Em meio às extensas comemorações de seus 50 anos, completados em 10 de março último, a Funcesp, o maior fundo de pensão de patrocínio privado do país, com uma carteira de investimentos de R$ 32,03 bilhões, busca o rejuvenescimento. A prioridade estabelecida pela entidade fechada de previdência complementar (EFPC) é injetar sangue novo na população atendida por seus planos previdenciários, já que quase dois terços dos 107 mil cidadãos que atinge são aposentados ou pensionistas. Com isso, a Funcesp quer reduzir a defasagem crescente entre os benefícios pagos e as contribuições de participantes ativos e patrocinadores, que somou R$ 1,72 bilhão no último ano. “Estamos à procura de novos participantes e patrocinadores. E vamos pescá-los em nossos próprios ‘aquários’”, comenta o diretor-presidente Walter Mendes.
A organização da “pescaria” está a cargo da gerência executiva comercial, criada recentemente após alguns anos de estudos. Titular da área, o administrador de empresas Lucas Schmidt, que ostenta no currículo uma passagem por 13 anos pela consultoria Mercer Brasil, terá a missão de fisgar novos contribuintes e mantenedores em quatro “reservatórios” inseridos no raio de ação da Funcesp. “Um de nossos públicos-alvo são funcionários das patrocinadoras que ainda não aderiram à Funcesp. São cerca de 3,6 mil potenciais participantes“, observa Mendes.
Na esfera dos participantes, atuais e futuros, a entidade espera encontrar o apoio necessário para fazer decolar o seu plano instituído familiar, o FamilInvest. Lançado em junho deste ano e voltado aos dependentes e parentes em até quarto grau dos atuais participantes da Funcesp, o novo plano, lançado no formato de Contribuição Definida (CD), vem sendo demandado em níveis bem abaixo das previsões iniciais. Das 4 mil adesões projetadas para os primeiros 12 meses de operação, só 12,5% se concretizaram até o momento. “Fomos demasiadamente otimistas em relação ao FamilInvest”, admite o diretor-presidente. “Os planos familiares, de uma maneira geral, devem crescer de forma lenta, até porque apresentam um novo desafio ao setor, que é fazer a venda no varejo. Estamos desenvolvendo estratégias específicas para o segmento.”
Novos patrocínios – Em estágio bem mais adiantado está a ampliação das operações com os mantenedores, que teve início no segundo semestre de 2018 com a aprovação pela Previc dos três primeiros planos de contribuição definida (CDs) da Funcesp, para participantes da antiga Eletropaulo, da AES Tietê e da Empresa Metropolitana de Águas e Energia (Emae). A solução está prestes a ser abraçada por outras duas patrocinadoras da entidade, que contabiliza em sua grade de opções cinco planos de benefício definido (BDs) abertos a adesões. “O novo CD é um plano standard, de prateleira, que começou a ser desenvolvido há dois anos. A meta, a médio prazo, é que todos os nossos 11 patrocinadores ofereçam esse produto como opção aos seus BDs”, assinala o diretor-presidente.
A ampliação do quadro de mantenedores é outro objetivo da fundação, que pretende desenvolver esforços em duas frentes. A primeira e mais relevante é composta por empresas do mesmo setor econômico ao qual estão vinculados os atuais patrocinadores. O projeto da Funcesp é trazer para baixo do seu guarda-chuva novas grandes empresas. “Dois exemplos que estão em nosso radar são os grupos State Grid, da China, e Enel, da Itália, que assumiram os controles da CPFL e da Eletropaulo em 2017 e no ano passado, respectivamente, e contam com vários outros negócios no Brasil”, destaca Mendes. “No caso da Enel, comemoramos recentemente, após seis meses de negociações, a reconquista da operação do plano de saúde da Eletropaulo, que havíamos perdido em 2000.”
A segunda vertente abrange a prestação de serviços para fundos de pensão mantidos por grupos e empresas diversas, sem quaisquer vínculos com o setor dos atuais patrocinadores. É uma faixa de mercado na qual, por sinal, a Funcesp já começa a conquistar espaço. Em maio, a entidade firmou um acordo com a Sabesp para assumir a administração dos seus planos de saúde, trabalho antes executado pela própria Sabesprev, assegurando o ingresso da estatal paulista no quadro de patrocinadores de seus produtos previdenciários. “O nosso CD standard passou a ser uma opção exclusiva para os novos funcionários contratados pela Sabesp”, explica Mendes.
A demanda nesse segmento ainda está em formação. Mas tende, na avaliação do executivo, a ganhar corpo nos próximos anos em razão do processo de consolidação de entidades no sistema fechado de previdência complementar, ditada pelo aumento das despesas administrativas que a cada dia tornam mais inviáveis as EFPCs de menor porte.
“O desafio representado pela gestão de recursos em um cenário de juros baixos também contará pontos a favor da prestação de serviços por fundações maiores ao setor”, observa Mendes, que tomou o cuidado de não estabelecer metas iniciais para as pescarias da Funcesp. “Essa postura é resultado da frustração causada pela procura, bem abaixo das expectativas, do Familinvest. Só iremos traçar números e objetivos concretos após a conclusão de um trabalho de prospecção inicial e mapeamento que está sendo executado por nossa gerência comercial.”
Desempenho – Com uma rentabilidade acumulada nos nove primeiros meses do ano de 11,12%, que supera em 3,79 pontos percentuais a meta atuarial, a Funcesp vem aumentando, de forma gradativa a exposição de sua carteira ao risco. No período de 12 meses encerrado em setembro último, as aplicações em renda variável registraram crescimento de 55,31%, para R$ 4,36 bilhões, e elevaram a sua fatia no bolo total de de 9,61% para 13,63%. A entidade também passou a contemplar fundos multimercados e imobiliários, estes últimos como opção ao enxugamento de seu portfólio de imóveis (ver página 22).
“Nossa política de investimentos tende a abrir ainda mais espaço para aplicações de risco, especialmente às ações, que, devido à maior liquidez, são ativos mais adequados para grandes entidades, caso da Funcesp”, diz o diretor-presidente. “Outra opção que olhamos com atenção são os investimentos no exterior, segmento no qual, aliás, fomos um dos primeiros integrantes do sistema fechado de previdência complementar a explorar. Chegamos a ter volumes expressivos de aplicações em mercados externos, realizamos lucros, por conta da alta das bolsas de valores nos Estados Unidos, e devemos voltar a crescer nessa modalidade.”
A redução da taxa Selic, seguindo o movimento em voga nas principais economias globais, sinaliza, na visão de Mendes, uma profunda reformulação do modus operandi das principais EFPCs brasileiras. Acostumados a gerir por conta própria carteiras expressivas de títulos públicos ao longo de décadas, devido a taxas de juros anormalmente elevadas, esses investidores institucionais passarão a atuar de maneira muito mais intensa como alocadores de recursos, a exemplo do que ocorre com os fundos de pensão na Europa e Estados Unidos. “O desafio está posto. Para obter retornos maiores e cumprirem as suas metas atuariais, as fundações de previdência terão de escolher gestores externos capacitados e conhecer mais a fundo um leque maior de opções de investimento no Brasil e no exterior”, diz Mendes.