetar significativamente o desempenho das carteiras de investimentos. No acumulado do ano, até 9 de setembro, o Ibovespa registrava perdas de –35,82%. “Com esse quadro de queda nas bolsas, nossa carteira de renda variável está abaixo da meta no acumulado até setembro”, conta o gerente de análise de investimentos da fundação Real Grandeza, Benito Siciliano. A Real Grandeza, fundação de Furnas Centrais Elétricas, possui 15% dos seus ativos em renda variável.
Segundo Benito, os 75% alocados em renda fixa estão batendo a meta, até porque desse total 70% são formados por títulos indexados ao IGP-M. Os outros 10% da carteira de investimento da fundação estão em imóveis e empréstimos a participantes. Ele acredita que conseguirá fechar o ano cumprindo a meta, por conta dessa concentração em papéis indexados ao IGP-M e CDI, os quais estavam em um fundo exclusivo e não tiveram perdas com a marcação a mercado. “Já vínhamos fazendo a marcação antes e não tivemos problemas com as novas regras”, diz Siciliano.
No ano passado a Real Grandeza ficou ligeiramente abaixo da meta, considerando o pagamento do IR. Neste ano, a reversão de parte do valor provisionado para o pagamento do IR terá um impacto positivo sobre o balanço. “Mas não deve ser tão significativo, pois entre 70% e 80% do valor provisionado foi pago”, contabiliza Siciliano.
Na São Rafael, fundo de pensão da Xerox do Brasil, o cumprimento da meta atuarial será uma tarefa difícil e dependerá da reversão das perdas em bolsas. Até setembro, a fundação estava um pouco abaixo da meta, que é IGP-DI + 6%. Sua carteira de renda variável, que representa 14% dos ativos totais, vinha perdendo da meta atuarial. A carteira de renda fixa também teve problemas, com LFTs de 2004 e 2005, embora dos cinco fundos exclusivos quatro estivessem batendo a meta em setembro.
Embora os planos da São Rafael sejam em CD, o que na realidade não a obriga a bater uma meta, a política interna é de tê-los como uma referência de desempenho. “Toda a nossa atuação é no sentido de bater a meta”, diz o superintendente da fundação, Peter Rasch. “Mas isso vai depender, em grande parte, do desempenho da Bolsa neste final de ano.”
Outra fundação que está na expectativa de uma reversão da tendência de queda das bolsas para conseguir cumprir a meta é a Eletros, fundo de pensão da Eletrobrás. A fundação não teve perdas com a marcação a mercado, mas sofreu forte impacto com a queda dos papéis nas bolsas. Com 25% da sua carteira de investimentos em renda variável, a Eletros resolveu ignorar neste ano uma política de investimentos que vinha seguindo desde 1999, de fazer operações de trava para a carteira em bolsa. “Não tínhamos uma previsão de queda tão grande para 2002, então não fizemos trava”, conta Márcio Cavour, diretor de investimentos da fundação.
Segundo ele, as perdas da fundação se limitaram à renda variável, uma vez que não teve perdas com a marcação a mercado. “O grosso dos nossos papéis já estava a mercado, tanto que quando o Banco Central permitiu marcar pela curva os papéis deste ano nós mantivemos a marcação a mercado”, conta Cavour. “Agora, na renda variável a história é outra, só não perdeu quem tinha trava na carteira”.
A meta atuarial da Eletros é INPC + 6%, e até o início de outubro a rentabilidade da carteira de investimentos estava abaixo disso. A única coisa que atenuava a situação da carteira era a reversão do IR provisionado, que transformava o déficit em um pequeno superávit.
No ano passado, a fundação Eletros já teve um déficit na sua carteira de investimentos, de cerca de 1% do patrimônio. Para este ano, com a ajuda da reversão do IR, a fundação espera fechar o ano com superávit. “Desisti de fazer prognósticos para 2002, mas espero manter o pequeno superávit que estamos tendo até agora, mesmo à custa da reversão do IR”, afirma afirma Cavour.
Na fundação CESP, em meados de setembro a rentabilidade da carteira de investimentos ainda superava um pouco a meta, segundo o diretor de investimentos, Martin Glogowsky. “Mas, agora não sei mais, nem sei como ficará até o final do ano. O que sei é que está muito difícil cumprir a meta”.
Com 14 patrocinadoras, cada uma com seu plano, a fundação Cesp tem sua meta estabelecida em IGP-DI. Da sua carteira de investimentos, 75% estão aplicados em renda fixa, sendo que dois terços são papéis indexados ao IGP, informa Glogowsky. No ano passado a rentabilidade da carteira da CESP foi de 11,4%, cinco pontos percentuais abaixo da sua meta de 16,4%.
Para o diretor da empresa Consultorys, Dionísio Jorge da Silva, um dos problemas do não cumprimento da meta por vários anos é que isso pode resultar em déficits para os planos, e após três anos de déficits seguidos tanto a patrocinadora quanto os participantes são chamados a apresentar uma proposta de ajuste. “Em 2000 o sistema fechou com superávit, mas já naquele ano algumas fundações tiveram déficit. Em 2001 o sistema fechou com déficit e em 2002 deve aumentar o déficit. Para muitas fundações, os três anos de déficit se configuram já neste ano, e isso é preocupante”, diz Silva.

Déficit de R$ 9,1 bilhão até junho
O Demonstrativo Contábil Consolidado de junho, publicado recentemente pela Secretaria de Previdência Complementar (SPC), mostra que o sistema possui um déficit técnico acumulado de R$ 9,1 bilhão. “Isso demonstra que o sistema está com ativos abaixo da sua necessidade de reservas”, explica o secretário da Previdência Complementar, José Roberto Savóia.
De acordo com ele, esse déficit é conseqüência de algumas dificuldades enfrentadas pelo mercado recentemente, principalmente quanto ao mal desempenho das bolsas no início do ano e aos resultados da marcação dos títulos a valor de mercado, de acordo com as exigências do Banco Central.